Acórdão nº 0623633 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Outubro de 2006
Magistrado Responsável | ANABELA DIAS DA SILVA |
Data da Resolução | 24 de Outubro de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I - B………… e mulher, C………, casados sob o regime de comunhão de adquiridos e residentes na Rua …., nº …., …., Vila Nova de Famalicão intentaram a presente acção declarativa com processo sumário contra D…….., Ldª, sociedade comercial por quotas, com sede no Lugar ……, ….., Vila Nova de Famalicão, pedindo que fosse declarado resolvido o contrato-promessa celebrado entre eles e a ré e identificado no artº 1º da p. inicial e ainda que se condenasse a ré a restituir-lhes a quantia recebida a título de sinal, em dobro, no valor total de 11.971,14 €, acrescida dos juros legais a contar da citação e até efectivo e integral pagamento.
Alegaram os autores para tanto e em síntese que no dia 6.04.2000 celebraram com a ré um contrato, elaborado por esta, a que deram a designação de "contrato de compra e venda" e, através do mesmo, os autores prometeram comprar à ré e esta prometeu vender-lhes uma fracção autónoma composta por uma casa geminada, lote 19, de rés-do-chão e 1º andar, tendo sido estipulado o preço de 15.500.000$00/77.313,67 €.
Aquando da assinatura de tal contrato, os autores entregaram à ré a quantia de 1.200.000$00/5.985,57 €, a título de sinal e princípio de pagamento, ficando a restante parte do preço de ser paga com o decorrer da obra, sendo que a escritura pública seria efectuada quando o prédio estivesse concluído.
No entanto, a ré não mais contactou com os autores, e quando estes, em Maio de 2002, se deslocaram aos seus escritórios ficaram a saber que a ré já havia celebrado escritura pública de compra e venda da referida fracção com um terceiro.
O cumprimento daquele contrato-promessa tornou-se definitivamente impossível por culpa da ré.
Os autores perderam o interesse na concretização do negócio, pretendendo a resolução do mesmo, exigindo o dobro da prestação que efectuaram.
*A ré, pessoal e regularmente citada veio contestar o pedido formulado, pedindo a absolvição do mesmo.
Para tanto alegou a ré que apenas negociou com a autora C……….
Aquando da assinatura do contrato-promessa, o mesmo não foi sujeito a reconhecimento presencial das assinaturas no notário, conforme é hábito da ré, porque a autora C….... pediu para levar o contrato consigo para ser assinado pelo namorado, prescindindo assim daquele reconhecimento notarial de assinaturas. No entanto, e assim sendo, o referido contrato é nulo.
A ré, depois de celebrado tal contrato, foi contactada pela autora C……. que lhe declarou que poder cumprir tal contrato, uma vez que já não se iria casar com o autor marido.
Assim, o incumprimento do contrato foi da vontade dos autores que se desisnteressaram do negócio, razão pela qual não chegaram a escolher qualquer material para o acabamento da casa, nem procederam à entrega de qualquer outra quantia.
A ré pode assim fazer sua a quantia entregue.
*Os autores responderam pugnando pela validade do contrato-promessa, reafirmaram o que já haviam alegado em sede de p. inicial e pediram a condenação da ré como litigante de má-fé.
*Foi realizada uma tentativa de conciliação das partes, sem êxito.
*Considerando a simplicidade da selecção da matéria de facto controvertida, não se procedeu à fixação da base instrutória.
*Procedeu-se a julgamento da matéria de facto, a qual foi decidida a fls. 113 a 116, sem qualquer reclamação das partes.
Finalmente, proferiu-se sentença onde se julgou a acção parcialmente procedente, considerando-se revogado, por mútuo acordo, o contrato estabelecido entre autores e ré, condenando-se a ré a devolver aos autores o valor do sinal em singelo, ou seja, 5.985,57 €, acrescido de juros à taxa legal aplicável, desde a data da citação e até efectivo e integral pagamento.
*Inconformados com tal decisão, recorreram os autores, de apelação e juntando aos autos as suas alegações, apresentam nelas as seguintes conclusões: O tribunal "a quo" não tinha suporte factual que permitisse proferir decisão no sentido de considerar revogado, por mútuo acordo, o contrato estabelecido entre B……. e C………. e Construções D…….., Ldª.
Com efeito, os factos constantes do item 7 não permitem concluir, como se decidiu, pela verificação de um qualquer efectivo acordo de revogação, como nem sequer permite concluir pela existência do mesmo.
E, tratando-se, como se trata de um contrato-promessa reduzido a escrito qualquer eventual revogação por mútuo acordo do mesmo, nos termos da lei, não é passível de ser provada com recurso à prova testemunhal.
Sendo que, a prova por testemunhas, se tiver por objecto quaisquer convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo do documento particular, quer as convenções sejam anteriores à formação do documento ou contemporâneas dele, quer sejam posteriores, é inadmissível (artº394º nº1 do CC).
Pelo que para decidir pela revogação por mútuo acordo do contrato-promessa, tal decisão teria de ter por base cláusula expressa nesse sentido e reduzida a escrito.
Razão pela qual apenas ficou provado a realização de uma reunião mas não que dessa reunião acordaram autores e ré em revogar, por mútuo acordo, o contrato-promessa.
Acresce que qualquer alteração ao contrato teria de constar de cláusula reduzida a escrito.
Verificando-se inequivocamente que ao decidir-se como se decidiu pela revogação por mútuo acordo, o tribunal "a quo" - dado que nenhuma das partes peticionou tal revogação - condenou em objecto diverso do que as partes peticionaram conhecendo de questões sobre as quais não podia tomar conhecimento (artº 661º nº1 do CPC).
Pelo que a sentença é nula atento o disposto no artº 668º nº 1 al. d) e e) do CPC.
Nem os recorrentes nem a recorrida alegaram e peticionaram a revogação do contrato promessa por mútuo acordo e sendo que a sentença deve manter-se, quanto ao seu conteúdo, dentro dos limites definidos pela pretensão dos autores e eventualmente da reconvenção deduzida pelos réus, em cumprimento da vetusta máxima romanista "ne eat index ultra vel extra petita partium", a violação do princípio dispositivo no artigo 661º do CPC, ou seja, a não coincidência da decisão com os "petita partium" determina a nulidade da sentença.
Nulidade que expressamente se invoca com todas as consequências legais.
*A recorrida juntou aos autos as suas contra-alegações, as quais termina com as seguintes conclusões: O tribunal "a quo" decidiu correctamente ao considerar revogado por mútuo acordo o contrato-promessa estabelecido entre B………. e C………. e a recorrida, Construções D………, Ldª.
Tal conclusão retira-se dos factos dados como assentes no 8 da contestação da decisão da matéria de facto, e da qual não houve qualquer recurso ou reclamação.
E sendo certo que estamos perante um contrato-promessa reduzido a escrito e que a sua revogação por mútuo acordo não pode ser provada por prova testemunhal, se da análise das circunstâncias do caso concreto tornar verosímil a existência de convenção das partes, parece admissível a prova testemunhal acreca desta.
No caso em apreço e face às circunstâncias que decorrem dos depoimentos das testemunhas e da matéria dada como provada, nomeadamente, que os recorrentes nunca escolheram louças, etc, nem deram outras entradas em dinheiro de acordo com o contrato, o recurso as testemunhas não apresenta os perigos a que os artºs 394º e 395º visam obstar mas antes servem de base inicial à formação da convicção do tribunal, ou antes a esclarecer o significado dessas circunstâncias.
Pelo que a decisão judicial está de acordo com a lei.
II - Colhidos os vitos legais, cumpre decidir.
Na 1ª instância fixou-se a seguinte matéria de facto: AA e Ré celebraram em 6 de Abril de 2000, um contrato - elaborado pela Ré - a que deram a designação de contrato de compra e venda, o qual consiste no seguinte: "CONTRATO DE COMPRA E VENDA 1.º.Outorgante: D1……….., casado, contribuinte fiscal n.° …….5880, natural da freguesia de ……. (Santa Maria), concelho de Vila Nova De Famalicão, portador do Bilhete de...
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