Acórdão nº 06B3836 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução09 de Novembro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I "AA" intentou, no dia 30 de Setembro de 2002, contra a Herança Ilíquida e Indivisa aberta por óbito de BB e o Centro Nacional de Pensões, a que sucedeu o Instituto de Solidariedade e Segurança Social, acção declarativa de apreciação, com processo ordinário, pedindo se declare ter vivido com BB em condições análogas às dos cônjuges durante mais de dois anos, até à data da sua morte, inexistirem pessoas a quem possa exigir alimentos, ter direito a que a herança daquele lhos preste, serem os réus os únicos e universais herdeiros da herança, não ter esta bens ou rendimentos que lhe permitam prestar alimentos e ser titular do direito a exigir pensão de sobrevivência e subsídio por morte.

Fundamentou a sua pretensão na circunstância, por um lado, de ter vivido em condições análogas às dos cônjuges, desde 1958, com BB, beneficiário da segurança social, até à morte deste, em 17 de Setembro de 2001, no estado de viúvo há mais de dois anos E, por outro, viver da pensão de reforma de velhice, em estado de pobreza e ajuda de terceiros, não ter BB deixado bens e as três filhas não terem possibilidades de lhe valer.

Apenas o Instituto de Solidariedade e Segurança Social contestou a acção, aceitando o falecimento de BB e a sua qualidade de beneficiário da segurança social e impugnando os demais factos alegados pela autora sob o fundamento de os desconhecer, e opôs-se à desistência da instância formulada pela autora.

Foi concedido à autora o pedido de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e de encargos com o processo.

Realizado o julgamento, no âmbito do qual foi declarada sanada a irregularidade decorrente da omissão de selecção da matéria de facto, foi proferida sentença no dia 22 de Junho de 2005, por via da qual se declarou ter a autora vivido com o falecido BB em condições análogas às dos cônjuges durante mais de dois anos e até à data da sua morte, e que, por isso, tinha direito a exigir alimentos à herança aberta por óbito de BB, e que ela não integra bens ou rendimentos que permitam prestar-lhos.

Apelou a autora, e a Relação, por acórdão proferido no dia 4 de Junho de 2006, revogou parcialmente a sentença recorrida e declarou o direito da apelante a exigir do Instituto de Solidariedade e Segurança Social, por óbito de BB, o subsídio por morte e a pensão de sobrevivência.

Interpôs o Instituto de Solidariedade e Segurança Social recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - tem direito à pensão de sobrevivência quem tiver direito a pedir alimentos à herança; - a atribuição das prestações por morte depende do reconhecimento judicial do direito a alimentos pela herança ou da qualidade de titular das prestações por morte no caso de não reconhecimento do direito a alimentos por falta ou insuficiência de bens da herança; - a recorrida devia provar a sua necessidade de alimentos, não poder prover à sua própria subsistência, bem como a inexistência ou insuficiência de bens da herança e não os poder obter dos ascendentes nem dos irmãos; - o nosso quadro jurídico-constitucional regulador da família não permite a equiparação da união de facto ao casamento, sob pena de se violarem os princípios da igualdade e da proporcionalidade ínsitos nas disposições dos artigos 2º, 13º, nº 2, 36º, nº 1, 63º, nº 1 e 3, e 67º da Constituição; - ao decidir como decidiu, apesar de os factos provados não revelarem todos os requisitos de atribuição à recorrida do direito à pensão de sobrevivência, o acórdão violou os artigos 8º do Decreto-Lei nº 322/90, de 18 de Outubro, 2º e 3º do Decreto Regulamentar nº 1/94, de 18 de Janeiro, a Lei nº 7/2001, de 11 de Maio, e os artigos 342º, 2009º e 2020º do Código Civil, pelo que deve ser revogado.

Respondeu a recorrida em síntese de conclusão: - os factos provados revelam que no momento da morte de BB, não casado nem separado judicialmente de pessoas e bens, beneficiário da segurança social, a recorrida vivia com ele, há mais de dois anos, em condições análogas às dos cônjuges; - resulta dos referidos factos não lhe ser possível obter alimentos de alguma das pessoas aludidas nas alíneas a) e d) do artigo 2009º do Código Civil, nem da herança de BB, por não ter deixado bens ou por serem insuficientes para o efeito; - inexistem quaisquer pessoas a quem possa pedir alimentos nos termos do artigo 2009º do Código Civil; - a sua confissão faz prova plena da existência das três filhas, todas economicamente débeis.

II É a seguinte a matéria de facto declarada provada no acórdão recorrido: 1. A autora e BB conhecerem-se em Malange, Angola, por volta do ano de 1958, enamoraram-se, por lá ficaram até Setembro de 1975, altura em que, por causa da descolonização, vieram juntos para Portugal e juntos foram viver para o ..., freguesia do Campo, concelho de Viseu.

  1. Desde a data referida sob 1 até ao falecimento, BB e a autora mantiveram vidas em comum, à vista de toda a agente, partilhando a cama, a mesa e a habitação, como se casados fossem.

  2. Durante o período de tempo referido sob 2, a autora dedicou-se inteiramente a BB, preparando as refeições de ambos, lavando a roupa, cuidando do arranjo da casa e dando-lhe carinho.

  3. Eram considerados, nos lugares onde viveram, por amigos, vizinhos e familiares, como se fossem marido e mulher, e mantiveram, ininterruptamente até à morte dele, respeito, fidelidade e auxílio recíprocos.

  4. ...

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