Acórdão nº 07B1847 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Junho de 2007

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução21 de Junho de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I AA intentou, no dia 9 de Outubro de 1995, contra BB, CC, DD, EE, FF, GG, HH, II, JJ e KK, acção declarativa constitutiva, com processo ordinário, pedindo a declaração da nulidade ou a revogação de identificada procuração, a declaração da nulidade do subsequente contrato de compra e venda, ordenado o cancelamento do registo de aquisição a favor dos réus e a sua condenação a indemnizá-lo por litigância de má fé.

Fundamentou a sua pretensão na circunstância de a ré BB lhe haver vendido a nua propriedade da fracção predial "H" do prédio sito na Calçada da ......, nº ..., Lisboa e, depois, disso, a haver vendido aos réus, e de a vendedora, por virtude de anomalia psíquica, não haver compreendido o sentido da procuração irrevogável que emitiu para o efeito.

Em contestação, BB impugnou os factos articulados pelo autor e, em reconvenção, pediu a anulação do contrato de compra e venda celebrado com aquele, sob o fundamento da exploração do seu estado de necessidade e de dependência por LL.

Os outros réus, por seu turno, impugnaram os factos articulados pelo autor, arguíram a ilegitimidade deste relativamente ao pedido de declaração de nulidade da procuração e a ilegitimidade dos réus KK, MM, FF e de NN O autor, na réplica, pronunciou-se no sentido da sua legitimidade ad causam e impugnou os factos articulados pela ré BB na reconvenção.

No despacho saneador, foi a excepção de ilegitimidade do autor julgada improcedente e a excepção da ilegitimidade de KK de MM, de FF e de NN julgada procedente, pelo que foram absolvidos da instância.

Falecida a ré BB, foram declarados habilitados para o prosseguimento dos termos da demanda, PP, QQ, RR e SS.

Falecido o réu DD, foram declarados habilitados em sua substituição os réus CC, EE, GG, HH e JJ, e, na sequência do falecimento de PP, foi habilitado em sua substituição TT.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 31 de Março de 2006, por via da qual foi declarada a nulidade do contrato de compra e venda celebrado entre a ré BB, representada por DD, e os réus DD, GG e II e ordenado o cancelamento do respectivo registo predial de aquisição.

Apelaram os réus, e a Relação, por acórdão proferido no dia 13 de Fevereiro de 2007, por maioria, negou provimento ao recurso, essencialmente com base na natureza declarativa do registo predial, na presunção ilidível dele resultante e na circunstância de os recorrentes haverem fundado a sua pretensão no contrato de compra e venda e não na referida presunção, acrescentando dever a questão dever ser decidida segundo as regras da nulidade dos negócios jurídicos e da compra e venda.

Interpuseram os apelantes recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - a questão a dirimir não depende apenas da apreciação e decisão em termos substanciais e civilísticos estritos, mas também das regras e normas de registo predial aplicáveis; - aquando do contrato que celebraram, os recorrentes, compradores, ignoravam a alienação a favor do recorrido; - face ao disposto no artigo 5º, nº 1, do Código do Registo Predial, a venda da nua propriedade ao recorrido é ineficaz em relação aos recorrentes por a sua aquisição ter sido levada ao registo antes do contrato de compra e venda que celebraram e não implicar a nulidade deste; - não há venda de bens alheios por a vendedora, titular da propriedade da fracção predial inscrita no registo estar legitimada para realizar a segunda venda; - o registo que efectuaram é aquisitivo ou tabular, pelo que beneficiam do seu efeito substantivo, que não pode ser prejudicado; - são terceiros registais e gozam da presunção do registo consagrada nos artigos e 17º nº 2, do Código do Registo Predial; - é inaplicável o artigo 291º do Código Civil por este se restringir à hipótese de o terceiro de boa fé não ter agido com base no registo anterior a favor do transmitente, ou seja, às aquisições nulas ou anuláveis em que o subadquirente não é um verdadeiro terceiro registal; - o acórdão recorrido violou os artigos 291º, nºs 1 e 2 e 892º do Código Civil e 5º a 7º, 17º, nº 2 e 122º do Código de Registo Predial, pelo que deve ser revogado.

Respondeu o recorrido, em síntese de conclusão: - extinto o usufruto por morte da vendedora, cessou a sua autonomização em relação ao direito de propriedade.

- o recorrido não procedeu ao registo de aquisição da nua propriedade da fracção predial por mero descuido, mas como a vendedora continuou a usufruir a casa na qualidade de usufrutuária, não relevava para si o registo no imediato; - ao conhecer que os recorrentes adquiriram a fracção, apresentou a registo a sua aquisição com o usufruto, que foi efectuado provisoriamente por dúvidas em razão da falta de legitimidade da vendedora; - os recorrentes adquiriram coisa alheia, por falta de legitimidade da vendedora, sendo aplicável o disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 291º do Código Civil; - o recorrido, ao invés dos recorrentes, é segundo de boa fé por virtude da sua aquisição, do pagamento da sisa, da oferta à câmara do direito de preferência e da publicidade da venda, pelo que não releva a boa fé por eles alegada quanto à outorga da escritura, ao pagamento do preço e à efectivação do registo.

II É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. A ré BB era dona da fracção autónoma designada pela letra "H", correspondente ao 3º andar do prédio urbano sito na Calçada ....., nºs ......-B, ...... e ......-C, descrito na 5ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o nº ../...., da freguesia da Graça (Santo André), Lisboa.

  1. O autor e a ré BB, na escritura pública outorgada no dia 14 de Janeiro de 1993, no 2º Cartório Notarial de Lisboa, declararam, a última vender e o primeiro comprar, por 6 000 000$, a raiz ou nua propriedade da fracção predial mencionada sob 1.

  2. O autor, para além do pagamento daquela escritura, procedeu previamente ao pagamento do imposto municipal de sisa, tendo, para a efectivação de tal venda, apresentado requerimento à Câmara Municipal de Lisboa, edilidade territorial com preferência na eventual aquisição da citada fracção.

  3. A ré BB sempre manteve com os seus sobrinhos boas relações, estes sempre a estimaram, e ela afirmou a elementos da família O.... S.... que pretendia doar aos sobrinhos, EE, GG, HH e JJ os prédios rústicos e urbanos de que era proprietária nos concelhos de Banavente, Salvaterra de Magos e Guarda e os direitos de usufruto de duas fracções autónomas sitas no concelho de Lisboa, bem como afirmou que pretendia vender aos mesmos sobrinhos a fracção onde habitava mencionada sob 1.

  4. Por isso, a fim de assegurar a execução do que pretendia, no dia 26 de Maio de 1995, no 17º Cartório Notarial de Lisboa, onde se deslocou pelo seu próprio pé e outorgou a procuração inserta a folhas 48 a 57, onde se exprimiu-se com clareza, compreendendo o teor do acto praticado, e assinou a procuração, embora com alguma dificuldade pois, dada a sua idade, estava com as mãos pouco firmes.

  5. O teor do documento mencionado sob 5 foi elaborado em momento anterior ao da sua outorga, e em tal procuração, a ré BB declarou constituir seus bastantes procuradores os réus CC e DD, a quem conferiu poderes especiais, que podiam ser exercidos conjunta ou separadamente, para em seu nome, entre outros, venderem quando, pelo preço e condições que entenderem, aos seus filhos, EE, GG, JJ e II, em comum e parte iguais, a fracção autónoma descrita sob 1.

  6. Após a outorga da referida procuração, os réus CC e DD averiguaram se os registos referentes às diversas propriedades estavam em conformidade e constataram que sim.

  7. Em escritura pública outorgada no dia 9 de Agosto de 1995, no Cartório Notarial de Benavente, o réu DD, na qualidade de...

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