Acórdão nº 0950/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Outubro de 2004

Magistrado ResponsávelBRANDÃO DE PINHO
Data da Resolução13 de Outubro de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do STA: Vem o presente recurso jurisdicional, interposto pela Fazenda Pública, da sentença do TAF de Coimbra, que julgou procedente o recurso interposto por A... e B..., da decisão do Director Geral dos Impostos que determinou o acesso directo da Administração Fiscal às respectivas contas bancárias.

Fundamentou-se a decisão, no que ora importa, em que a al. c) do nº 2 do art. 63°-B da LGT (aditado pelo art. 13°, nº 2 da Lei n.º 30-G/00, de 29 de Dezembro) só contempla casos de foro criminal, que não de mero ilícito contra-ordenacional, sendo que não vem imputado aos recorrentes "qualquer comportamento criminal, sem (se) fazer qualquer juízo sobre a gravidade do seu comportamento, (ou) sequer alusão aos elementos de algum tipo de crime fiscal", indiciando-se apenas "que o valor do imóvel era superior ao declarado".

A Fazenda recorrente formulou as seguintes conclusões: "1 - A sentença recorrida fez errada interpretação e aplicação da lei (art. 63°-B, nº 2, c) da L.G.T.) ao caso concreto; 2 - Entendeu o Meritíssimo Juiz a quo que «as situações em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado» só poderiam ser aquelas que também constituam «indícios de prática de crime doloso em matéria tributária»; 3 - Recorrendo ao elemento literal e analisando o preceito gramaticalmente, é por demais evidente não ser esse o sentido que dele resulta; 4 - A primeira parte do preceito refere-se à situação da existência de indícios da prática de crime doloso, situação essa que tem como exemplo a utilização de facturas falsas; 5 - Se a situação, descrita na segunda parte do preceito (situações em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado) fosse um dos exemplos das que constituam "indícios da prática de crime doloso", então o exemplo anterior (utilização de facturas falsas) nunca dela deveria estar separado através de vírgula, mas, apenas, através da conjunção e, dado existirem apenas esses dois exemplos; 6 - O Meritíssimo Juiz, na sua transcrição (fls. 74 vº), omitiu a existência da dita vírgula imediatamente antes da conjunção e, constante do texto original do preceito; 7- Tal omissão faz a completa diferença na leitura do preceito legal - sem o referido sinal de pontuação, e como acima foi referido, já faz sentido a interpretação acolhida na sentença ora recorrida; 8 - Na alínea c) do nº 2 do art. 63°-B, estão previstas duas situações em que pode ser admitida a quebra do sigilo bancário: uma delas no caso de existirem indícios da prática de crime doloso em matéria tributária (com o exemplo do caso da utilização de facturas falsas); outra, nas situações em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado; 9 - Ambas as situações constituem duas orações que estão ligadas por uma conjunção copulativa, que determina a paridade da sua função dentro da frase; 10 - Esta interpretação faz sentido se se tiver em conta outros elementos: 11 - Na primeira parte, o legislador exige, apenas, a existência de indícios, não os qualificando (como fortes ou graves, etc. ), i.e., no caso da prática de crime doloso o legislador contenta-se, apenas, com a existência de indícios; 12 - Na segunda parte, precisamente por se tratar de situações que não entram na esfera do crime doloso em matéria tributária, o legislador foi mais rigoroso, exigindo que os factos fossem gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado; 13 - O Regime Geral das Infracções Tributárias tem um carácter particular, que pode explicar esta solução legal; 14 - Neste podem-se configurar várias situações que, em abstracto, poderiam preencher um tipo de crime, mas que, apenas devido ao seu valor, podem passar a ser qualificadas de contra--ordenações (ex. crime de abuso de confiança e crime de fraude ).

15 - O legislador com a fórmula adoptada terá pretendido abranger ambas as situações, para permitir a derrogação do sigilo bancário também nos casos que, apenas pelo valor, não se enquadrem em nenhum tipo de crime em matéria fiscal; 16- O caso em apreciação não é o único em que são utilizados conceitos imprecisos e genéricos nesta matéria; 17 - Na fixação dos pressupostos do recurso à avaliação indirecta, cuja verificação pode permitir a derrogação do sigilo bancário, nos termos da alínea a) do preceito em análise, o legislador socorreu-se, muitas vezes, de conceitos indeterminados e imprecisos (ex. "Existência de manifesta discrepância entre o valor declarado e o valor de mercado de bens ou serviços" - 88°, d) L.G.T.; "insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração" - 88°, a)...

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