Acórdão nº 01312/06 de Tribunal Central Administrativo Sul, 26 de Setembro de 2006
Magistrado Responsável | JOSÉ CORREIA |
Data da Resolução | 26 de Setembro de 2006 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
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- RELATÓRIO 1.1.- B... TRANSPORTES, S.A., com os sinais identificadores dos autos, recorre da sentença proferida pela Mª. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, no processo de impugnação que deduziu contra a liquidação adicional de IRC e respectivos juros compensatórios, referentes ao ano de 1996.
Alega e termina formulando as seguintes conclusões: 1.- Nestes termos, a Recorrente conclui as suas alegações requerendo que seja o presente recurso julgado procedente e, consequentemente, a sentença proferida seja revogada e substituída por acórdão que dê provimento ao pedido daquela, porquanto: 2.- A decisão a quo merece censura porquanto os fundamentos por si utilizados assentaram em factos insuficientes e interpretaram e aplicaram mal a lei.
Vejamos, tal decisão considerou: i) Em primeiro lugar que, nas operações de cisão o "princípio base" no apuramento das mais e menos-valias é o da neutralidade tributária, pelo que in casu os activos foram transmitidos pelo valor de aquisição histórico; ii) Em segundo lugar, no que respeita à ausência de fundamentação da liquidação, o Tribunal entendeu que a Recorrente conhecia as razões por que lhe foi liquidado imposto posto que a sociedade terá "apreendido o iter valorativo e cognscítivo que determinou a efectiva defesa dos seus pontos de visia", não existindo assim, segundo o Tribunal, qualquer ausência de fundamentação relevante; iii) De seguida, ainda no que respeita à falta de fundamentação, entendeu que a Administração fiscal se pronunciou sobre os novos elementos trazidos pela então impugnante em sede de audição prévia; iv) Em quarto lugar, quanto à violação dos princípios constitucionais e de lei ordinária da boa fé, da confiança e da segurança jurídica, o Tribunal a quo limitou-se a concluir (sem justificar) não existir qualquer violação de tais princípios por parte da Administração; v) Finalmente, veio o Tribunal a quo concluir, também sem qualquer justificação, pela improcedência quanto ao vício de violação de lei por falta de pressupostos para a liquidação de juros compensatórios. Para o Tribunal, tal liquidação está "suficientementefundamentada".
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Concluímos, no entanto, que importa começar por incluir na sentença factos que resultaram da instrução do processo mas que não foram tomados como base na decisão, e que determinam a modifícabilidade da decisão de facto e de direito, a saber: i) Ficou provado que a Recorrente só foi constituída em 31 de Janeiro de 1991, no âmbito do processo de reprivatização e de cisão da RNIP; ii) Ficou provado que os bens transmitidos por cisão foram reavaliados no âmbito da sociedade cindida nos termos do Decreto-Lei n.° 12/90 (e não ao abrigo de legislação de carácter fiscal), tendo a reserva de reavaliação sido incorporada no capital social da RNIP, SA; iii) Ficou provado que o valor de aquisição-base atribuído aos activos da Recorrente foi aquele que ficou inscrito no balanço de cisão e que está patente nos prospectos de venda da empresa, não existindo no balanço qualquer referência a uma reserva de reavaliação que evidenciasse a existência de uma divergência entre o valor do activo histórico e contabilístico; iv) Ficou provada a não adesão da Recorrente ao regime especial da neutralidade fiscal na cisão da RNIP, SÁ; v) Ficou provado que a Administração fiscal nunca evidenciou o cumprimento dos requisitos substanciais, formais ou procedimentais respeitantes às cisões que gozam de neutralidade e, em particular, não carreou para os autos a alegada declaração passada pela Recorrente de que esta consideraria o valor de aquisição histórico no caso de futura alienação dos bens, nos termos do artigo 62.° n.° 8 do Código do IRC; vi) Em regra, compete às sociedades intervenientes nos processos de fusões ou cisões provar que preencheram os requisitos substanciais, formais e procedimentais para que possam gozar do regime de neutralidade fiscal; vii) No caso em apreço, em virtude da Recorrente negar que se aplicou o regime da neutralidade, do Estado ser o dono da empresa ao tempo da cisão, e ser o Estado quem tem interesse na liquidação do imposto (no pressuposto de que se aplicou o regime da neutralidade), compete à Administração fiscal, em conformidade com o artigo 74.° n.° l da LGT, o ónus de prova de que: a) os sujeitos passivos intervenientes na cisão haviam optado pelo regime especial da neutralidade aplicável às cisões; b) se verificaram os requisitos previstos na lei para se aplicar tal regime especial; c) foi emitida uma declaração pela Recorrente comprovando que respeitaria o regime especial da neutralidade como mandava o artigo 62.° n.° 8 do Código do IRC; viii) O regime especial da neutralidade fiscal aplicável às cisões e fusões não consubstancia um "princípio base" de aplicação automática, sendo antes um regime especial aplicável preenchidos determinados requisitos; ix) O princípio da boa fé, conjugado com o princípio da colaboração, impunham que o Estado /» casu tivesse adoptado um comportamento diferente em relação à Recorrente, desde logo a) começando por lhe prestar a informação que o valor dos activos correspondia a um 'Valor reavaliado" e, b) num segundo momento, que em caso de venda, impunha a respectiva tributação como se não tivesse existido qualquer reavaliação, decorrendo daqui a necessidade de se revogar a sentença posto que esta também neste domínio aplicou erroneamente o Direito ao não anular os actos postos em crise pela ora Recorrente; x.) A interpretação pela qual se conclui que o regime especial (de neutralidade) aplicável às cisões e fusões é um "princípio geral" e automático colide frontalmente com os princípios da igualdade, segurança jurídica e da boa-fé, previstos no artigo 166.° da CRP, funcionando numa inaceitável e ilegal lógica de presunção absoluta, pelo que a sentença do Tribunal a quo ao trilhar tal entendimento viola, ela também, tais princípios fundamentais da actuação da Administração merecendo assim censura e necessidade de ser revogada; xx) A liquidação de juros compensatórios não indica a taxa dos juros aplicável, nem o início e o fim da sua contagem, pelo que tal liquidação é ilegal por falta de fundamentação, merecendo também censura a decisão a quo que em si baseou; xx.i} Acresce que, evidenciada está também a falta de culpa da Recorrente na apreciação dos factos e na sua subsunção ao Direito relevante, pelo que sempre se revelaria a liquidação de juros compensatórios ilegal face à jurisprudência constante dos Tribunais Superiores nestas circunstâncias.
Termos em que, a decisão a quo, no que respeita à não anulação da liquidação de IRC e juros compensatórios merece inteira censura, devendo V.Ex.as concederem provimento ao presente recurso jurisdicional, revogando a sentença, e tudo com as devidas consequências legais.
Só nestes termos será respeitado o DIREITO e feita JUSTIÇA.
Não houve contra - alegações.
O EPGA emitiu a fls. 143/144, o seguinte douto parecer: "1- Em longas alegações vem a requerente dissentir da douta sentença invocando, em resumo que: Que a matéria de facto é insuficiente e que deverão ser aditados novos factos alegados na impugnação para uma correcta decisão da causa, pelo que houve erro de direito devendo assim a sentença recorrida ser anulada; Que a interpretação pela qual se conclui que o regime especial de neutralidade fiscal aplicável às cisões e fusões colide frontalmente com os princípios da igualdade e segurança jurídica e boa fé, previstos no artigo 166.° (deve ser artigo 266.° conforme invocado nas alegações de fls.66 e seguintes) da CRP; Que a liquidação dos juros compensatórios não indica a taxa de juros aplicável, nem o início e o fim da sua contagem, pelo que a liquidação padece de vício de fundamentação; Que não teve culpa na apreciação dos factos e aplicação do direito pelo que é ilegal a liquidação dos juros compensatórios.
2- Quanto à matéria de facto a sentença seleccionou os actos relevantes segundos as diversas interpretações plausíveis de direito.
Também foi feito o seu devido enquadramento lega pelo que não existe qualquer erro de facto nem de direito.
3-Quanto ao regime especial de neutralidade fiscal não vemos em que possa contrariar o conteúdo do artigo 266.° da CRP como bem se refere em iii) da douta sentença recorrida.
Refira-se que este vício não foi invocado na petição inicial mas tão só nas alegações de fls. 66 e seguintes pelo que duvidamos se a sentença dele deveria ter tomado conhecimento.
De qualquer dos modos ao referir-se no artigo 62.° n.° 3 alínea a) do CIRC que "Na determinação do lucro tributável da sociedade para a qual são transmitidos os elementos patrimoniais das sociedades fundidas ou cindidas: a) O apuramento dos resultados respeitantes aos elementos patrimoniais transmitidos é feito como se não tivesse havido fusão ou cisão;" não se descortina como é que houve violação do artigo 266.° n.° 2 da CRP. AF limitou-se a cumprir a lei observando os princípios contidos neste n.° 2 do artigo 266.° da CRP.
4- Relativamente a falta de fundamentação relativamente aos juros compensatórios assiste razão à recorrente.
A fundamentação deve ser expressa, eira suficiente e congruente.
A fundamentação de acordo com a jurisprudência citada na sentença deve ser de tal modo que um destinatário normal compreenda o caminho cognoscitivo e valorativo percorrido pelo autor do acto no sentido de ser proferido aquele acto e não outro e que permita ao seu destinatário poder conformar-se com o mesmo ou impugná-lo Ora tal não acontece com os juros compensatórios.
Efectivamente a recorrente ou qualquer destinatário normal não compreende, conforme se deduz da liquidação de fls. 16, qual a taxa de juros aplicada, qual o montante sobre que incidiu essa taxa e qual o termo inicial e final tidos em consideração para o cálculos dos juros compensatórios.
Neste sentido tem sido a jurisprudência deste TCAS.
Apenas consta da liquidação a norma jurídica que prevê a obrigação de pagar os juros compensatórios (artigo 80.° do CIRC)...
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