Acórdão nº 04P1128 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Junho de 2004

Magistrado ResponsávelHENRIQUES GASPAR
Data da Resolução09 de Junho de 2004
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: 1. No processo nº 615/01.0TALSD,do Tribunal da Comarca de Lousada, foram julgados os arguidos AA, BB, CC e DD, tendo este sido condenado pela prática, como reincidente, de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, previsto e punível pelos arts. 21º, nº 1, e 24°, alínea. c), do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão.

Não se conformando com a decisão, os arguidos AA e DD, interpuseram recurso para o tribunal da Relação do Porto, que, todavia, negou provimento ao recurso interposto pelo arguido DD, mantendo, quanto a ele, a decisão recorrida.

  1. Novamente inconformado, o arguido DD interpõe recurso para o Supremo Tribunal, apresentando a respectiva motivação, que termina com as seguintes conclusões: 1ª- O acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto que contínua a decisão proferida pelo Tribunal de primeira instância e aplica uma pena de prisão de 7 anos e 6 meses é recorrível, nos termos do exposto no artigo 400°, n°, l, f), do Código de Processo Penal; 2ª- O acórdão recorrido enferma de um vício de contradição insanável da fundamentação (de acordo com o vertido no artigo 410º, n° 2, b), do Código de Processo Penal); 3ª- Uma vez que se deu como provado que o arguido tinha uma actividade profissional lícita (venda de flanelas), bem como todos os membros que compõem o seu agregado; e, 4ª- Que o montante de 15.425,00 € apreendidos provinha da venda de produtos estupefacientes realizada desde início de Setembro até 31 de Outubro de 2002; 5ª- Ora, se por um lado não parece razoável que o arguido, consumidor de heroína desde 1995, tenha aforrado 15.425,00€ através da venda de produtos estupefacientes em 60 dias, sem que se saiba a quantidade média diária, número de consumidores a quem vendeu e a diferença do preço da compra para o preço da venda, por outro lado, parece razoável que essa quantia ou, pelo menos boa parte dela, provenha do desempenho de actividades lícitas, desempenhados quer pelo arguido quer pelo membros do seu agregado familiar.

    1. - O Tribunal recorrido deu como provado que o arguido vendeu heroína, por várias vezes a diversos consumidores de tais produtos, como seja, EE.

    2. - Entende o recorrente que os Meritíssimos Juízes partiram do caso concreto para a generalização, raciocínio este que não é admissível em processo penal, nem encontra base probatória nas diligências externas realizadas pelos agentes da polícia.

    3. - Ou seja, apesar de constar do elenco da matéria de facto dada como provada, mais não é que uma conclusão, e como tal deve ser expurgada da matéria de facto dada como provada.

    4. - O tribunal recorrido ao condenar o arguido como reincidente, violou o disposto no artigo 75° do Código Penal, pois nada refere quanto às circunstâncias concretas que motivaram o arguido e que revelaram que este não teve em atenção as condenações anteriores.

    5. - Entende ainda o recorrente que a sentença recorrida violou o disposto no artigo 24°, c), do DL 15/93, de 22 de Janeiro, dado que a conduta pela qual o arguido merece censura penal não preenche o tráfico de estupefacientes na forma agravada; 11ª- Os factos dados como provados não são suficientes para preencher todos os elementos típicos objectivos do crime de tráfico de estupefacientes na forma agravada; 12ª- Para tal seria necessário que houvesse factos dados como provados que sustentassem a "avultada compensação monetária" que o arguido obteve ou visava obter com o tráfico de heroína; 13ª- Ora, nada se diz quanto a quantidades vendidas, número de consumidores a quem vendeu, preço dessas mesmas transacções e. valor das compras de heroína destinadas às aludidas vendas; 14ª- Com efeito, ao contrário do exposto no artigo 21° do dito diploma, neste caso não basta a simples detenção da heroína para que a conduta do arguido seja qualificada; 15ª- Nem basta o montante de 15.425,00€ apreendido; 16ª- Pois, quanto a este montante não sabe o recorrente se enquadra a dita avultada compensação pecuniária, conceito este que necessita preenchimento valorativo por parte do julgador; 17ª- Nem sabe se resulta do lucro de possíveis transacções de produtos estupefacientes.

    6. - Por outro lado, nada diz o acórdão se a heroína apreendida se destinava ou não, pelo menos em parte ao próprio consumo do arguido.

    7. - Razão pela qual se afirma que a medida concreta da pena de 7 anos e 6 meses de prisão ultrapassa em grande parte a culpa concreta do arguido, que, durante a audiência de julgamento foi classificado como um "desgraçado", que desde 1995 consome diária e assiduamente heroína.

    1. - Por fim, saliente-se que a vigência da norma ou normas violadas e o alarme social causado na sociedade não é colocado em causa se for aplicada uma pena de prisão mais leve ao arguido.

    2. - Razão pela qual se afirma que o acórdão recorrido violou o disposto nos artigo 71° do Código Penal.

    Pede, por isso, a revogação do acórdão recorrido,«com as legais consequências».

    O magistrado do Ministério Público, respondendo à motivação, considera, em conclusão, que não há qualquer contradição fundamentação, dado que o facto de o arguido vender trapos não é incompatível com a actividade de traficante estupefacientes; a condenação por tráfico, tráfico agravado foi correcta, dado que a matéria de facto dada como provada integra a alínea c) do artº 24º do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro; foi também correcta a condenação do arguido como reincidente, dado não ter sido sensível a admoestação contida em condenação anterior (em prisão), por delito idêntico; e que também foi correcta a medida da pena encontrada.

  2. Neste Supremo Tribunal, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta, teve a intervenção a que se refere o artigo 416º do Código de Processo Penal (CPP).

    Colhidos os vistos, teve lugar a audiência, com a produção de alegações, cumprindo apreciar e decidir.

    As instâncias consideraram provados, no que se refere ao recorrente, os seguintes factos: a) o arguido AA é irmão do arguido CC e é também conhecido pelas alcunhas de "Quarenta e cinco" e "FF "; b) por seu lado, o arguido DD é vulgarmente conhecido como "GG", sendo amigo e primo do AA; d) desde data não precisamente apurada, mas, pelo menos, a partir de Março de 2001, o arguido AA passou a adquirir por compra produtos estupefacientes, designadamente heroína, que depois levava para a sua residência, sita no lugar de Agra, Sousela, Lousada; e) desde data não precisamente apurada, mas, pelo menos, a partir de Setembro de 2002, o arguido DD passou a adquirir por compra produtos estupefacientes, designadamente heroína, que depois levava para a sua residência, sita no lugar de Agra, Sousela, Lousada, onde repartia o produto adquirido em porções mais pequenas, acondicionando-o em doses de, pelo menos, 0,5 e l gramas, as quais vendia a quem se mostrasse interessado, marcando encontro com os compradores através de telemóvel habitualmente num local descampado e deserto, onde se processava a permuta dos produtos estupefacientes contra a entrega das quantias monetárias exigidas; h) o arguido AA vendia, em regra, cada meia grama de heroína a 25 Euros e cada grama do mesmo produto a 50 Euros, enquanto que o arguido DD vendia, em regra, cada grama do mesmo produto estupefaciente a 70 Euros e cada meia grama a 35 Euros.

    i)...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT