Acórdão nº 06P113 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2006

Magistrado ResponsávelSILVA FLOR
Data da Resolução01 de Março de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I. No Tribunal Judicial da comarca de Alijó, em processo comum com intervenção do tribunal colectivo, foi julgado AA, sob a acusação de ter cometido um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelos artigos 131.º e 132.º, n.os 1 e 2, alínea d), do Código Penal, e um crime de detenção ilegal de arma, previsto e punido pelo artigo 6.º, n.º 1, da Lei n.º 22/97, de 27 de Junho.

Por acórdão de 21 de Abril de 2005, foi decidido: a) Julgar verificados os elementos típicos, de carácter objectivo, de um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelos artigos 131.º e 132.º, n.º1, ambos do Código Penal, e de um crime de detenção ilegal de arma, previsto e punido pelo artigo 6º, n.º1, da Lei nº22/97, de 27 de Junho, tendo os respectivos factos sido praticados pelo arguido AA; b) Declarar o arguido AA inimputável relativamente à prática de tais factos; c) Determinar o internamento do arguido AA em estabelecimento psiquiátrico adequado ao seu tratamento, por período não inferior a 3 (três) anos.

Os assistentes BB e CC, em representação de seus netos … e ..., recorreram dessa decisão para o Tribunal da Relação do Porto, alegando que o tribunal da 1.ª instância «incorreu em erro notório na apreciação da prova ou que, no mínimo, o conjunto da prova carreada para os autos e produzida em audiência é manifestamente insuficiente para a decisão da matéria de facto provada», mostrando-se violadas as disposições dos artigos 158.º, 323.º, alínea a), e 340.º, n.º 1, todos do Código Processo Penal.

Por acórdão de 19 de Outubro de 2005, a Relação do Porto, considerando que os assistentes não tinham legitimidade para recorrer, rejeitou o recurso, condenando os recorrentes no pagamento de 3 UCs, nos termos do artigo 420.º,n .º 4, do Código de Processo Penal.

De novo inconformados, os assistentes recorreram para este Supremo Tribunal, formulando na motivação do recurso as conclusões que em seguida se transcrevem: I. Como se lê na fundamentação do A.U.J. n.º 8/99 (in D.R., 1.ª Série-A, de 10/AGO/1999), "o processo penal não pode ser entendido como um corpo fechado em que as suas decisões não importem reflexos noutros campos do direito que não os estritamente penais (reflexos a manifestarem-se no próprio processo em curso, mas em matéria não penal, ou em processo de outra natureza)"; II. No caso em apreço nestes autos estamos justamente perante uma daquelas situações típicas em que a decisão proferida em sede processual penal tem inexoráveis reflexos em matéria não penal e/ou em processo de outra natureza (v. g., de direito sucessório e de direito dos menores e da família); III. Com efeito, os menores ofendidos, aqui representados pelos seus avós maternos, admitidos a intervir nos autos como assistentes, são filhos da vítima e do arguido e, por essa razão, têm manifesto e inequívoco interesse próprio e concreto em recorrer do decidido na l.ª instância, ainda que desacompanhados do M.° P.°; IV. É que a al. a) do art. 2034.° do CCiv. estabelece expressis verbis que carece de capacidade sucessória, por motivo de indignidade, o condenado como autor ou cúmplice de homicídio doloso, contra o autor da sucessão, devendo a declaração de indignidade ser obtida por via de acção, a fim de ser havida como inexistente a devolução da sucessão ao indigno, sendo ele considerado para todos os efeitos, possuidor de má fé dos respectivos bens (cfr. arts. 2036.° e 2037.° do CCiv.); V. Ora, a expressão "condenação por homicídio doloso", constante da cit. al. a) do art. 2.034.° do CCiv., não se confunde e muito menos é sinónimo do desfecho que os autos tiveram na 1.ª instância, que (além do mais) julgou "verificados os elementos típicos, de carácter objectivo, de um crime de homicídio qualificado (...), tendo os respectivos factos sido praticados pelo arguido", que foi aí julgado "inimputável relativamente à prática de tais factos" e sujeito à medida de segurança de "internamento (...) em estabelecimento adequado ao seu tratamento, por período não inferior a 3 (três) anos" VI. Por outro lado, a condenação por homicídio doloso terá ainda inegáveis reflexos no que concerne ao poder paternal, seja na vertente mais ampla da inibição do respectivo exercício por parte do arguido e pai dos menores, seja somente em termos de limitação desse mesmo exercício; VII. Donde resulta à evidência o interesse próprio e concreto dos menores, aqui representados pelos recorrentes, em ver também sindicado pela via do recurso se houve ou não um erro notório na apreciação...

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