Acórdão nº 0319/05 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Maio de 2005

Magistrado ResponsávelBRANDÃO DE PINHO
Data da Resolução11 de Maio de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do STA: Vem o presente recurso jurisdicional, interposto pela FAZENDA PÚBLICA, da sentença do TAF do Porto, que julgou «procedente por provada» a impugnação judicial deduzida por A..., anulando «a conta de emolumentos impugnada», «tendo a impugnante direito a juros indemnizatórios, nos termos do art. 43° da LGT».

Fundamentou-se a decisão na admissibilidade da revisão do tributo em causa, a qualificar de taxa, ainda que de um «género especial», que, todavia, contraria o direito comunitário - directiva 69/355/CEE, de 17/07/1969 - a qual «reúne os pressupostos necessários para que lhe seja reconhecido o chamado efeito directo» tendo, assim, «aplicação nos Estados-membros, independentemente de ser transposta para a legislação nacional pelo que é lícito aos particulares invocarem-na junto da respectiva jurisdição», sendo devidos «juros vencidos e vincendos desde a data do pagamento até integral restituição».

A Fazenda recorrente formulou as seguintes conclusões: "1.ª A sociedade "A..." interpôs, em 09 de Janeiro de 2003, recurso contencioso de anulação do acto de indeferimento do pedido de revisão oficiosa recebido na Conservatória do Registo Comercial do Porto em 13 de Maio de 2002.

  1. Alicerçou o seu pedido na ilegalidade da liquidação de emolumentos, consubstanciada na desconformidade da Tabela de Emolumentos do Registo Nacional de Pessoas Colectivas, com o disposto no artigo 100, alínea c) da Directiva n.° 69/335/CEE, do Conselho, de 17 de Julho, bem como na ilegalidade do indeferimento do pedido de revisão oficiosa.

  2. Os emolumentos objecto do presente litígio, respeitantes ao registo de aumento de capital, foram cobrados pela Conservatória do Registo Comercial do Porto (2.a Secção), em 03 de Abril de 2001 (Ap. 6), e resultam da aplicação do artigo 1, n.°s 2 e 3 da Tabela de Emolumentos do Registo Comercial, aprovada pela Portaria 996/98, de 25 de Novembro, com a redução prevista no artigo 59.° da Lei 30-C/2000, de 29 de Dezembro.

  3. Por despacho do Meritíssimo Juiz de Direito do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, Unidade Orgânica 1, datado de 22 de Abril de 2004, foi o recurso contencioso convolado em impugnação judicial.

  4. A douta sentença recorrida julgou o pedido procedente anulando a liquidação de emolumentos impugnada, com fundamento na violação do citado normativo comunitário, e condenou a Administração na restituição da quantia paga acrescida de juros indemnizatórios desde a data do seu pagamento até à emissão da respectiva nota de crédito.

  5. Ora, a anulação judicial de um acto de liquidação de emolumentos com fundamento na sua ilegalidade, para além do prazo previsto na alínea a) do n.° 1 do artigo 102° do CPPT, depende da verificação dos pressupostos de aplicação do artigo 78°, n.° 1 da LGT, na parte em que prevê a revisão oficiosa de actos tributários com fundamento em «erro imputável aos serviços».

  6. Para se colocar em causa os actos de liquidação, correm os prazos constantes na alínea a) do n.° 1 do artigo 102° do CPPT, ou seja, 90 dias contados a partir do termo do prazo para pagamento voluntário dos emolumentos em causa.

  7. Pois, se o que a autora pretende é impugnar o acto de liquidação, então os únicos meios serão a reclamação graciosa ou a impugnação judicial dos actos de liquidação. E tais procedimentos deveriam ter sido desencadeados em tempo útil, tendo em consideração o efeito directo da Directiva em causa.

  8. De facto, de acordo com o artigo 102° do Código de Procedimento e de Processo Tributário, a impugnação deveria ter sido apresentada no prazo de 90 dias contados a partir do termo do prazo de pagamento dos emolumentos em causa.

  9. Por seu turno o artigo 70° do Código de Procedimento e de Processo Tributário dispõe que "a reclamação graciosa pode ser deduzida com os mesmos fundamentos previstos para a impugnação judicial e será apresentada no prazo fixado no n.° 1 do artigo 102°".

  10. Ora o prazo de 90 dias previsto no n.° 1 do artigo 102.° do CPPT não ofende o direito comunitário. De facto, o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias por acórdão proferido em 17 de Junho de 2004, no processo C-30/02 (Recheio-Cash & Carry vs. Fazenda Pública/Registo Nacional de Pessoas Colectivas), e que se junta como doc. n.° 2, relativamente às questões prejudicais submetidas pelo Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa, decidiu que: 12.ª «O princípio da efectividade do direito comunitário não se opõe à fixação de um prazo de caducidade de 90 dias para apresentação do pedido de reembolso de um imposto cobrado em violação do direito comunitário, contados a partir do termo do prazo de pagamento voluntário do referido imposto.» 13.ª Liminarmente, deverá referir-se que o artigo 78.° da Lei Geral Tributária, distingue claramente entre a revisão dos actos tributários pela entidade que os praticou desencadeada por iniciativa do contribuinte ou por iniciativa da Administração Tributária.

  11. O legislador foi coerente a este respeito: o pedido de revisão dos actos tributários por iniciativa do contribuinte previsto na primeira parte do n.° 1 do artigo 78° da LGT não é mais do que uma reclamação graciosa (apesar da LGT a denominar como reclamação administrativa), pelo que o seu prazo é coincidente com o desta, bem como os fundamentos: "(...) qualquer ilegalidade".

  12. Em termos de harmonia sistemática, o procedimento encontra-se bem construído. O contribuinte pode alegar qualquer ilegalidade verificada no procedimento no prazo normal de reclamação. Tal é totalmente conforme com o regime de anulabilidade do acto, que impede que a liquidação em causa possa ser impugnada a todo o tempo, mas apenas no prazo previsto no n.° 1 do artigo 102.° do CPPT: 90 dias a contar da data do pagamento das liquidações impugnadas (cfr., por exemplo, Acórdão do STA de 20 de Março de 2002, referente ao processo n.° 026774) 16.ª Esse é um corolário do princípio da segurança jurídica, corporizado na estabilidade dos actos de liquidação de tributos, pois, a possibilidade de utilização do regime da revisão oficiosa do acto tributário como meio de impugnação indirecta de actos de liquidação já há muito estabilizados tem como consequência a total supressão dos prazos de impugnação e reclamação para todos os actos da Administração praticados em violação de lei, mormente naqueles casos em que o tributo não tenha sido pago, em que a revisão se pode fazer a todo o tempo.

  13. Por seu lado, de acordo com a segunda parte do n.° 1 do artigo 78.°, a Administração Tributária, pode iniciar um procedimento de revisão oficiosa com fundamento em erro imputável ao serviço.

  14. O procedimento de revisão oficiosa de iniciativa da administração, mesmo entendendo-se que o particular o pode desencadear, não pode englobar juízos de legalidade ou ilegalidade da liquidação, limitando-se a Administração à apreciação e eventual correcção de erros materiais.

    19.º De facto, uma análise atenta da natureza jurídica do acto de revisão revela a sua natureza de acto administrativo secundário do tipo rectificativo, enquanto subespécie dos actos modificativos, tendencialmente semelhante ao dispositivo normativo que consta do artigo 148° do Código do Procedimento Administrativo (CPA) nos termos do qual englobam-se na rectificação dos actos administrativos «os erros de cálculo e os erros materiais na expressão da vontade do órgão administrativo, quando manifestos», os quais «podem ser rectificados, a todo o tempo, pelos órgãos competentes para a revogação do acto».

  15. Qualquer outro entendimento que se possa avançar é desequilibrado em sede de harmonia do sistema e um alargamento dos casos...

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