Acórdão nº 01088/05.3BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 24 de Maio de 2007
Magistrado Responsável | Dr |
Data da Resolução | 24 de Maio de 2007 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: Relatório Associação ….
– com sede na rua …, Braga – interpõe recurso jurisdicional da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal [TAF] de Braga – em 29 de Maio de 2006 – que, com fundamento na sua ilegitimidade, absolveu da instância a Comissão Regional da Grande Área Metropolitana do Minho [CR] e a sociedade M…, SGPS, Lda.
[MS] – a decisão foi proferida no âmbito de uma acção administrativa especial em que a A... pedia a anulação da deliberação de 4 de Julho de 2005 da CR que autorizou a MS a instalar um estabelecimento comercial de retalho não alimentar no lugar de Senra de Abaixo, freguesia de Lamaçães, concelho de Braga.
Conclui as suas alegações da forma seguinte: 1- A decisão recorrida aborda a questão de modo errado; 2- A recorrente alega factos donde se infere com segurança que tem legitimidade por ser parte na relação material controvertida, como resulta dos artigos 1 a 3 do requerimento inicial, 6º a 8º da resposta, e do documento nº 1 junto a folhas 2 e 3; 3– Entende a recorrente ter alegado factos relevantes no sentido de justificar a sua intervenção nos autos, na qualidade de defensora dos interesses económicos, sociais e profissionais dos seus associados; 4– A fundamentação da decisão recorrida é restritiva e limitadora face às novas circunstâncias criadas pela actual reforma do contencioso administrativo, que veio consagrar os princípios da tutela jurisdicional efectiva, da promoção de acesso à justiça, e da plenitude da garantia jurisdicional administrativa; 5– A decisão recorrida restringe a aferição da legitimidade activa processual ao nº 1 do artigo 9º do CPTA, não tomando em consideração, como deveria, o nº 2 do mesmo artigo; 6– Com este nº 2 o legislador pretendeu ampliar a legitimidade activa, de tal modo que, actualmente deverá ser considerado parte legítima não só o autor que alegue ser parte na relação material controvertida, como também todas as pessoas, singulares ou colectivas, abrangidas pelo nele disposto; 7– No caso concreto, resulta claro que a recorrente se integra na previsão desse nº 2. Aliás, na própria decisão recorrida é admitido que a recorrente “…comporta-se neste autos como defensora do ambiente e do urbanismo, com enfoque na construção de um equipamento comercial, e autorizada a sua instalação em termos que alegadamente não respeitam a lei…” – ver página 4 da decisão recorrida; 8- Saliente-se ainda que o próprio nº 1 do artigo 55º do CPTA, nas suas alíneas c) e f), vem acolher o alargamento da legitimidade activa do nº 2 do artigo 9º e dos princípios indicados.
Termina pedindo a revogação da decisão recorrida.
Apenas a M… contra-alegou, concluindo assim: I- Para que nos termos dos artigos 9º nº 1 e 55º nº 1 alínea a) do CPTA a recorrente pudesse ser considerada parte na relação material controvertida, teria que ter invocado ser titular de interesse directo e pessoal posto em causa pelo acto administrativo impugnado; II- A recorrente não alegou qualquer interesse próprio e real que, por via da impugnação judicial do acto administrativo pudesse vir a ser salvaguardado; III- A autora não tem, na verdade, qualquer direito [potestativo] próprio que se integre na relação material controvertida que ela mesma configura; IV- Como sublinha a decisão recorrida, o facto de ter participado na deliberação tomada pela CR não faz da autora parte da relação material controvertida, precisamente porque a deliberação não põe em causa qualquer interesse directo e pessoal da autora; V- Importa, ainda, equacionar a legitimidade da recorrente à luz do disposto no artigo 9º nº 2 do CPTA, que confere às associações defensoras dos interesses em causa, entre outras, legitimidade para propor e intervir, nos termos da lei, em processos principais e cautelares destinados à defesa de valores e bem constitucionalmente protegidos como “a saúde pública, o ambiente, o urbanismo, o ordenamento do território, a qualidade de vida, o património cultural e os bens do Estado, das Regiões Autónomas e das Autarquias Locais”; VI- O fundamento da legitimidade social de associações, como a recorrente, assenta cumulativamente na sua natureza estatutária [desinteressada] e no seu objecto social [a defesa de interesses gerais, de bens colectivos: a saúde pública, o ambiente, o património cultural, etc.], abrangendo tanto as que têm carácter público quanto privado; VII- Do requerimento inicial resulta apenas que a autora tem por competência a “representação, defesa e promoção dos interesses económicos, sociais, profissionais e culturas dos seus associados”, interesses esses que não têm protecção constitucional; VIII- Uma vez que a autora se apresentou a demandar a CR e a ora recorrida com vista à defesa de valores ou bens que não mereceram tutela constitucional, tem de concluir-se que não tem legitimidade para, nos termos do artigo 9º nº 2 do CPTA, propor a acção nos termos em que o fez; IX- Por outro lado, ainda que se entendesse que a conclusão constante do artigo 63º do requerimento inicial [não concretizada num único facto alegado] era suficiente para se afirmar que a recorrente se apresenta como defensora do ambiente e urbanismo [valores com protecção constitucional] a verdade é que não decorre do por ela alegado que os mesmos façam parte das suas competências; X- Atendendo a que, nos termos do artigo 9º nº 2 do CPTA, o fundamento da legitimidade social ou alargada das associações depende do seu objecto social incluir a defesa de bens constitucionalmente protegidos, cuja defesa se pretende concretizar judicialmente, conclui-se que a autora carece de legitimidade para propor a presente acção, se não mesmo de capacidade judiciária; XI- Assim, apesar dos esforços da recorrente para justificar a sua legitimidade à luz do artigo 9º nº 2 do CPTA, no caso concreto não se mostra preenchida a respectiva previsão; XII- Mesmo que por absurdo não procedesse esta argumentação, o que não se concede, a verdade é que, atento o disposto na alínea e) do nº 1 do artigo 55º do CPTA a autora sempre careceria de legitimidade para propor a presente acção; XIII- A regra de legitimidade para impugnar actos administrativos da autoria de órgãos colegiais resulta do artigo 55º nº 1 alínea e) do CPTA, que sendo especial em relação à regra geral invocada pela autora, e por força do princípio lex specialis derogat generali, veda a esta a impugnação do acto administrativo em causa; XIV- Dispõe a alínea e) do nº 1 do artigo 55º do CPTA que apenas os presidentes de órgãos colegiais podem impugnar um acto administrativo praticado pelo respectivo órgão, pelo que a autora, enquanto membro do órgão que proferiu o acto administrativo em causa, não tem o direito de impugnar externamente as deliberações tomadas pelo órgão; XV- De nada vale à recorrente a circunstância de ter votado contra a deliberação, já que a declaração de voto de vencido tem como única consequência jurídica a exoneração da responsabilidade individual ou pessoal do respectivo declarante pela deliberação tomada [artigo 28º nº 2 do CPA]; XVI- Atento o exposto, verifica-se que a autora não é parte legítima na presente acção, atento o disposto no artigo 55º nº 1 alínea e) do CPTA, e artigo 14º nº 4 do CPA, o que conduz à absolvição da instância; XVII- Mas, ainda que se viesse a considerar a autora parte legitima, a verdade é que sempre careceria de interesse em agir, o que teria como consequência, também, a absolvição da instância; XVIII- Nos termos do artigo 55º nº 1 alínea a) do CPTA, tem legitimidade para impugnar um acto administrativo quem alegue ser titular de um interesse directo e pessoal, designadamente por ter sido lesado pelo acto nos seus direitos ou interesses legalmente protegidos; XIX- É certo que a autora é uma pessoa colectiva de utilidade pública e que o artigo 55º nº 1 alínea c) do CPTA confere legitimidade às pessoas colectivas [públicas e privadas] para impugnar um acto administrativo quanto aos direitos e interesses que lhes cumpra defender; XX- Porém, como refere Mário Aroso de Almeida “Como é evidente, para que a impugnação se inscreva nas incumbências de uma pessoa colectiva pública, é necessário que o acto impugnado contenda com os interesses legalmente estabelecidos como atribuições dessa pessoa colectiva.
[…] É o que sucede […] quando esteja em causa um acto praticado no exercício de uma competência respeitante a uma matéria em relação à qual a entidade interessada em impugnar também tenha poderes de intervenção, quando esse acto ponha em causa interesses que a essa entidade cumpra defender”; XXI- Do exposto, e ainda que a autora fosse parte legítima, o que não se concede, não é possível, todavia, concluir pela existência de efectivo interesse em agir da sua parte, já que, por um lado, não identifica os titulares dos interesses em representação dos quais é permitida a sua actuação em juízo, como, por outro, não identifica que interesses são esses, nem em que medida o acto administrativo impugnado é susceptível de os afectar; XXII- Não é possível, pois, saber qual a utilidade concreta que pode advir, para cada um dos associados da autora, da anulação do acto administrativo em causa; XXIII- Como tal, constata-se não ter a autora real interesse em agir, o que se traduz na falta de pressuposto processual que conduz à absolvição da instância.
Termina pedindo a manutenção integral da decisão recorrida.
O Ministério Público pronunciou-se pelo não provimento do recurso jurisdicional.
*De Facto Apesar de a decisão recorrida não ter fixado quaisquer factos provados, com interesse para a decisão da questão excepcional, entendemos por bem, em nome da clareza, considerar como assente o seguinte: 1- A Associação … [Comércio, Turismo e Serviços] pediu ao TAF de Braga a anulação da deliberação de 4 de Julho de 2005 da Comissão Regional da Grande Área Metropolitana do Minho, que autorizou à sociedade M…, SGPS-Lda a instalação de um...
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