Acórdão nº 01717/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Dezembro de 2003

Magistrado ResponsávelJORGE DE SOUSA
Data da Resolução17 de Dezembro de 2003
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1 - A... interpõe no Tribunal Central Administrativo recurso contencioso do despacho de 11-04-2001, do SENHOR SECRETÁRIO DE ESTADO DO ENSINO SUPERIOR que, negando provimento a recurso hierárquico, confirmou o despacho de 9-01-2001, da Senhora Presidente do Instituto Politécnico de Setúbal, que lhe aplicou a pena disciplinar de suspensão por 180 dias.

O Tribunal Central Administrativo negou provimento ao recurso.

Inconformado o recorrente interpôs o presente recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, apresentando alegações com as seguintes conclusões: 1. O aresto em recurso enferma da nulidade prevista na alínea c) do nº 1 do art. 668º do CPC por haver uma total contradição entre os fundamentos de facto - dos quais não resulta provado que o recorrente tenha praticado qualquer comportamento, designadamente aquela por que fora punido - e a decisão alcançada - que confirma a legalidade do acto punitivo por o recorrente ter adoptado uma conduta violadora dos seus deveres disciplinares.

Acresce que, 2. O aresto em recurso enferma de claro erro de julgamento ao não ter julgado procedente o vicio de violação do direito fundamental à tutela judicial efectiva - v. art. 268º/4 da CRP - por as partes terem sido notificadas para apresentarem alegações sem antes ter sido elaborada a base instrutória e sem permitir às partes apresentarem os meios probatórios que entendessem convenientes à defesa da sua posição, tendo aplicado uma norma inconstitucional - o art. 12º/1 da LPTA - incorrendo numa omissão que determina a nulidade de todo o processado posterior à apresentação da resposta.

  1. O aresto em recurso enferma de erro de julgamento ao não julgar procedente o vicio de nulidade insuprível por diminuição das garantias de defesa do arguido consagradas no nº 3 do art. 269º da Constituição e no art. 42º do ED, porquanto, - não foi inquirida uma das testemunhas arroladas pelo arguido no processo disciplinar, pelo que enferma o mesmo de nulidade insuprível (v. Acºs do STA de 16/04/70, AD 103/1090, de 26/07/73, AD 143/1533, de 28/02/80, AD 224.225/978, de 10/03/80, AD 262/1131, de 14/11/89, Rec. nº 26064 e de 8/11/89, AD 347/1332), tanto mais que o nº 5 do art. 61º do ED apenas permite a não audição de uma testemunha quando o instrutor considere suficientemente provados os factos alegados pelo arguido (o que não sucedeu no caso sub judice, conforme resulta do facto de ter havido a aplicação de uma sanção disciplinar) - foi produzida prova posteriormente à apresentação da resposta à nota de culpa sem que se tenha permitido ao recorrente pronunciar-se sobre a mesma, designadamente sobre os depoimentos prestados, violando-se assim o princípio do contraditório (v. Acºs do STA de 18/3/88, AD 365/557 e de 1275/88, AD 328/439).

  2. O aresto em recurso enferma de erro de julgamento ao não ter julgado procedente a violação do princípio da legalidade e do disposto no art. 31º/1/g do ED, uma vez que estamos perante uma acumulação de infracções não discriminada nem provada.

  3. Em Tribunal não se efectuou qualquer prova que permitisse concluir que o recorrente praticara os factos de que fora acusado, pelo que, por força do princípio da presunção da inocência, deveria o aresto em recurso ter anulado o acto recorrido com fundamento em erro nos pressupostos.

  4. O aresto em recurso enferma de erro de julgamento ao não ter anulado o acto recorrido por violação do princípio da proporcionalidade das penas consagrado no art. 28º do DL 24/84.

    Acresce que, 7. O aresto em recurso enferma de erro de julgamento ao não ter anulado o acto impugnado por preterição do princípio da audiência dos interessados, uma vez que o cumprimento deste princípio é igualmente obrigatório em sede disciplinar (não se estando perante qualquer das situações mencionadas no art. 103º do CPA), devendo, consequentemente, a Administração ouvir o particular sobre o teor da nota de culpa e, posteriormente, sobre a proposta de decisão final constante do relatório final (v., neste sentido FREITAS DO AMARAL, "O Novo Código de Procedimento Administrativo" INA. 1992, pág. 26 e ESTEVES DE OLIVEIRA e OUTROS " Código de Procedimento Administrativo, pág. 523;, PEDRO MACHETE, ob. cit., e o Acº do STA de 01/03/92, AD 399/253). E, por fim, 8. O aresto em recurso enferma de erro de julgamento ao não considerar procedente o vicio de falta de fundamentação por terem sido violados os arts. 124º e 125º do CPA, uma vez que o acto recorrido não se encontra fundamentado em conformidade com o imposto pelos arts. 124º e 125º do CPA.

    Nestes termos, Deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, revogado o Acórdão de 9/1/2003.

    A Autoridade Recorrida contra-alegou, concluindo da seguinte forma: 1.O douto Acórdão recorrido enuncia, nos termos do artigo 651.º, n.º 2, do Código do Processo Civil e 57º da LPTA, os factos apurados (fls. 93 a 100), conhecendo em separado de cada um dos vícios apontados pelo Recorrente e referindo apenas factos, argumentos ou fundamentos susceptíveis de justificar a improcedência do recurso: não incorre, por isso, em contradição entre os fundamentos e a decisão.

  5. O Douto Acórdão recorrido não aplicou o artigo 12º da LPTA, nem impediu o Recorrente de produzir as provas que eventualmente pretendesse, apenas decidiu que o vicio suscitada pelo Recorrente nas alegações oferecidas nos termos do artigo 67º do RSTA, a ser procedente, constituiria nulidade, que teria de ser arguida, para poder ser conhecida, nos termos gerais, o que não sucedeu.

  6. A falta da inquirição de uma testemunha de defesa que não compareceu na data marcada para a sua audição, nem justificou a falta, e a não notificação do arguido para se pronunciar sobre o depoimento das testemunhas por ele indicadas não ofende o disposto no artigo 269º, nº. 3, da Constituição, nem no artigo 42º do ED.

  7. No acto objecto do douto Acórdão recorrido são mencionados os factos objecto dos dois processos disciplinares instaurados ao Recorrente - o segundo quando o primeiro apenas aguardava a aplicação de eventual punição - como inequivocamente resulta da leitura do Relatório elaborado no segundo processo, que dá por integralmente reproduzido o relatório da primeiro.

  8. Encontram-se juntos aos autos os processos administrativos nos quais se provaram os actos imputados ao Recorrente, pressuposto da pena que lhe foi aplicada, pelo que não se pode dizer que nenhuma prova foi produzida.

  9. O Acórdão recorrido também nenhuma censura merece ao não julgar procedente a violação do princípio da proporcionalidade das penas, consagrado no artigo 28º do citado DL 24/84, assacada pelo Recorrente ao acto dele objecto.

  10. No procedimento disciplinar, a defesa do arguido equivale à sua audiência (cf. n.º 9 do artigo 61º do ED), não sendo exigível que seja novamente ouvido sobre o projecto de decisão, salvo se, após o oferecimento da defesa, a administração carrear novas provas para o processo, o que não sucedeu.

  11. O acto sobre cuja legalidade o Acórdão recorrido se pronunciou foi fundamentado de forma clara, completa e concisa, permitindo a um destinatário normal entender perfeitamente o seu sentido e, designadamente, as razões que levaram à aplicação de uma pena ao Recorrente, pelo que, 9. O douto Acórdão sob recurso nenhuma censura merece, devendo o recurso ser julgado improcedente e a decisão integralmente confirmada, só assim se fazendo a costumada JUSTIÇA O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer manifestando concordância com a sentença recorrida.

    Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

    2 - No acórdão recorrido deu-se como assente a seguinte matéria de facto: A - Por despacho da Srª. Presidente do Instituto Politécnico de Setúbal, de 30.11.99, nos termos do art. 50º do ED, aprovado pelo DL 24/84, de 16 de Janeiro, na sequência de participação formulada, foi instaurado processo disciplinar ao ora recorrente, professor-adjunto da Escola Superior Tecnologia e Gestão do Instituto Politécnico de Setúbal.

    B - Nomeado Instrutor, foi autuado o processo disciplinar, e concluída a fase instrutória foi deduzida a seguinte acusação: «Concluída a fase instrutória dos presentes autos de processo disciplinar e face à matéria apurada, em artigos de acusação contra o senhor Professor A... professor-adjunto da Escola Superior Tecnologia e Gestão do Instituto Politécnico de Setúbal, articulo, nos termos e ao abrigo do disposto no nº 2 do artigo 57º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local (EDFAACRL), os seguintes factos: 1º O arguido é professor adjunto da Escola Superior de Ciências Empresariais do Instituto Politécnico de Setúbal, estando integrado no grupo disciplinar de "Métodos Quantitativos" de que é coordenador, designado pelo Conselho Científico, o senhor professor B....

    1. A esse mesmo grupo disciplinar pertencem, também, as assistentes Drs C..., D... e E... .

    2. Enquanto coordenador do Grupo Disciplinar, o Prof. B... exerce a gestão operacional dos recursos humanos afectos ao aludido grupo, pessoal docente incluído, sendo, neste sentido e para efeitos da distribuição e coordenação do serviço inerente às disciplinas que compõem o grupo, superior hierárquico do pessoal docente respectivo.

    3. No dia 3 de Setembro de 1999, o coordenador, Professor B..., convocou uma reunião, à qual esteve presente, para além dele próprio, o arguido e as antes aludidas assistentes.

    4. Nessa reunião, que se destinou a distribuição de serviço, o senhor coordenador apresentou o documento, cuja cópia se encontra a fls. 23 dos presentes autos, que continha a distribuição de serviço relativo à elaboração dos testes de Matemática e Estatística I.

    5. Designadamente, aí se determinou que o arguido e as assistentes Dras. C..., D... e E... se deveriam reunir, no dia 07/09/99, para, em conjunto, elaborarem os acima mencionados testes de Matemática e Estatística I.

    6. Mais se destinava que o arguido...

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