Acórdão nº 052/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Maio de 2004

Magistrado ResponsávelPOLÍBIO HENRIQUES
Data da Resolução25 de Maio de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO "A..., SA", com sede na Rua ..., Senhora da Hora, Matosinhos, intentou, no Tribunal Administrativo do Circulo do Porto, recurso contencioso de anulação da deliberação, de 11 de Abril de 2002, do Conselho de Administração da Rede Ferroviária Nacional, REFER, EP., que adjudicou as empreitadas "FE 404 - Construção da Estação e Interface de Coina" (Lote A) e "FE 405 - Construção da Estação e Interface de Penalva" (Lote B), à recorrida particular "B..., com sede na Rua ..., Miraflores, Algés.

Por sentença de fls. 437 a 442, foi julgada extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.

Inconformada, a impugnante recorreu para este Supremo Tribunal que, por acórdão de 20 de Agosto de 2003, revogou aquela decisão e ordenou o prosseguimento dos autos.

O Tribunal Administrativo do Circulo do Porto, conhecendo do mérito, por sentença de 20 de Outubro de 2003, negou provimento ao recurso contencioso de anulação.

Não a aceitando, a impugnante interpõe recurso dessa decisão para este Supremo Tribunal, apresentando alegações com as seguintes conclusões: 1 - Entendeu o Tribunal "a quo" negar provimento ao recurso interposto, considerando que a Comissão de Avaliação de Propostas não cometeu qualquer erro grosseiro, pelo que, e em consequência, não violou quaisquer um dos princípios invocados pela recorrente. Considerou ainda o mesmo Tribunal que os critérios e sub-critérios de avaliação das propostas, a saber, garantia de qualidade de boa execução; preço e prazo, foram atempadamente ponderados e publicitados e que a comunicação efectuada à recorrente pela entidade adjudicante de que a empreitada em causa havia já sido adjudicada ao Consórcio B..., consubstancia uma notificação do acto recorrido à recorrente, concluindo não existir qualquer vício de violação da lei.

2- Com o devido respeito, e salvo melhor opinião, não tem razão o Tribunal "a quo", pelo que deverá a sentença recorrida ser revogada e, em consequência, ser anulado o acto de adjudicação objecto do recurso contencioso.

3 - Desde logo, o Tribunal "a quo" não fundamenta a sua decisão.

4 - Por outro lado, a sentença recorrida é contraditória, ou mistura conceitos; é redutora e omissa, não considerando a totalidade dos vícios invocados pela recorrente.

5 - A actividade da Comissão de Análise de Propostas não deve ser arbitrária, mas praticada no exercício de poderes discricionários cumulativamente com poderes vinculados.

6 - Como tal, é uma actividade com limites e impugnável, quer por violação de lei, quer por vício de desvio de poder.

7 - No caso dos presentes autos são bem patentes esses vícios e tal é demonstrado e invocado já em sede de recurso contencioso pela ora recorrente 8 - O Tribunal recorrido define de forma primorosa o vício de violação da lei e os princípios constitucionais a que a discricionariedade administrativa se encontra sujeita, mas reduz o caso dos autos à apreciação de erro grosseiro e, a partir dessa premissa, de forma não fundamentada e inadequada, porque se tratam de ilicitudes diferentes, conclui simplesmente que também não houve violação de qualquer um dos princípios invocados pela recorrente.

9 - O Tribunal recorrido não se pronuncia sequer sobre o vicio de desvio de poder invocado pela recorrente, além de não considerar factos admitidos por acordo (porque nunca contestados) e que só reforçam a tese da recorrente já exposta em sede de recurso contencioso.

10 - O Tribunal recorrido também não tem razão ao considerar não padecer o acto impugnado de vício de violação da lei.

11 - Tal como demonstrado ao longo de todo este processo, e, conforme mais uma vez se faz nas presentes alegações, a proposta da recorrente é a melhor e mais vantajosa para qualquer uma das empreitadas objecto do concurso em causa.

12 - O Programa de Concurso apresenta 3 Critérios de adjudicação, a saber, Garantia da Qualidade de Boa Execução; Preço e Prazo, atribuindo-lhes as ponderações respectivamente de 45%;35% e 20%.

13 - Na apreciação qualitativa da própria Comissão de Análise, é a recorrente que apresenta o preço mais vantajoso; é a recorrente que revela mais experiência em obras similares; é a recorrente que apresenta a melhor Memória Descritiva e Justificativa; é a recorrente que revela mais baixos índices de sinistralidade, e em decréscimo; é a recorrente que demonstra ter o melhor Sistema de Gestão da Segurança e é a recorrente que demonstra ter o melhor Sistema de Gestão da Segurança e é a recorrente que tem o melhor Sistema de Gestão Ambiental da Obra.

Isto é, 14 - A recorrente é a melhor nos principais factores de adjudicação de qualquer empreitada! E tal é admitido pela entidade adjudicante, ora recorrida, que não contesta a relevância de tais factores em sede de resposta à petição de recurso.

15 - No universo total dos 48 factores apreciados pela Comissão, a ora recorrente é melhor em 16, enquanto que o concorrente nº 3, adjudicatário, é melhor apenas em 12, sendo equivalentes nos restantes.

16 - Estes factos deveriam, por si só, conferir à ora recorrente uma classificação consideravelmente superior à que lhe foi atribuída, conduzindo, logicamente, à adjudicação das empreitadas, não ao concorrente nº 3, mas à recorrente.

17 - Assim não entendeu a entidade adjudicante. Incompreensivelmente, porém.

18 - Note-se que as classificações atribuídas aos concorrentes e apresentadas no Relatório Final, a págs. 57/65 são precisas em relação a cada critério, indo até à segunda casa decimal.

19 - No entanto, a) Nenhuma explicação é apresentada quanto à forma como se procedeu aos cálculos que conduziram a resultados numericamente tão precisos; b) Em violação da alínea e) do número 1 do artigo 66º do RJEOP, nem o Anúncio, nem o Programa de Concurso, estabelecem todos os factores e subfactores em que foram divididos os critérios enumerados no ponto 12 supra, assim como nenhuma valoração ou ponderação lhes é atribuída; c) Nada em qualquer um dos Relatórios de Avaliação de Propostas indica essa valoração ou a classificação obtida por cada concorrente em cada um desses factores e subfactores.

20 - A sentença recorrida refere que, quer o Anúncio, quer o Programa de Concurso estabelecem e ponderam os sub-critérios que concretizam os critérios de apreciação.

21 - Ora, o Anúncio e o Programa de Concurso ponderam apenas os critérios de adjudicação - aqueles que confusamente a sentença recorrida apelida simultaneamente de critérios e sub-critérios: Garantia da Qualidade da Boa Execução; Preço e Prazo.

22 - Naqueles documentos concursais, o critério Garantia da Qualidade da Boa Execução é concretizado em : Qualificação Profissional da Equipa Técnica; Memória Descritiva e Justificativa de Execução da Obra; Plano de Trabalhos; Sistema de Gestão da Qualidade; Sistema de Gestão da Segurança e Sistema de Gestão Ambiental da Obra, sendo que, cada um desses factores é ainda sub-dividido em diversos sub-factores.

23 - Nenhum desses factores ou sub-factores é ponderado ou valorado.

24 - O critério Preço, por sua vez, é dividido em: Valor da Proposta; Nota Justificativa do Preço; Cronografia Financeiro/Plano de Pagamentos; Lista de Preços Unitários; Custo Diário de Estaleiro; Lista de Preços Unitários de Mão de Obra em Trabalhos Eventuais e Lista de Preços de Equipamentos para Utilização em Trabalhos Eventuais.

25 - Nenhum destes factores ou sub-factores é ponderado ou valorado.

26 - Estes factos violam a lei e vão contra a unanimidade da doutrina e jurisprudência.

27 - As classificações atribuídas a cada concorrente pela Comissão de Análise das Propostas e o consequente acto de adjudicação do concurso em causa ao concorrente número 3 só poderão dever-se a um erro manifesto ou a um critério ostensivamente subjectivo, desacertado e inadmissível, o qual não pode deixar de ser jurisdicionalmente fiscalizado de forma a conduzir à anulação do acto de adjudicação, por vício de violação da lei e de desvio de poder.

28 - A entidade adjudicante procedeu a uma análise das propostas dos vários concorrentes, não discricionária, mas antes inaceitavelmente tendenciosa, subjectiva e arbitrária, implicando um desvio de poder, porque utilizado para um fim diverso do visado com a sua atribuição, o que implica a invalidade do acto de adjudicação objecto do presente recurso.

29 - Acresce que a entidade adjudicante viola ainda o disposto nos artigos 61º, 62º e 63º do CPA, ao não fornecer por diversas vezes à ora alegante os elementos referidos no ponto 31 supra, mesmo depois de requeridos pela recorrente em sede de concurso.

30- De resto, não só a entidade adjudicante não revela tais elementos, como também não revela, por exemplo, apesar de requerido, quando tiveram lugar as notificações exigidas pelos artigos 110º e 108º do RJEOP ou até quando teriam celebrado o contrato de empreitada, apenas informando a ora alegante sobre a decisão de adjudicação.

31 - A entidade adjudicante viola o próprio Programa de Concurso, nos termos do qual a notificação para Audiência Prévia deveria fornecer "os elementos necessários para que os interessados fiquem conhecer todos os aspectos relevantes da decisão".

32 - São também unânimes a doutrina e a jurisprudência ao entenderem por força, nomeadamente, do Princípio da Igualdade, que a...

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