Acórdão nº 0112/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Março de 2004

Magistrado ResponsávelPOLÍBIO HENRIQUES
Data da Resolução24 de Março de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO A... e B..., identificados nos autos, instauraram no Tribunal Administrativo do Circulo de Lisboa, acção declarativa de condenação com processo ordinário contra o Estado Português.

Por sentença de 10 de Julho de 2002, o Tribunal Administrativo do Circulo julgou procedente a excepção dilatória de incompetência absoluta do Tribunal, em razão da matéria, "bem como de erro na forma do processo" e, em consequência, ao abrigo do disposto na alínea a) do nº 1 do art. 288º do Código de Processo Civil, absteve-se de conhecer do pedido formulado pelas Autoras e absolveu o Réu da instância.

Inconformadas, as Autoras, interpõem recurso dessa decisão para este Supremo Tribunal, apresentando alegações com as seguintes conclusões:.

1- Na determinação do tribunal competente em razão da matéria deverá atender-se aos termos do pedido e da causa de pedir formulados na petição inicial (v. art. 66º do CPC); 2- No presente processo as ora recorrentes não exigiram o pagamento de qualquer indemnização decorrente de qualquer processo expropriativo ou nacionalização (v. arts. 1º e segs. do CE 91); 3- No presente processo foi peticionada uma indemnização por actos e omissões imputáveis ao Estado, decorrentes da sua actividade de gestão pública, tendo o Estado Português actuado munido de ius imperii e invocando poderes de autoridade, tendo violado direitos e interesses legítimos dos ora recorrentes e causado diversos prejuízos (v. Ac. Trib. Conflitos de 2000.12.05, Proc. 360; cfr. Acs. STA de 1997.11.27, Proc. 34366; de 1996.06.04, Proc. 39783); 4- Os referidos prejuízos nunca seriam ressarcidos no âmbito de um processo de expropriação, no qual está em causa apenas o valor dos bens à data da declaração de utilidade pública (v. arts. 27º e segs. do DL 845/76, de 18 de Dezembro (CE76), arts. 22º e segs. do DL 438/91, de 9 de Novembro (CE 91) e arts. 23º e segs. da Lei 168/99, de 18 de Setembro (CE 99), não abrangendo, assim, os prejuízos verificados desde a data da ocupação ilícita e abusiva dos prédios em causa (v. art. 22º da CRP e art. 51º/1/h) do DL 129/84, de 27 de Abril (ETAF)); 5- Os actos e omissões que integram a causa petendi da presente acção respeitam, além do mais, às actuações ilícitas de diversas autoridades públicas que promoveram e incitaram a ocupação dos prédios das ora recorrentes e que, devendo fazê-lo, não impediram a sua ocupação, bem como a utilização, degradação e destruição dos meios de produção neles existentes, incluindo culturas, animais, máquinas e edifícios (v. art. 51º/1/h) do ETAF e art. 6º da LPTA); 6- Os referidos actos e a falta de tempestivo pagamento da indemnização devida violam claramente o artigo 62º da CRP e os artigos 1305º, 1308º e 1310º do Código Civil, pelo que é manifesta a responsabilidade civil do Estado Português por actos de gestão pública (v. art. 22º da CRP), resultando a competência do douto Tribunal a quo do disposto no art. 51º/1/h) do ETAF; 7- O art. 5º do DL 406-A/75, de 29 de Julho, os arts. 10º e 15º da Lei 80/77, de 26 de Outubro, e os arts. 8º e segs. do DL 199/88, de 31 de Maio, não regulam a competência dos Tribunais em razão da matéria, limitando-se a criar um dever para o Estado de indemnizar pronta e justamente os particulares sujeitos a nacionalizações e expropriações (v. preâmbulo do DL 199/88, de 31 de Maio), o que não tem a ver com o objecto do presente processo, que se refere apenas aos prejuízos causados pela ocupação ilícita e abusiva dos prédios das ora recorrentes; 8- No presente processo as ora recorrentes peticionaram uma indemnização pelos prejuízos causados por diversos actos de gestão pública, nomeadamente os decorrentes da ocupação abusiva e ilícita dos seus bens, na sequência de actos de incitamento de elementos das forças armadas e de agentes das forças de segurança pública, que se recusaram a tomar qualquer medida para tutelar os direitos das recorrentes, não estando em causa a indemnização devida por qualquer processo expropriativo (v. art. 51º/1/h) do ETAF); 9- A douta sentença recorrida enferma assim de manifestos erros de julgamento, tendo violado frontalmente, além do mais, o disposto nos arts. 22º e 62º da CRP e no art. 51º/1/h) do ETAF; O Réu Estado Português contra-alegou propugnando pela manutenção da sentença recorrida.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir: 2.

FUNDAMENTAÇÃO 2.1. OS FACTOS Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos: 1. - As Autoras são as actuais proprietárias dos seguintes imóveis: a) Prédio rústico com a área de 722,3125 hectares, denominado "...", sito na freguesia de ..., município de Évora, inscrito na respectiva matriz cadastral sob o art. nº 1, da Secção N N1 N2; b) Prédio rústico com a área de 119,8750 hectares, denominado "...", sito na freguesia de ..., município de Évora, inscrito na respectiva matriz cadastral sob o art. Nº 3 da Secção N1 N2; c) Prédio rústico com a área de 541,200 hectares, denominado "...", sito na freguesia de ..., município de Évora, inscrito na matriz cadastral sob o art. Nº 3 da Secção N; d) Prédio rústico com a área de 254,4000 hectares, denominado "...", sito na freguesia de ..., município de Évora, inscrito na respectiva matriz cadastral sob o art. Nº 2 da Secção N N1; e) Prédio rústico com a área de 490,9375 hectares, denominado "...", sito na freguesia de ..., município de Évora, inscrito na respectiva matriz cadastral sob o art. n 1 da Secção M; f) Prédio rústico com a área de 252, 1375 hectares, denominado "...", sito na freguesia de ..., município de Évora, inscrito na respectiva matriz cadastral sob o art. n.º 2 da Secção C C1.

2 - As AA. adquiriram os prédios em causa por sucessão de C..., falecido em 75.05.12.

3 - Em princípios de Setembro de 1975, os prédios em causa foram ocupados.

4 - Pela Portaria n° 579/75, de 24 de Setembro, foi decretada a expropriação de diversos prédios, neles se incluindo os prédios identificados nas alíneas A, B, C e D (v. nºs 51 e 52 da Portaria nº 579/75).

5 - Em 75.09.24, o Instituto de Reorganização Agrária (IRA), foi investido na posse administrativa dos Prédios identificados sob as letras A, B, C e D (v. art. 9° do DL 406-A/75).

6 - Pela Portaria n°. 373/76, de 18 de Junho, foi decretada a expropriação de diversos prédios, neles se incluindo o prédio identificado sob a letra E (v. art. 30° da Portaria n°. 373/76).

7 - Em 75.06.18, o IRA foi investido na posse administrativa do prédio identificado sob a letra E (v. art. 9° do DL 406-A/75).

8 - Pelas Portarias n°. 362/76, de 12 de Junho e 406/76 de 7 de Julho, foi decretada a expropriação de diversos prédios, neles se incluindo o Prédio identificado sob a letra F (v. nº 1 da Portaria nº 362/76, e nº 5 da Portaria 406/76).

9- Em 76.06.12, o IRA foi investido na posse administrativa do Prédio F (v. art. 9° do DL 406-A/75).

10 - Os prédios referidos deixaram assim de poder ser explorados pelos seus legítimos proprietários.

11 - Na sequência do despacho de 80.09.23, do Senhor Secretário de Estado da Estruturação Agrária, foi demarcado o Prédio A e atribuído às AA. uma área de reserva de propriedade, com a área total de 429,107412 ha.

12 - Na sequência do despacho de 91.08.29, do Senhor Secretário de Estado da Alimentação, foram demarcadas e atribuídas às AA. áreas de reserva de propriedade incidente sobre 218,2500 ha do Prédio B, que já havia sido objecto de despacho de 80/09/30. (v. documento junto aos autos a fls. 42).

13 - Na sequência do despacho de 91.08.29, do Senhor Secretário de Estado da Alimentação, foram demarcadas e atribuídas às AA. áreas de reserva de propriedade incidentes sobre 339,7560 ha do Prédio A e sobre 252,1375 ha do Prédio F, tendo sido entregues às AA a exploração económica e posse deste último.

14 - Pela...

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