Acórdão nº 0195/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Fevereiro de 2005

Magistrado ResponsávelJORGE DE SOUSA
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1 -A... interpôs o presente recurso contencioso do Despacho do Senhor SECRETÁRIO DA ESTADO ADJUNTO DO MINISTRO DA SAÚDE, de 22 de Outubro de 2002, que homologou as listas definitivas, elaboradas pelo Conselho Ético e Profissional de Odontologia, dos profissionais acreditados e não acreditados no âmbito do processo de regularização dos odontologistas, previsto na Lei n.º 4/99 de 27 de Janeiro, com a redacção da Lei n.º 16/2002 de 16 de Fevereiro.

O Recorrente apresentou alegações com as seguintes conclusões: l. O acto impugnado é inválido por incompetência do seu autor, devendo ser anulado nos termos do disposto no Art.º 135º do Código do Procedimento Administrativo, uma vez que não resulta de qualquer disposição da Lei n.º 4/99 de 27 de Janeiro a atribuição desse poder ao Senhor Ministro da Saúde não se encontrando abrangido por qualquer delegação, nem tal resulta da aplicação de princípios gerais relativos ao exercício da competência administrativa.

  1. O acto, objecto de recurso é inválido por ter procedido a uma restrição ilegal dos meios probatórios admitidos no procedimento administrativo, aflorado no n.º 1 do Art.º 87º do Código do Procedimento Administrativo e nos termos do qual os factos, que carecem de prova podem sê-la por recurso a todos os meios de prova admitidos em direito. Ora, o Conselho Ético e Profissional de Odontologia decidiu restringir o princípio geral do valor probatório no procedimento administrativo de todos os meios em direito admitidos sem habilitação legal e sobretudo através de formas insusceptíveis de derrogar disposições de valor legal.

    Nestes termos, o acto impugnado é inválido por violação directa do princípio da hierarquia dos actos normativos e, em particular, do n.º 6 do Art.º 112.º da Constituição devendo como tal ser declarado nulo.

  2. O despacho recorrido sempre seria inválido por violação de Lei, dado desrespeitar a directiva legal, relativa à descoberta da verdade material, subjacente ao principio do inquisitório, estabelecido no Art.º 56.º do Código do Procedimento Administrativo, devendo, consequentemente, ser anulado nos termos do Art.º 135.º do mesmo Diploma Legal.

  3. O acto contestado é também inválido, por violação de Lei, a que equivale a violação do princípio da proporcionalidade constante do n.º 2 do Art.º 266.º da nossa Lei Fundamental e no Art.º 5.º do Código do Procedimento Administrativo, uma vez que procede a uma restrição administrativa dos meios com valor probatório no procedimento de acreditação dos odontologistas, sem que exista qualquer racionalidade que a suporte evidenciando-se a sua desnecessidade desadequação e aleatoriedade.

  4. O acto «sub juditio» viola o princípio da igualdade, previsto no n.º 2 do Art.º 266.º da Constituição e no n.º 1 do Art.º 5.º do Código do Procedimento Administrativo, uma vez que o Conselho Ético e Profissional de Odontologia valorou como prova admissível em relação a determinados odontologistas, documentos (declarações) cujo valor probatório foi desconsiderado em relação ao recorrente. Deste modo, deve o acto em causa ser declarado nulo, nos termos da alínea d) do n.º 2 do Art.º 133.º do Código do Procedimento Administrativo.

  5. O acto impugnado é ainda inválido por erro sobre os pressupostos de facto, uma vez que o recorrente reúne todos os requisitos necessários para a acreditação como odontologista: antiguidade relevante e formação profissional. Deste modo, o acto administrativo em questão deve ser anulado de acordo com o disposto no Art.º 135º do Código do Procedimento Administrativo.

  6. Finalmente, o Art.º 2º da Lei n.º 4/99 de 27 de Janeiro, ao condicionar retroactivamente a liberdade de acesso à profissão de odontologista, conforme garantida pelo Art.º 47º da Constituição, viola a regra da retroactividade das restrições de direitos, liberdades e garantias, estabelecida no n.º 3 do Art.º 18º da nossa Lei Fundamental, bem como o princípio da confiança subjacente ao princípio do Estado de Direito Democrático. Consequentemente, o acto recorrido, enquanto acto administrativo de aplicação de disposições inconstitucionais, é um acto inválido, devendo ser declarado nulo.

    Termina pedindo que o presente recurso seja julgado procedente e, em consequência, seja declarado nulo ou anulado o acto impugnado pelas razões enunciadas nas conclusões acima elencadas.

    A Autoridade Recorrida contra-alegou, não apresentando conclusões, defendendo que o recurso não merece provimento.

    O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer nos seguintes termos: O recorrente A... neste recurso pretende a anulação do despacho do Senhor Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Saúde de 22/10/02 que homologou as listas definitivas elaboradas pelo Conselho Ético e Profissional de Odontologia acreditados e não acreditados no âmbito do processo de Regularização dos Odontologistas, determinado pela Lei n.º 4/94, de 27/1, com a redacção da Lei n.º 16/02, de 22/2.

    No decorrer da petição inicial o recorrente alega, em síntese, que o acto impugnado é ilegal por se verificarem os vícios de incompetência do autor do acto, restrição ilegal dos meios probatórios com violação de lei por quebra dos princípios da igualdade e da proporcionalidade.

    A meu ver o recorrente não tem razão.

    De acordo com a argumentação apresentada pela autoridade recorrida não se verifica qualquer dos vícios assacados ao acto.

    Em primeiro lugar, a autoridade recorrida é competente uma vez que houve despacho a delegar poderes (despacho 1237/02 de 9/5/02 alterado pelo despacho 1343/02, de 15/7).

    Por outro lado, o Conselho Ético e Profissional de Odontologia funciona na dependência do Ministério da Saúde (art. 4.º da Lei 4/95) cabendo ao Ministro a acreditação final dos odontologistas após a conclusão do processo feito pelo Conselho (art. 5.º da citada Lei).

    Deste modo, não ocorre, a meu ver o alegado vício de incompetência.

    Por outro lado, um dos requisitos para a inscrição na Ordem é a apresentação de documentos para fazer prova da actividade profissional.

    Tal imperativo decorre da Lei 4/95 que permite ao Conselho Ético a possibilidade de exigir determinados documentos julgados necessários à comprovação objectiva de tal prática.

    Esta competência, além de decorrer da lei consta de uma grelha de documentos exigíveis nos termos da acta VII das reuniões do Conselho, onde se indicam os motivos que determinaram a seleccionar esses meios de prova.

    Na ausência dessa documentação não é possível a inscrição na Ordem, devendo desse modo improceder o alegado vício de erro nos pressupostos de facto.

    Finalmente, também não ocorre, a nosso ver, qualquer violação dos princípios constitucionais, uma vez que foi preocupação da Administração obter a maior segurança na assistência à saúde, de modo a não existirem dúvidas sobre as habilitações académicas dos profissionais de saúde.

    Assim, face ao exposto, sou de parecer que deve ser negado provimento ao recurso.

    Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

    2 - Com base nos elementos que constam do processo e do processo instrutor apenso, consideram-se provados os seguintes factos: O Recorrente exerce a profissão de odontologista; Por aviso publicado no Diário da República, II Série, de 9-8-2000, foi aberto o processo de acreditação profissional dos profissionais abrangidos pela Lei n.º 4/99, de 27 de Janeiro, com a redacção da Lei n.º 16/2002 de 22 de Fevereiro; O Recorrente apresentou a sua candidatura à acreditação como odontologista, instruindo-a, além do mais, com os documentos cujas cópias constam de fls. 57, 124, 130 e 131, cujo teor se dá como reproduzido, que consistem - numa declaração, emitida pela Senhora Delegada de Saúde de Almada, não datada, em que se afirma que o Recorrente exerce a actividade de Odontologista desde 1978, no concelho de Almada; - duas declarações emitidas por um médico (indicado pela Associação Dentária Portuguesa como sendo pai do Recorrente), uma datada de 1-2-1988 e outra de 23-1-90, em que é afirmado que o ora Recorrente apoiava e praticava a arte dentária há cerca de 10 anos e que exercia a actividade de odontologista desde 1978, respectivamente; - um atestado emitido pela Junta de Freguesia do Laranjeiro, em que se refere, além do mais, que o ora Recorrente exerce a actividade de profissional de odontologista desde o ano de 1978; - 15 diplomas emitidos pela Faculdade de Odontologia de Piracicaba - Brasil, relativos a frequência de cursos; Em reunião realizada em 24-11-2000 (a que se reporta a acta que consta de fls. 51, cujo teor se dá como reproduzido) o Conselho Ético e Profissional de Odontologia aprovou a metodologia da apreciação dos processos de candidatura ao processo de acreditação e regularização dos odontologistas, definindo a seguinte grelha (que consta de fls. 52 e 53): Metodologia da apreciação dos processos de acreditação dos odontologistas ao abrigo da Lei n.º 4/99, de 27 de Janeiro: 1 - Verificar se os requerentes reúnem os requisitos previstos na Lei n.º 4/99, de 27 de Janeiro: 1.1 Nos termos do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 4/99, de 27 de Janeiro: 1.1.1 Inscrição no Departamento de Recursos Humanos da Saúde do Ministério da Saúde, ao abrigo do Despacho de 28 de Janeiro de 1977 do Secretário de Estado da Saúde (Diário da República, 2.ª Série, de 14 de Fevereiro de 1977); 1.1.2 Inscritos ao abrigo do Despacho de 30 de Julho de 1982 do Ministério dos Assuntos Sociais (Diário da República, 2.ª Série, de 25 de Agosto de 1982); 1.1.3 Constam da Lista Nominativa entrada no Ministério da Saúde em 1981; 1.1.4 Exercício público da actividade de odontologia há pelo menos 20 anos, contados a partir da data de entrada em vigor da Lei n.º 4/99, de 27 de Janeiro.

    Nos termos do n.º 2 do artigo 2.º da Lei n.º 4/99, de 27 de Janeiro: 1.2.1 Inscritos ao abrigo do Despacho de 1/90, de 3 de Janeiro, da Ministra da Saúde (Diário da República, 2ª' Série, de 23 de Janeiro de 1990); 1.2.2 Exercício público da actividade...

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