Acórdão nº 01005/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Outubro de 2003
Magistrado Responsável | RUI BOTELHO |
Data da Resolução | 02 de Outubro de 2003 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I Relatório A..., SA, e ..., Lda, com melhor identificação nos autos , vêm recorrer da decisão do TAC do Porto, de 20.12.02, que rejeitou o recurso contencioso da deliberação, de 10.4.01, da Comissão do Concurso para atribuição de licenças para extracção de inertes no rio Tejo, aberto pela Direcção-regional do Ambiente e do Ordenamento do Território de Lisboa e Vale do Tejo.
Na alegação que apresentou formulou as seguintes conclusões: l.
O presente recurso circunscreve-se à questão de determinar se o acto do qual as Recorrentes interpuseram o recurso na 1.ª Instância era recorrível directamente (o que se defendeu e ainda defende) ou se, ao invés, e como considerou o Tribunal "a quo", era obrigatório esgotar a via hierárquica dentro do órgão recorrido.
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Esta teoria da não definitividade (vertical, claro) do acto de exclusão das Recorrentes do concurso, suportada no artigo 18° do Programa de Concurso, cremos, em primeiro lugar, que parte de uma errónea interpretação desta disposição.
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O artigo em causa estabelece o seguinte: "Apenas das deliberações da comissão que decidam reclamações dos concorrentes ou seus representantes cabe recurso necessário para a Directora da DRAOT /LVT" .
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Entendeu o Tribunal "a quo" (cfr. fls. 3 da douta sentença) que "De tal normativo resulta claro que pressuposto necessário da utilização de ulterior recurso contencioso pelos interessados de quaisquer deliberações da comissão de avaliação de propostas é a apresentação de reclamação por parte dos concorrentes, que deve ter lugar no próprio acto público e a posterior interposição de recurso hierárquico para a Directora da DRAOT /LVT das decisões da comissão sobre as reclamações apresentadas" .
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Desde logo, e do ponto de vista literal, não comporta a referida norma tal entendimento, parecendo-nos suficientemente claro que a ideia que a mesma pretende transmitir é a de que o recurso (hierárquico) necessário só existe quando a comissão decide pela segunda vez, o que faz todo o sentido, pois é razoável submeter à decisão de um órgão superior a segunda decisão do órgão inferior.
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Tal basta para afastar a antiga ideia da necessidade do acto definitivo vertical como condição necessária para o recurso contencioso e a que o Tribunal "a quo" se refere implicitamente quando afirma (cfr. fls. 3) que "Na verdade, o entendimento defendido pelas ora recorrentes de que em face do citado art. 18° do Programa de Concurso nenhum concorrente está obrigado a reclamar para a comissão de uma sua deliberação desfavorável, podendo, se não quiser reclamar, interpor logo recurso contencioso, não tem o mínimo de suporte na citada norma e contraria princípios elementares da teoria do acto administrativo".
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O conceito, hoje - mas já plasmado no artigo 268°, n° 4, da C.R.P. desde a revisão de 1989 - prende-se mais com a eficácia externa do acto da Administração, ou seja, com os efeitos que tal acto produz junto do particular.
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Este entendimento não parte só da doutrina, mas também da jurisprudência (cfr., por exemplo, o Ac. do STA- 1a Secção - de 12.12.1996, proc. n° 40330, onde se refere no n° I do sumário que" A partir da revisão constitucional de 1989 a recorribi1idade contenciosa dos actos administrativos passou a aferir-se através da sua idoneidade para lesarem direitos ou interesses", in Cadernos de Justiça Administrativa, n° 8, pág. 13).
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Quanto aos actos praticados num procedimento administrativo, a nível jurisprudencial a orientação dominante vai no sentido da sua recorribilidade imediata, apontando-se, por exemplo, o Ac. do STA de 03.12.1998, proc. n° 41377, onde se afirma que "O acto de exclusão de um concorrente num concurso de empreitada de obras públicas, é acto destacável, lesivo de direitos ou interesses legalmente protegidos e, consequentemente, imediatamente recorrível".
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Acresce, ainda, que no domínio do D.L. n° 197/99, de 08.06 (aplicado subsidiariamente pela Comissão à resolução de todas as questões que se suscitaram antes e durante os concursos), as reclamações para a Comissão das suas deliberações desfavoráveis deixaram de ser obrigatórias (cfr. artigos 98° a 104°), bem como os posteriores recursos hierárquicos, que passaram a ser todos facultativos ( cfr. artigos 180° a 189°).
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Não se diga, ainda, como o fez a douta sentença recorrida (cfr. fls. 5 e 6), que o D.L. n° 197/99, de 08.06 não é aplicável ao caso em apreço, antes regulando-se a actividade de extracção de inertes pelo D.L. n° 46/94, de 22.02 (isto é verdade mas apenas quanto ao modo de exercer esta actividade), pois se é certo que não é directamente aplicável, pelo menos foi utilizado pela Recorrida em todo o procedimento subsidiariamente, pois os actos públicos de abertura de documentos, propostas, sua suspensão, prestação de esclarecimentos, etc., decorreram em estrita obediência ao diploma em causa (cfr., por exemplo, a acta que constitui o acto recorrido ou o Programa de Concurso).
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Em face do exposto, resulta bem explícito que seja por uma deficiente interpretação do artigo 18° do Programa de Concurso, seja pela opinião dominante da doutrina e da jurisprudência, seja pela solução legal do D.L. n° 197/99, de 08.06...
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