Acórdão nº 06P1575 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Setembro de 2006
Magistrado Responsável | RODRIGUES DA COSTA |
Data da Resolução | 21 de Setembro de 2006 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
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RELATÓRIO 1.
No Tribunal Judicial da Comarca de Castro Daire, em processo comum colectivo, foi julgado o arguido AA, melhor identificado nos autos, tendo no final sido absolvido do crime continuado de actos sexuais com adolescentes, previsto e punido pelos arts. 30.º, nº 2, e 174.º, do Código Penal, de que vinha acusado, e condenado como autor material de um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelos arts. 131º e 132º, nº 1 e 2, als. b), d) e i), do Código Penal, na pena de 18 (dezoito) anos de prisão e ainda como autor material de um crime de ocultação de cadáver, previsto e punido pelo art. 254º, nº 1, al. a), do mesmo diploma legal na pena de 1 (um) ano de prisão.
Em cúmulo jurídico de tais penas parcelares, foi o arguido condenado na pena única de 18 (dezoito) anos e 6 (seis) meses de prisão.
O arguido foi ainda condenado, na procedência do pedido de indemnização civil formulado pelo assistente BB e pela demandante civil CC, a pagar a quantia global de € 90.000 (noventa mil euros) - € 50.000,00 pela perda do direito à vida, cuja titularidade radicava na vítima, e € 40.000,00 pelos danos não patrimoniais sofridos pelo assistente e demandante civil -, cabendo, dessa quantia global, a fracção de € 45.000 (quarenta e cinco mil euros) a cada um dos demandantes civis.
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Inconformados com a decisão, o arguido e os demandantes civis interpuseram recurso para o Tribunal da Relação do Porto, que, negando provimento a esses recursos, manteve integralmente o decidido.
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Ainda inconformados, os demandantes civis vieram interpor recurso para este Supremo Tribunal, pondo em causa a pena aplicada e a indemnização fixada.
No que respeita a esta última, discutem o seu quantitativo, que entendem dever ser fixado em € 40.000,00 para cada um dos demandantes, devendo ainda atender-se ao sofrimento da própria vítima, que reclamaria, a título de compensação, outros € 40.000, e ao dano patrimonial sofrido pelos recorrentes, que não seria ressarcido com quantia inferior a € 25.000,00 para cada um deles.
Por último, entendem que o carro que possibilitou ao arguido a prática dos crimes deveria ser declarado perdido a favor do Estado, sendo entregue aos recorrentes ou a eles devendo ser atribuído o produto da venda, a ser descontado na quantia indemnizatória.
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Tendo o Ministério Público levantado a questão prévia da falta de legitimidade dos recorrentes para interporem recurso relativamente à medida da pena, foi esta questão decidida em conferência no sentido da sua procedência, tendo o processo prosseguido par audiência relativamente às demais questões.
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Colhidos os vistos, realizou-se a audiência de julgamento.
Cumpre agora decidir.
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FUNDAMENTAÇÃO 6. Matéria de facto proveniente das instâncias 6. 1. Factos dados como provados: 1. Em data que não foi possível concretizar, mas situada nos meses de Novembro ou Dezembro de 2002, o arguido AA começou a namorar com a vítima DD, nascida no dia 23 de Junho de 1986, relacionamento que se manteve até ao dia 13 de Fevereiro de 2004, e que, a partir de determinada altura, passou a ser do conhecimento dos familiares da DD, de algumas suas colegas de escola, e até dos colegas de trabalho do arguido; 2. Logo que iniciaram o namoro, o arguido e a DD passaram a trocar, frequentemente, telefonemas - muitas vezes mais do que uma vez por dia e até ao dia 13 de Fevereiro de 2004, às 14 horas e 45 minutos - enviando, ainda, o arguido mensagens do seu telemóvel de marca "Nokia", modelo "3310", com o IMEI ..., e com o n.º ..., para os telemóveis da DD, com os números ... e ..., escrevendo palavras como "amor", "adoro-te", e "gosto muito de ti"; 3. A partir do mês de Dezembro de 2002, aproveitando-se desse relacionamento, o arguido começou a ter relações de cópula completa com a DD, não sendo estas do conhecimento dos pais da mesma; 4. As relações sexuais referidas no ponto anterior foram mantidas pelo menos três vezes por mês, e até pelo menos ao final do mês de Janeiro de 2004, no carro do arguido, de marca "Renault", modelo "Clio", com a matrícula ..., junto à praia fluvial e ao campo de futebol da Folgosa, no concelho de Castro Daire; 5. De uma dessas relações sexuais, referidas nos pontos anteriores, resultou a gravidez da DD, a qual se encontrava, no dia 13 de Fevereiro de 2004, grávida de 6 meses e 25 dias de gestação; 6. Logo que o pai da DD, o assistente BB, soube que o arguido era casado e que namorava a sua filha, proibiu-o de continuar a encontrar-se com ela; 7. Por esse motivo, a DD escondeu dos seus familiares, até finais de Janeiro de 2004, a sua gravidez, altura em que contou à sua mãe, a demandante civil CC, e ao irmão EE, dizendo-lhes que o pai do seu filho era o arguido; 8. Logo que a mãe e irmão da DD ficaram a saber que ela estava grávida, decidiram que o melhor seria contarem ao pai daquela, a fim de encontrarem uma solução para o futuro dela e do filho, sendo que apenas o não fizeram porque a DD lhes disse que seria ela e arguido que contariam ao pai, depois de obterem o resultado da ecografia que a DD havia feito no dia 26 de Janeiro de 2004; 9. A DD, ao constatar que a mãe e o irmão aceitaram a sua gravidez e lhe ofereceram toda a ajuda para resolverem o futuro dela e do filho, ficou muito contente e falou com o arguido para combinarem o dia em que o mesmo iria a sua casa falar com o pai e assumir a paternidade; 10. Todavia, e não obstante o arguido por várias vezes ter marcado o encontro, acabou sempre por desmarcá-lo, desculpando-se com o facto de não poder, sendo que em data que não foi possível concretizar, quando o arguido estava a tomar café com a DD e com a prima desta, FF, o mesmo disse que assumia a paternidade mas de seguida se matava, pois se a mulher soubesse o seu casamento terminava; 11. No dia 13 de Fevereiro de 2004, cerca das 14 horas, a DD saiu da casa dos seus pais, sita no ..., freguesia de Castro Daire, onde residia, e dirigiu-se ao Centro de Saúde de Castro Daire para uma consulta de obstetrícia com a sua médica de família, após o que pretendia encontrar-se com o arguido, a fim de irem os dois a sua casa para contarem ao pai a sua gravidez e resolverem o futuro de ambos; 12. Durante a consulta referida no ponto anterior, a DD disse à GG, médica que a consultou, que após terminar a consulta ia encontrar-se com o pai da criança, pois ele ia assumir perante o seu pai a paternidade; 13. Após a consulta referida nos pontos anteriores, a DD dirigiu-se ao café denominado "...", sito nas proximidades da escola secundária de Castro Daire, local a que chegou cerca das 15 horas e 30 minutos, e onde esteve a conversar com a sua colega de turma HH, tendo-lhe dito que estava grávida, que o pai do seu filho era o arguido, e ainda que já havia contado à mãe e irmão, sendo que apenas o pai não sabia, mas que não passava desse dia, pois estava a fazer tempo para que o arguido chegasse do trabalho para depois ir ter com ele ao Centro Cultural de Castro Daire - local onde quase todos os dias, ao final da tarde, o arguido se encontrava com a DD -, para irem os dois falar com o pai; 14. Na ocasião referida no ponto anterior, a DD contou ainda à HH que o arguido disse que ia separar-se da mulher e que iriam viver para o estrangeiro quando recebesse uma indemnização por ter levado um tiro; 15. Cerca das 16 horas e 45 minutos do dia 13 de Fevereiro de 2004, a DD saiu do café "..." e foi em direcção ao Centro Cultural, que fica próximo da Av. ... e do Complexo Desportivo de Castro Daire, a fim de aí esperar pelo arguido; 16. Entre as 17 horas e as 17 horas e 20 minutos do dia aludido no ponto anterior, após terminar o trabalho, o arguido foi ao encontro da DD, que sabia estar à sua espera junto ao dito Complexo Desportivo, com intenção de a levar para lugar escondido para a matar e depois enterrar o corpo, tudo para que não...
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