Acórdão nº 0657165 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Fevereiro de 2007
Magistrado Responsável | PINTO FERREIRA |
Data da Resolução | 05 de Fevereiro de 2007 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação do Porto I - Relatório B………., divorciada, residente na ………., …, ………., ………., ………., Matosinhos veio, por apenso e como incidente ao processo de divórcio, requerer a fixação de arrendamento da casa de morada de família, contra, C………., alegando que, por acordo celebrado no âmbito do divórcio por mútuo consentimento, a casa de morada de família foi atribuída ao requerido até à partilha, sem pagamento de qualquer contrapartida.
Sucede que a requerente teve de contrair empréstimo bancário para aquisição de casa, um T2, nada comparável com a casa de morada de família, o qual suporta com dificuldade e que, sendo embora professora do ensino secundário, possui uma incapacidade para o trabalho de 80%, o que lhe acarreta elevados gastos com a saúde e frequentes tratamentos.
Mais invoca que a casa de morada de família é um bem comum de ambos os cônjuges, o qual foi atribuída ao requerido, deve este compensar a requerente pela respectiva utilização, na parte correspondente.
Conclui, com base e fundando-se no fixado no art. 1793º do CC, pedindo que o tribunal fixe e determine a constituição de um arrendamento, dando um valor da renda mensal a pagar pelo requerido à requerente, proporcional à sua parte na moradia.
O tribunal decide indeferir liminarmente o requerimento inicial, absolvendo o requerido da instância.
Inconformada, recorre a requerente.
Recebido o recurso, apresentam-se alegações e contra alegações.
Colhidos os vistos legais, nada obsta ao conhecimento do recurso.
* II - Fundamentos do recurso Delimitam e demarcam o objecto do recurso as conclusões que nele são apresentadas - artigos 684º n.º 3 e 690º n.º 1 do CPC -.
Justifica-se, assim, a sua transcrição.
I - O despacho recorrido, na parte em que é objecto do presente recurso, deve manter-se pois aplicou correctamente ao caso em apreço as normas legais e os princípios jurídicos competentes.
II - A circunstância de os cônjuges terem acordado quanto ao destino da casa de morada de família não obsta a que, posteriormente, exerçam o direito de ver fixado o respectivo arrendamento, pois o acordo quanto ao destino da casa de morada de família não constitui renuncia ao direito de percepção dos frutos.
III - A atribuição do direito de uso, enquanto parcela do direito de propriedade, apenas restringe o proprietário que dele abdica de continuar a utilizar a coisa, não comprimindo o direito de fruir a coisa, o direito à percepção dos frutos, dos rendimentos que a mesma está apta a produzir.
IV - Assim, ao acordar que a casa de morada de família fosse utilizada, em exclusivo, pelo Recorrido, a Recorrente não abdicou do rendimento que tal bem seria susceptível de proporcionar.
v - Por outro lado, o direito ao arrendamento previsto no art. 1793.° do Código Cível só nasce em momento posterior à atribuição da casa de morada de família em exclusivo a um dos cônjuges, ou seja, depois de decretado o divórcio e transitada em julgado a sentença homologatória: sem a atribuição, em exclusivo, da casa de morada de família a um dos cônjuges nenhum arrendamento pode ser fixado entre eles.
VI - Daí que a fixação do arrendamento se processe por via incidental na acção de divórcio, após o seu decretamento.
VII - Compete ao Julgador acautelar os interesses públicos da família, fazendo respeitar o equilíbrio das relações pessoais e patrimoniais entre os ex-cônjuges e, nessa medida, uma vez atribuído o uso exclusivo da casa de morada de família, decretar imperativamente - o arrendamento por forma a salvaguardar de modo justo e equitativo os legítimos interesses de ambos ou, não o tendo efectuado, conhecer da pretensão do cônjuge quanto à sua fixação.
VIII - No caso vertente, não ocorre a excepção de caso julgado uma vez que o Tribunal não decidiu quais os direitos das partes no que respeita à fruição do bem "casa de morada de família".
IX - De resto, sendo a decisão sobre o arrendamento da casa de morada de família processada como incidente depois do trânsito em julgado da sentença que decretou o divórcio, jamais poderia a sentença proferida nos autos principais constituir caso julgado quanto àquela questão.
X - Sem prescindir, sempre se dirá que mesmo a entender-se que o arrendamento deveria ter sido fixado pelas partes no acordo, o que por mera hipótese se admite, sempre se verificariam os pressupostos que permitem ao Tribunal alterar aquele acordo e por consequência a decisão proferida, decretando o arrendamento.
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