Acórdão nº 06S4140 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Outubro de 2006

Magistrado ResponsávelMÁRIO PEREIRA
Data da Resolução18 de Outubro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I - O Autor AA pediu com a presente acção emergente de contrato de trabalho que a R. Empresa-A = fosse condenada a reconhecer que ele A. tem direito a receber dela, mensalmente, desde a data da sua reforma e durante toda a sua vida, uma quantia que, somada à pensão de reforma da Segurança Social, perfaça o valor da sua "reforma total", anualmente actualizada, calculada nos termos da "Ordem de Serviço" da R. n.° 10/81 de 18 de Dezembro de 1981, num mínimo de 10% do salário base previsto, à data da reforma, para o Grupo I da respectiva tabela salarial do CCT para a Indústria Vidreira.

Pediu também que a ré fosse condenada a pagar-lhe: a) € 6.527,67 referente a subsídios de turno desde Abril de 1996 até Julho de 2001; b) € 659, 94 referente ao facto de, por tais subsídios de turno não terem sido contabilizados para efeitos de Segurança Social, a pensão de reforma do A. não ter sido acrescida, mensalmente, de mais € 38,82 e relativos ao referido período e condenando-se ainda a R. a pagar, mensalmente, ao A. a quantia de € 38,82 e que acrescerá à respectiva pensão de reforma; c) € 3.584,79 a título de complemento de reforma referente ao período em que a Segurança Social iniciou o pagamento da pensão de reforma ao A. e até 31 de Julho de 2002.

A R. contestou, impugnando parte da factualidade alegada pelo A. e invocando que não assiste a este, de facto e de direito, razão no tocante aos montantes pedidos a título de subsídio de turno e que, a ser considerada devedora do pagamento do diferencial entre o valor da pensão atribuída pela Segurança Social e a que resultaria se no cálculo da mesma tivessem sido considerados os descontos sobre as quantias peticionadas a título de subsídio de turno, as invocadas prestações mensais de € 38,82 desde Junho de 2001 sempre seriam da responsabilidade da Segurança Social/Caixa Nacional de Pensões, que é quem tem para com o autor uma relação creditícia de protecção social como contrapartida pelos descontos efectuados ao longo da carreira retributiva, pelo que nessa parte o litígio não é da competência dos Tribunais de Trabalho mas sim dos Tribunais Tributários.

Quanto aos complementos de reforma, sustentou que grande parte das cláusulas da Ordem de Serviço nunca foram aplicadas ao longo dos anos, sofrendo diversas alterações de que os trabalhadores foram tomando conhecimento e a elas nunca se opuseram, que o A. actuou abusivamente ao recorrer ao elemento literal da Ordem de Serviço para com base nela assentar o direito ao complemento nos moldes em que o fez, pois não só a O.S. não reproduz integralmente a vontade da R. ao atribuir o benefício em questão, como a prática da sua implementação, imediatamente posterior à divulgação da mesma, e confirmada por uma Ordem de Serviço de 1992, afasta alguns dos procedimentos nela previstos e, finalmente, que não assiste ao A. o direito a complemento de reforma uma vez que a pensão de reforma que recebe da Segurança Social é superior ao valor líquido da última remuneração auferida pelo mesmo antes de se reformar.

O A. respondeu à contestação, defendendo a improcedência da excepção de incompetência absoluta do Tribunal do Trabalho.

Por decisão proferida a fls. 150 a 151 verso dos autos, transitada em julgado, foi considerada procedente a excepção de incompetência material do Tribunal do Trabalho para apreciação do pedido acima constante da alínea b) do pedido formulado pelo A. e fixou-se o valor da causa em € 61.382,20.

Após julgamento, foi proferida sentença (fls. 180 e ss.) que julgou a acção parcialmente procedente e: a) condenou a R. a reconhecer o direito que ao A assiste quanto ao complemento de reforma, no valor de € 178, 59/mês, desde a data da sua reforma, complemento que será sujeito à actualização prevista no ponto 1.9. do citado Regulamento Interno (acréscimo de 750$00 sobre a "reforma total" em 1 de Janeiro de cada ano), direito que se manterá enquanto o valor da "reforma total" for superior ao da reforma atribuída pela Segurança Social, sendo que em relação aos montantes vencidos se vencem juros moratórios à taxa legal; b) absolveu a R. do restante peticionado.

A R. interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Coimbra, vindo este, pelo acórdão de fls. 266 e ss., a condená-la a pagar ao A , a título de subsídio complementar mensal e desde a data da reforma deste (se tal se vier a mostrar devido), a quantia que se liquidará em execução da sentença e consiste na diferença existente entre o valor da "reforma total" (€ 801, 70 em 2001) e a prestação da segurança social que o mesmo A auferiria se tivesse trabalhado até ao 65 anos de idade, prestação essa que se deverá calcular com base nos parâmetros estabelecidos pelo D.L. 486/73 de 27/9, devendo o valor total da reforma ser actualizado anualmente e com efeitos a partir de 1/1 em 750$00.

II - Desta feita inconformado o A., recorreu de revista para o STJ, tendo apresentado as seguintes conclusões:

  1. A ré, ora recorrida, através da Ordem de Serviço n° 10/81 de 18 de Dezembro de 1981, procurou regular o direito à pensão complementar de reforma dos seus trabalhadores não podendo desconhecer "que estava em causa definir um quadro factual e jurídico que se prolongaria no tempo" tendo estabelecido não só a forma de cálculo do complemento de reforma como também das actualizações".

  2. Quanto ao cálculo, e tendo em atenção o n° 17 daquela OS, a expressão aí utilizada ("...aquela que for concedida") "indica claramente a ideia que o que releva é a pensão que for concedida pela Segurança Social, tendo em conta os respectivos pressupostos e o regime legal, ou seja, a pensão efectivamente paga".

  3. E, de igual modo, no n° 12 da referida OS, se considera que o subsídio complementar é sempre "... um complemento da pensão de reforma atribuída pela Previdência Social ...".

  4. Assim, o teor daquelas cláusulas, designadamente ao mandar atender "à pensão que for concedida" pela Segurança Social é "... incompatível com uma pensão de reforma ficcionada, calculada com base em regras estabelecidas á data da emissão da Ordem de Serviço...".

  5. O direito do A. (e demais trabalhadores da Ré) ao referido complemento de reforma, é um direito "diferido", isto é, "um direito que só se adquire no momento em que se mostram integralmente verificados os respectivos pressupostos, existindo anteriormente uma mera expectativa jurídica do seu recebimento".

  6. "Só com a reforma do trabalhador este adquire o direito a eventual pensão complementar de reforma e só nesta altura existem elementos concretos para calcular a mesma, como sejam a antiguidade do trabalhador, remunerações, etc." G) Não fazendo sentido "que no momento de determinar se o trabalhador tem direito a receber efectivamente da ré uma pensão complementar de reforma se atenda, no cálculo a efectuar, a elementos de facto vigentes a essa data, e se complemente a mesma com um elemento vigente, não a essa data, mas sim à data da emissão da OS (pensão estatutária do trabalhador de acordo com o DL n.º 486/73 de 27-09)".

  7. O princípio estatuído no art° 237° do Cód. Civil, para além de, em termos de direito do trabalho, o referido complemento de reforma não consubstanciar uma verdadeira liberalidade (pois haverá sempre para a empresa um qualquer "ganho" pela passagem do trabalhador à reforma, quiçá, incentivada pelo tal complemento...), dizíamos, tal principio "não poderá prevalecer sobre o estatuído no art° 236° do CC ... apenas valendo para os casos em que a declaração, consultados os diversos elementos utilizáveis para a interpretação de acordo com as regras fixadas neste último preceito, comporta dois ou mais sentidos, baseados em razões de igual força" - o que não é o caso dos autos pois, "face às regras de interpretação do art° 236 ° do CC, essas dúvidas acabam por esbater-se".

  8. É, pois, de concluir que o A. tem direito, durante toda a sua vida, a um subsídio complementar de reforma, a calcular tendo em conta "que a pensão de reforma da Previdência/Segurança Social a atender para o cálculo da "Reforma Total" é a efectivamente paga".

  9. Tanto mais que o "DL n° 329/93 não trouxe uma alteração imprevista e anormal das circunstâncias em que a R. fundou a decisão de conceder o subsídio complementar de reforma, sendo ainda que o regime nele consagrado não envolve uma excessiva onerosidade económica para a R.".

  10. Por outro lado, se vingasse a tese propugnada pela Ré e acolhida no Acórdão ora em revista, então o valor da "Reforma Total", caso o A. só se viesse a reformar aos 65 anos de idade (idade da reforma por velhice), teria que ser calculado por referência a essa idade e não aos 61 anos já que, então, o valor da pensão de reforma atribuída pela Segurança Social, se calcularia por referência aos 65 anos e não aos 61 anos...

  11. Deve, pois, ser reconhecido ao A. e ora recorrente o direito a receber, mensalmente, desde a data da respectiva reforma e até ao...

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