Acórdão nº 0645587 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Junho de 2007

Magistrado ResponsávelJOSÉ PIEDADE
Data da Resolução13 de Junho de 2007
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em Audiência, os Juízes desta 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: Na .ª Vara Criminal do Porto, processo supra referido, foi julgado B………., acusado de um crime de abuso de autoridade, p. e p. pelo art. 93º, nº 1, e por um crime de insubordinação, p. e p. pelo art. 72º, nº 1, al. d), ambos do CJM, tendo sido proferido Acórdão com o seguinte dispositivo: - Condenar o arguido B………., como autor material de um crime de abuso de autoridade, p. e p. pelo art. 93º, nºs 1 e 4 do CJM aprovado pelo DL 141/77, de 09/04, na pena de 9 meses de prisão; - Condenar este arguido pela autoria de um crime de insubordinação, p. e p. pelo art. 72º, nº 1, al. d) do mesmo diploma legal, na pena de 7 meses de prisão; - Condenar o arguido B………. na pena única de 12 meses de prisão; - Suspender a execução desta pena pelo período de 1 ano.

*Deste Acórdão recorreu B………., formulando as seguintes conclusões: 1. No decorrer da Audiência de Julgamento, pretendeu o Tribunal a quo, ao abrigo do disposto no art. 340º, nº 1 do CPP, inquirir como testemunha C……….; 2. A esta pretensão opôs-se o arguido, ora recorrente, nos termos que constam da Acta de Audiência do dia 27/06/06, que aqui se dão como reproduzidos, vindo o Douto Colectivo, porém, a admiti-lo a intervir naquela qualidade, nos termos e com os fundamentos do despacho de fls., então proferido; 3. Com tal decisão não se conformou o arguido, dela interpondo recurso, o qual foi admitido e mandado subir, com o recurso da decisão final (cfr. Despacho de fls. 579); 4. O ora recorrente mantém óbvio interesse na apreciação de tal recurso, o que desde já faz consignar, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 412º, nº 5 do CPP; 5. Contra o arguido, ora recorrente, foi deduzido o libelo acusatório de fls., aí lhe sendo imputados os factos constantes dos seus pontos 1 a 16, que aqui se dão por reproduzidos, para todos os efeitos legais; 6. Ao proferir a decisão de que ora se recorre, deu o Tribunal a quo por provados factos diferentes daqueles constantes do citado libelo acusatório, os quais, não sendo substancialmente diversos dos da acusação, constituem, de todo o modo, uma alteração daquela; 7. Ao dar por provados os factos descritos no Acórdão recorrido, a fls. 2 e 3, procedeu, pois, o Tribunal da 1ª Instância, a uma alteração não substancial da acusação, pelo que, deveria tal alteração, nos termos do disposto no art. 358º, nº 1 do CPP, ter sido comunicada ao arguido, sendo-lhe concedido, se requerido, prazo para defesa; 8. Não tendo sido observado o circunstancialismo previsto na citada norma legal, verifica-se, de acordo com o art. 379º, nº 1 al. b) do mesmo Diploma Legal, a nulidade do Douto Acórdão recorrido e a anulação do Julgamento (cfr. Ac. STJ de 19/02/1998 in BMJ, 474, 351); 9. Nos termos do disposto no art. 368º, nº 2 do CPP, ao ser apreciado o mérito da causa, devem ser enumerados discriminada e especificamente, bem como submetidos a deliberação e votação, tanto os factos alegados pela acusação, como os factos alegados pela defesa, devendo constar da fundamentação da Sentença, sob pena de nulidade, a enumeração especificada tanto dos factos provados, como não provados, de entre os alegados pela acusação e pela defesa (cfr. art. 374º, nº 2 e 379º, nº 1, a), do CPP); 10. O Douto Acórdão recorrido é omisso relativamente a vários factos constantes do libelo acusatório de fls., relevantes para a decisão da questão da culpabilidade, bem como para a determinação da medida da pena, não os dando nem por provados, nem por não provados; 11. É o caso dos pontos nºs 3 e 4, 10, 11 e 12 e 16 constantes daquela acusação; 12. Ao não dar especificamente por provados ou não provados estes factos alegados pela acusação, essenciais para a boa decisão da causa, violou a decisão recorrida o disposto nos arts. 368º, nº 2 e 374º, nº 2 do CPP, padecendo, por tal motivo e de acordo com o art. 379º, nº 1, al. a) do mesmo Diploma, de nulidade (cfr. Ac. STJ de 06/02/1991, processo nº 41200; AJ nºs 15-16, 6 e Acórdão do STJ de 26/05/1999, processo nº 1488/98-3ª, SASTJ, nº 31, 90); 13. Como se refere supra, tanto deve a decisão final enumerar discriminada e especificamente, dando por provados ou não provados, os factos da acusação como os factos alegados pela defesa; 14. A fls. 128 e segs. dos autos, apresentou o arguido B………., ora recorrente, contestação escrita - que aqui se dá inteiramente por reproduzida - nela alegando, designadamente, circunstâncias derimentes da sua eventual responsabilidade criminal, bem como circunstâncias atenuantes da mesma responsabilidade criminal (cfr. pontos 4 a 16, 23 a 33, 36 a 39, 42 e 43 e 45 a 51 da sua defesa e ainda o art. 32º do CP, e arts. 93º, nº 3, al. c) e art. 20º do Código de Justiça Militar então em vigor); 15. O Acórdão recorrido é totalmente omisso relativamente a tal contestação, não lhe fazendo a menor alusão; 16. Não descriminando os factos nela alegados, não os apreciando, nem os dando especificamente por provados ou não provados; 17. Tal constitui violação das supra citadas normas processuais penais (arts. 368º, nº 2 e art. 374º, nº 2), violação esta que acarreta, de igual modo, a nulidade do Acórdão recorrido (cfr. art. 379º, nº 1, al. a) do CPP e Acórdão do STJ de 2 de Fevereiro de 2000, proc. nº 1160/99 - 3ª SASTJ, nº 38, 69); 18. Ao arguido, ora recorrente, vinha imputada a prática de um crime de insubordinação, p. e p., à data da prática dos factos, pelo art. 72º, nº 1 al. d) do Código de Justiça Militar; 19. Segundo a citada norma legal, comete o crime de insubordinação o militar que, sem motivo justificado, recusar ou deixar de cumprir qualquer ordem que, no uso de atribuições legítimas, lhe for intimidado ou mandado intimidar por algum superior; 20. Trata-se, pois, de um crime de desobediência, sendo perfeitamente válidas e aplicáveis relativamente àquele todas as considerações doutrinais e jurisprudenciais tecidas a propósito deste ilícito, previsto e punido pelo art. 348º do CP; 21. Da conjugação dos factos considerados provados pelo Tribunal a quo, com os factos não provados, designadamente os dos pontos 10, 11 e 12 da acusação resulta que o arguido não praticou o ilícito que lhe vinha imputado; 22. Condenando-o, violando a decisão daquele Tribunal a quo o disposto no art. 72º, nº 1, al. d) do CJM; 23. Desobedecer é, como vem no Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo III, pág. 349 "faltar à obediência devida", ou seja, desobedecer a ordem ou mandado legítimos; 24. No caso dos autos, atento o circunstancialismo em que a mesma lhe foi transmitida, não era legitima a ordem para que o arguido se sujeitasse a um teste de alcoolemia; 25. Quando tal ordem lhe foi transmitida, há muito que o arguido não se encontrava de serviço, tendo mesmo abandonado já as instalações do Quartel e regressado a casa, de onde voltou àquelas instalações, na sequência de uma chamada telefónica que lhe foi feita nesse sentido (cfr. factos provados da decisão recorrida); 26. Não pode, pois, considerar-se que tal ordem lhe foi transmitida no terminus do seu serviço, isto é, imediatamente após a cessação do período de serviço, como previsto pela Circular 4/2001 aludida na decisão recorrida, que fundamentaria aquela obrigatoriedade; 27. Ao decidir de forma diferente, violou a decisão recorrida o disposto no art. 72º, nº 1, al. d) do CJM; 28. Deu o Tribunal a quo por provado que o arguido apenas se recusou a submeter ao teste de alcoolemia "por entender que já não se encontrava de serviço", isto é, por estar absolutamente convencido que tal ordem era ilegítima e extemporânea; 29. Sempre deveria ter aquele Tribunal considerado que, ao agir da forma descrita, o arguido incorrera num erro sobre a ilicitude da sua conduta, não censurável, atento o circunstancialismo acima exposto, agindo, portanto, sem culpa e, como tal, devendo ser absolvido; 30. Condenando-o, violando a decisão daquele Tribunal a quo o disposto no art. 17º, nº 1, do CP; 31. Incorre no crime de desobediência (vg insubordinação), quem deixar de obedecer a ordem legitima de autoridade competente, desde que, ou exista uma disposição legal a cominar a punição de tal comportamento (cominação legal), ou, na falta da dita cominação legal, a autoridade (no caso, o superior hierárquico), faça a correspondente cominação (cominação funcional) - isto é, advirta o destinatário da ordem de que a não obediência à mesma o faz incorrer no crime de desobediência/insubordinação (cfr. Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 3/11/2004, in www.dgsi.pt); 32. No caso dos autos, não existindo norma que preveja expressamente que o militar que se recusar a submeter a um teste de alcoolemia comete um crime de desobediência (ou melhor, insubordinação), o arguido apenas cometeria tal crime se expressamente advertido pelo graduado de serviço no sentido de que, caso não obedecesse àquela ordem, incorreria no crime de insubordinação - o que não aconteceu (cfr. factos 10, 11 e 12 da acusação, não provados); 33. Trata-se de uma situação de desobediência atípica ou inominada, que exige e pressupõe que a autoridade ou o funcionário (ou o superior hierárquico) fizeram a correspondente cominação (cfr. art. 348º, nº 1 al. b) do CP); 34. Não existindo tal cominação, falta a necessária voluntariedade para se poder afirmar o dolo; 35. Não se encontrando preenchidos todos os elementos do tipo legal, o arguido deveria ter sido absolvido do crime de insubordinação que lhe vinha imputado; 36. Condenando-o, violou o Douto Acórdão Recorrido o disposto no art. 72º, nº 1, al. d) do CJM, bem como no art. 13º do CP; 37. Para se considerar preenchido o tipo doloso do ilícito em análise, não basta dar como provado - como faz a decisão recorrida - que "o arguido sabia que estava obrigado à obediência às ordens dos seus superiores", devendo ainda ficar demonstrado, como alegado no ponto 12 da acusação que "o arguido sabia que a ordem lhe era dada por um superior hierárquico, no uso de atribuições...

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