Acórdão nº 04P4710 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Abril de 2006

Magistrado ResponsávelSORETO DE BARROS
Data da Resolução19 de Abril de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

"AA" e BB, identificados nos autos, recorrem do acórdão de 19.07.04, do Tribunal da Comarca de Serpa, proferido no âmbito dos autos de processo comum colectivo n.º 71/03.

  1. 1 Os arguidos, sob acusação do Ministério Público, foram julgados, tendo sido condenados (para o que, agora, importa) : O arguido AA, pela prática, em co-autoria material, de: - três crimes de furto simples, na forma consumada, previsto e punido nos termos do artigo 203º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão por cada crime; - seis crimes de furto qualificado, na forma tentada, previsto e punido pelo artigo 204º, n.º 2, alínea e), com referência aos artigos 202º, alínea d) e 203º, n.º 1, todos do Código Penal, na pena de três anos de prisão por cada crime; - dois crimes de furto qualificado, na forma tentada, previstos e punidos pelos artigos 22º, 23º, 73º e 204º, n.º 2, alínea e), com referência aos artigos 202º, alínea d) e 203º, n.º 1, todos do Código Penal, na pena de 1 ano e 2 meses de prisão por cada crime; - um crime de burla informática, na forma tentada, previsto e punido nos termos dos artigos 22º, 23º, 73º e 221º, n.º s 1 e 3 do Código Penal, na pena de oito meses de prisão; - pela prática, em autoria material singular e na forma consumada, de um crime de tráfico de produtos estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/I, com referência à tabela I-C anexa a este último, na pena de 4 anos e seis meses de prisão; Em cúmulo jurídico, na pena unitária de dez (10) anos de prisão; O arguido BB, pela prática, em co-autoria material com os restantes arguidos: - três crimes de furto simples, na forma consumada, previsto e punido nos termos do artigo 203º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão por cada crime; - seis crimes de furto qualificado, na forma tentada, previsto e punido pelo artigo 204º, n.º 2, alínea e), com referência aos artigos 202º, alínea d) e 203º, n.º 1, todos do Código Penal, na pena de três anos de prisão por cada crime; - dois crimes de furto qualificado, na forma tentada, previstos e punidos pelos artigos 22º, 23º, 73º e 204º, n.º 2, alínea e), com referência aos artigos 202º, alínea d) e 203º, n.º 1, todos do Código Penal, na pena de 1 ano e 2 meses de prisão por cada crime; - um crime de burla informática, na forma tentada, previsto e punido nos termos dos artigos 22º, 23º, 73º e 221º, n.º s 1 e 3 do Código Penal, na pena de oito meses de prisão; Em cúmulo jurídico, na pena unitária de nove (9) anos de prisão. ' 1.

    2 Inconformados, interpuseram recurso (um, para o STJ e, outro, para a Relação de Évora).

  2. 3 Terminam a motivação do recurso com as seguintes conclusões : Recorrente AA: " 1 - Na qualificação da forma do crime, salvo melhor opinião, e com o devido respeito, estes foram erroneamente considerados como: a) seis crimes de furto qualificado na forma consumada; b) dois crimes de furto qualificado na forma atentada; c) três crimes de furto simples na forma consumada; d) um crime de burla informática na forma atentada.

    2 - O aqui recorrente não concorda com o facto de estes terem sido qualificados em concurso porque: a) Pelo aqui defendido no ponto 1.4.1, 1.4.2. e 1.4.3., provado em audiência de julgamento e aceite pelo Douto Acórdão: - houve durante toda a actuação do recorrente uma única motivação que perdurou até à sua detenção; - houve também durante toda a actuação meios exteriores que facilitaram o continuar da actividade criminógena, diminuindo assim consideravelmente a culpa do agente, pois a partir de determinada altura os crimes iam sendo cometidos sem grande reflexão sobre o seu significado e consequências por parte da reiteração, por parte do recorrente; - o bem jurídico lesado foi sempre o mesmo (o património); - toda a actuação do recorrente foi executada de forma homogénea; 3- Estão desta maneira preenchidos todos os requisitos (que são cumulativos) para não poder ser aqui considerado concurso de crimes, mas sim um único crime continuado, nos termos do artigo 30º, n.º 2 do C.P.

    Em suma, Considerando que há aqui um único crime continuado (e não concurso de crimes) a medida da pena a aplicar deverá, obrigatoriamente, ter em conta o estipulado no artigo 79º do C.P., aplicando-se assim uma única pena, a qual deverá ter como medida a conduta mais grave que integre a continuação.

    Pelo exposto, somos assim remetidos para o artigo 204º, n.º 2, alínea e) do C.P., ou seja, A pena a aplicar ao recorrente deverá ser compreendida entre os 2 e os 8 anos de prisão." Do recorrente BB: "A- Vem o presente recurso em razão de o recorrente não se conformar com o douto Acórdão proferido a fls. 1 a 37 que condenou o arguido em co-autoria material com os restantes arguidos em: - Três crimes de furto simples, na forma consumada, p.ep. pelo artigo 203º, n.º1 do C.P., na pena de 1 ano e 6 meses de prisão por cada crime; - Seis crimes de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 204º, n.º 2 com referência aos artigos 202º, alínea d) e 203º, n.º 1 do C.P. na pena de 3 anos de prisão por cada crime; - Dois crimes de furto qualificado na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22º, 23º, 73º e 204º, n.º 2, alínea e) com referência aos artigos 202º, alínea d) e 203º, n.º 1 do C.P. a uma pena de 1 ano e 2 meses de prisão por cada crime; - Um crime de burla informática, na forma tentada p. e p. pelos artigos 22º, 23º, 73º e 221º, n.º s 1 e 3 do C.P. na pena de 8 meses de prisão.

    Tendo o arguido sido condenado à pena unitária de 9 anos de prisão.

    B- Salvo melhor opinião e com o devido respeito, o aqui recorrente não concorda com o facto de os crimes supra citados serem qualificados em concurso.

    C- Pois, pelo atrás descrito verificou-se, durante toda a actuação do aqui recorrente uma única motivação que perdurou até à sua detenção.

    D- O modus operandi foi essencialmente o mesmo, tendo o arguido na sua actuação utilizado os meios estritamente necessários para alcançar os seus fins.

    E- O instrumento utilizado para rebentarem as fechaduras foi sempre o mesmo - o pé de cabra.

    F- Os meios exteriores coadjuvaram em toda a actividade criminosa e, no continuar da mesma, pois a partir de determinada altura os crimes iam sendo cometidos sem grandes reflexões sobre o seu significado e consequências da reiteração por parte do Recorrente (opinião também perfilhada no Douto Acórdão ora recorrido); G- O bem jurídico lesado foi sempre o mesmo.

    H- Pelo que considera o Recorrente estarem preenchidos todos os requisitos do crime continuado, nos termos do artigo 30º, n.º 2 do C.P..

    I- Assim, e tendo em conta o artigo 79º do C.P., deverá aplicar-se uma pena única a qual deverá ter como medida a conduta mais grave que integra a continuação.

    J- Logo, nos termos do artigo 204º, n.º 2 do C.P., a pena a aplicar ao ora recorrente deverá ser compreendida entre os 2 e os 8 anos de prisão.

    Nestes termos, nos melhores de direito e com o mui douto suprimento de V.Ex. deverá ser dado provimento ao presente recurso e, por via disso, ser revogado o acórdão ora recorrido por outro que condene o recorrente pela prática de um crime continuado e não em concurso de crimes, com o que V. Ex. farão como sempre, JUSTIÇA." 1.

    4 Os recursos foram admitidos com subida imediata, nos próprios autos, com efeito suspensivo . (fls. 619) 1.

    5 Respondeu o Ministério Público, a defender o decidido . (fls.633 a 652) 2.

    Por ocasião do exame preliminar, o relator admitiu que os recursos pudessem ser rejeitados, por manifesta improcedência .

  3. 1 Realizada a conferência, cumpre decidir, adiantando-se o seguinte : - o recurso é rejeitado sempre que for manifesta a sua improcedência (n.º 1., do art.º 420.º, do C.P.P.) ; - o recurso é manifestamente improcedente quando, através de uma avaliação sumária dos seus fundamentos, se pode concluir, sem margem para dúvidas, que ele está votado ao insucesso (Ac. STJ de 01.03.2000, proc. 12/00) ; - em caso de rejeição, o acórdão limita-se a identificar o tribunal recorrido, o processo e os seus sujeitos e a especificar sumariamente os fundamentos da decisão (n.º 3., do art.º 420.º, do C.P.P.) ; - o recurso é julgado em conferência quando deva ser rejeitado (n.º 4., do art.º 419.º, do C.P.P.

    ) .

  4. 2 Posto isto, é necessário ter presente a matéria que o Tribunal de Serpa deu como assente : 1 Na noite de 4 de Dezembro de 2003, entre as 22.00 e as 23.00 horas, em Loulé, os cinco arguidos combinaram, entre si, dirigir-se, nessa mesma noite, a estabelecimentos comerciais sitos em várias localidades da região de Serpa, com o propósito de os assaltarem e deles subtraírem os objectos e valores que aí encontrassem; Para esse fim, os arguidos muniram-se de luvas, destinadas a não deixarem impressões digitais nos locais que assaltassem, de um alicate de pressão, de uma chave de fendas, de um pé-de-cabra, de um berbequim e de um alicate de cortar de grandes dimensões; Os arguidos deliberaram que se fariam transportar no veículo automóvel, da marca «Renault», com a Nº-0, pertencente ao arguido BB; Em execução do plano descrito, os arguidos deslocaram-se, no veículo referido, até à área do concelho de Serpa; Até próximo de Ourique, o veículo foi conduzido pelo arguido BB; A partir daí, foi o arguido CC quem conduziu o veículo, até ao momento em que todos foram detidos, pois era o único arguido que conhecia bem o Baixo Alentejo; 2 Chegados à localidade de Pias, já na madrugada de 5 de Dezembro, os arguidos deliberaram retirar gasolina dos depósitos de veículos automóveis estacionados na via pública para, com ela, abastecerem o veículo em que se faziam transportar; Em execução dessa deliberação, os arguidos dirigiram-se ao veículo automóvel, da marca «Fiat», modelo «Punto», com a matrícula Nº-1, propriedade de DD, que se encontrava estacionado no Local-F, em Pias, e, utilizando o berbequim com que vinham munidos, fizeram quatro furos no respectivo depósito de combustível, após o que dele retiraram, fazendo sua...

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