Acórdão nº 07B2330 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Julho de 2007
Magistrado Responsável | SALVADOR DA COSTA |
Data da Resolução | 10 de Julho de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I AA intentou, no dia 10 de Maio de 1999, contra BB, acção executiva para pagamento de quantia certa, com processo ordinário, a fim de haver dele 2 320 000$ de capital, juros vencidos no montante de 542 728$ e vincendos à taxa legal, com base em seis cheques.
O executado deduziu, no dia 21 de Junho de 1999, embargos, invocando a caducidade da execução e a prescrição do direito de crédito invocado pelo exequente e que já havia pago a este devido.
Falecido o executado no dia 18 de Agosto de 1999, foram habilitados, por sentença proferida no dia 23 de Junho de 2000, em sua substituição, CC, DD, EE, FF, GG e HH.
Em 9 de Julho de 2002, o exequente cumulou na execução requerimento executivo com base em sete letras de câmbio, com valor global de € 39 554, 67 de capital e juros vencidos no montante de € 10 275,24, sacadas por ele e ditas aceites pelo executado, afirmando naquele requerimento que elas se destinavam ao pagamento de vários empréstimos que o exequente havia feito ao executado.
No dia 21 de Novembro de 2002, foi considerado deferido tacitamente o pedido de apoio judiciário dos referidos habilitados na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo e de nomeação de patrono, que incidiu sobre o advogado .....
No dia 5 de Dezembro de 2002, os habilitados deduziram embargos de executado, invocando não ser a assinatura constante das letras dadas à execução de BB, não ser o exequente parte legítima por virtude de as letras terem sido endossadas a terceiros, ocorrer a prescrição de cinco das letras, incluindo os juros, e a falta de indicação da relação subjacente aos títulos dados à execução, o que o embargado negou na contestação.
Em 23 de Janeiro de 2003, as partes transaccionaram em termos de fazer terminar a execução inicial relativa aos cheques, transacção que foi judicialmente homologada na mesma data.
Na fase da condensação, o tribunal conheceu das excepções da ilegitimidade e da prescrição, que julgou não verificadas, com excepção da prescrição dos juros, que julgou parcialmente procedente.
Os embargantes apelaram da referida decisão, acabando por restringir nas conclusões da alegação o objecto do recurso à excepção de prescrição, recurso que subiu a final.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 30 de Agosto de 2006, por via da qual a quantia exequenda só foi reduzida quanto aos juros, fixados na taxa legal aplicável quanto às cinco primeiras letras desde 9 de Julho de 1997, à sexta a partir de 30 de Janeiro de 1998 e à sétima letra desde de 24 de Abril de 1998.
Apelaram os embargantes, e a Relação, por acórdão proferido no dia 8 de Fevereiro de 2007, negou provimento aos recursos de apelação do despacho saneador e da sentença final.
Interpuseram os apelantes recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - o acórdão é nulo porque omite pronúncia sobre a contradição do teor dos títulos dados à execução no que se refere à relação subjacente e ao teor da alegação da obrigação subjacente; - há contradição insanável entre a fundamentação e as respostas aos quesitos e entre estas e o depoimento das testemunhas, e a prova produzida não revela que o antecessor dos recorrentes tenha assinado os documentos dados à execução; - há contradição entre o teor dos títulos dados à execução e a alegação da relação subjacente, e esta não consubstancia os requisitos exigidos pelo artigo 46º, nº 1, alínea c), do Código de Processo Civil; - o ónus de prova da veracidade das assinaturas incumbe ao recorrido, tendo o acórdão violado os artigos 374º do Código Civil e 516º, 653º e 655º do Código de Processo Civil, impondo-se a anulação da matéria de facto declarada provada e a sua reapreciação de acordo com aquelas normas; - os cinco primeiros mútuos são nulos por falta de forma, pelo que não importam o reconhecimento ou a constituição de quaisquer obrigações exigíveis, nomeadamente as relativas às quantias neles inscritas; - os dois últimos mútuos também são nulos por falta de forma, porque não há documento revelador do seu reconhecimento pelo mutuário; - o recorrido omitiu a articulação dos factos que deviam servir de fundamento à e a demonstração de que a obrigação subjacente não constitui objecto de negócio formal; - o tribunal não pode substituir-se ao recorrido e considerar que cada título dado à execução corresponde a vários empréstimos, por tal não ter sido por ele alegado; - o artigo 46º do Código de Processo Civil não permite a apresentação à execução de títulos não acompanhados de alegação da respectiva relação subjacente e da respectiva prova documental; - ao decidir a improcedência da excepção peremptória de inexistência de título executivo, o acórdão violou os artigos 70º da Lei Uniforme Sobre Letras e Livranças e 46º, nº 1, alínea c), do Código de Processo Civil; - o acórdão violou os artigos 220º e 1143º do Código Civil, com a redacção que a este último foi dada pelos Decretos-Leis nºs 190/85, de 24 de Junho, 163/95, de 13 de Julho, e 46º, alínea c), 264º, 286º, 664º e 668º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil; - deve declarar-se que os documentos dados à execução não constituem títulos executivos, que não importam a constituição de qualquer obrigação exigível por virtude da nulidade dos mútuos, ou anular-se o julgamento e ordenar-se a sua repetição por forma a responder-se à base instrutória conforme as regras do ónus de prova e desta.
Respondeu o recorrido, em síntese útil de alegação: - o tribunal não recorreu a presunções para responder aos quesitos primeiro e terceiro da base instrutória, e o Supremo Tribunal de Justiça não pode sindicar a decisão da matéria de facto proferida pela Relação; - as cinco primeiras letras não foram consideradas títulos cambiários, mas quirógrafos assinados pelo devedor; - não estão provados factos reveladores de que os montantes dos empréstimos que os documentos dados à execução se destinavam a pagar, fossem de valor igual ou superior ao previsto para a celebração por escritura pública; - os factos provados não revelam que os documentos dados à execução tenham subjacentes contratos de mútuo de valor igual ao titulado por eles, nem a forma de cada um dos empréstimos, seu montante ou circunstâncias de modo e tempo da sua outorga; - a aposição da assinatura de aceite nas letras implica o reconhecimento unilateral da dívida, pode valer como título executivo e ao devedor incumbe, nos termos do artigo 458º, nº 1, do Código Civil, a prova da inexistência ou da cessação da respectiva causa.
II É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. O exequente AA deu à execução sete impressos uniformizados destinados a servir de letra, constando: a) no primeiro, a data de emissão 20 de Março de 1992, a data de vencimento 20 de Maio de 1992, a quantia de 1 360 000$, reforma da letra de 1 700 000$, de 20 de Março de 1992; b) no segundo, a data de emissão de 25 de Março de 1992, a data de vencimento 25 de Maio de 1992, a quantia 520 000$, reforma da letra de 585 000$, de 25 de Março de 1992; c) no terceiro, a data de emissão em 25 de Maio de 1992, a data de vencimento 25 de Julho de 1992, a quantia de 600 000$ e transacção comercial; d) no quarto, a data de emissão de 25 de Maio de 1992, data de vencimento 25 de Julho de 1992, a quantia de 1 300 000$ e transacção comercial; e) no quinto, a data de emissão de 6 de Outubro de 1992, a data de vencimento em 6 de Dezembro de 1992, a quantia de 600 000$, transacção comercial; f) no sexto, a data de emissão de 25 de Dezembro de 1992, a data de vencimento de 30 de Janeiro de 1998, a quantia de 2 600 000$ e transacção comercial; g) no sétimo, a data de emissão de 24 de Janeiro de 1998, a data de vencimento 24 de Abril de 1998 e a quantia de 950 000$ e transacção comercial.
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As assinaturas desenhadas no local destinado ao sacador nos referidos impressos, preenchidos pelo punho de BB, foram manuscritas pelo punho do exequente.
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As assinaturas desenhadas no local destinado ao aceite nos referidos impressos foram manuscritas pelo punho de BB, e foram por este entregues ao exequente.
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Os documentos acima referidos destinavam-se ao pagamento de vários empréstimos que o exequente havia feito ao BB.
III A questão essencial decidenda é a de saber se deve ou não declarar-se a extinção da acção executiva em causa.
Considerando o conteúdo do acórdão recorrido e das conclusões de alegação dos recorrentes e do recorrido, a resposta à referida questão pressupõe a análise e decisão das seguintes subquestões: - lei processual aplicável à execução, à oposição e aos recursos.
- está ou não o acórdão recorrido afectado de nulidade por omissão de pronúncia? - infringiu ou não a Relação alguma norma substantiva concernente ao ónus de prova? - a decisão da matéria de facto proferida pela Relação é ou não susceptível de ser sindicada por este Tribunal? - âmbito da impugnação do conteúdo dos referidos títulos executivos; - a relação subjacente aos documentos dados à execução envolve ou não contratos nulos? - constituem ou não título executivo os documentos apresentados pelo recorrido à execução? - síntese da solução para o caso espécie decorrente dos factos provados, da dinâmica processual envolvente e da lei.
Vejamos, de per se, cada uma das referidas subquestões.
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Comecemos pela determinação da lei processual aplicável à acção...
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