Acórdão nº 016/06 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Maio de 2006

Magistrado ResponsávelBRANDÃO DE PINHO
Data da Resolução17 de Maio de 2006
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A Fazenda Pública vem recorrer da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A… contra acto de liquidação de emolumentos registrais, no montante de PTE 15.000.000$00 (€ 74.819,68), consequentemente o anulando e fazendo acrescer "juros indemnizatórios, contados desde a data do pagamento até à emissão da respectiva nota de crédito".

Fundamentou-se a decisão na admissibilidade do pedido de revisão oficiosa da liquidação, nos termos do artigo 78.º da Lei Geral Tributária, que, nos termos do seu artigo 3.º, tanto se aplica aos impostos como às taxas, sendo que o artigo 128.º do Decreto Regulamentar n.º 55/80, de 8 de Outubro apenas tem aplicação aos erros resultantes de averiguações à actuação dos funcionários, o que não está ora em causa; e a tabela aprovada pela Portaria n.º 996/98, de 25 de Novembro é ilegal por contrariar o art. 10.º, al. c) da Directiva n.º 69/335, na redacção da Directiva n.º 85/03, como é jurisprudência tanto comunitária como nacional, sendo devidos juros indemnizatórios contados desde a data do pagamento até à da emissão da respectiva nota de crédito já que o erro imputável aos serviços abarca o erro de direito.

A Fazenda recorrente formulou as seguintes conclusões: Dos Factos 1.ª A sociedade "A…" interpôs, em 10 de Janeiro de 2003, recurso contencioso de anulação do acto de indeferimento tácito do acto de revisão oficiosa recebido na Conservatória do Registo Comercial do Porto em 13 de Maio de 2002.

  1. Alicerçou o seu pedido na ilegalidade da liquidação de emolumentos, consubstanciada na desconformidade da Tabela de Emolumentos do Registo Comercial, com o disposto no artigo 10.°, alínea c) da Directiva n.° 69/335/CEE, do Conselho, de 17 de Julho, bem como na ilegalidade do indeferimento do pedido de revisão oficiosa.

  2. Os emolumentos objecto do presente litígio, respeitantes ao registo de aumento de capital e alteração do contrato, foram cobrados pela Conservatória do Registo Comercial do Porto, em 31 de Julho de 2001 (Ap. 21), e resultam da aplicação do artigo 1.°, n.°s 2 e 3 da Tabela de Emolumentos do Registo Comercial, aprovada pela Portaria 996/98, de 25 de Novembro, com a aplicação do limite máximo de emolumentos fixado para cada acto de registo, previsto na alínea c) do artigo 23.° da mesma tabela.

  3. Por despacho de 27 de Fevereiro de 2003, do Exmo. Director-Geral dos Registos e do Notariado, aquele pedido de revisão oficiosa foi rejeitado por extemporaneidade na sua apresentação.

  4. Pelo que, foi requerida pela ora impugnante, em 24 de Março de 2003, a ampliação do objecto de recurso.

  5. Por decisão judicial de 28 de Novembro de 2003, transitada em julgado, foi o recurso contencioso convolado em impugnação judicial e admitido o pedido de ampliação do objecto de recurso.

  6. A douta sentença recorrida julgou o pedido procedente anulando a liquidação de emolumentos impugnada, com fundamento na violação do citado normativo comunitário e na aplicabilidade do artigo 78.° ao caso sub judice, e condenou a Administração na restituição da quantia paga acrescida de juros indemnizatórios desde a data do seu pagamento até à emissão da respectiva nota de crédito.

    Dos Fundamentos 8.ª Ora, a anulação judicial de um acto de liquidação de emolumentos com fundamento na sua ilegalidade, para além do prazo previsto na alínea a) do n.° 1 do artigo 102.°do C.P.P.T., depende da verificação in casu dos pressupostos de aplicação do artigo 78.°, n.° l da LGT, na parte em que prevê a revisão oficiosa de actos tributários com fundamento em «erro imputável aos serviços».

  7. Para se colocar em causa os actos de liquidação, correm os prazos constantes na alínea a) do n.° 1 do artigo 102.°do C.P.P.T., ou seja, 90 dias contados a partir do termo do prazo para pagamento voluntário dos emolumentos.

  8. Pois, se o que a autora pretende é impugnar o acto de liquidação, então os únicos meios serão a reclamação graciosa ou a impugnação judicial dos actos de liquidação. E tais procedimentos deveriam ter sido desencadeados em tempo útil, tendo em consideração o efeito directo da referida Directiva.

  9. De facto, de acordo com o artigo 102.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário, a impugnação deveria ter sido apresentada no prazo de 90 dias contados a partir do termo do prazo de pagamento dos emolumentos em causa.

  10. Por seu turno o artigo 70.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário dispõe que "a reclamação graciosa pode ser deduzida com os mesmos fundamentos previstos para a impugnação judicial e será apresentada no prazo fixado no n.° 1 do artigo 102.º".

  11. Ora o prazo de 90 dias previsto no n.° 1 do artigo 102.° do CPPT não ofende o direito comunitário. De facto, o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias por acórdão proferido em 17 de Junho de 2004, no processo C-30/02 (Recheio... vs Fazenda Pública/Registo Nacional de Pessoas Colectivas), e que se junta como doc. n.° 1, relativamente às questões prejudicais submetidas pelo Tribunal Tributário de 1a Instância de Lisboa, decidiu que: 14.ª «O principio da efectividade do direito comunitário não se opõe à fixação de um prazo de caducidade de 90 dias para apresentação do pedido de reembolso de um imposto cobrado em violação do direito comunitário, contados a partir do termo do prazo de pagamento voluntário do referido imposto.» 15.ª Liminarmente, deverá referir-se que o artigo 78.° da Lei Geral Tributária, distingue claramente entre a revisão dos actos tributários pela entidade que os praticou desencadeada por iniciativa do contribuinte ou por iniciativa da Administração Tributária.

  12. O legislador foi coerente a este respeito: o pedido de revisão dos actos tributários por iniciativa do contribuinte previsto na primeira parte do n.° 1 do artigo 78.° da LGT não é mais do que uma reclamação graciosa (apesar da LGT a denominar como reclamação administrativa), pelo que o seu prazo é coincidente com o desta, bem como os fundamentos:"(...) qualquer ilegalidade".

  13. Em termos de harmonia sistemática, o procedimento encontra-se bem construído. O contribuinte pode alegar qualquer ilegalidade verificada no procedimento no prazo normal de reclamação. Tal é totalmente conforme com o regime de anulabilidade do acto, que impede que a liquidação em causa possa ser impugnada a todo o tempo, mas apenas no prazo previsto no n.° 1 do artigo 102.° do CPPT: 90 dias a contar da data do pagamento das liquidações impugnadas (cfr., por exemplo, Acórdão do STA de 20 de Março de 2002, referente ao processo n.° 026774).

  14. Esse é um corolário do princípio da segurança jurídica, corporizado na estabilidade dos actos de liquidação de tributos, pois, a possibilidade de utilização do regime da revisão oficiosa do acto tributário como meio de impugnação indirecta de actos de liquidação já há muito estabilizados tem como consequência a total supressão dos prazos de impugnação e reclamação para todos os actos da Administração praticados em violação de lei, mormente naqueles casos em que o tributo não tenha sido pago, em que a revisão se pode fazer a todo o tempo.

  15. Por seu lado, de acordo com a segunda parte do n.° 1 do artigo 78.°, a Administração Tributária, pode iniciar um procedimento de revisão oficiosa com fundamento em erro imputável ao serviço.

  16. O procedimento de revisão oficiosa de iniciativa da administração, mesmo entendendo-se que o particular o pode desencadear, não pode englobar juízos de legalidade ou ilegalidade da liquidação, limitando-se a Administração à apreciação e eventual correcção de erros materiais.

  17. De facto, uma análise atenta da natureza jurídica do acto de revisão revela a sua natureza de acto administrativo secundário do tipo rectificativo, enquanto subespécie dos actos modificativos, tendencialmente semelhante ao dispositivo normativo que consta do artigo 148.° do Código do Procedimento Administrativo (CPA) nos termos do qual englobam-se na rectificação dos actos administrativos «os erros de cálculo e os erros materiais na expressão da vontade do órgão administrativo, quando «manifestos», os quais «podem ser rectificados, a todo o tempo, pelos órgãos competentes para a revogação do acto».

  18. Qualquer outro entendimento que se possa avançar é desequilibrado em sede de harmonia do sistema e um alargamento dos casos de aplicação do artigo 78.° da L.G.T. às situações de erro de direito não só é totalmente contrário ao espírito da lei, como redundaria em total insegurança jurídica. Note-se que o erro de direito não integra - nem poderia integrar - o elenco das causas de rectificação dos actos administrativos previstas no artigo 148.° do CPA e rectius no artigo 78.° da LGT.

  19. Veja-se os termos restritos com que os n.°s 3 e 4 do artigo 78.°, estabelecem a intervenção do dirigente máximo do serviço na revisão da matéria tributável - erro muito manifesto e de correcção muito mais simplificada e justificada, que o erro alegado no caso sub judice. Neste caso, o dirigente máximo pode autorizar no prazo de 3 anos, excepcionalmente, a revisão, com fundamento em injustiça grave e notória. Não satisfeito com os termos restritos previstos no n.° 3 o legislador sentiu a necessidade de restringir ainda mais os termos enquadrantes da decisão definindo que " [...] apenas se considera notória, a injustiça ostensiva e inequívoca, e grave, a resultante de tributação manifestamente exagerada e desproporcionada com...

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