Acórdão nº 0645444 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 19 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelPAULA LEAL DE CARVALHO
Data da Resolução19 de Março de 2007
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B………. intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra C………., Ldª pedindo que se condene a Ré a: (a) pagar-lhe a quantia de €2.111,69, a título de danos morais e retribuições desde os 30 dias anteriores à propositura da acção; (b) a pagar-lhe a indemnização de €3.179,07 se o A. por ela optar; (c) pagar-lhe os juros vencidos e vincendos a partir de 26 de Março, até efectivo pagamento, tudo acrescido dos vencimentos desde a propositura da acção até à sentença e proporcionais referentes a esse período.

Para tanto, alega em síntese: ter sido, aos 20.01.04, ilicitamente despedido pela Ré, uma vez que o foi sem justa causa, para além de que os factos imputados não determinam a imediata impossibilidade de subsistência da relação de trabalho; tal ilicitude confere-lhe o direito: à reintegração ou indemnização de antiguidade, conforme opção que venha a fazer, e devendo esta ser fixada em €3.179,07, correspondente a 40 dias x 3 meses de retribuição; a todas as prestações pecuniárias que deixou de auferir desde os 30 dias anteriores à propositura da acção até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que, à data da p.i., liquida em €574,00; à reparação dos danos não patrimoniais, em montante não inferior a €1.500,00.

Não se tendo logrado obter acordo na audiência de partes, a Ré veio contestar a acção, considerando, em síntese, ter o A. sido despedido com justa causa porquanto: no dia 11 de Novembro de 2003, em que, com autorização da Ré, se encontrava ausente do serviço por conta das férias, prestou trabalho numa outra oficina de mecânica e pintura denominada «D……….» envergando o equipamento de trabalho pertencente à Ré e no qual se encontravam inscritos os dizeres «F……….», o que poderia ter induzido em erro eventuais clientes na expectativa de que também ai se efectuavam serviços oficiais de tal marca, quando é a Ré quem tem o exclusivo de tais reparações. Com tal comportamento o A. violou os deveres previstos nas alíneas e) e f) do artº 121º do CT, bem como nas als. d), g), h) e j) da clª 37ª do CCT do sector automóvel.

Termina concluindo pela sua absolvição do pedido.

*Realizada a audiência de discussão e julgamento, no decurso da qual o A. optou pela indemnização de antiguidade, e decidida a matéria de facto, da qual não foram apresentadas reclamações, foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente: (a) declarou a ilicitude do despedimento; (b) condenou a Ré a pagar ao A.: (b1) a quantia de €1.720,00 a título de indemnização por despedimento ilícito; (b2) a quantia total de €16.646,00 de remunerações vencidas até à data da sentença, bem como as que se vencerem até ao seu trânsito em julgado; (b.3) juros de mora à taxa legal até integral pagamento.

*Inconformada com tal sentença, veio a Ré interpor o presente recurso de apelação, pretendendo a revogação da sentença recorrida e, em consequência, a sua substituição por outra que julgue a acção totalmente improcedente e a absolva do pedido. Para tanto, refere nas conclusões das suas alegações o seguinte: 1. Em 4/12/2003, a Ré, ora recorrente, instaurou um processo disciplinar ao A., ora recorrido, remetendo-lhe a respectiva nota de culpa, à qual este respondeu.

  1. Em 20/01/2004, foi o A. notificado da decisão final do procedimento disciplinar que decidiu pela aplicação da sanção disciplinar de despedimento com justa causa.

  2. O procedimento disciplinar movido ao A. buscou o seu fundamento na violação por este das disposições conjugadas das alíneas e) e f) do Art.º 121.º do Código de Trabalho e das alíneas d) g) h) e j) da Cláusula 37ª do Contrato Colectivo de Trabalho aplicável ao sector automóvel.

  3. O A. recorreu a juízo pedindo a declaração de ilicitude do despedimento de que foi alvo alegando, para o efeito, que os factos que lhe eram imputados na nota de culpa não correspondiam à verdade.

  4. A ré, ora recorrente, contestou a acção movida pelo A, reafirmando a violação por este dos deveres laborais referidos na Nota de Culpa, mais sublinhando saber este que estava impedido de realizar quaisquer trabalhos em oficinas de mecânica que não as pertencentes à sua entidade patronal.

  5. Mais contestou a ré afirmando que, em face da gravidade dos comportamentos adoptados pelo autor - dados como provados no procedimento disciplinar - outra sanção não seria possível que não o despedimento com justa causa.

  6. Da Audiência de Discussão e Julgamento resultou, nomeadamente, provado que: "Em Janeiro de 2001, o A. foi admitido ao serviço da R. - que desenvolve a actividade de comércio e reparação de automóveis e acessórios -, para, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, desempenhar as funções de pintor de automóveis de 2ª." (ponto 1 dos factos provados) "Em Janeiro de 2004, o A. mantinha a categoria de pintor de automóveis de 2ª e auferia o vencimento mensal de € 574.00, acrescido de subsídio de alimentação de €5,00 por dia". (ponto 2 dos factos provados) "Em 4/12/2003, a R. instaurou um processo disciplinar ao A., remetendo-lhe a respectiva nota de culpa, à qual o A. respondeu." (ponto 3 dos factos provados) "Em 20/01/2004, o A. recebeu a decisão final do processo disciplinar, na qual lhe havia sido aplicada a sanção de despedimento imediato com justa causa". (ponto 4 dos factos provados) "Da nota de culpa constavam, de relevantes, os seguintes factos imputados ao A. e que fundamentaram a aplicação da sanção disciplinar: (ponto 5 dos factos provados) "…a C………., Ldª, desenvolve a actividade de comércio e reparação de automóveis e acessórios." "…no dia 3/11/2003 o funcionário B………. efectuou um pedido de ausência para os dias 10 e 11 de Novembro à administração da C………., Ldª pedindo que essas faltas fossem descontadas em férias." "… depois de analisado o pedido, e de se verificar as férias por gozar do funcionário B………., pela administração da C………., Ldª foi decidido aceitar o pedido de justificação com o consequente desconto nas férias." "…o funcionário B………. consequentemente não se apresentou ao serviço quer no dia 10 quer no dia 11 de Novembro de 20003." "…Em 11 de Novembro de 2003, por volta das 14 horas a administração da C………., Ldª tomou conhecimento por intermédio de um outro seu funcionário de nome E………. que, nesse mesmo dia, o funcionário B………. se encontrava a trabalhar numa oficina de mecânica e pintura denominada "D………." com sede em ………., Esposende." "…o referido funcionário encontrava-se a trabalhar naquela oficina com o equipamento de trabalho pertença da C………., Ldª." "…no referido equipamento encontravam-se inscritas os dizeres "F………." o que, claramente, poderá ter induzido em erro eventuais clientes que se tenham dirigido aquela oficina, na expectativa de que lá também se efectuavam serviços oficias "F……….".

    "…cerca das 14, 30 horas do mencionado dia 11 de Novembro de 2003, (…) o funcionário (…) encontrava-se efectivamente vestido com o fato de trabalho pertença da C………., Ldª e a efectuar serviços em viaturas de clientes da D……….".

    "… o trabalhador D………. (…) violou (…) as instruções claras que tinham sido dadas pela administração da C………., Lda, em reunião convocada para esse efeito, com a presença dos trabalhadores, no dia 31 de Outubro de 2003, no sentido de que todas e quaisquer situações de concorrência desleal levadas a cabo por qualquer trabalhador seriam sancionadas disciplinarmente." (sublinhado nosso) "Em 31 de Outubro de 2003, a Administração da R. comunicou a todos os seus trabalhadores que não permitia que estes realizassem biscates." (ponto 6 dos factos provados) "O A. pediu à R. para, nos dias 10 e 11 de Novembro de 2003, gozar dois dias de férias, o que lhe foi concedido". (ponto 7 dos factos provados) "No dia 11 de Novembro de 2003, o A. encontrava-se numa oficina de mecânica e pintura denominada "D……….", sita em ………., Esposende, a trabalhar numa viatura automóvel." (ponto 8 dos factos provados) "Nessa ocasião envergava um fato de trabalho com os dizeres "F……….", pertencente à R. e fornecida por este aos seus trabalhadores." (ponto 9 dos factos provados) 8. Não se provou, na sequência da Audiência de Discussão e Julgamento, nomeadamente, que: a) "que o fato usado pelo A. estivesse fora de uso." b) "que o A. se encontrasse naquela oficina a arranjar a sua própria viatura, um Mercedes …. de 1969." 9. Em face (ou apesar de, diremos nós) da factualidade dada como provada o Mmº Juiz "a quo" entendeu ter sido ilícito o despedimento do A.

  7. Na realidade, refere a douta sentença recorrida, não houve, por parte do A. a violação do dever ínsito na alínea e) do n.º 1 do Art.º 121.º do Código de Trabalho, isto é, não houve violação do dever de não concorrência.

  8. Para sustentar juridicamente a afirmação feita o Mmo Juiz "a quo" refere na douta sentença recorrida que o dever de não concorrência pressupõe a admissibilidade do pluriemprego, ou seja, a possibilidade da prestação de trabalho a mais de um empregador, sem que qualquer deles se possa arrogar, sem mais, o direito de exigir essa prestação em exclusivo.

  9. Apenas quando exista cláusula de exclusividade é que a entidade patronal poderá exigir em absoluto que o seu trabalhador se abstenha de prestar actividade profissional para outrem.

  10. Não se tendo provado, nem sequer a R. alegado, continua a douta sentença recorrida, que do contrato de trabalho existente com o A. fizesse parte essa cláusula de exclusividade, não houve por parte do A. qualquer violação do dever ínsito na alínea e) do n.º 1 do Art.º 121.º do Código de Trabalho.

  11. Mais acrescenta a douta sentença recorrida que a comunicação efectuada pela Ré aos seus trabalhadores, no dia 31/10/2003 - facto 6 da matéria provada - foi uma tentativa de estabelecer, de forma superveniente e sem o acordo daqueles, uma cláusula desse teor, ao proibi-los de realizar "biscates".

  12. Não pode a recorrente estar mais em desacordo com a aplicação que o Mmo Juiz "a quo" fez do direito aos factos, pois que, desde já se acentua, não...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT