Acórdão nº 048041 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Março de 2004
Magistrado Responsável | ANTÓNIO MADUREIRA |
Data da Resolução | 09 de Março de 2004 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1. RELATÓRIO 1. 1. O Secretário do Estado do Trabalho interpôs, no uso da competência delegada pela alínea h) do n.º 5 do despacho do Ministro do Trabalho e da Segurança Social n.º 11 386/2002, publicado no DR., II Série, de 21/5/2002, recurso para o Pleno desta Secção do acórdão da 3.ª Subsecção de 16/10/02, que, no âmbito do recurso contencioso interposto contra o então Ministro do Trabalho e da Solidariedade por A..., com os devidos sinais nos autos, anulou o seu despacho de 17/7/01, que rejeitou o recurso hierárquico para ele interposto da decisão do Gestor do Programa Pessoa, que, aprovando o saldo final no âmbito do Pedido n.º 7 - Medida 942220 P1, referente ao Programa de Formação Profissional e Emprego - Pessoa - Q.C.A., lhe impôs a redução do financiamento, com o fundamento de que esse acto havia sido praticado no exercício de competências próprias e exclusivas e, como tal, era já um acto definitivo, contenciosamente impugnável.
Nas suas alegações, formulou as seguintes conclusões: 1.ª) - O Gestor do Programa Pessoa é uma autoridade ou órgão designado pelo Estado membro, não integrada na Administração Pública central e institucional, nomeado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 15/97 (2.ª série) de 6/2, publicada no DR de 26.03, nos termos do art.º 6.°, n.º 1 do Decreto Reg. n.º 15/96.
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) - O Gestor goza do estatuto de encarregado de missão, previsto no art.º 37.º da Lei n.º 49/99, de 22/06, estatuto diferente do previsto para os cargos elencados no Estatuto do Pessoal Dirigente e dos que lhe são legalmente equiparados.
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) - Acrescente-se ainda que nem no Decreto-Lei n.º 115/98, de 4/5- Lei Orgânica do Ministério alterada pelo DL n.º 45-A/2000, de 22/3, se refere o Gestor como órgão do Ministério ou se determina qualquer vínculo hierárquico ao Ministro do trabalho e da Solidariedade Social.
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) - Por outro lado, a inexistência de uma previsão legal idónea e suficiente de recurso tutelar impede o recurso ao mesmo nos termos do n.º 2 do art.º 177.º do CPA.
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) - Foi este também o entendimento adoptado pelo STA no acórdão de 8/2/2001, processo n.º 45 919, em que foi recorrente ..., Ld.ª e recorrido o Secretário de Estado do Trabalho e Formação.
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) - E, mais recentemente, no Acórdão do STA de 21/11/2001,proferido no processo n.º 47 306 - P, em que foi recorrente A... e recorrido o Secretário de Estado do Trabalho e Formação.
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) - Cite-se, ainda, o voto de vencido do Exm.º Conselheiro José Cândido de Pinho no acórdão proferido pelo STA em 28/11/2002, no processo n.º 48 401, em que foi recorrente CIDEC - Centro Interdisciplinar de Estudos Económicos e recorrido o Secretário de Estado do Trabalho.
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) - Ao concluir pela existência de uma relação de subordinação ao membro do Governo, com base em errada interpretação e concatenação das normas de direito comunitário e do direito interno, aplicáveis ao Fundo Social Europeu e, assim, ao não apreciar a inserção do cargo em referência na Lei Orgânica do Ministério, o douto aresto, com o devido respeito, violou o bloco de legalidade do acto.
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2.
Contra-alegou a recorrida (recorrente contenciosa), que formulou as seguintes conclusões: 1.ª) - O Gestor do Programa Pessoa tem o estatuto de Encarregado de Missão.
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) - Nos termos dos disposto no artigo 23.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26/9, o Encarregado de Missão é nomeado para o desempenho de funções junto dos membros do Governo.
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) - Não tem, assim, o Encarregado de Missão, e consequentemente o Gestor do Programa Pessoa competência própria e exclusiva.
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) - Ficando dependente do membro do Governo junto do qual exerce funções.
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) - Pelo que aos actos do Gestor do Programa Pessoa estão sujeitos a recurso hierárquico necessário para a entidade governamental junto de quem exerce funções.
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) - Este é o estatuto jurídico que tem assento legal expresso, e seu não acatamento traduz-se na violação do princípio do respeito das normas jurídicas que cria - o princípio do Estado de Direito formal.
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) - E a evolução das realidades não pode justificar tal violação, competindo antes ao Estado criar as leis que melhor se ajustem a tal evolução.
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) - Deve, pois, ser negado provimento ao recurso, mantendo-se o acórdão recorrido, como é de JUSTIÇA.
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3.
O Exm.º Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.
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4.
Foram colhidos os vistos dos Exm.ºs Juízes Adjuntos, pelo que cumpre decidir.
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FUNDAMENTAÇÃO 2. 1. OS FACTOS: O acórdão recorrido deu como provados os seguintes factos: a) - Inconformada com a decisão do Gestor o Programa Pessoa que decidiu o seu pedido de aprovação do saldo final, impondo-lhe a redução de financiamento que lhe foi concedido no âmbito do quadro QCA II, a Recorrente dela interpôs recurso hierárquico para o Sr. Ministro do Trabalho solicitando a modificação de tal decisão.
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- O que provocou a prolação do Parecer n.º 200/DSJ/2001, elaborado no âmbito da Direcção de Serviços Jurídicos do Ministério do Trabalho e da Solidariedade, onde se escreveu o seguinte: ".... Acrescentamos ainda que nem no Dec-Lei n° 115/98 de 4.5- Lei Orgânica deste Ministério - alterado pelo Dec-Lei n° 45-A/2000, de 22.3, nem no mencionado Dec. Regul. N.° 15/96 ou noutro diploma aplicável aos apoios no âmbito do FSE do II QCA, se refere o indicado Gestor como um dos órgãos do Ministério ou se determina qualquer vínculo hierárquico ao Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade - atente-se no Acórdão do STA, proferido no Proc. n° 45919, 1. Secção, 1. Subsecção, em 8.2.01.
Por isso nunca poderá caber recurso hierárquico para o membro do Governo da decisão aqui controvertida, de harmonia com o art.º 166.° do CPA e contrariamente à pretensão da recorrente.
3.3. Consideramos que ao membro do Governo estão cometidos, no atinente ao presente pedido de financiamento, unicamente, poderes de gestão global e de supervisão.
Mas mesmo que se entenda haver lugar a recurso hierárquico impróprio necessário, nos termos do art.º 176.° do CPA, aquele teria de se encontrar abrangido expressamente pela lei, o que também não se verifica na situação em análise, conforme foi decidido no supracitado Acórdão.
3.4. Por outro lado, embora na parte inicial do mencionado n.° 4 do art.º 6.° do Dec. Regul. N.° 15/96 se aluda aos "poderes das entidades de controlo de nível superior", a contestada decisão também não pode ser revogada no âmbito do recurso tutelar, por não existir norma expressa nem competência revogatória, ao abrigo do art.º 177.°, n.° 2, 1.ª parte, do supracitado Código.
3.5. Na sequência do que explicitámos, opinamos no sentido de que o presente recurso administrativo deve ser rejeitado, pelo facto de o acto impugnado não ser susceptível daquele, de harmonia com o art.º 173.°, al. b), do CPA." - vd. pgs 5 a 9 que se dão por inteiramente reproduzidas.
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- Na sequência do aludido parecer a Autoridade Recorrida proferiu o despacho ora recorrido, datado de 17.7.01: "Concordo. Com os fundamentos do presente parecer, rejeito o recurso" (fls. 5 dos autos).
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2. O DIREITO A única questão que se nos coloca, neste recurso, é a de saber se o despacho impugnado, proferido em 17/7/01 pelo então Ministro do Trabalho e da Solidariedade - actualmente Ministro do Trabalho e da Segurança Social - que, com fundamento no Parecer 200/DSJ/2001, parcialmente transcrito no probatório, rejeitou o recurso hierárquico interposto pelo Recorrente da decisão do Gestor do Programa Pessoa, que aprovando o pedido de pagamento de saldo, no âmbito do referenciado processo, reduziu o financiamento que lhe fora atribuído, é recorrível.
Trata-se de questão amplamente debatida na nossa jurisprudência, em que se formaram duas correntes de sentido oposto.
Uma, para a qual, em síntese, resulta do quadro legal regulador do II Quadro Comunitário de Apoio (QCA II) a atribuição ao Ministro do Trabalho da gestão global desse Quadro, conferindo-lhe poderes de controlo e de supervisão sobre os actos dos gestores de programas, gestores esses que, contudo, não estão inseridos na cadeia hierárquica do ministério, pelo que também não estabelecendo a lei qualquer recurso hierárquico (impróprio) ou tutelar, as suas decisões se apresentam directamente impugnáveis contenciosamente.
Neste sentido decidiram, entre outros, os acórdãos da 1.ª Secção deste STA de 8/2/01, 22/11/01, 14/3/02, 28/5/02 e 1/7/02, proferidos nos recursos n.ºs 45 919, 47 306, 48 235, 48 040 e 905/02, respectivamente.
Outra, para a qual o Gestor está inserido na cadeia hierárquica do Ministério do Trabalho e não é detentor de competência exclusiva, pelo que os seus actos não são directamente recorríveis, antes deles havendo recurso hierárquico necessário para o referido ministro.
Neste sentido decidiram, entre outros, os acórdãos da Secção de 8/2/00, 15/6/00, 31/1/01, 9/10/02 e 16/10/02, proferidos nos recursos n.ºs 45 413, 45 749, 45 917, 48 011 e 48 382, respectivamente.
Esta última corrente acabou por receber consagração no Pleno da Secção, tendo todos os acórdãos sobre a matéria tirados até ao momento decido neste sentido (cfr. os acórdãos de 15/10/02, 19/2/03, e de 4/6/03 proferidos nos recursos n.ºs 45 917, 45 794, 41 749 e 48 235 - os dois últimos ambos de 4/6/03 - respectivamente).
Por se nos afigurar a mais consistente e com ela concordarmos inteiramente, a ela aderimos, tendo, no acórdão da Subsecção de 3/6/2003, proferido no recurso n.º 1 181/02, no qual fomos relator, sustentado a nossa posição na transcrição, nas partes úteis, do referido acórdão do Pleno de 15/10/02, que, de modo profundo, desenvolvido e esclarecedor, sustenta, a nosso ver, de forma inatacável, a posição avançada.
E porque as alegações do recorrente, pese embora o meritório esforço nelas desenvolvido, nos não convencem a mudar de posição e por as posições nelas sustentadas estarem devidamente tratadas no referido acórdão do Pleno, iremos adoptar o mesmo procedimento, reiterando as...
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