Acórdão nº 0923/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Maio de 2005

Magistrado ResponsávelJORGE DE SOUSA
Data da Resolução17 de Maio de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1 - A..., interpôs neste Supremo Tribunal Administrativo o presente recurso contencioso do despacho proferido pelo Secretário de Estado do Ensino Superior de indeferimento de autorização de funcionamento dos cursos de mestrado em Economia, em Sociologia - Sociedade, Modernidade e Mudança, em Matemática, em Gerontologia e em Direito (Despacho nº. 7140/2002, de 8-3-2002, publicado no Diário da República, 2.ª Série, de 10-4-2002), imputando-lhe vícios de falta de fundamentação, falta de audiência do interessado e violação de lei.

Por acórdão da 3.ª Subsecção, de 2-3-2003, foi concedido provimento ao recurso contencioso e anulado o acto recorrido por vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de direito, designadamente errada interpretação do disposto nos arts. 14.º, 28.º e 39.º, n.ºs 1 e 3, do Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo e 8.º do Decreto-Lei n.º 216/92.

Interposto recurso jurisdicional para o Pleno da Secção, foi-lhe concedido provimento, revogado o acórdão recorrido e ordenada a baixa do processo à Subsecção para conhecer dos vícios não apreciados.

2 - A Recorrente apresentou alegações com as seguintes conclusões: A - O despacho recorrido ignorou, como não devia, matéria de facto essencial, sobre que não questionou ou ouviu a recorrente, posto ter concluído, erradamente, que não era cumprida a regra legal da docência mínima por doutores em cada um dos cursos de licenciatura base dos cursos de mestrado.

B - Foi cometida, portanto, a nulidade da falta de audição prévia, que inquinou o processo decisório e, naturalmente, o acto recorrido.

C - Em todo o caso, o despacho recorrido compreende fundamentação diversa e contrária daquela que foi notificada à Recorrente nos termos do artigo 100º. do C. P. A.

D - Na prática, houve omissão de formalidade essencial por falta de audiência do interessado, pois a matéria relevante para a decisão foi outra que não a determinante no projecto de decisão.

E - Em matéria de direito, em sentido estrito, o despacho aqui recorrido é, designadamente, ilegal por violação dos arts. 14.º, 28.º e 39.º do Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo (EESPC) e do art. 8.º do Decreto-Lei 216/92 de 13 de Outubro.

F - Quanto ao EESPC, por considerar aplicáveis aos cursos de mestrado os seus artigos 14.º e 28.º, os quais apenas regulam cursos de licenciatura; quanto ao Decreto-lei 216/92, por remissão do art. 39º/2 do EESPC, por assumir uma interpretação que diferencia os estabelecimento de ensino estatais dos não estatais, quando a Lei estabelece um único regime jurídico para os mestrados, independentemente da instituição que os ministra.

G - A decisão apresenta vícios na fundamentação, a saber: a) é obscura quando confunde o preenchimento de requisitos quanto ao corpo docente nos mestrados com os do corpo docente nas licenciaturas que lhes servem de base (e esses também estão preenchidos); b) é insuficiente quando não especifica qual ou quais os requisitos que deveriam estar preenchidos e não estão, isto é, qual a cadeira em que falta um docente habilitado com o grau de doutor ou qual o doutor que deveria estar, e não está, em tempo integral; c) é absolutamente contraditória quando colide com as portarias que aprovaram os cursos de Economia (Portaria n.º 54/93, de 13 de Janeiro) com Reestruturação (Portaria n.º 28/99 de 18 de Janeiro); Sociologia (Portaria n.º 118/95 de 3 de Fevereiro) com Reestruturação (Portaria n.º 1120/2000 de 28 de Novembro); Matemática (Portaria n.º 1124/91 de 29 de Outubro) com Reestruturação (Portaria n.º 1213/97 de 29 de Novembro); Psicologia (Portaria n.º 878/93 de 15 de Setembro) com Reestruturação (Portaria n.º 1066/97 de 21 de Out.) e Direito (Portaria n.º 1155/97 de 12 de Novembro), que asseguram o preenchimento dos requisitos essenciais previstos no E. E. S. P. C. o qual em momento nenhum foi infirmado, pois, se alguma irregularidade houvesse nessas licenciaturas, os serviços de Inspecção do Ensino Superior já teriam notificado a recorrente para corrigir as deficiências sob pena de encerramento dos cursos.

H - Pelo exposto em A, E, F e G, supra, o acto não está fundamentado, sendo, portanto, nulo, nos termos dos arts. 124º/1/a e 133º/2/d C. P. A., na vertente interpretativa subjectivo-garantística que permite subsumir à categoria de direito fundamental o princípio enunciado pelo artigo 268º/3, C. R. P.

H - Pelo exposto em C e D, supra, o acto é anulável nos termos do art. 135º. C. P. A., por não ser cominada sanção mais grave, não se admitindo, aqui, um aproveitamento do acto administrativo, por não procederem as razões justificativas, nem por analogia nem por extensão, da regra do art. 103º. C. P. A.

I - O acto faz aplicação de normas inconstitucionais, ou, ao menos, cuja interpretação é desconforme à Constituição, pois a concretização do programa dos art. 75º/2 e 76º., C. R. P. (direitos e deveres culturais), interpretados em conformidade com o art. 43º/1/4 (direitos, liberdades e garantias), C. R. P., sob o impulso de extensão do art. 17º., C. R. P., torna iniludivelmente sancionável a cominação do art. 133º/2/d, CPA, por não existir qualquer poder discricionário, por parte do órgão executivo competente, na decisão de aceitar ou recusar o reconhecimento: se os requisitos legais estiverem reunidos, reconhece; caso contrário, não reconhece.

J - Assim, e desde já prevenindo a eventualidade de recurso para o Tribunal Constitucional, se alega expressamente a inconstitucionalidade dos art. 14.º, 28.º e 39.º do EESPC, aprovado pelo D. L. 16/94, de 22.01, e do art. 8.º do D. L. 216/92, de 13.10, quando interpretados no sentido de restringirem a liberdade de aprender e ensinar e de criação de estabelecimentos particulares e cooperativos, concretizada no direito a obter os efectivos reconhecimento e fiscalização por parte do Estado, em regime de plena igualdade e democraticidade do sistema de ensino, no respeito pela sua autonomia estatutária, científica, pedagógica, administrativa e financeira, ordenada à qualidade do ensino, restrição intolerável enquanto contrária ao princípio da proporcionalidade a que deve obedecer quanto incide sobre direitos, liberdades e garantias ore direitos fundamentais de natureza análoga, tudo nos termos, e por ordem de raciocínio, dos art. 43º/1/4, 75º /2, 76º., 18º. e 17º., C. R. P.

L - Mas, considerando que, afinal, o acto administrativo impugnado teve apenas suporte em erro material, o reconhecimento deste será bastante para uma imediata reformulação, por parte da entidade recorrida, que ainda tem poderes para tanto e deve vénia ao princípio da celeridade.

Estas as razões que, assim se espera, conduzirão à anulação motu proprio, ou à anulação judicial, do acto administrativo ora impugnado, fazendo-se, por essa via, Justiça.

A Autoridade Recorrida contra-alegou, concluindo da seguinte forma: 1. Não houve preterição de qualquer formalidade essencial na prolação do acto recorrido, porquanto, a recorrente foi ouvida, em sede de audiência prévia, ao abrigo do artigo 100.º do CPA.

  1. O n.º 2 do artigo 59.º do EESPC constitui uma mera faculdade, e não uma formalidade essencial - como pretende fazer crer a entidade recorrente que assiste à entidade decisora, de solicitar esclarecimentos ou elementos adicionais.

  2. O preenchimento das listas, que serviram de suporte à decisão ora recorrida, é da exclusiva responsabilidade do estabelecimento de ensino superior.

  3. Uma vez notificada da intenção da Administração de indeferir os requerimentos apresentados, impendia sobre a entidade recorrente o ónus de carrear para o processo os elementos de prova quanto à existência de erro nas listas relativas ao corpo docente das licenciaturas em causa.

  4. A entidade recorrente não fez prova de que a matéria de facto se encontrava erradamente fixada.

  5. O Despacho n.º 7140, de 8 de Março de 2002, através do qual foi indeferido o pedido de autorização de funcionamento dos cursos de mestrado em Economia, Sociologia - Sociedade, Modernidade e Mudança, Matemática, Gerontologia e Direito, a ministrar na Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, foi proferido com fundamento na correcta avaliação dos pressupostos de facto e do quadro legal aplicável.

  6. O acto de indeferimento em causa teve por fundamento o facto de os cursos de Economia, Matemática, Sociologia, Direito e Psicologia, não possuírem um corpo docente consentâneo com o consignado nos artigos 14.º e 28.º do EESPC.

  7. Na realidade, a licenciatura de Economia apenas apresenta 1 doutorado em regime de tempo integral, quando deveria ter 4 doutorados, 2 dos quais naquele regime.

  8. Relativamente à licenciatura em Matemática deveria integrar 5 doutores, 3 dos quais em regime de tempo integral, no entanto, apresenta, nesse regime, somente um doutorado pertencente à área académica em causa.

  9. Também a licenciatura em Sociologia não cumpre os preceitos legais relativos ao corpo docente, porquanto, deveria integrar 4 doutores, a tempo integral, mas apenas apresenta, comprovadamente, um doutor nesse regime.

  10. O mesmo se passa em relação à licenciatura em Direito que, embora devesse integrar 5 doutores, dos quais três deveriam estar em regime de tempo integral, integra apenas dois doutores nessa situação.

  11. Finalmente, na licenciatura em Psicologia - licenciatura considerada adequada para servir de base ao mestrado requerido -, também não se encontra demonstrada a existência dos oito doutores em regime de tempo integral.

  12. No que respeita ao grau de mestre, preceitua o artigo 39.º do EESPC que os estabelecimentos de ensino superior podem requerer autorização para conceder o grau de mestre transcorridos que sejam 5 anos de funcionamento do curso a que dizem respeito, sendo aplicável à atribuição dos graus de mestre e doutor o regime previsto para os estabelecimentos de ensino superior público.

  13. Acresce que, para um estabelecimento de ensino ser autorizado a conceder o grau de...

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