Acórdão nº 045169 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Dezembro de 2002

Magistrado ResponsávelJORGE DE SOUSA
Data da Resolução04 de Dezembro de 2002
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1 - B.... interpôs recurso contencioso de anulação da Portaria Conjunta n.º 424/99 (2.ª Série) do Senhor Primeiro-Ministro e do Senhor Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e Pescas de 09/04/99, publicada no Diário da República, II Série, de 27-4-99, na parte em que mandou reverter apenas a favor de C... a área de 500,7500 ha do prédio rústico HERDADE DE ... com a consequente derrogação da Portaria n.º 740/75 de 13 de Dezembro, na parte em que expropriou aquela Herdade.

Por falecimento do Recorrente, o processo prossegue com os seus herdeiros.

O Recorrente imputou ao acto recorrido vícios de violação de lei.

As autoridades recorridas responderam, afirmando que o acto recorrido não enferma dos vícios que o Recorrente lhe imputa.

A recorrida particular, C..., contestou, suscitando as excepções dilatórias do caso julgado, formado sobre um acórdão do Pleno deste Supremo Tribunal Administrativo de 9-7-97, e da irrecorribilidade do acto recorrido, por ser meramente confirmativo ou de execução do despacho do Senhor Secretário de Estado da Alimentação de 27-4-90 e do despacho do Senhor Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e Pescas de 22-3-99. Para além disso, esta recorrida particular defendeu que o acto recorrido não enferma dos vícios que o Recorrente lhe imputa.

O Recorrente respondeu, defendendo que devem ser julgadas improcedentes as excepções deduzidas pela recorrida particular.

O Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público emitiu doutor parecer, em que defende que não se verifica qualquer das excepções referidas, pelas seguintes razões, em suma: - Quanto à excepção do caso julgado, não se verifica a identidade de sujeitos nem de objecto exigíveis pelo art. 498.º do C.P.C.; Na verdade, no recurso n.º 28598 impugnou-se um despacho proferido pelo Senhor Secretário de Estado da Alimentação datado de 27-4-90 que atribuiu unicamente à recorrida particular C... a totalidade da reserva de 91.000 pontos do prédio Herdade do ..., reserva essa estabelecida por reversão, face à Lei n.º 109/88, de 26 de Setembro; Neste processo impugna-se o despacho proferido em 23-3-99 pelo Senhor Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e Pescas que originou a Portaria n.º 424/99, de 9-4-99, em que se discute o direito de reversão da aludida propriedade, por força da Lei n.º 86/95, de 1 de Setembro; - O acto agora impugnado não é de execução do despacho proferido pelo Senhor Secretário de Estado da Alimentação de 27-4-95, uma vez que tratando-se de um acto novo, distinto e inovador relativo ao direito de reversão, não vem desenvolver nem disciplinar o anterior.

Os actos de execução, no ensinamento do Prof. MARCELLO CAETANO em Manual de Direito Administrativo, 10.º edição, página 447, são «actos administrativos praticados em consequência necessária da definição de situações jurídicas constantes de outro acto administrativo anterior», não revestindo tal característica o acto recorrido.

Em alegações, o Recorrente apresentou as seguintes conclusões: 1 - A portaria recorrida ao atribuir exclusivamente à recorrida particular a área objecto da reversão, partiu do pressuposto de que na partilha dos bens do casal tinha sido adjudicado à recorrida particular o crédito a liquidar pelo Estado proveniente da expropriação da área de 1013,8548 ha do prédio rústico ....

2 - Na partilha dos bens do casal foi tão só partilhado o valor de Esc: 9.270.700$00 correspondente à indemnização atribuída pelo Estado pela expropriação da referida área expropriada.

3 - Esse mesmo valor não ficou a pertencer à recorrida particular, como valor resultante da partilha dos bens do casal, mas destinou-se exclusivamente e integralmente ao pagamento das dívidas do casal, sendo além do referido valor, as dívidas suportadas por ambos em partes iguais.

4 - As entidades recorridas enganaram-se quanto a estes factos, com base nos quais praticaram o acto Administrativo recorrido.

5 - Este erro de pressupostos integra vício de violação de Lei nos termos do art. 135º do C.P.A, e violou o art. 3º nº 1 b) da Lei 199/88 de 31/05, e determina a anulabilidade do acto.

6 - A área revertida foi expropriada a D..., pai do recorrente pela portaria 740/75 de 13/12.

7 - O recorrente exerceu o direito de reversão previsto na Lei da Reforma Agrária.

8 - A reversão tem efeitos retroactivos e restabelece o direito de propriedade tal como ele existia à data da expropriação.

9 - Na data de expropriação o prédio pertencia como bem comum ao casal, recorrente e recorrida particular.

10 - A portaria recorrida ao atribuir a área objecto da reversão exclusivamente à recorrida particular, vai impedir o restabelecimento da propriedade com efeitos retroactivos à data da expropriação.

11 - Violou assim o acto recorrido o disposto no art. 44º nº l do Decreto-lei 86/95 de 01/09, o art. 961º do C.C., os arts. 5º e 7º do Código das Expropriações e o art. 11º do Decreto Regulamentar 44/88 de 14/02.

12 - Encontra-se pendente no Tribunal da Comarca de Penamacor a acção em que são partes recorrente e recorrida particular e que tem por objecto decidir sobre o alcance e partilha da verba de Esc. 9.270.700$00 correspondente ao valor atribuído pelo Estado como indemnização pela expropriação da área do prédio excedentário à reserva.

13 - Só após decidido o direito de cada uma das partes na aludida acção, se procederá à partilha desses direitos no Tribunal Comum e em processo especial de inventário, nomeadamente a área devolvida por reserva, por reversão e bem assim os direitos indemnizatórios atribuídos pelo Estado pela privação do uso e fruição dessas áreas art. 3º nº 1 b) da Lei 199/99 de 31/05.

14 - A área da reserva, a área de reversão e bem assim a indemnização ainda a atribuir pelo Estado ao abrigo da citada disposição legal não foram partilhadas pelo casal.

15 - Ao atribuir exclusivamente à recorrida particular a área objecto da reversão, as entidades recorridas pelo acto impugnado estão a intrometerem-se nas atribuições do poder judicial, a quem compete decidir do alcance e partilha dos bens do casal.

16 - Com o despacho recorrido as entidades recorridas estão a proceder ilegalmente à partilha da área de reversão atribuindo-a em benefício exclusivo a uma das partes, a recorrida particular.

17 - O despacho recorrido conjunto do Sr. Primeiro Ministro e do Sr. Ministro da Agricultura, por não ter actuado dentro dos limites das funções que cabem à Administração, violou o art. 266º da Constituição da República, sendo assim inconstitucional.

18 - A portaria recorrida violou ainda o disposto no art 133º n.º 2 a) do C.P.A. e os arts. 1326º, 1327º, 1354º, 1373º e 1374º do C.P.C.

Termos em que a portaria recorrida deverá ser declarada nula ou anulável na parte em que atribuiu exclusivamente à recorrida particular a área de reversão.

O Senhor Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e Pescas apresentou contra-alegações, a que aderiu o Senhor Primeiro-Ministro, com as seguintes conclusões: 1 - A Portaria recorrida observou e respeitou o acordo de partilhas do recorrente e recorrida particular, homologado por sentença judicial transitada em julgado.

2 - Pronunciando-se sobre o sentido e o alcance desse acordo, na parte em que este dispõe sobre o prédio rústico denominado "Herdade de ..." e a intervenção do Estado sobre ele, o douto acórdão de 09.07.97 do Pleno da Secção do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no recurso nº 28598, considerou que a atribuição à recorrida particular da reserva inicialmente demarcada nos termos da Lei nº 77/77 e do crédito a liquidar sobre o Estado proveniente da expropriação tem o alcance de transferência para o património desta de todos os direitos dessa natureza emergentes da aplicação das leis sobre Reforma Agrária.

3 - A Portaria recorrida, ao proceder à reversão da área expropriada do prédio "Herdade de ..." a favor da recorrida particular, seguiu o entendimento do douto acórdão de 09.07.97 citado.

4 - Tendo sido adjudicados na partilha a totalidade dos direitos sobre o prédio rústico "Herdade de ...", emergentes da aplicação das leis sobre Reforma Agrária, à recorrida particular, a esta tinha também de ser atribuída a reversão do mencionado prédio por ser um desses direitos previstos na Lei nº 86/95, de 1 de Setembro.

5 - A decisão recorrida contida da Portaria impugnada foi tomada no âmbito e dentro dos limites de função administrativa.

6 - A Portaria recorrida não enferma dos vícios de que vem arguida improcedendo, assim, todas as conclusões das alegações do recorrente.

Termos em que deve ser negado provimento ao recurso com as legais consequências.

A recorrida particular apresentou alegações com as seguintes conclusões: 1 - O acto recorrido constitui um acto meramente confirmativo ou de execução do despacho do Senhor Secretário de Estado da Alimentação, de 90.04.27, e do despacho do Senhor Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, de 99.03.22, pelo que deverá ser rejeitado por este venerando Supremo Tribunal (v. art. 25º da LPTA).

2 - Pela partilha acordada entre o recorrente e a ora recorrida particular aquando do seu divórcio, homologada judicialmente, ficou afecto a esta todos os direitos correspondentes ao prédio "...", pelo que o acto recorrido não padece do vício de erro nos pressupostos de facto alegado nas conclusões 1ª a 5ª e 13ª e 14ª das alegações do recorrente.

3 - São também totalmente improcedentes as conclusões 6ª a 11ª das alegações do recorrente, pois, além de não ser aplicável ao caso concreto o instituto da reversão previsto no art. 5º do Código das Expropriações, o titular do novo direito de reversão conferido pela portaria sub judice não tem necessariamente de coincidir com o proprietário do prédio à data da expropriação.

4 - É ainda improcedente o vício de usurpação de poderes invocado pelo recorrente nas conclusões 15ª a 17ª das alegações, uma vez que as entidades recorridas, limitaram-se a...

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