Acórdão nº 0645320 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 20 de Dezembro de 2006
Magistrado Responsável | OLGA MAURÍCIO |
Data da Resolução | 20 de Dezembro de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo n.º 5320/06-4 (../05.3GBVNH) Relatora: Olga Maurício Acordam, em audiência, na 2ª secção criminal (4ª secção judicial) do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO 1.
No Tribunal Judicial de Vinhais, no processo ../05.3GBVNH, julgado em processo comum, com tribunal singular, foi o arguido B………. condenado: A - Quanto à parte crime: - na pena de cento e quarenta dias de multa, à taxa diária de cinco euros, como autor material, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143º, n.º 1 do C. Penal, - na pena de noventa dias de multa, à taxa diária de cinco euros, pela prática, como autor material, de um crime de ameaça, p. e p. pelo art. 153º, nºs 1 e 2 do C. Penal, - em cúmulo jurídico, foi condenado na pena única de cento e oitenta dias de multa, à taxa diária de cinco euros.
B - Quanto à parte cível: - foi o demandado B……….. condenado a pagar a C………. a quantia global de setecentos e cinquenta euros), - foi o demandado B………. condenado a pagar ao "Hospital Distrital de Bragança, S.A." a quantia de quarenta e cinco euros e trinta cêntimos), - foi o demandado B………. condenado a pagar à "Administração Regional de Saúde do Norte / Sub-Região de Saúde de Bragança" a quantia de cento e dezassete euros e vinte cêntimos, acrescida de juros de mora à taxa legal, até efectivo e integral pagamento, desde a notificação ao demandado do pedido de indemnização civil deduzido.
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Inconformado o arguido recorreu da decisão proferida, apresentando as seguintes conclusões: 1ª - Os ferimentos apresentados pelo assistente limitam-se a lesão superficiais, na pele, na face posterior do ombro esquerdo, pequenas escoriações no ombro direito e ligeiro edema no dedo mínimo do pé direito.
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- Todos esses ferimentos são leves e sem que gerem qualquer incapacidade para o trabalho em geral.
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- Tais lesões ocorreram já noite dentro e não foram presenciadas por ninguém, designadamente pela mulher do assistente.
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- A versão que o assistente dá dos factos é materialmente impossível.
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- O assistente ter-se-á ferido por si próprio (voluntariamente ou não) ou outrem o feriu e quis imputar suas lesões ao arguido, ressabiado por lhe ter feito secar as árvores.
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- O arguido, na tarde do dia dos factos e até pelas 2 ou 3 horas do dia seguinte, esteve ausente de ………., ou seja, na festa de D………. em casa de familiares.
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- O arguido não podia ter praticado o delito por se encontrar ausente do local.
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- Nada se provou sobre danos de carácter patrimonial a favor do assistente e os de ordem moral, mesmo que existam, não são da responsabilidade do arguido.
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- Na hipótese, que não se aceita, de o arguido ter desafiado o assistente, tal não constitui um crime de ameaça. O mal que se anuncia é presente e não futuro pelo que falta um elemento essencial ao crime de ameaça.
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- As testemunhas de defesa do arguido depuseram em julgamento asseverando que o arguido não podia ter praticado o delito por ter estado com eles em D………. à hora em que terá sido consumado.
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- Também os companheiros de E……… prestaram seu depoimento no sentido de que não viram o arguido, naquela tarde e noite em ………., afirmando ser falso que tivessem passado por ele quando, com o assistente, foram ao café.
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- Não se prescindiu da documentação da prova. Todavia, por deficiência do respectivo aparelho, não há registo fonográfico dos depoimentos da defesa e dos tais senhores de E………. .
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- Em consequência desta falta, há a nulidade do julgamento por omissão de acto essencial à descoberta da verdade e como tal deve ser declarado, ordenando-se a sua repetição de harmonia com o disposto no art. 363, 364, 119 alínea e) e 120 nº 1 alínea d) do C. P. P.
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- Independentemente de tal nulidade, não demonstram os autos com suficiente clareza que o arguido tenha praticado os delitos de que vem acusado e por que foi condenado, não tendo a prova sido devidamente apreciada e valorada, designadamente que o arguido estivesse no local, tivesse usado uma faca, tivesse agredido e ameaçado o assistente, havendo infracção ao disposto no art. 127 do C. P. P. e sendo indevidamente interpretado e aplicado o disposto nos art. 143 nº 1 e 153 nº 1 e 2 do C. P.
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- Dever-se-ia ter julgado a causa no sentido de que o arguido não praticou os actos de que vem acusado não só por impossibilidade material conforme vêm descritos, mas também porque o arguido estava ausente do local quando foram praticados, absolvendo-se totalmente.
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- Não se fez qualquer prova de danos materiais para o assistente ou de quaisquer outros causados pelo arguido, pelo que dever-se-ia ter julgado também nesse sentido com total absolvição do arguido.
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- Nestes termos e nos mais de direito, deve ser revogada a sentença recorrida e o arguido absolvido, ou ser declarado nulo o julgamento e ordenar-se a sua repetição.
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O recurso foi admitido.
O Sr. Procurador da República junto do tribunal recorrido respondeu defendendo, quanto à questão de fundo, a manutenção do decidido.
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Nesta Relação, o Exmº Sr. P.G.A. emitiu parecer pronunciou-se no sentido de ser dado provimento ao recurso no que à absolvição pela prática do crime de ameaças respeita.
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Proferido despacho preliminar foram colhidos os vistos legais.
Teve lugar a audiência, cumprindo decidir.
* FACTOS PROVADOS 6.
Na decisão proferida na 1.ª instância julgaram-se provados os seguintes factos: "1 - No dia 13 de Agosto de 2005, a hora não concretamente apurada, mas cerca das 21h00, quando o queixoso C………. passeava a pé na Estrada Municipal, junto ao ………., na localidade de ………., concelho de Vinhais, foi surpreendido com a presença do arguido que se dirigiu directamente àquele; 2 - Acto contínuo, com o auxílio de uma faca, desferiu o arguido pelo menos um golpe no corpo do queixoso, para além pontapés.
3 - Em consequência da agressão de que foi vítima, resultaram para o queixoso C………. diversas lesões, designadamente escoriações no ombro esquerdo, ferida incisa suturada na região escapular direita e um ligeiro edema do dedo mínimo no membro inferior, para além de dores na cabeça, nas costas e na perna direita; 4 - As lesões referidas no ponto anterior demandaram ao queixoso, directa e necessariamente, para a sua cura, um período de 8 dias, todos com incapacidade para o trabalho em geral e 5 dias com afectação da capacidade de trabalho profissional; 5 - O queixoso, após ter sido agredido, logrou desembaraçar-se do arguido correndo em direcção a casa; 6 - Foi então que o arguido foi buscar, a lugar não concretamente apurado, uma arma, presumivelmente uma caçadeira, a qual não foi possível identificar e apreender, e empunhando-a em direcção ao ofendido disse "anda para baixo que te quero matar"; 7 - Na sequência das agressões descritas em 2, o queixoso recebeu tratamento no Centro de Saúde de Vinhais e no Hospital Distrital de Bragança.
8 - O arguido agiu com o intuito concretizado em causar lesões corporais no queixoso, molestando a saúde e a integridade física do mesmo; 9 - O arguido, ao actuar da forma descrita em 6, fê-lo com o propósito de provocar medo e inquietação ao queixoso, bem como de lhe prejudicar a sua liberdade de determinação, o que conseguiu, pois o queixoso, devido ao tom em que foi a proferida a referida expressão, acreditou que aquele tivesse intenção de o matar, receando ainda hoje encontrar-se com o mesmo; 10 - Sabia o arguido que o tom em que dirigiu a aludida expressão, empunhando uma arma, era adequada a causar-lhe insegurança, medo e receio pela perda da sua vida e a prejudicar-lhe a sua liberdade de determinação; 11 - O arguido agiu de vontade deliberada, livre e consciente, bem sabendo que tais condutas são proibidas e punidas por lei penal; 12 - No dia 13 de Agosto de 2005, pelas 23,13 horas, deu entrada no Serviço de Urgência do Hospital Distrital de Bragança o queixoso C……….; 13 - Em virtude dessa admissão foram prestados todos os cuidados hospitalares que a sua situação demandava; 14 - Tendo a demandante Hospital Distrital de Bragança despendido a quantia de € 45,30; 15 - Em consequência da conduta do arguido, no dia 13 de Agosto de 2005, o queixoso foi transportado pelo Serviço de Bombeiros ao Centro de Saúde de Vinhais, a fim de lhe serem prestados cuidados de saúde; 16 - Os cuidados de saúde prestados ao queixoso tiveram de ser realizados nos dias 13, 19 e 22 do mês de Agosto de 2005 e resultaram das lesões provocadas pelas agressões do arguido; 17 - Com o transporte e os cuidados de saúde, despendeu o SNS a quantia de € 117,20; 18 - O arguido despendeu a quantia de € 8,80 nos tratamentos efectuados; 19 - A conduta do arguido causou medo ao queixoso, durante os dias que esteve de férias; 20 - A situação criou aborrecimentos ao queixoso, impedindo-o do gozo tranquilo das férias e de fazer determinados trabalhos em casa; 21 - O queixoso sentiu-se...
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