Acórdão nº 0817/05 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Novembro de 2005

Magistrado ResponsávelRUI BOTELHO
Data da Resolução23 de Novembro de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I Relatório A…, com melhor identificação nos autos, vem recorrer da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Círculo de Lisboa (TAF), de 4.3.05, que negou provimento ao recurso contencioso que interpôs da deliberação da Câmara Municipal de Cascais, de 21.10.02, que lhe indeferiu um pedido de alteração de um projecto de licenciamento e do respectivo alvará de loteamento.

Terminou a sua alegação formulando as seguintes conclusões: 1.º O pedido de alteração ao alvará de loteamento n° 5/69 formulado pela recorrente, em 2001.10.04, foi tacitamente deferido em 2002.01.25, ex vi do disposto nos arts. 23° /1 /a) e 111° /c) do DL 555/99, de 16 de Dezembro, na redacção que lhe foi dada pelo DL 177/2001, de 4 de Junho, pois a entidade recorrida não se pronunciou sobre a pretensão da recorrente, no prazo legalmente fixado (v. art. 108° do CPA) - cfr. texto nºs. 1 e 2; 2.º O recurso à intimação judicial por parte do interessado, maxime da ora recorrente, consubstancia uma mera faculdade, que não foi exercida in casu, uma vez que a entidade recorrida praticou o acto sub judice, revogando implicitamente o acto silente anterior, antes que a recorrente pudesse fazer uso daquela faculdade, de forma legal e tempestiva (v. art. 138° e segs. do CPA e arts. 6°/1 e 90°/1/a) da LPTA, ex vi do disposto no art. 112°/7 do DL 555/99; cfr. art. 28°/1 da LPTA) - cfr. texto nºs. 3 e 4; 3°. Da deliberação sub judice não resulta a voluntariedade da revogação da aprovação tácita da pretensão em causa, pelo que, faltando um dos elementos essenciais do acto em análise, este é nulo (v. art. 133°/1 do CPA) - cfr. texto nºs. 5 a 7; 4°. A deliberação impugnada revogou ilegal e intempestivamente anterior acto constitutivo de direitos, tendo assim violado frontalmente o disposto nos arts. 133° e 138° e segs. do CPA - cfr. texto nºs. 8 a 11; 5°. A douta sentença recorrida violou frontalmente o disposto no art. 266° da CRP e nos arts. 11° e 24° do DL 555/99, de 16 Dezembro, pois os fundamentos invocados na deliberação sub judice e pacificamente seguidos na sentença, não integram a previsão de nenhuma das alíneas deste normativo legal, que contém uma enumeração taxativa - cfr. texto nºs. 12 a 15; 6°. O PDM de Cascais, ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros n°. 96/1997, de 19 de Junho, é manifestamente ilegal, na medida em que não respeitou os direitos e interesses legítimos da ora recorrente, sendo certo que o licenciamento em apreço nunca violaria qualquer disposição daquele instrumento de gestão territorial (v. arts. 2°, 9°/b), 115° e 266° da CRP, art. 4° do CPA e art. 5°/1/e) do DL 69/90; cfr. art. 74°/3 do DL 380/99, de 22 de Setembro) - cfr. texto nºs. 16 a 18; 7°. A deliberação sub judice, ao indeferir a pretensão da ora recorrente, negou e restringiu direitos e decidiu em contrário da pretensão formulada pela interessada, tendo revogado anteriores actos constitutivos de direitos, pelo que tinha necessariamente de ser fundamentada de facto e de direito, ex vi do disposto nos arts. 268°/3 da CRP e 124° e 125° do CPA - cfr. texto nº. 19; 8°. A deliberação recorrida não contém quaisquer razões de facto e de direito do indeferimento da pretensão da recorrente e da revogação de anteriores actos constitutivos de direitos, não indicando nem concretizando a aplicação de quaisquer normas eficazes e aplicáveis in casu, nem remetendo de forma válida e eficaz para quaisquer pareceres que pudessem fundamentar a decisão tomada - cfr. texto nº. 20; 9°. No caso em análise, são totalmente irrelevantes os motivos invocados na contestação, pois a nossa lei não admite qualquer fundamentação a posteriori - cfr. texto nº. 21; 10°. A deliberação sub judice enferma de manifesta falta de fundamentação, ou, pelo menos, esta é insuficiente, obscura e incongruente, tendo violado o disposto nos arts. 268°/3 da CRP e 124° e 125° do CPA - cfr. texto nº. 22; 11°. O acto administrativo impugnado ofendeu abertamente o conteúdo essencial do direito fundamental de propriedade privada da ora recorrente, consagrado nos arts. 61° e 62° da CRP, pois revogou anterior acto constitutivo de direitos e indeferiu a sua pretensão sem se basear ou invocar normativos válidos e eficazes, criando assim restrições ao referido direito, mediante simples acto administrativo, pelo que a sua nulidade é inquestionável (v. art. 133°/2/d) do CPA) - cfr. texto nºs. 23 e 24; 12°. O acto administrativo impugnado violou os princípios da igualdade, justiça, boa-fé, confiança e respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos da ora recorrente, pois, perante o deferimento tácito da sua pretensão, impunha-se a respectiva aprovação pela CMC - cfr. texto nºs. 25 a 28; 13º. A douta sentença recorrida, ao negar provimento ao recurso contencioso, violou o disposto, além do mais, nos arts. 11º, 23º, 24º, 111º, 112º e 555/99 de 16 de Dezembro, os arts. 4º, 124º, 125º, 108°, 133°, 138° do CPA, art. 6°, 28° e 90° da LPTA e 115°, 266°, 268º da CRP.

A autoridade recorrida concluiu assim a sua contra-alegação: A. O acto impugnado é um acto de indeferimento de um pedido de alteração do alvará de loteamento.

  1. Não existe, ao contrário do que entende a Recorrente, qualquer acto tácito de deferimento da pretensão por si formulada.

  2. E, a ser assim, o acto impugnado não veio revogar qualquer acto tácito de deferimento com natureza de acto constitutivo de direitos.

  3. E isto porque o pedido de alteração de um alvará de loteamento obedece ao procedimento de licenciamento, nos termos do artigo 27 n.º 4 do Decreto-lei n.º 555/99.

  4. E, tendo sido ultrapassado o prazo legal para a prática do acto, cumpre ter em consideração o artigo 111° do Decreto-lei n.º 555/99.

  5. De acordo com o artigo 111 al. a) do diploma acima citado, o silêncio da administração após o decurso do prazo para a prática do acto não tem qualquer valor, quando o acto em questão devesse ser praticado no âmbito do procedimento de licenciamento.

  6. Assim, não obstante o acto impugnado ter sido praticado após o decurso do prazo para o efeito, não existe qualquer acto anterior de deferimento tácito da pretensão da ora Recorrente.

  7. Com efeito, o artigo 111° al. a) do citado diploma legal, apenas permite ao interessado intimar judicialmente a Administração para a prática do acto devido, seja ele de deferimento ou indeferimento.

    I. Ou seja, o silêncio da Administração após o decurso do prazo para a prática do acto em questão, não tem qualquer valor.

  8. O interessado apenas pode presumir o deferimento tácito da sua pretensão, após o decurso do prazo fixado pelo Tribunal, sem que o acto devido se mostre praticado, em sede de intimação judicial, nos termos do artigo 112° do Decreto-lei n.º 555/99.

  9. No presente caso, não houve qualquer intimação judicial e o acto impugnado foi praticado após o decurso do prazo fixado no Decreto-lei n.º 555/99.

    L.

    Assim, nem o acto impugnado nem a sentença recorrida vieram revogar qualquer acto de deferimento tácito constitutivo de direitos, improcedendo tudo o quanto alegado pela Recorrente nesta matéria.

  10. Da mesma forma, improcede tudo o quanto alegado sobre a "falta de voluntariedade da revogação do deferimento tácito e do acto silente", uma vez que não houve qualquer revogação no presente processo.

  11. Face ao acima exposto, improcede igualmente tudo o quanto exposto sobre a violação dos artigos 123.º n.º 1 al. e), 133.º,138.º,140° e 141° do CPA.

  12. O acto de indeferimento não resultou de uma deficiência ou omissão de instrução, passível de ser suprida ou sanável, inexistindo, assim, por parte do acto impugnado ou da sentença recorrida qualquer violação do artigo 11.º n.º 4 e 5 do Decreto-lei n.º 555/99.

  13. Entende ainda a Recorrente que a sentença recorrida, na esteira do acto impugnado, viola o artigo 266° da CRP e o artigo 24° do Decreto-lei 555/99, pois os fundamentos invocados não integram a previsão normativa deste normativo legal.

  14. Ora, tal argumentação é manifestamente improcedente porque o fundamento para o acto impugnado é justamente a violação do PDM de Cascais, violação essa contemplada no artigo 24° a) do Decreto-lei n.º 555/99.

  15. Por outro lado, vem a Recorrente argumentar que o PDM de Cascais é ilegal uma vez que "os planos municipais de ordenamento de território devem sempre respeitar e salvaguardar as situações constituídas e os direitos adquiridos antes da sua elaboração, não os podendo pôr em...

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