Acórdão nº 2497/06-1 de Tribunal da Relação de Évora, 06 de Março de 2007
Magistrado Responsável | ANTÓNIO DOMINGOS PIRES ROBALO |
Data da Resolução | 06 de Março de 2007 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em audiência, os juízes que compõem a secção criminal da relação de Évora.
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Relatório1.1. No âmbito do processo comum colectivo n° … 1° Juízo do Tribunal Judicial da Comarca do … procedeu-se ao Julgamento do Arguido A. …, a quem vinha imputada a prática de um crime de homicídio negligente p. e p. pelo artigo 137° n.ºs 1.º e 2.º do Código Penal, de um crime de ofensas à integridade física negligentes p. e p. pelo artigo 148.º n.º 1.º do Código Penal, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelo artigo 292°, também do Código Penal e de duas contra-ordenações p. e p. pelos artigos 27.º n.ºs 1 ° e 2° e 17° n.ºs 1 ° e 2°, ambos do Código da Estrada.
A final veio a decidir-se, por acórdão de 14/07/2005, o seguinte: a) declarar prescrito o procedimento pelas contra-ordenações que vinham imputadas p. e p. pelos art.ºs 27, n.ºs 1 e 2 e 17, n.ºs 1 e 2, ambos do Código de Estrada.
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julgar parcialmente procedente por provada a acusação deduzida pelo Ministério Público e, em consequência, condena-lo, em concurso ideal efectivo: I - na pena de dezoito meses de prisão, pela prática de um crime de homicídio por negligência grosseira, p. e p. pelos art.ºs 26 e 137, n.ºs 1 e 2, ambos do Código Penal, cuja execução lhe foi suspensa pelo período de três anos, mediante pertinente documento médico, a sua abstinência do consumo de bebidas alcoólicas.
II - na pena de sessenta dias de multa à taxa diária de quatro euros, pela prática de um crime de ofensa corporal negligente, p. e p. pelos art.s 26 e 148, n.º 1, ambos do C.P.
III - na pena de noventa dias de multa à taxa diária de quatro euros e na medida de segurança de cassação de carta de condução por dois anos e seis meses, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. nos art.ºs 26, 101, n.º 1, al. b), n.º 2, al. c), n.ºs 3 e 2, e 292, n.º 1, todos do Código Penal.
III) em cúmulo, nos termos do disposto no art.º 77, n.ºs 1, 2, 3 e 4, do Código Penal, condena-lo, na pena única de 18 meses de prisão, cuja execução se lhe suspendeu pelo período de 3 anos, impondo-lhe o dever de semanalmente comprovar nos autos, mediante pertinente documento médico, a sua abstinência do consumo de bebidas alcoólicas, na pena de multa única de cento e vinte dias, à taxa diária de quatro euros e na medida de segurança de cassação da carta de condução com interdição de concessão de nova carta pelo período de 2 anos e 6 meses.
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condená-lo a entregar a carta de condução, no prazo de dez dias, a contar do trânsito em julgado da decisão, na secretaria do tribunal, ou em qualquer posto policial (art,ºs 508, n.º 3 e 500, n.º 2, ambos do Código de Processo Penal).
*1.2. Inconformado, dele recorreu o arguido, de direito e de facto, para este Tribunal da Relação, concluindo a motivação de recurso com as seguintes conclusões (transcritas ): «1- O arguido foi condenado pela autoria material de um crime de condução em estado de embriaguês p. -e p. nos artigos 26 e 101°1 n.º alínea b)1 n.º2 alínea c) e 292°, n.º l todos do CP.
2- Não foi produzida prova que pudesse ter levado à decisão supra, motivo pelo qual se impõe a modificação da decisão do Tribunal a quo sobre a matéria de facto, o que é possível por haver documentação da prova, nos termos do artigo 431°, alínea b) do CPP.
3- O Recorrente considera os pontos 9, 16, 17, 20 (na parte em que refere "pelo menos"), 21 (na parte em que refere pelo menos") e 26 dos factos provados e bem assim os pontos X, XI, XII, XVI e XXVII dos factos não provados incorrectamente julgados.
4- De acordo com o ponto 9 dos factos provados '' A. … conduzia com uma taxa de álcool no sangue de 1,54 gr/l, tendo aquela taxa de álcool no sangue sido colhida às 17h35, ou seja 45 minutos depois do acidente.
5- Considerar provado que à hora do acidente o arguido apresentava a mesma TAS que 45 minutos depois é forçosa e notoriamente, ilógico, arbitrário e violador das mais elementares regras de experiência comum e consequentemente errado, motivo pelo qual ocorreu um erro grave e notório na apreciação da prova, o qual se invoca para efeitos do disposto no artigo 410°, n.º2, alínea c) do CPP.
6- Acresce que, de acordo com o artigo 1° do Decreto Regulamentar 24/98 de 30 de Outubro a presença de álcool no sangue pode detectar-se através de analisador qualitativo, analisador quantitativo, análise ao sangue e exame médico.
7- São estas as únicas formas legalmente previstas para detecção de álcool no sangue de um condutor - trata-se da chamada prova vinculada, subtraída à livre apreciação do Julgador prevista no artigo 127° CPP, não podendo, pois o Julgador substituir-se àqueles, sob pena de violação daquele dispositivo, motivo pelo qual se impõe que o facto 9 seja abolido do rol dos factos provados, passando a fazer parte do rol de factos não provados.
8- Quanto ao ponto 16 dos factos provados, o Tribunal a quo presumiu que o arguido mentiu, sendo certo que, vigora no nosso sistema legal o princípio da presunção da inocência, consagrado constitucionalmente no artigo 32°, n.º 2 CRP.
9- Da prova testemunhal produzida em audiência e acima transcrita, não resultam quaisquer indícios de que o arguido se sentisse e soubesse embriagado.
10- Não se sentindo nem se sabendo embriagado, naturalmente não poderia prever uma TAS superior a 1,20 gr/l de sangue nem conformar-se com tal possibilidade e bem assim com a possibilidade de vir a atingir pessoas com aquela viatura ao conduzir naquelas circunstâncias que inexistiam, motivo pelo qual o facto 16 deve ser alterado.
11- Quanto ao ponto 17, sempre se dirá que, se o arguido não se sentia embriagado nem revelava sinais de embriaguês, certamente não podia prever que uma situação inexistente pudesse dar causa a um acidente, motivo pelo qual tal ponto deverá ser dado como não provado.
12- Quanto ao ponto 20 dos factos provados, o Tribunal a quo alega que "não ficou com a certeza que o arguido tenha bebido uma cerveja com esta testemunha, apenas tendo a certeza de que, pelo menos, uma bebeu" (vide acórdão recorrido, respectiva fl. 21), ou seja, o Julgador manifestou, de forma flagrante, ter ficado com dúvidas.
13- Das declarações do arguido e da prova testemunhal produzida em audiência e acima transcrita quanto a esta matéria não resulta provado nem indiciado que o arguido tenha bebido pelo menos uma cerveja, antes se provou que o arguido bebeu urna cerveja.
14- A dúvida sobre a realidade de um facto deve ser decidida a favor do arguido, sendo certo que ter bebido "pelo menos uma cerveja" é, certamente, mais grave do que ter bebido uma cerveja.
13- Quanto ao ponto 21 dos factos provados, o Tribunal a quo "(...) ficou com dúvidas que o arguido apenas tenha ingerido as cervejas que declarou face à taxa acusada e daí que se tenha considerado provado que bebeu pelo menos aquelas que declarou ter bebido" vide acórdão recorrido, respectiva fls. 23).
16- Também aqui o Tribunal a quo manifestou expressamente terem subsistido dúvidas quanto ao número de cervejas ingerido, motivo pelo qual deveria decidido a favor do arguido em obediência ao princípio in dubio pro reo.
17- "No caso de se suscitar no espírito do julgador, uma dúvida razoável sobre a existência de um facto alegado pelo arguido ou resultante da discussão da causa que seja favorável ao mesmo arguido, então há que julgar o facto provado de harmonia com o princípio in dubio pro reo" (Ac. STJ de 13/10/1999 in dgsi.pt/jstj), pelo que tendo o Tribunal a quo decidido contra o arguido, tais pontos 20 e 21 deverão ser alterados em conformidade com o que acima ficou dito.
18- De acordo com o ponto 26 dos factos provados "A. … foi submetido a teste de controlo de alcoolemia às 17h35 tendo acusado uma taxa de álcool no sangue de 1,54 gr/l." 19 - Para fundamentar a sua decisão, o Tribunal a quo referiu: "Os factos provados em 26 basearam-se no resultado do teste de álcool efectuado ao arguido e cujo talão comprovativo está junto a fls. 5 destes autos, não tendo sido proferida qualquer prova com aptidão para destruir a força probatória do mencionado teste" (acórdão recorrido, respectiva fI. 24).
20- Também aqui, entende o Recorrente que a prova produzida pelo aludido talão foi posta em causa e que, como tal, se impunha decisão diversa da proferida.
21- Nos termos do n.º 1 do artigo l59 CE (na redacção vigente à data do acidente) "O exame de pesquisa de álcool expirado é realizado por agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito".
22- De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 12° do Decreto- Regu1amentar n° 24/98 de 30 de Outubro "Só podem ser utilizados quantitativos de álcool no ar expirado analisadores que obedeçam às características fixadas em portaria conjunta dos Ministros da Administração Interna, da Justiça e da Saúde e que sejam aprovados por despacho do director-geral de viação".
23- Dispõe o n.º 2 do mesmo diploma legal que "a aprovação a que se refere o número anterior é precedida de aprovação de marca e de modelo a efectuar pelo Instituto Português de Qualidade (...)".
24- O teste dos autos foi efectuado pelo alcoolímetro Alcotest, modelo Drager 7110 MKIII P n.º 0013 aprovado pelo Despacho de Aprovação do modelo n.º 211.06.96.3.30 publicado no DR n.º 223 III série de 25 de Setembro de 1996 e pelo Despacho Complementar n.º 3211.06.97.3.5G publicado no DR n.º 54, III série de 5 de Março de 1998.
25- O talão junto aos autos a fls. 5 faria fé em juízo, se tivessem sido cumpridos os requisitos que a lei impõe na recolha da prova.
26- De acordo com o Despacho de n.º 211.06.96.3.30 publicado no DR n.º 223 III série de 25 de Setembro de 1996 o aparelho em causa tem, entre outras, as principais características metrológicas: Tempo de aquecimento: Após ligação 15 minutos à T.A. de 20.ºC e Temperatura de utilização: 15°C a 35°C.
27- Em nenhuma parte do processo se faz referência à temperatura a que o teste foi realizado, referência que é imprescindível para se poder apurar se o resultado do teste é...
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