Acórdão nº 06P185 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Março de 2006
Magistrado Responsável | JOÃO BERNARDO |
Data da Resolução | 08 de Março de 2006 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I - Os arguidos: AA e BB; Foram, juntamente com outros, condenados na ...º Vara Criminal de Lisboa.
O primeiro: Como co - autor de um crime de tráfico de droga p. e p. pelo n.º1 do art. 21.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22.1, com referência às Tabelas I - A e I - C anexas ao mesmo, na pena de sete anos de prisão; Como autor de um crime de detenção ilegal de arma de defesa, p. e p. pelo art. 6.º, n.º1 da Lei n.º 22/97, de 27.6, na pena de dez meses de prisão.
Em cúmulo jurídico foi ele condenado na pena única de: Sete anos e seis meses de prisão.
O segundo: Como co-autor de um crime de tráfico de droga p. e p. pelo n.º1 do art. 21.º do Decreto-Lei n.º15/93, de 22.1, por referência às Tabelas I - A e I - B anexas ao mesmo, na pena de sete anos de prisão; Como co-autor de um crime de detenção ilegal de arma de defesa p. e p. pelo art. 6.º, n.º1, da Lei n.º 22/97, de 27.6, na pena de um ano de prisão.
Em cúmulo jurídico foi ele condenado na pena única de: Sete anos e seis meses de prisão.
II - Interpuseram recurso e o Tribunal da Relação de Lisboa: Concedeu parcial provimento ao recurso interposto pelo arguido AA, alterando a pena parcelar que lhe foi aplicada por tráfico de droga, para seis anos de prisão e a pena única que passou a ser de: Seis anos e seis meses de prisão; Negou provimento ao recurso do arguido BB.
III - Quer um quer outro recorrem agora para este Supremo Tribunal.
Vejamos primeiro o recurso do AA.
IV - Encerra ele a respectiva motivação com as seguintes conclusões: 1.- O tribunal recorrido não atendeu ao recurso no tocante à matéria de facto pelo que se requer o pronunciamento e decisão do mesmo quanto às diversas questões de facto suscitadas pelo recorrente nas alegações apresentadas, atendendo aos poderes de cognição do n.º 1 do Art. 428.° do Código de Processo Penal; 2.- O recorrente não se conforma com o tipo de crime a que foi condenado o recorrente, nem com a concreta medida da pena concretamente aplicada. O recorrente deve ser condenado pelo crime de consumo de estupefacientes, previsto e punido pelo art. 40. ° do Dec.-Lei n.º 15/93, de 22/01, mais consentâneo com os factos dados como provados; 3. - O recorrente não concorda com a condenação pelo crime de detenção de arma ilegal de defesa, devendo quanto a esta condenação ser absolvido porque a matéria de facto considerada como provada é insuficiente para provar a titularidade da mesma; 4.- O recorrente requer o vício de nulidade da matéria provada que fundou a decisão e condenação do arguido pelo o crime de tráfico de estupefacientes com base nos artigos conjugados do n.º 3 do Art. 345.°, da alínea b) do n.º 1 do Art. 356.° e 357.°, todos do Código de Processo Penal; 5.- Quanto á escolha da concreta medida da pena, como critério deve ser observado o disposto nos Artigos 70.° e 71.º do Código Penal em vigor, o que não sucedeu com o tribunal recorrido, que não atendeu ao critério da escolha da pena, mais favorável ao recorrente, dando o legislador preferência a penas não privativas da liberdade, se com isso se encontrarem garantidas as funções da punição. O recorrente entende que uma pena não privativa de liberdade em função do entendimento do crime de consumo de estupefacientes é suficiente.
6.- Não foi entendido pelo tribunal recorrido de forma a se fazer a devida justiça, em sede de determinação da concreta medida da pena, atendendo á culpa do recorrente e às exigências de prevenção geral e de ressocialização do mesmo.
7.- Não é entendimento do recorrente, no caso sub júdice, que a aplicação de uma pena privativa de liberdade, atenda às exigências de prevenção, nos sentido em que esta é interpretada pela jurisprudência e pela doutrina correntes e 8.- Nem a ausência de antecedentes criminais, como atenuante e factor de redução da pena foi levada em linha de conta pelo tribunal recorrido, como se encontra previsto na alínea e) do n.º 2 do Art. 71.° do Código Penal, no sentido da ponderação da pena privativa de liberdade, concretamente aplicada ao recorrente.
Contra-motivou a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta, junto do Tribunal da Relação de Lisboa, tendo concluído nos seguintes termos: 1. É manifesto que o Tribunal da Relação delimitou correctamente o âmbito do recurso em matéria de facto, e que a restrição do conhecimento do recurso aos vícios do n°2 do art. 410 e à matéria de direito é consequência da inobservância pelo arguido, do ónus de impugnação especificada previsto nos n°.s 3 a), b), c) e 4 do CPP. Como tal, esta Relação não tinha condições para o mais amplo e efectivo conhecimento da matéria de facto, contrariamente ao que se invoca.
2. Verifica-se a contradição exigida pelo art. 357 n°1 b) do CPP quando em Audiência o arguido afirma que à data da busca já não residia com a co-arguida CC, quando no primeiro interrogatório judicial admitiu que esta última era a sua companheira, e que a ajudava a preparar as coisas (embalagem da droga) em casa. Logo, é evidente que está verificado o condicionalismo previsto nos art.ºs 356 n°3 b) e 357 n°1 b) do CPP, que permite a leitura do interrogatório em audiência e a sua valoração probatória. 3. É manifesto que os factos provados e definitivamente fixados integram o núcleo fundamental da previsão do art. 21 n°1 do DL 15/93 de 22 de Janeiro sendo que não tem cabimento a invocada relevância exclusiva, para a condenação do recorrente pelo crime de consumo de droga.
4.Não se verifica nenhum dos erros invocados quanto à determinação da medida concreta das penas parcelares e da pena única aplicada, uma vez que se mostram respeitados os limites concretos da culpa, resultantes da ilicitude material dos factos comprovados, e respeitados os fins das penas; 5.Contudo relativamente à pena parcelar aplicada ao crime de detenção ilegal de arma de defesa p. p. pelo art. 6° n°1 da lei 22/97, de 27 de Junho, não é admissível recurso, atento o disposto na alínea f) do n°1 do art. 400 do CPP.
6.Não se coloca a questão da opção por uma pena não detentiva, como se pretende, dada a dimensão da pena única aplicada e o limite punitivo imposto no art. 50 n°1 do CP.
7. A diminuição da pena parcelar imposta pelo crime de tráfico de droga para 6 anos de prisão (em vez dos 7 anos) corresponde ao ajustamento possível da culpa revelada aos factos apurados, pelo que não comporta nova diminuição na sequência deste recurso.
8 Em consequência, o recurso afigura-se-nos manifestamente injustificado e inviável, pelo que será de rejeitar ao abrigo do disposto nos arts. 420 n°1 e 434 ambos do CPP..
V - Interessa, pois, tomar posição sobre se: É admissível recurso quanto à condenação pelo crime de detenção ilegal de arma de defesa; O tribunal recorrido não atendeu ao recurso vindo da 1.ª instância, no tocante à matéria de facto; Existe nulidade no que concerne à decisão sobre a matéria de facto provada; Deve ser condenado apenas pelo crime de consumo de estupefacientes; Deve manter-se a condenação pelo dito crime de detenção ilegal de arma de defesa; Em qualquer caso, a medida da pena encontrada é exagerada, sendo, nomeadamente, de evitar a pena de prisão efectiva.
VI - Vem provada a seguinte matéria de facto, com interesse para a apreciação do recurso deste arguido: 5 Mantivemos a numeração vinda do tribunal recorrido ( e já da primeira instância ), pelo que começamos pelo n.º5, o primeiro que contém matéria relevante para este recurso.
. Em 08-09-2003, cerca 10h15, os arguidos CC e o DD, companheiros um do outro, tinham consigo na residência onde moravam, sita na Rua ..., n.º 34, R/C Esq., em Lisboa: - Uma pistola de marca Victoria com o n.º de série ..., calibre 6,35 mm, com o respectivo carregador contendo uma munição do mesmo calibre, em condições de funcionamento, e sem que fossem titulares de licença de uso e porte de arma; - Dois moinhos com resíduos de heroína; - Dezanove embalagens de plástico com heroína com o peso liquido total de 50,998 gramas; - €4687,21 (quatro mi/ seiscentos e oitenta e sete euros e vinte e um cêntimos) divididos em vários maços agrupando notas de vinte, dez e cinco euros; - Uma balança modelo E68 com ecran digital destinada à pesagem de pequenas quantidades de estupefaciente, com resíduos de heroína; - Vários pedaços de haxixe, com o peso liquido total de 0,896 gramas; - Um saco de plástico com resíduos de heroína; - Três caixas de plástico, conhecidas como Tuperware, com resíduos de heroína; - Um coador com resíduos de heroína; - Um isqueiro com resíduos de heroína; - Vários sacos de plástico e papel de alumínio destinados a embalar doses individuais de produto estupefaciente,.
- Vários sacos de plástico com fecho hermético, normalmente usados para guardar moedas; - Quatro telemóveis de marca Alcatel, Samsung e Bosch, no valor global de €195,00; - Dezoito anéis em ouro; - Duas argolas em ouro; - Três fios em ouro; - Quatro pulseiras em ouro; - Um par de brincos em ouro; - Um alfinete para gravata em ouro, tudo no valor global estimado de €614,80; 6. A CC procedia à venda de rua, entregando também heroína ao arguido EE, que depois se encarregava de proceder à venda directa junto de consumidores que lho solicitassem; 7. Ao arguido DD cabia fundamentalmente, dentro de casa, dividir, misturar e embalar em sacos de plástico o produto estupefaciente; 8. Desde pelo menos Maio de 2003 até 08-09-2003, a arguida CC e o arguido AA não trabalharam e pagavam €700,00 mensais a titulo de renda de casa, sendo que todas as despesas que tinham eram suportadas com o dinheiro obtido na venda de droga; 59. Os arguidos tinham conhecimento dos factos acima descritos e, ainda assim, quiseram agir da forma mencionada, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei; 60. Pelo menos parte dos produtos...
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