Acórdão nº 0741423 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 18 de Junho de 2007

Magistrado ResponsávelPINTO MONTEIRO
Data da Resolução18 de Junho de 2007
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em audiência, no Tribunal da Relação do Porto: No Tribunal Judicial de Tabuaço, foram os arguidos B………. e C………., ambos devidamente identificados nos autos a fls. 1203, condenados pela prática de um crime de desobediência na forma continuada, p.p. nos termos dos arts. 348.º, n.º1, al. b), e 30.º, ambos do Código Penal, na pena de multa, cada um, de 65 dias, à razão diária de €80,00.

Inconformados com a decisão, recorreram os arguidos, tendo concluído a motivação nos termos seguintes: 1 - O Tribunal condenou cada um dos arguidos pela prática, na forma continuada, de um crime de desobediência p. e p. pelo art.º 348.º, n.º1, al. b), e 30.º, do C. P., na pena de multa de 65 dias, à taxa diária de €80,00, num total de €5.200,00.

2 - Tal crime ter-se-ia consubstanciado nas datas de 11 de Julho de 2001, no período compreendido entre 11 de Setembro de 2001 e 19 de Setembro de 2001 e no dia 14 de Novembro de 2001, por, contrariamente ao que havia sido ordenado pela decisão administrativa, terem mantido em funcionamento a oficina de britagem.

3 - A responsabilidade dos arguidos, segundo a sentença recorrida, decorre das circunstâncias de ter considerado que os mesmos exerciam a gerência de facto e que foi com o seu conhecimento e consentimento que ocorreu tal laboração.

4 - Porém, a prova produzida em audiência apenas confirma a circunstância de serem gerentes de direito da D………., Lda.

5 - Na verdade, a sentença recorrida extraiu desse facto, conclusão de que, sabiam da laboração da central de britagem.

6 - Os arguidos negaram tal conhecimento, afirmando ser o irmão E………. quem exercia a gerência de facto na pedreira e central de britagem.

7 - E as testemunhas apenas foram questionadas sobre os hábitos de funcionamento da empresa D………., Lda que não se circunscrevem aos trabalhos e não quanto à pedreira e central de britagem, especificamente e nos períodos indicados.

8 - Em momento algum, qualquer testemunha afirmou terem os arguidos ordenado o que quer que fosse relacionado com os trabalhos das pedreiras, bem como disseram que os arguidos sabiam que se encontrava a laborar a central de britagem.

9 - Isto porque dedicando-se a empresa a trabalhos de obras públicas teve no local a laborar a central de tapete betuminoso.

10 - E isto sim e tão só era do conhecimento dos arguidos.

11 - Encontra-se, assim, a sentença recorrida ferida das nulidades da insuficiência da matéria de facto para a decisão e erro notório na apreciação da prova.

12 - Veja-se no sentido que se pugna, os depoimentos dos arguidos, constantes da cassete n.º1, lado A, desde o n.º0000 ao n.º0292; e n.º0000 ao n.º1521 do lado A - 1.ª cassete - 2.ª sessão, das testemunhas F………., cassete n.º1 lado B desde o n.º0388 ao n.º1332; G………., n.º1333 ao n.º1745 do lado B, primeira cassete, H………., cassete n.º2, lado A do n.º0615 ao n.º1305; I………., desde o n.º1306 ao n.º1735 do lado A e desde o n.º0000 ao n.º0554 do lado B, 2.ª cassete; J………., desde o n.º0555 ao n.º1742 do lado B, 2.ª cassete e desde o n.º0000 ao n.º0553 do lado A, 3.ª cassete; K………., desde o n.º1616 ao 1745 do lado A, 3.ª cassete e desde o n.º0000 ao n.º1745 do lado B - 3.ª cassete e desde o n.º0000 ao n.º 0411 do lado A - 4.ª cassete; L………., desde o n.º 0412 ao n.º 1646 do lado A - 4.ª cassete; M………., desde o n.º1417 ao n.º 1740 do lado B, 1.ª cassete e desde o n.º0000 ao n.º0749 do lado A - 2.ª cassete - 2.ª sessão e N……….; desde o n.º0750 a n.º1235 do lado A - 2.ª cassete - 2.ª sessão.

13 - Ainda que assim não fosse tendo sido interposto recurso hierárquico da decisão administrativa para o Sr. Ministro da Economia que foi admitido e considerado tempestivo, encontravam-se suspensos os efeitos do despacho recorrido pelo que, nas datas em causa, não estava em vigor.

14 - Isto porque, não obstante, a D………., Lda, tendo optado pela via contenciosa veio a constatar-se que no decurso desta, a notificação da decisão administrativa havia sido feita deficientemente, não alertando a empresa, como é obrigatório, para a possibilidade de recorrer hierarquicamente.

15 - Facto este que, não obstante ter vindo ao conhecimento do processo na fase do inquérito foi sempre ignorado pelo Tribunal.

16 - Por tal motivo e ao abrigo do disposto no art.º 65 do CPA (deve ter querido dizer "art.º 68.º", disposição legal que estabelece o conteúdo da notificação) a D……….., Lda intentou o recurso hierárquico do despacho da Sr.ª Directora para o Sr. Ministro da Economia e depois o recurso contencioso para o Tribunal Administrativo de Viseu, cujos termos correm com o n.º…/04.9BEVIS.

17 - Conforme resulta a fls. 239/240 dos autos, na informação prestada pela Direcção Regional do Norte ao Sr. Ministro da Economia aquando do recurso hierárquico, considerou, aliás decorrente da lei, que aquele "deu entrada em 14 de Fevereiro de 2003, pelo que é tempestivo".

18 - Nunca foi intenção dos arguidos de desobedecer à decisão administrativa.

19 - Assim se explicando a circunstância de terem de imediato cessado a laboração da central de britagem.

20 - Impunha-se assim que tivessem de ser absolvidos.

21 - No entanto e apenas por mera cautela, nunca os arguidos deveriam ter sido condenados de forma tão gravosa e repressiva.

22 - O quantitativo diário fixado é desadequado às condições económicas e capacidade financeira dos arguidos que, muito embora sejam titulares de alguns bens passam sérias dificuldades, essencialmente decorrentes da recessão do mercado de obras e também do muito dilatado prazo de pagamento por parte, designadamente, dos clientes - autarquias locais - o que é do conhecimento geral.

23 - Como suporte probatório das condições económicas dos arguidos, o que foi o suporte do cálculo do montante diário, foram utilizadas provas não produzidas em julgamento nem submetidas a contraditório.

24 - Isto porque foi solicitada à Repartição de Finanças certidão dos imóveis titulados pelos arguidos e não foi dado conhecimento em sede de audiência de julgamento aos mesmos e não foi dado conhecimento aos arguidos.

25 - E assim violou-se o princípio da proibição de provas, previsto no art. 355.º, n.º1, do CPP, sendo assim, a sentença é nula também nesta perspectiva.

26 - Termos em que deve ser revogada a sentença recorrida e substituída por uma outra que absolva os arguidos, ou então anular-se a audiência de julgamento nos termos pugnados e caso assim não se entenda, subsidiariamente ser aplicada aos arguidos uma pena de multa diária nunca superior a €10,00.

X X XNa 1.ª instância respondeu o M.º P.º pronunciando-se pelo não provimento do recurso, sendo no mesmo sentido o parecer do Exm.º Procurador Geral Adjunto neste tribunal.

Cumprido o disposto no n.º2 do art. 417.º do C. P. Penal não houve resposta.

Foram colhidos os vistos legais.

Procedeu-se à audiência de julgamento de harmonia com o formalismo legal, como consta da respectiva acta.

Cumpre decidir.

X X XNa audiência de julgamento da 1.ª instância procedeu-se à documentação da prova ali oralmente produzida, pelo que, nos termos dos arts. 364.º, n.º1, e 428.º, n.º2, ambos do C. P. Penal, este tribunal conhece de facto e de direito.

X X XTendo em conta as conclusões da motivação do recurso e que estas delimitam o seu objecto, são as seguintes as questões suscitadas pelos arguidos a merecerem apreciação, que se indicam pela ordem por que, logicamente, devem ser apreciadas; a) fundamentação dos factos relativos à situação económica dos arguidos em prova não produzida na audiência de julgamento, em violação do disposto no n.º1 do art. 355.º do C. P. Penal, que qualificam como nulidade da sentença; b) erro de julgamento da matéria de facto provada; c) errada qualificação jurídica da matéria de facto provada; e d) medida da pena.

X X Xa) É a seguinte a matéria de facto considerada provada constante da sentença recorrida: I - Os arguidos são sócios gerentes da sociedade comercial por quotas que gira sob a denominação «D………., Lda», registada na Conservatória do Registo Comercial de Tabuaço sob a matrícula n.º ../……, com sede na Vila de Tabuaço, que tem por objecto social o exercício da indústria de construção civil, obras públicas, britagem e exploração de pedreiras - [Certidão da Conservatória do Registo Comercial junta a fls. 248 a 256 e certidão actualizada de 23.06.06, cujo teor se dão aqui por integralmente reproduzidos] (sic).

II - Por despacho, datado de 13 de Abril de 2000, proferido pela Directora Regional da Direcção Regional do Norte do Ministério da Economia, foi revogada a licença de estabelecimento da pedreira …., ………, n.º ., sita em ………., concelho de Tabuaço, e determinada a cessação de imediato da sua actividade e ainda a cessação, de imediato, da laboração da oficina de britagem …-., sita no mesmo lugar, exploradas pela sociedade por quotas «D……….., Lda», com a cominação de que o não acatamento destas determinações constituía a prática de um crime de desobediência, nos termos do artigo 348, n.º 1, alínea b) do Código Penal - [vd. certidão de fls. 182 e seguintes cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido].

III - No dia 19 de Abril de 2000, através de carta registada com a/r, na qualidade de representantes legais da sociedade por quotas "D………., Lda", os arguidos foram notificados daquela decisão.

IV - Os arguidos foram, assim, através daquela notificação, advertidos de que incorriam na prática de um crime de desobediência simples caso não acatassem as ordens de cessação, de imediato, da actividade da pedreira e de laboração da oficina de britagem.

V - Não obstante o supra descrito, no dia 11 de Julho de 2001, no período compreendido entre 11 de Setembro de 2001 a 19 de Setembro de 2001 e no dia 14 de Novembro de 2001, soldados da GNR de Tabuaço deslocaram-se à oficina de britagem, sita no ………., Tabuaço, área desta comarca, encontrando-se aquela a laborar, com conhecimento e autorização dos arguidos.

VI - Os arguidos sabiam que a ordem que lhes foi transmitida era legítima e emanava da autoridade administrativa competente.

VII - Agiram, assim, os arguidos...

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