Acórdão nº 956/06-3 de Tribunal da Relação de Évora, 02 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelASSUNÇÃO RAIMUNDO
Data da Resolução02 de Novembro de 2006
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. nº 956/06-3 ACÓRDÃO Acordam os Juízes que compõem a Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: A Parceria Alentejana...................., com sede em Sines, moveu a presente acção, com processo ordinário, contra o Município de Sines, alegando, em síntese o seguinte: Por escritura pública celebrada em 13/12/47, Domingos Rodrigues Pablo deu de arrendamento à A. um prédio rústico que era constituído por um quintal, e que até aí era utilizado apenas para cultura; Tal arrendamento, conforme consta na escritura, tinha como objecto "a exploração de uma esplanada de diversões, cinema, bar, café, restaurante e qualquer outra diversão"; Também pela referida escritura foi desde logo dada autorização à A, para efectuar todas as obras que entendesse necessárias para aquele fim, ficando as mesmas sempre a pertencer à A.; A A. levou a efeito as edificações necessárias àquela exploração, obras essas feitas à sua custa; Por virtude da realização dessas obras, o prédio, na sequência de participação ás Finanças, passou de rústico a urbano, tendo sido inscrito na matriz predial urbana, em 1949, em nome da A.; Desde então que a A. vem usando as obras que levou a efeito, delas retirando benefícios, actuando na qualidade de proprietária das mesmas; Sempre a A. pagou a renda do quintal arrendado ao Domingos Pablo e depois aos seus herdeiros e posteriormente, por estes o terem vendido ao Gabinete da Área de Sines, a este; Posteriormente passou a pagar ao Réu, pois que o património do G.A.S. foi integrado neste; Em 1993 o Réu solicitou uma avaliação fiscal extraordinária, tendo sido fixada uma renda mensal de 300.000$00, em vez dos anteriores 400$00, tendo sido invocadas para essas alterações as obras existentes no local, levadas a efeito pela A.; Por tudo o referido, entende a A. que o Réu é apenas proprietário do terreno arrendado e que ela é a proprietária das obras e construções aí levadas a efeito.

Conclui, pedindo que: - Seja declarado que entre a A. e os antecessores do R. foi constituído um direito de superfície, sendo a A. a superficiária de todas as obras e construções levadas a cabo por ela no terreno que arrendou e que identifica, seja por força da cláusula 4ª do contrato de arrendamento, seja por virtude da usucapião, sendo o Réu dono tão só desse terreno; - Sejam ordenadas as modificações registrais em conformidade com isso - Caso assim se não entenda, seja considerado adquirido por acessão o terreno (quintal) onde estão incorporadas as obras; - Caso ainda assim se não entenda, seja decidido que o R. não pode cobrar à A. qualquer renda pela parte urbana, devendo a renda ser fixada pelos critérios dos arrendamentos rurais.

O R.

veio contestar e, em resumo, veio alegar: A autora desde 1962 que não exerce qualquer actividade comercial no arrendado, tendo arrendado o quintal e as construções nele existentes a terceiros; O Réu procedeu ao averbamento na descrição predial de modo a incluir nela as obras referidas no art.º 1395 da matriz, porque as mesmas têm a natureza de benfeitorias; As obras levadas a cabo pela A. não lhe trouxeram um significativo valor; A invocada cláusula 4ª da escritura de arrendamento é nula porque contraria as disposições legais então em vigor.

Termina pedindo a improcedência da acção e a sua absolvição dos pedidos.

Na réplica a A. respondeu às excepções suscitadas e manteve a tese defendida na petição inicial. Terminou pedindo a improcedência das excepções e a procedência da acção.

No despacho saneador foi afirmada a validade da instância e a regularidade da lide. Foram elaboradas a matéria de facto assente e a base instrutória.

As partes apresentaram os respectivos róis de testemunhas e o R. requereu prova pericial para um dos quesitos formulados (25º).

Após os trâmites legais e depois de levada a efeito a arbitragem requerida, o R. veio aos autos, em articulado superveniente, arguir a falta de personalidade jurídica da A. e também a sua incapacidade jurídica.

Alegou que a A. não se encontrava registada à data da propositura da acção, situação que só agora teve conhecimento e que a saber-se àquela data levaria ao indeferimento liminar da petição inicial, por a A. carecer de capacidade jurídica. Por outro lado, os subscritores da procuração dos autos não tinham poderes para representar e vincular a A. sociedade.

Este requerimento, foi então apreciado por despacho proferido a fls., 297, com a data de 12-10-2001, tendo sido liminarmente indeferido.

Em audiência de julgamento o R. apresentou reclamação à matéria de facto assente e à base instrutória, reclamação que foi declarada extemporânea, em virtude de à presente acção não se aplicar a reforma dada pelo DL. 329-A/95 de 12-12 ao Código de Processo Civil.

Após a audiência de julgamento, o despacho que respondeu à matéria de facto quesitada não mereceu qualquer reclamação.

Proferida a sentença, a acção foi julgada procedente e foi decidido: "Declarar que entre a A. e os antecessores do R. foi constituído um direito de superfície, sendo a A. superficiária e o antecessor do Réu proprietário do solo; Declarar, em consequência, que o Réu é tão só proprietário do terreno referido nas als. A) a F) dos factos assentes, sendo a A. proprietária das obras e construções nele implantadas, bem como da parcela de terreno com entrada pelo lado Norte (R. Zeca Afonso) que serve de acesso e apoio ás construções; Condenar o Réu a assim reconhecer; Ordenar o cancelamento do averbamento nº 06 feito pela ap. 03/05/12/94 à descrição nº 1863; Ordenar o cancelamento da descrição nº 1863 na parte relativa ao quintal com a área de 2000 m2." Inconformado, recorreu o R. que apresentou as seguintes conclusões: 1 - Não se encontra demonstrado nos autos, que o apelante saiba, que as pessoas que se arrogam a qualidade de representantes da sociedade recorrida sejam seus gerentes.

2 - Segundo o disposto no art° 252°, n° 1, do CSC, a representação das sociedades por quotas pertence aos respectivos gerentes.

3 - Não sendo gerentes da sociedade, os subscritores da procuração junta aos autos não a representam, só podendo litigar em nome próprio, pelo que são partes ilegítimas no processo, devendo, em consequência de tal violação do citado art° 252° ser o R., ora apelante, absolvido da instância.

4 - Quando tal não se entenda de direito, deve, então, a sociedade ser notificada, nos termos e para os efeitos consignados no art° 40 do CPC, para juntar ao processo nova procuração, com ratificação do processado.

5 - Não se tendo pronunciado sobre esta questão, que já fora levantada nos autos, encontra-se a douta sentença recorrida afectada por nulidade de omissão de pronúncia, conforme decorre do disposto no art° 668°, n° 1, al. d) do CPC, a qual deverá ser declarada e suprida, mediante a absolvição do apelante da instância. Quando assim senão entenda: 6 - No Código Civil de 1867 como no actual os direitos reais encontravam-se sujeitos ao princípio do "numerus clausus", como afirmam os Prof.s Pires de Lima e Antunes Varela, em Código Civil Anotado (Coimbra, 1972), sendo esta orientação largamente maioritária na doutrina e na jurisprudência, pelo que não era possível às partes constituírem tais direitos, mediante a celebração de contratos.

7 - O direito conferido pelo proprietário do prédio dos autos, mediante a celebração do contrato de arrendamento com a apelada, foi, pois, um verdadeiro direito de arrendatário e não um direito de superfície, o qual não se encontrava previsto no Código de Seabra para obras ou construções, pelo que, se se tratasse de um negócio constitutivo deste último direito seria nulo, por violação do art° 2 189° do citado Código, o qual discriminava as únicas formas de propriedade dita imperfeita consideradas em tal diploma.

8 - Com efeito, apenas o art° 22° da Lei 2030, de 22 de Junho de 1948, introduziu na ordem jurídica portuguesa o direito de superfície, na modalidade de manutenção de obra própria em terreno alheio.

9 - Ao considerar que, por contrato outorgado em 1947, quando tal direito não existia no ordenamento...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT