Acórdão nº 06S3782 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelMÁRIO PEREIRA
Data da Resolução22 de Março de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I - Os autores AA, BB, CC, DD e EE, todos de apelidos ....

, deduziram contra as rés Empresa-A e Empresa-B acção declarativa, com processo especial, emergente de acidente de trabalho mortal, sofrido por FF, marido da 1ª autora e pai dos restantes autores, pedindo que se condene as RR. a pagarem-lhes, na medida da respectiva responsabilidade, as pensões, despesas de funeral e de transportes e, concluindo-se pela culpa da entidade empregadora, pensões agravadas e indemnização por danos morais próprios e da vítima e pela perda do direito à vida desta, sendo as pensões acrescidas de um duodécimo em Dezembro de cada ano e todas as quantias em dívida, de juros de mora no montante de € 2.493,98, para além dos vencidos desde a data da citação até integral pagamento.

As RR. contestaram.

A Empresa-B excepcionou a caducidade do direito de acção.

Invocou também que o acidente ocorreu por culpa do sinistrado ou por violação das regras de segurança por parte da 1.ª co-R., entidade empregadora.

A R. Empresa-A invocou também a caducidade do direito de acção, alegou que o acidente ocorreu por culpa do sinistrado, pois terá ingerido bebidas alcoólicas em excesso e impugnou factos da p.i..

As RR. concluíram pela sua absolvição do pedido.

Foi proferido despacho saneador, no qual foi julgada improcedente a excepção de caducidade do direito de acção.

Dele agravou a R. Empresa-A, pedindo que fosse julgada procedente a excepção.

Instruída e julgada a causa, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando as RR. a pagar aos AA. pensões anuais, não agravadas, na proporção de 56,69% a cargo da seguradora e 43,31% a cargo da entidade patronal.

Dela apelou a R. Empresa-A, pedindo a sua absolvição do pedido.

Também os AA. apelaram, pedindo a alteração da sentença por forma a contemplar os pedidos de pensões agravadas e de indemnização por danos morais e direito à vida.

II - A Relação negou provimento ao agravo e às apelações, embora tenha reformulado o cálculo das pensões, com a condenação das RR. nas pensões, pelos montantes e proporções que deixou definidos e com o acréscimo de 1/12 em Dezembro de cada ano, enquanto devidas, sendo todos os duodécimos acrescidos de juros de mora, à taxa legal, desde o vencimento de cada um deles, até integral pagamento.

Do acórdão da Relação recorreram de revista a R. Empresa-A e os AA.

A R. apresentou as seguintes conclusões: 1ª. O acidente ocorreu em 28.05.1996 e a Autora viúva constituiu mandatário em 26.06.1996.

  1. O regime da suspensão da Instância previsto no art. 122° do Cód. Proc. Trabalho apenas se aplica quando o MºPº patrocina os beneficiários, pois constituído mandatário aplica-se o regime da interrupção da Instância, uma vez que cessou o curso oficioso do processo - cfr. Ac. da Relação do Porto, de 14.10.2002, no processo 0240810, in www.dgsi.pt - ficando a paralisação exclusivamente por conta da negligência ou inércia dos interessados.

  2. Tendo o processo estado sem andamento entre a ultima tentativa de conciliação, ocorrida em 28.10.1997 e a data da apresentação da petição inicial, em 28.04.2004, decorreu mais do que o ano previsto na Base XXXVIII da Lei n.º 2127, de 3 de Agosto de 1965, pelo que caducou o direito de acção.

  3. Tem que se encontrar um ponto de equilíbrio entre os interesses de ordem pública emergentes do acidente de trabalho e os princípios e valores da certeza e da segurança do Direito. É contraproducente e inadmissível a eternização da pendência judicial. Pelo que, esse ponto de equilíbrio se mostra superiormente enunciado na tese do douto acórdão fundamento - Ac. RP, de 14.10.2002, já referenciado nas alegações e na conclusão 2ª supra.

  4. A recorrente considera incorrectamente julgado o ponto G) dos factos dados como provados: "À data do acidente o sinistrado auferia cerca de cem mil escudos mensais". Entende que tal facto deveria ser considerado não provado.

  5. Em lugar dele, em face da prova documental existente no autos e, nesta sede, concreta e somente da compaginação dos documentos oferecidos por Autores e Ré, deverá dar-se como provado, no âmbito do quesito primeiro, o seguinte: "À data do acidente, o sinistrado auferia a retribuição base mensal de Esc. 56.690$00, acrescida de um subsídio de alimentação de Esc. 615$00, por cada dia de trabalho efectivo, e ajudas de custo cuja média rondava os Esc. 5.000$00/ mês".

  6. Sobre esta questão, constituída pelo montante da retribuição do sinistrado à data da morte, terão que avultar sobre os demais elementos de prova os recibos de vencimento anexos à contestação, que se mostram elaborados em papel timbrado da entidade patronal e assinados pelo sinistrado. Com a devida vénia, a prova segura da retribuição não poderá emergir de outros elementos, sob pena de arbitrariedade.

  7. Ao invés, os papéis (pretensos recibos) juntos pelos Autores não estão assinados por ninguém e não permitem descortinar a sua proveniência, pelo que devem considerar-se inidóneos, mormente para determinar o montante salarial do sinistrado ao serviço da ora Recorrente.

  8. Ademais, o art. 94° da LCT (DL 49408, de 24.11.1969) consagra que "No acto do pagamento da retribuição, a entidade patronal deve entregar ao trabalhador documento donde conste o nome completo deste, número de inscrição na previdência respectiva ... ".

    Donde, e observando o disposto nos art. 393°, n.ºs 1 e 2, e 394°, n.º 1, do Código Civil, não poderá a prova testemunhal ser admitida para infirmar o valor dos recibos autuados pela ré patronal. Recibos esses que são os únicos que se mostram assinados pelo sinistrado.

  9. Com o devido respeito e sem qualquer desvalor intelectual, o douto Acórdão recorrido viola, designadamente, o disposto na Base XXXVIII, n.º 1, da Lei n.º 2127, de 3 de Agosto 1965, bem assim o disposto nos arts. 285° e 291° do Cód. Proc. Civil. E ainda o disposto nos arts. 393°, n.ºs 1 e 2, e 394°, n.º 1, do Cód. Civil.

    Pede que seja revogado o acórdão recorrido, com a sua absolvição de todos os pedidos.

    Por seu turno, os AA. apresentaram, na sua revista, as seguintes conclusões: 1ª. A douta decisão recorrida não merece qualquer censura quando conclui pela violação, nos presentes autos, de regras de segurança em vigor na construção civil, porquanto tal violação esteve na base da condenação dos responsáveis da entidade patronal (arguidos no respectivo processo crime que correu termos no Tribunal Judicial de Vila do Conde), como autores materiais de um crime de infracção de regras de construção, p. e p. pelo art. 277°, n.ºs 1, al. a) e 2, do Cod. Penal, na pena de um ano de prisão (cfr. douto acórdão junto aos autos a fls. ).

  10. Contudo, já merece censura a conclusão inserta na mesma decisão de que os ora recorrentes "não demonstraram a existência do nexo de causalidade entre a violação das regras de segurança e a produção do acidente" e que esteve, de resto, na base da não responsabilização da ré entidade patronal.

  11. Sendo que os ora Recorrentes continuam a entender que a responsabilidade da ré entidade patronal, nos termos do disposto no artigo 54° do Dec. 360/71, de 21/8, não está sequer dependente da verificação do referido nexo causal entre a violação das regras de segurança e a verificação do acidente; 4ª. Vejam-se a esse propósito o Ac. do STJ de 16-4-97, publicado na Col. Jur., Tomo II, pág. 268 e os Ac do STJ de 26/11/80, de 17/7/87 e 9/1/91, publicados respectivamente no BMJ, 301°, 319 e em Acs Dout., 312°, pág. 1624 e 331°, pág. 376.); 5ª. De resto, mesmo que se comungue do entendimento subjacente à douta decisão recorrida, os ora Recorrentes continuam a entender que da prova produzida nos presentes autos resulta mais do que evidente o nexo causal entre a violação das normas de segurança em apreço e o acidente que vitimou o sinistrado .

  12. Com efeito, o carrinho transportado pelo sinistrado ia carregado com betão pronto, logo constituía um objecto necessariamente pesado, e necessariamente instável, instabilidade agravada pelo facto de ser transportado sobre uma laje em betonagem, logo de piso também ele irregular e instável.

  13. A queda foi, pois, provocada pelo desequilíbrio do objecto transportado (carrinho) quando o sinistrado circulava próximo da borda da laje.

  14. Ora, é evidente para qualquer homem médio que a existência de resguardo e guarda-corpos colocados na bordadura da laje, teria permitido suster a queda, quer do carrinho de betão, quer do próprio sinistrado, já que quer o trabalhador, quer o seu instrumento de trabalho, teriam embatido contra aquele meio de protecção colectiva, impedindo a verificação do resultado.

  15. Ao invés, a inexistência de resguardos ou guarda-corpos permitiu que o sinistrado e o carrinho de betão tivessem ultrapassado o limite da laje e se tivessem estatelado no solo, causando a morte ao marido e pai dos ora recorrentes.

  16. De resto, o único propósito desse meio de protecção colectiva é precisamente constituir uma barreira entre a laje onde se encontra o trabalhador e o precipício que existe no fim da laje.

  17. Pelo que, face à factualidade apurada, é por de mais evidente o nexo causal existente entre a falta de resguardos ou guarda corpos e a queda de que o sinistrado foi...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
4 temas prácticos
4 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT