Acórdão nº 06S3212 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Dezembro de 2006

Magistrado ResponsávelFERNANDES CADILHA
Data da Resolução14 de Dezembro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça 1. Relatório.

"AA", intentou a presente acção emergente de contrato de trabalho contra Empresa-A, com sede em Lisboa, pedindo que seja declarado ilícito o seu despedimento, e a Ré condenada a reintegrá-lo no seu posto de trabalho ou, em alternativa, a pagar-lhe a indemnização de antiguidade, e ainda condenada a pagar-lhe as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento e uma indemnização por danos morais, acrescida de juros moratórios desde a propositura da acção.

Em sentença de primeira instância, foi julgado ilícito o despedimento, e, em consequência, a ré condenada a reintegrar o autor no seu posto de trabalho e a pagar retribuições em dívida, bem como uma indemnização por danos morais no montante de € 3.500,00, acrescida de juros de mora desde a data da citação até integral pagamento.

Em apelação, o Tribunal da Relação de Lisboa confirmou o julgado.

Ainda inconformada, a ré vem interpor recurso de revista, em que formula as seguintes conclusões: 1) Antes de mais, importa rememorar alguns dos factos que o acórdão considerou provados: "Em 2 de Novembro de 2003, o A. comentou com o colega de trabalho, de nome BB, que, caso a Empresa-A fosse "macaco" com ele, também o seria; O A. disse que bastaria fazer uma "chante" numa betoneira para que o Empresa-A ficasse completamente às escuras; E comentou ainda com o Colega de trabalho que bastaria abrir uma válvula de retorno na central de frio para que os compressores rebentassem: Em 5 de Novembro de 2005, o autor comentou com o Senhor CC, subchefe da secção de manutenção da Empresa-A de Loures, que quem quisesse prejudicar a Empresa-A bastava abrir a válvula do depósito de água potável o que podia provocar uma explosão nos transformadores do hipermercado; E disse ainda que as consequências desse acto seriam destrutivas, pois até o problema ser solucionado o hipermercado.teria de fechar ao público por algumas horas"; 2) Da perspectiva da Recorrente, o que importa dilucidar é se o autor, desagradado, por qualquer motivo, com a conduta da Empresa-A, pode, no seu local de trabalho, perante outros colegas de trabalho, discorrer, por diversas vezes, de um modo abertamente desafiador, sobre as diversas formas que teria de provocar rebentamentos e explosões nas instalações da sua entidade empregadora; 3) O acórdão recorrido considera que "em relação ao autor podem-lhe, com efeito, ser imputadas conversas infelizes e inadequadas, susceptíveis de gerarem juízos errados nos seus interlocutores. Mas um trabalhador que pretende/ por alguma forma/ prejudicar intencionalmente a sua entidade patronal não começa por anunciar aos seus colegas de trabalho o que vai fazer e a forma como pretende fazê-Io.

4) Isto é, segundo o Tribunal recorrido, os trabalhadores podem ameaçar tranquilamente as suas entidades patronais, porquanto a própria existência das ameaças faz presumir que não têm qualquer intenção de as prejudicar - o que é inaceitável; 5) É que o autor produziu um verdadeiro manual verbal subordinado ao tema como prejudicar a Empresa-A, provocando rebentamentos e explosões nas suas instalações, que decidiu partilhar com os Colegas; 6) No entanto, segundo o acórdão recorrido, "(...)dado não se ter provado algo que aponte no sentido de que autor queria prejudicar a Recorrente apenas podemos concluir que a manutenção das conversas em causa não configuraram a prática de um ilícito disciplinar grave que determine a impossibilidade da subsistência da relação laboral (...); 7) Esta errónea e perturbadora conclusão deslocaliza o cerne da questão sub judice.

Com efeito, será que a ideia de confiança que preside ao vínculo laboral é suficientemente elástica para permitir que um trabalhador se entretenha a descrever aos colegas, e mesmo superiores hierárquicos, adiantando, de resto, pormenores técnicos, os diversos modos como, considerando as suas funções na empresa, e os seus conhecimentos técnicos, poderia efectivamente prejudicar a Ré, provocando rebentamentos e explosões na empresa? 8) A Relação considerou que sim. No entanto, se, em vez de trabalhar para a Empresa-A, o autor prestasse serviço numa central nuclear, será que o Tribunal recorrido manteria a posição que assumiu no acórdão recorrido? Provavelmente não; 9) Porém, da perspectiva da Recorrente, não estando em causa se o trabalhador pretendia ou não, de facto, provocar as explosões e rebentamentos a que aludiu - mas o próprio discurso do Recorrido - é indiferente a natureza da actividade da empresa (mais ou menos perigosa) para a qual o trabalhador presta serviço; 10) Importa ainda recordar os factos, descritos sob os pontos 2, 20, 21, que o acórdão recorrido considerou provados, isto é, "O trabalhador era electricista especializado; Prestava serviços de manutenção à Ré, os quais implicavam a assistência técnica ao equipamento eléctrico existente na loja, nomeadamente, às arcas frigoríficas e congeladoras que contêm os artigos para comercialização; Bem como ao equipamento eléctrico existente nas lojas e nos armazéns"; 11) Ora, considerando estes factos, é manifesto que a relação laboral em apreço continha um laço fiduciário intenso, porquanto o trabalhador manipulava - com tudo o que isso implica - todo o "equipamento eléctrico existente nas lojas e nos armazéns"...

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