Acórdão nº 0957/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Novembro de 2004

Magistrado ResponsávelJORGE DE SOUSA
Data da Resolução10 de Novembro de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1 - A… interpôs recurso contencioso do acórdão do CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO de 19-3-2002, que confirmou o acórdão da Secção Disciplinar do mesmo Conselho que o puniu com pena de inactividade por 12 meses.

A entidade recorrida não respondeu.

O recorrente apresentou alegações com as seguintes conclusões: 1) Nenhum titular de órgão ou agente da Administração Pública pode intervir em procedimento administrativo quando, nos termos da alínea g) do art. 44º do Cód. de Procedimento Administrativo se trate de recurso de decisão por si proferida, ou com a sua intervenção.

2) Não sendo a situação dos Autos especialmente contemplada na lei, uma vez que de recurso não se tratou nas diferentes fases do procedimento administrativo, não deixou contudo a Administração de violar o princípio da imparcialidade ao nomear para as diferentes fases processuais o mesmo senhor Inspector.

3) Ao limitar a matéria a que as testemunhas poderiam responder, quer por "a priori" as considerar ignorantes dos factos, ou por as mesmas poderem vir a dar respostas "óbvias" e "desnecessárias", impedindo, desta forma que trouxessem ao processo o testemunho decorrente da sua convivência profissional e pessoal com o Arguido, o Instrutor pôs em causa o princípio da mais ampla defesa e condicionou o apuramento da verdade material dos factos que se encontrava constitucionalmente e processualmente obrigado (cfr. art. 269º nº3 da CRP e art. 179.º nº 1 da LOMP), o que gera nulidade insuprível do processo.

4) Os arts. 141.º, n.º 1, e 151º, n.º l da L.O.M.P., ou art. 170º nº l e 183º do Estatuto Ministério Público, ao não preverem, expressamente, tal como fazem os arts 24º e 25 do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e agentes da Administração Central, Regional e Local, as infracções que implicam a cominação de uma e de outra pena, revestem carácter inconstitucional por violação do disposto no art. 29.º nº 3 da CRP.

5) Inexiste fundamento legal que justifique a pena de inactividade imposta, porquanto essa pena tem de basear-se em condutas dolosas e em casos de procedimento que atente gravemente contra a dignidade e prestígio do funcionário ou agente ou da função (cfr. art. 25º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central. Regional e Local, subsidiariamente aplicável); 6) A pena aplicável a comportamento que integra "negligência grave e grave desinteresse pelo cumprimento dos seus deveres profissionais" é a suspensão de exercício (cfr. art. 24º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, subsidiariamente aplicável); 7) a aplicação da pena constitui um poder vinculado da administração, devendo o art. 138º nº l do estatuto do Ministério Público ser interpretado e integrado com os critérios subjacentes ao disposto nos arts. 24º e 25º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central Regional e Local, subsidiariamente aplicável; 8) a fundamentação para a aplicação das penas de suspensão do exercício ou de inactividade é bem diversa, estando a primeira voltada para os casos de negligência grave ou de grave desinteresse dos deveres profissionais e a última incidindo em aspectos estruturais e ligados à dignidade da função; 9) Assim, o Acórdão recorrido, ao não considerar os critérios abstractos que levariam à aplicação da pena de suspensão, distinguindo-os dos da pena de inactividade, de acordo com o Estatuto Disciplinar, carece de fundamentação bastante, vício gerador de nulidade.

10) Considerando-se como início do procedimento disciplinar a data de 28/06/1999 (cfr. Doc. nº6. fls. 1) e sendo os factos do conhecimento do Conselho Superior do Ministério Público desde a data da apresentação do Relatório, datado de 11/09/1998, há muito se encontrava preenchido o prazo prescricional de curto prazo previsto no nº 2 do art. 4º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central Regional e Local 11) Baseando-se o procedimento disciplinar em factos apurados no âmbito de inspecção extraordinária iniciada em 21 de Maio e concluída em 24 de Junho de l998, cujo período abrangido é o de 01/03/1995 a 28/02/1998, ao alargar o seu objecto para além de 21 de Maio de 1995, excedeu em 2 meses e 20 dias o prazo prescricional constante do nº 1 do art. 4º do mesmo Estatuto Disciplinar, nomeadamente, quando são imputados ao Recorrente a prática ou omissões de tactos cuja verificação se deu para além dessa data e quando a apreciação do comportamento infractor se reporta também a período anterior àquela data.

12) Verifica-se, assim, o decurso dos prazos prescricionais previstos nos nº 1 e 2 do art. 4.º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central Regional e Local, aplicável «ex vi» do preceituado no art. 216 do Estatuto do Ministério Público, sendo o seu conhecimento de carácter oficioso e constituindo excepção peremptória cuja verificação conduz à extinção do procedimento disciplinar. Ao não conhecer da invocada prescrição, encontra-se o Acórdão recorrido ferido de nulidade, por violação de norma imperativa.

13) Todas as prescrições verificadas na acção inspectiva, nomeadamente em Inquéritos sob a responsabilidade do Recorrente, ocorreram em data anterior a 21/05/1995, sendo certo que na "aplicação de uma pena em processo disciplinar não podem ser tomadas em consideração infracções já prescritas" (cfr. Ac. do STA de 15/11/1984, in BMJ 345, pág. 434), pelo que o Acórdão recorrido, ao tomá-las em consideração na aplicação da pena ao Recorrente, agiu com violação de lei expressa.

14) Em termos de justiça relativa, a situação do Recorrente não assume a gravidade daquela em que o Conselho Superior do Ministério Público, pelo Acórdão de 18 de Fevereiro de 1998 do pleno da Secção do Contencioso Administrativo, publicado no BMJ nº 474, pág. 241 a 266, aplicou a pena de inactividade por 15 meses.

15) a determinação da medida da pena em processo disciplinar, deverá ser tomada em conta, além do mais, a conduta posterior ao facto, especialmente, quando esta seja destinada a reparar as suas consequências (cfr. art. 71º n 2 al. e) do Cód. Penal "ex vi" do art. 216º do Estatuto do Ministério Público); 16) o conhecimento do Relatório elaborado pelo Exm.º Senhor Inspector ... e do Acórdão do Conselho Superior do Ministério Público que atribuiu a classificação ao Reclamante de SUFICIENTE constitui um eles essencial a ponderar na determinação da medida da pena a aplicar, 17 O Acórdão recorrido deve ser anulado, com fundamento em nulidade insuprível do procedimento disciplinar, nos termos do nº 1 do art. 179º da LOMP, em nulidade decorrente de falta de fundamentação bastante no que à determinação dos critérios determinantes da pena efectivamente aplicada concerne, nos termos dos art. 24º e 25º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central Regional e Local e art. 138 do Estatuto do MP, em nulidade decorrente do não conhecimento da prescrição do procedimento disciplinar nos termos do art. 4º, nº 1 e 2, do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central Regional e Local, em vício de violação de lei, por ofensa aos princípios da proporcionalidade - art. 5º, nº 2 do CPA - e da justiça - art. 6º do CPA - na ponderação da pena efectivamente aplicada, com o que se fará sã JUSTIÇA! Não foram apresentadas contra-alegações.

O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer nos seguintes termos: Quanto à alegada violação do princípio da imparcialidade pelo facto de ter sido nomeado o mesmo Inspector para as diferentes fases processuais, não nos parecer ter a mesma ocorrido, não só porque nenhuma infracção existe ao disposto no art. 44.º do C.P.A., como também o acórdão que aplicou a pena foi proferido por entidade diversa - o Plenário do Conselho Superior do Ministério Público.

Em relação à invocada violação do direito de defesa, através do indeferimento da requerida audição de testemunhas, remete-se para o despacho de indeferimento de fls. 303, notando-se que essa inquirição havia já sido requerida em sede de defesa e fora indeferida, sem que deste indeferimento tivesse sido apresentado qualquer recurso ou reclamação, e 1 «...não se afigurou ao instrutor a existência ou possibilidade de existência de qualquer outra diligência, essencial para a descoberta da verdade...».

Não revestem, por outro lado, os arts. 141.º, n.º 1, e 151.º, n.º 1, da L.O.M.P. ou arts. 170.º, n.º 1, e 183.º, do E.M.P. qualquer inconstitucionalidade, por violação do art. 29.º, n.º 3, da C.R.P., dado que, tal como se configura nos arts. 24.º e 25.º do E.D., o elenco das condutas infracções disciplinares não é taxativo, mas meramente indicativo.

Não tem, a nosso ver, a pena de inactividade de basear-se em condutas dolosas, podendo a mesma aplicar-se a comportamentos de grave negligência ou grave desinteresse pelo cumprimento dos deveres profissionais, como acontece no caso «sub-judice».

Não se verifica também, em nosso entender, a prescrição do procedimento disciplinar, uma vez que entre a data da instauração do inquérito (24-3-1999) e a data da instauração do processo disciplinar (23-6-1999) não decorreram mais de três meses.

Por outro lado, apesar de o relatório ter sido elaborado em 11-9-18998, a verdade é que somente em 24-3-1999 foi apresentado ao órgão máximo do serviço (Conselho Superior do Ministério Público), para a prolação de acórdão, sendo certo que, art. do art. 4.º, n.º 2 do E.D., o prazo de 3 meses para a instauração de procedimento disciplinar só começa a correr a partir do conhecimento da falta pelo órgão máximo do serviço.

Finalmente, não ocorre a alegada prescrição porque os factos infractórios relevantes para a aplicação da pena foram os existentes à data do último dia da inspecção extraordinária (28-2-1998) tal como vem referido no acórdão punitivo.

Assim, entende-se que o recurso não merece...

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