Acórdão nº 0960/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Julho de 2004

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução07 de Julho de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

A... interpôs, no Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra, recurso contencioso contra a Câmara Municipal da Murtosa e o respectivo Presidente pedindo a anulação da deliberação daquela Câmara, de 3/4/01, que lhe indeferiu o requerimento em que solicitava a passagem da licença de utilização de um prédio que construíra, alegando a sua ilegalidade em resultado de estar ferida de vícios de violação de lei e de forma.

Citados, os Recorridos defenderam-se por excepção - o Presidente da Câmara Municipal era parte ilegítima por a autoria da sindicada deliberação ser da Câmara Municipal - e por impugnação - o acto impugnado não sofria dos vícios que lhe eram imputados.

O Sr. Juiz a quo, por despacho de fls. 193 a 196, julgou o Presidente da Câmara parte ilegítima e, por sentença de fls. 232 a 242, negou provimento ao recurso.

Notificado da sentença, o Recorrente requereu, a fls. 246, que lhe fossem passadas diversas certidões e declarou pretender interpor recurso daquela sentença para este Tribunal.

Por despacho de fls. 249 o Sr. Juiz a quo ordenou a passagem de parte das certidões requeridas e admitiu o recurso.

Inconformado com o indeferimento parcial daquele pedido o Recorrente agravou desse despacho para este Tribunal.

Rematando as alegações dos seus recursos o Recorrente concluiu como se segue : I - Agravo do despacho de Julho de 2002 : 1ª - A coberto da inverídica e enganosa declaração, no final da contestação, da junção do P A (sic) - junta aos autos uma falsa certidão, já que não reproduz PA, de que se diz extraída, por dela se terem excluído os projectos aprovados, em que se fundamenta o recurso - no que os recorridos são reincidentes; - e julgada a causa, como se o PA estivesse junto aos autos - ainda aí se enganando o recorrente ; - tendo sido verificado que o recorrido não cumpriu devidamente o preceituado no artigo 46° da LPTA, e requerida a notificação dos recorridos para que o façam, não pode o requerimento ser indeferido, com o argumento do esgotamento do poder jurisdicional, pela sentença proferida.

  1. - Esgotado estaria o poder jurisdicional, quanto à matéria do requerimento, somente, se sobre a matéria do requerimento tivesse já sido proferido despacho. (artigo 666.° n.ºs 1 e 3 do CPC) 3.ª - Diferente entendimento constitui errada interpretação dos citados preceitos, com ofensa dos art.ºs 20.º, n° 5, e 268°, n.º 4, da CR - porquanto, privado o recorrente de fazer a prova da causa de pedir, assim se nega efectiva tutela jurisdicional dos direitos.

  2. - Os recorridos juntaram aos autos uma (falsa) certidão - a coberto de inverídica declaração, referida na conclusão 1ª - não o P A ou algum duplicado deste.

    Donde a insubsistência do argumento único do indeferimento dos restantes segmentos do requerimento.

  3. - «A publicidade do processo implica o direito ... de obtenção de cópias ou certidões de quaisquer peças nele incorporadas..., pelas partes ...» (art.º 167.º n.º 2, do CPC).

  4. - «O funcionário da secretaria encarregado do processo é obrigado a rubricar as folhas em que não haja a sua assinatura ...» (artigo 165° n.º 1 do CPC) 7.ª - O indeferimento de todos os requerimentos apresentados pelo ora Recorrente carece, pois, de qualquer fundamento legal, consubstanciando uma gravíssima, injusta e ilegal lesão dos legítimos interesses do Recorrente passando por cima da circunstância de o Tribunal ter decidido como se a documentação relevante estivesse junta aos autos (que não está), caucionando, assim, a falsidade da autoria do recorrido.

  5. - Quando assim se não entendesse, e sem nada conceder quanto ao que antecede, sempre poderia, e deveria, o Sr. Juiz Relator usar dos poderes previstos no art.º 700.º, n.º 1, al. a) do CPC.

  6. - O despacho recorrido violou, pois e multiplamente, a lei, e designadamente os art.s 46.º da LPTA, 666.º, n.ºs 1 e 3 , 167.º, n.º 2, e 165.º, todos do CPC.

  7. - Se tais disposições pudessem ser interpretadas e aplicadas no sentido que o despacho recorrido lhes pretende atribuir elas padeciam de patente inconstitucionalidade material por violação dos preceitos e princípios da CRP, maxime dos seus art.s 20.º, n.º 5, e 268.º, n.º 4, ambos da lei Fundamental.

  8. - Subsidiariamente, por razões de economia processual, poderá o Sr. Juiz Relator usar dos poderes previstos no art.º 700.º, n.º 1, al. a), do CPC.

    II - da sentença recorrida : 12.ª -

    1. A sentença recorrida decidiu que é inválido o deferimento da licença de utilização - com fundamento nos seguintes factos, que deu como provados: - no auto de embargo da obra, o funcionário informou que há desconformidade com o projecto aprovado; e - improcedeu o recurso de impugnação do embargo.

    2. - O (único) facto verídico é o da instauração do auto de embargo, contendo mero juízo de valor, mas não descrevendo nenhuma infracção do projecto; A improcedência do recurso é inverídica - como se verá.

  9. - Mas o embargo não é objecto do presente recurso.

    Pedido, neste recurso, é anulação da deliberação que revogou o deferimento tácito da licença de utilização da obra concluída, suspensa a eficácia do embargo.

  10. - «A licença de utilização destina-se a comprovar a conformidade da obra concluída com o projecto aprovado ...» (artigo 26° n.º 2, do Decreto-Lei n°445/91) Donde que: a) - Causa de pedir é - como sempre teria de ser - o projecto aprovado e a sua correcta execução.

    1. - só o projecto aprovado (com a composição prevista no artigo 15° n.º 2 do DL 445/911, de 20/11, então em vigor - onde se não inclui o requerimento do licenciamento) e a sua fiel execução, se discutem nestes autos.

    Não o embargo da obra.

  11. - Nem corresponde à verdade que improcedeu o recurso de impugnação do embargo - ao contrário do que, erradamente, foi dado como provado.

    Porquanto o Acórdão do STA não transitou em julgado - aguardando decisão de arguição de nulidades - conforme foi alegado.

    (artigos 65 a 67 da petição e doc. 30) 16.ª - a) - Deixando de conhecer da causa de pedir, a sentença incorreu em nulidade por omissão de pronúncia. (artigo 668° n.º 1 d) do CPC) E - em vez do que se contém nos projectos - ocupando-se do embargo, que nestes autos se não discute, incorreu em nulidade por excesso de pronúncia.

    1. - Deste modo, o tribunal não se ocupou da causa, submetida a julgamento - cujo elemento essencial é a causa de pedir.

    Diferente entendimento constitui errada interpretação do citado preceito, violando-se os artigos 20.º , n.º 5, e 268°, n.º 4, da CR.

  12. - a) - A questão da licitude (da exclusão da ilicitude) do facto do prosseguimento e conclusão da obra, cujo embargo estava suspenso na sua eficácia, nos termos dos artigos 80º e 81° da LPTA, foi já decidida com trânsito em julgado - em processo movido ao recorrente, mediante queixa da recorrida ao M.º P.º de Estarreja.

    Nem a ilicitude do prosseguimento e conclusão da obra, assim decidida, prejudica, nem poderia prejudicar a obrigação da fiel execução do projecto aprovado (que o embargo visa somente prevenir) - verificação a fazer pelos meios previstos na lei, com as inerentes consequências.

    1. - Decidida já a questão prejudicial da licitude da conclusão da obra, pelo tribunal competente de instrução criminal, a decisão impõe-se a todas as autoridades e sobre ela o tribunal não pode voltar a pronunciar-se. (artigo 671° n.º 1 do CPC) c) - Diferente entendimento constitui errada interpretação dos citados preceitos, com ofensa dos artigos 20º n.º 5 e 268° n.º 4 da CR.

  13. - a) - Tendo tomado o embargo como questão prejudicial - o tribunal contrariou uma outra decisão transitada em julgado, que se impõe a todas as autoridades. (artigo 671° n.º 1 do CPC) Pela autoridade administrativa, competente para o julgamento em matéria contraordenacional - foi decidido: - que das expressões constantes da informação do funcionário - que deu lugar ao auto de contra-ordenarão, como ao auto de embargo, que remete para o teor dessa informação - não consta nenhuma concreta imputação de algum facto desviante do projecto aprovado.

    (sic) Como se documentou nos autos.

    Decisão proferida pelo próprio Presidente da recorrida.

    1. - Dessa decisão, a sentença recorrida disse somente que foi tomada noutro processo - parecendo querer significar que não faz caso julgado material, na questão da infundamentação dos procedimentos tomados, contra o dono da obra.

      Mas não é de nenhuma decisão formal que se trata - sobre a qual somente se tivesse formado caso julgado formal.

    2. - Naqueles termos, decidiu-se definitivamente a questão de direito substantivo, da fundamentação do acto, essencial para a decisão da relação material, em sede contraordenacional, como do ordenado embargo.

    3. - O respeito do caso julgado é instrumento essencial da tutela jurisdicional, pela segurança que confere, na definição dos direitos dos cidadãos.

      Sem a segurança do caso julgado, manter-se-iam indefinidos os direitos - o que equivaleria à negação da efectiva tutela jurisdicional.

      Diferente entendimento constitui errada interpretação do artigo 671° n.º 1 do CPC, com ofensa dos artigos 20º n.º 5 e 268° n.º 4 da CR.

      E - ainda que caso julgado inexistisse - 19.ª - É uma evidência o acerto do julgamento do Presidente da recorrida, quanto à infundamentação do acto - decidindo que, das expressões constantes do auto, «não consta nenhuma concreta imputação de algum facto desviante do projecto aprovado.

      (sic) (Sem nunca esquecer que - no presente recurso - não é do embargo que aqui se trata, mas do projecto aprovado e da sua correcta execução) 20.ª a) - Estão plenamente provados pelo projecto aprovado, documento autêntico (artigos 369° n.º 1 e 371° n.º 1 do CC) - que a recorrida subtraiu ao julgamento, na 1.ª instância - no que é reincidente - os factos descritos em VIII, das presentes alegações, b) - Diferente entendimento constitui errada interpretação dos citados preceitos, com ofensa dos artigos 20º n.º 5 e 268° n.º 4 da CR.

  14. - Requerida licença de utilização da obra concluída, e jamais realizada vistoria da obra, nos termos do artigo 27° n.º 1 do diploma legal citado -...

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