Acórdão nº 65/03.3TBANS-T.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Abril de 2007

Magistrado ResponsávelT
Data da Resolução17 de Abril de 2007
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. RELATÓRIO.

    Acordam nesta Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra.

    Por requerimento datado de 26 de Maio de 2006 A....

    veio aos autos requerer que o Senhor Liquidatário optasse pela conclusão do contrato prometido reportado a um contrato-promessa que aquela celebrou com B....

    ., ora falida, outorgando a escritura pública de venda a favor da requerente.

    Alega para o efeito que, em 16 de Fevereiro de 2001, celebrou com a falida um contrato-promessa que tinha por objecto a fracção autónoma correspondente a um apartamento T2, no primeiro andar, lado sul, com garagem em construção, sito na Rua ....., Coimbra. Através de tal contrato-promessa de compra e venda a B... prometeu vender à requerente, que prometeu comprar, o apartamento T2, livre de quaisquer ónus ou encargos.

    Os promitentes sujeitaram o pagamento do preço a permuta, de tal modo que a promitente compradora se obrigou ao pagamento do preço estipulado, parte em dinheiro 7.000.000$00, que pagou e que a falida dela recebeu e o restante através da venda à falida da fracção autónoma designada pela letra F, 2º andar esquerdo, do prédio constituído em propriedade horizontal, inscrito na matriz de Santa Clara, sob o artº 3141 e descrito na Conservatória do registo predial de Coimbra sob o nº 871, sito na Quinta do Mendes, Santa Clara, Coimbra.

    Em face do incumprimento da falida e atendendo a que o mercado actual é extremamente difícil vender andares usados, a requerente, aproveitando a oferta de um interessado de 105.000,00 €, vendeu, por escritura de compra e venda a referida fracção em 17 de Abril de 2006, importância esta que coloca à disposição para pagamento do restante preço contra a celebração da escritura do contrato prometido. À data da declaração de falência, o contrato promessa celebrado encontrava-se por cumprir.

    Em finais de 2001, a falida entregou o apartamento e as chaves à requerente, que o recebeu e passou a partir dessa data aí a residir, habitual e consecutivamente até hoje.

    Apenas a requerente tem a chave da respectiva fracção e apenas ela a ocupa e utiliza.

    Em face do incumprimento da falida tem a requerente direito a receber o sinal prestado em dobro, ou seja, tem a receber a quantia de 69.831,70 € ou à execução específica do contrato. Porém, a requerente pretende o cumprimento do contrato e está pronta a pagar a restante parte do preço.

    A requerente goza do direito de retenção, e por isso, tem a faculdade de executar o apartamento, objecto do contrato promessa, nos termos em que o pode fazer o credor hipotecário e ser pago com preferência em relação aos demais credores do devedor.

    Notificado para o efeito, o Senhor Liquidatário Judicial alega que o contrato-promessa não tem eficácia real e extinguiu-se com a decretação da falência.

    A requerente não detém a qualidade de credora nos presentes autos, pelo facto de não ter reclamado qualquer crédito.

    A requente inviabilizou, através da venda da fracção permitida permutar, a execução específica do contrato.

    Não tem o Liquidatário qualquer autorização por parte da comissão de credores para cumprir o contrato prometido.

    A Sra. Juiz a fls. 42 ss indeferiu de igual forma a pretensão da promitente compradora.

    Daí o presente recurso de agravo interposto pela requerente, a qual no termo da sua alegação pediu que se revogue o despacho impugnado, insistindo no pedido que formulou.

    Foram para tanto apresentadas as seguintes, Conclusões.

    1) Em 16 de Fevereiro de 2001, em Coimbra, foi validamente celebrado entre a requerente A..., como promitente compradora e a falida B.... como promitente vendedora, um Contrato-Promessa Bilateral de Compra e Venda que teve como objecto a fracção autónoma correspondente a um apartamento T2, sito no primeiro andar, lado Sul, com garagem em construção, sito na Rua ......, Coimbra.

    2) Tal contrato, celebrado por escrito, estava contabilizado e era evidenciado pela documentação contabilística e escrita da falida, sendo portanto do conhecimento do Sr. Liquidatário Judicial, o qual, aliás, nessas condições, tinha obrigação de o conhecer e de o considerar para efeitos de reclamação de créditos e do disposto no artigo 164°-A do CPREF, ou seja, tinha obrigação de tomar motu proprio posição quanto ao cumprimento ou incumprimento do mesmo pela falida e comunicá-lo à ora recorrente.

    3) Nos finais do ano de 2001, a falida, num momento em que ainda não estava declarada como tal, entregou o andar/apartamento à requerente, ora recorrente, que dela o recebeu e passou a deter as respectivas chaves, aí passando a residir, habitual e consecutivamente até hoje, 4) Aí instalando as suas mobílias, objectos de utilidade doméstica, roupas e vestuário e aí passando a dormir, descansar, comer, confeccionar refeições, receber visitas e correspondência, aí, afinal, tendo instalado a sua casa de morada de família, daí saindo todos os dias para os seus afazeres profissionais e aí regressando diariamente e tudo o mais fazendo do que é habitual qualquer pessoa fazer na sua própria habitação e residência e tendo, nomeadamente, requerido o fornecimento de água e gás que consome e paga.

    5) Apenas a requerente, ora recorrente, e apenas ela tem as respectivas chaves e só ela ocupa e utiliza, com exclusão da falida e quaisquer outras pessoas, desde os finais de 2001 até hoje, diária e consecutivamente, sem qualquer interrupção, o referido apartamento, em seu único e exclusivo proveito e sem oposição de quem quer que seja e à vista de toda a gente.

    6) A promitente vendedora, ora falida, foi declarada nesse estado por sentença de 08/06/2004, já transitada em julgado e até 18/07/2006, o Sr. Liquidatário Judicial não tomou qualquer posição quanto ao cumprimento ou incumprimento do contrato, nem nada comunicou à recorrente, a qual, aliás, até hoje, não foi perturbada, por qualquer modo, na posse que exerce sobre a fracção, nem no seu direito de retenção que vem exercendo.

    7) A recorrente, não reclamou o seu crédito nem propôs a acção prevista no artigo 205° do CPREF, sendo certo que sempre esteve, como está interessada no cumprimento do contrato.

    8) Face à referida posição do Sr. Liquidatário e ao tempo entretanto decorrido – quase dois anos – a ora recorrente, por requerimento dirigido àquele de 26/05/2006, pediu que o mesmo optasse pela conclusão do contrato prometido, de acordo com o preceituado no artigo 164º-A do CPREF, celebrando a escritura pública de venda a favor da recorrente.

    9) O Sr. Liquidatário optou pelo não cumprimento do contrato, do que a ora recorrente tomou conhecimento através da decisão recorrida, invocando, aquele e esta, os fundamentos de facto e de direito que aqui se dão por reproduzidos.

    10) A decisão não se limitou a conhecer do pedido formulado pela recorrente – que, aliás, indeferiu – mas espraiou-se também em considerações acerca da natureza do contrato promessa, quanto à existência do direito de retenção, quanto ao incumprimento da falida e da recorrente, entendendo e decidindo sobre a tempestividade e existência quer daquele direito de retenção, quer do direito de crédito, quanto à sua graduação, pronunciando-se assim e conhecendo de questões de que não podia tomar conhecimento, pelo que é a douta sentença proferida nula, nos termos do artigo 668°, no 1, al. d) do CPC, o que expressamente se invoca para todos os devidos e legais efeitos.

    12) Ao contrário porém do que se diz na sentença recorrida, a recorrente está em tempo de exercer o seu direito à execução específica do contrato, obtendo sentença que produza os efeitos da declaração negocial da parte faltosa. (sic) 13) Com efeito, o disposto no artigo 164°-A quanto à extinção do contrato refere-se apenas àqueles em que a falida é promitente adquirente e não alienante, estando, neste último caso, sempre obrigada à celebração do contrato prometido e, portanto, sempre podendo a recorrente exigir da massa falida a celebração do contrato ou recorrer à execução específica, nos termos dos artigos 410º Código Civil, regime este que não é, nem pode ser afastado, pelo simples facto do promitente vendedor ser declarado em estado de falência e, portanto, pelo referido artigo 164°-A do CPREF.

    14) Quando a sentença foi proferida, já se verificava o incumprimento pela promitente vendedora do contrato, pelo que, se eventualmente até aí não pudesse ser considerado definitivo, passou a sê-lo com a referida declaração do Sr. Liquidatário, uma vez que só com esta ficou definitivamente impossibilitada de o cumprir.

    15) É que não restam dúvidas de que, quando o liquidatário judicial não opta pelo cumprimento do contrato, opta pelo seu incumprimento e necessariamente, pelo pagamento, nos termos da lei, quer a civil, quer a especial constante do nº 1 do citado dispositivo, do dobro do sinal recebido, sempre no entanto sem prejuízo do direito da recorrente à execução específica.

    16) É pois nesta altura, e só nesta altura, que se verifica o incumprimento definitivo e o surgimento do direito de crédito da recorrente, emergente do não cumprimento do contrato-promessa e, portanto...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT