Acórdão nº 01186/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Março de 2005
Magistrado Responsável | SÃO PEDRO |
Data da Resolução | 10 de Março de 2005 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório A A... identificada nos autos, recorreu do acórdão proferido na 1ª Subsecção deste Supremo Tribunal, que, nos autos de Acção Ordinária interposta contra o ESTADO PORTUGUÊS, absolveu o réu da instância, invocando a oposição dessa decisão com o Acórdão deste STA de 4 de Novembro de 1982.
Em síntese concluiu ambos os acórdãos decidiram de forma oposta a mesma questão fundamental de direito, na ausência de alteração substancial da regulamentação jurídica, uma vez que: - o acórdão recorrido e fundamento decidiram sobre a interpretação e aplicação dos artigos 15º e 16° da Lei 80/77, de 26 de Outubro, no que se refere à necessidade do valor da indemnização por expropriação ou nacionalização ser previamente determinado pela Administração, bem como do direito dos cidadãos recorrerem ao Tribunal, para defesa dos seus direitos e interesses protegidos; - as situações de facto subjacentes aos dois acórdãos são absolutamente coincidentes, tendo sido aplicados em ambos os casos as mesmas normas jurídicas.
- os referidos acórdãos consagram soluções opostas para a mesma questão jurídica fundamental, pois no acórdão recorrido considerou-se que "O Tribunal está sempre vedado a pronunciar-se sobre a questão da indemnização em primeira decisão" e, no acórdão fundamento, decidiu-se de acordo com a tese oposta que se assim fosse "seria a própria administração a julgar em causa própria e, não como estabelece a Constituição, os Tribunais".
Contra-alegou o Estado Português, considerando que não havia oposição, por não se verificar a mesma situação de facto.
Parta tanto refere que nos presentes autos: - a autora requereu em 10-3-95 ao Ministro da Agricultura "a fixação da indemnização definitiva pela expropriação e nacionalização dos prédios, nos termos do Dec. Lei 199/98, de 31 de Maio, com as alterações introduzidas pelo Dec. Lei 199/91, de 29 de Maio, e pelo Dec.Lei 38/95, de 14 de Fevereiro" e que "conforme consta do oficio do Gabinete do Ministro da Agricultura, junto a fls.
173, o processo relativo à fixação da indemnização definitiva - referente aos prédios da autora) está em fase de instrução), tendo o tribunal decidido que o procedimento administrativo prévio precede obrigatoriamente a intervenção do Tribunal e não pode ser dispensado nem correr em paralelo com o procedimento judicial; A acção onde foi proferido o acórdão fundamento foi intentada com vista ao ressarcimento dos prejuízos causados pela não entrega da cortiça armazenada à data da ocupação, a qual terá sido oportunamente reclamada, existindo divergência entre o valor que lhe é atribuído pela autora e a importância recebida no âmbito do processo administrativo competente. Tendo o Tribunal considerado que as disposições dos artigos 15º e 16° da Lei 80/77 colidem com as disposições constitucionais dos artigos 205° e 206° na medida em que aquelas confiam a fixação da indemnização à Administração que se não pode considerar desinteressada na composição dos interesses em causa.
Colhidos os vistos legais é o processo submetido a julgamento.
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1. Fundamentação 2.2. Matéria de facto Para julgamento da questão de saber se há oposição de acórdãos, consideram-se relevantes as seguintes factos e ocorrências processuais: a) nestes autos foi proferido o acórdão de 29 de Abril de 2004, que, na parte relativa à fundamentação, transcreveu o Acórdão de 24-3-04, nos seguintes termos: "(...) Na lição de Manuel Andrade (in "Noções Elementares de Processo Civil", ed. de 1976, p. 91) a competência do tribunal determina-se pelo pedido do autor, sem dependência da legitimidade das partes nem da procedência da acção.
"E ponto a resolver de acordo (...) com os termos da pretensão do autor (compreendidos aí os respectivos fundamentos), não importando averiguar quais deveriam ser as partes e os termos dessa pretensão".
Tal entendimento tem sido perfilhado, em múltiplos acórdãos (vide, por todos os acórdãos de 1990.10.18 - rec° n° 17 139-P, 1997.11.27- rec° n° 34 366 e de 2003.02.27 - rec° n° 285/03) deste Supremo Tribunal em jurisprudência que considera ainda que "o juízo a formular quanto à competência, terá de ser elaborado independentemente da idoneidade do meio processual utilizado" (acórdão de 1999.03.23 - rec° n° 43973).
Ora, na acção, as AA. deduziram uma pretensão indemnizatória que, nos termos supra indicados, se funda, num primeiro momento, em factos materiais e/ou omissão do comportamento devido das forças militares e de segurança pública e, num segundo tempo, em actos jurídicos expropriativos. Formula, portanto, um pedido de indemnização emergente de actos praticados pelos agentes e órgãos da Administração no exercício de uma função pública, sob o domínio de normas de direito público, isto é, de actos de gestão pública (cf., por todos, o acórdão STA de 2001.11.21 - rec° n°40153).
Assim, sem curar de saber quais deveriam ser os termos da sua pretensão e o meio processual a utilizar, a acção, de harmonia com o pedido e a causa de pedir, é para efectivação de responsabilidade civil extracontratual do Estado por actos de gestão pública e a competência para conhecer dela está atribuída ao tribunal administrativo de circulo - art. 51°, n° 1, al. h) do ETAF.
Não sufragamos, pois, a decisão recorrida, na parte em que declarou a incompetência absoluta do Tribunal, em razão da matéria.
2.2.3. Não obstante, como veremos de seguida, a decisão de absolvição da instância deve manter-se.
2.2.3.1. O ordenamento normativo da reforma agrária, no seu conjunto, conforme demonstrado pelo juiz a quo, institui um regime especial de indemnização aos titulares de direitos sobre bens ocupados, expropriados e/ou nacionalizados e mais tarde devolvidos.
Segundo o art. 1°, n° 1, do DL n° 199/88 de 31 de Maio, "o cálculo das indemnizações definitivas devidas pela nacionalização e expropriação de bens e direitos ao abrigo da legislação sobre a reforma agrária far-se-á de acordo com os critérios e normas do presente diploma e com observância das disposições da Lei n° 80/77, de 26 de Outubro" Nesse regime está prevista, com relevância, para a decisão do presente recurso, a atribuição de indemnização para compensar, desde a data da ocupação efectiva, a perda temporária do uso e fruição dos "prédios rústicos objecto de expropriação ou nacionalização ao abrigo da legislação sobre reforma agrária, neles se compreendendo todo o capital fundiário constituído por terra e plantações, melhoramentos fundiários e obras e construções" (arts. 1°, n° 3 da Lei n°80/77 e 2°, n° 1, al. a) e b), 3°, n°1, al. c) e 7º, n°2 do DL 199/88 de 31.5).
No art. 5°, n° 1 do DL n° 199/88, na redacção introduzida pelo DL n° 38/95 de 14.2, a lei esclarece que tal indemnização "corresponderá ao valor do rendimento líquido dos bens durante o período em que o seu titular tiver ficado privado do respectivo uso e fruição, tendo em...
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