Acórdão nº 0962B/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 27 de Novembro de 2002

Magistrado ResponsávelANTÓNIO PIMPÃO
Data da Resolução27 de Novembro de 2002
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da 2ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: 1. O ERFP recorre do acórdão do TCA de fls. 96 a 109 que negou provimento ao recurso interposto pela FP, concedeu provimento ao recurso do impugnante, revogou a sentença recorrida e julgou a impugnação procedente com anulação da liquidação para o Pleno deste STA por oposição com o acórdão do mesmo TCA de 5-12-2000, Rec. 4236/00 (fls. 123 e seguintes).

A decisão de fls. 139 entendeu que se verifica a oposição invocada pela recorrente pelo que ordenou que se notificasse a recorrente para alegar nos termos do artº 282º 3 do CPCivil.

Não apresentado a recorrente alegações foi proferido o despacho de fls.140 com o seguinte teor: "Constando nos autos as alegações da recorrente FP (fls. 113 e seguintes), subam os autos ao ... STA".

Estas alegações apresentam as seguintes conclusões: 1. Com a aprovação e entrada em vigor do DL nº 202/96 de 23 de Out. modificaram-se os critérios de "incapacidade relevante" para efeito de reconhecimento de benefícios fiscais, nomeadamente os previstos no art.44º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF).

  1. Releva, agora, apenas, a incapacidade residual, ou seja, o coeficiente de (in)capacidade correspondente à disfunção residual, após a aplicação de meios de correcção, sem limites máximos de redução dos coeficientes previstos na TNI (alínea e) do nº 15 do Anexo I ao DL nº 202/96.

  2. Para efeitos de IRS o ano fiscal coincide com o ano civil (art. 134º do CIRS) 4. Em sede de IRS "a situação pessoal e familiar dos sujeitos passivos relevante para efeitos de tributação é aquela que se verificar no último dia do ano a que o imposto respeite "(ART.14º nº 7 do CIRS).

  3. Porque ninguém faz futurologia, nenhum atestado médico com data anterior a 31 de Dez pode certificar a situação pessoal do sujeito passivo àquela data.

  4. De qualquer modo o atestado apresentado pelo sujeito passivo não faz qualquer referencia à natureza, residual ou não, da incapacidade nele atestada, única que, actualmente releva (alínea e) do nº 5 do Anexo I ao DL nº 202/96.

  5. O que não retira qualquer validade intrínseca e objectiva ao atestado, validade essa que em abstracto, ou, eventualmente, para outros efeitos, se não contesta, ou alguma vez contestou.

  6. Só que, dizendo menos do que a Administração Fiscal pretende e tem o direito de saber e o dever de confirmar, não pode servir para confirmação da veracidade dos pressupostos do benefício em causa (art.6º do EBF e 122º do CIRS).

  7. Porque a AF tem o direito e o dever de fiscalizar e o sujeito passivo o dever de obediência ao "princípio da iniciativa dos interessados" consignado no art. 14º do EBF e nomeadamente na alínea c) do nº 1 de acordo com o qual deverá fazer prova da verificação dos pressupostos de reconhecimento dos benefícios".

  8. E tem, ainda o sujeito passivo de IRS o dever de colaboração (arts 123º e 124º alínea c), parte final do CIRS), também ele infringido.

  9. Da conjugação do disposto nos art. 14º nº 7 do CIRS e alínea e) do nº 5 do Anexo I ao DL nº 202/96 resulta que não está em causa, nem nunca esteve, qualquer aplicação retroactiva do DL nº 202/96, que, aliás fixa a própria data da sua entrada em vigor, (30 de Nov. de 1996) que é anterior à do termo do ano fiscal respectivo (31 de Dez. de 1996).

  10. Este diploma aplica-se, no entanto, com as devidas adaptações, aos processos de avaliação de incapacidade em curso, o que significa que se não aplica aos já terminados.

  11. É, pois, evidente que todos os atestados médicos emitidos antes da entrada em vigor do DL nº 202/96 não dependem da observância do mesmo para serem válidos e legalmente perfeitos, se tiverem observado as disposições legais em vigor à data da respectiva emissão.

  12. O que lhes não confere, no entanto, eficácia para prova da verificação dos pressupostos do benefício previsto no art. 44º do EBF, porque para tanto se exige que reflictam a situação médica dos beneficiários a 31 de DEZ.

  13. Os atestados médicos, só por si, não são senão a tradução escrita do resultado de um acto médico de observação objectiva num dado momento ( e não em qualquer outro) e não conferem quaisquer direitos, muito embora possam ser um elemento essencial para o seu reconhecimento, como é o caso.

  14. Assim, ninguém pode falar de direitos adquiridos "pelo atestado médico". A estado médico de todos nós é, por natureza, permanentemente mutável. E, por isso, nada pode ser adquirido nessa sede.

  15. Como se não pode falar, igualmente, de direitos adquiridos em sede de benefícios fiscais nomeadamente em sede de impostos anuais como é o IRS.

  16. A este propósito recorde-se que a regra geral em sede de benefícios fiscais foi sempre a da transitoriedade dos mesmos e o seu carácter excepcional, consagrado, aliás, na sua própria definição contida no nº 1 do art. 2º do EBF ("consideram-se benefícios fiscais as medidas de carácter excepcional....").

  17. Regra esta que A Lei Geral Tributária, aprovada pelo DL nº298/98 de 17 de Dez., apenas confirmou, tendo mesmo o legislador tido o cuidado de o realçar no respectivo preâmbulo, com as seguintes palavras: " a consagração da regra geral da transitoriedade dos benefícios fiscais, sujeitando-os a uma avaliação periódica visando impedir a sua transformação em verdadeiros privilégios fiscais.".

  18. É irrelevante discutir se se está perante um beneficio fiscal automático (que, aliás, não é o previsto no art. 44º do EBF) ou perante um beneficio de reconhecimento meramente declarativo, como é o caso, pois no caso concreto o reconhecimento do beneficio está, sempre, dependente da verificação dos respectivos pressupostos, o que no caso sub judice, não se verificou.

  19. O Acórdão recorrido fez errada interpretação dos factos e errada interpretação e aplicação das seguintes disposições legais; DL nº 202/96 de 23 de Out., nomeadamente do disposto na alínea c) do nº 5 do seu Anexo I), arts. , 11º 14º nº 1, alínea c) e 44º do Estatuto dos Benefícios Fiscais aprovado pelo DL nº215/89 de 01 de Jul. e ainda dos arts. 14º nº 7 e 66º nº 4 do CIRS.

    Nas mesmas alegações consta a fls. 113 sob a designação: "A - Da contradição de Acórdãos Os Acórdãos recorrido e fundamento apreciam situações de facto rigorosamente idênticas.

    Ambos os Acórdãos foram proferidos na vigência dos artigos 25º, nº 3 e 80º, nº 6 do CIRS e 44º do EBF e DL nº 202/96, de 23 de Outubro.

    As disposições legais aplicáveis quer num quer noutro acórdão e objecto de análise e interpretação são, por isso, rigorosamente as mesmas.

    Estão em causa a interpretação e aplicação do art. 44º do EBF, a definição de incapacidade relevante para efeito do mesmo, a validade de atestado médico nos termos em que ele foi emitido, o poder ou não da administração fiscal de exigir novo atestado para prova da incapacidade.

    A questão fundamental de direito subjacente em ambos os acórdãos foi a de saber se a A. Fiscal, ao proceder ao acto tributário de liquidação de IRS, não considerando, para efeitos fiscais, o grau de deficiência atribuído aos impugnantes através de atestado médico, ao abrigo de normativo em vigor ao tempo do atestado, enferma ou não de ilegalidade.

    Pelo que o Pleno da Secção deverá considerar que se verifica a alegada oposição de acórdãos, mandando prosseguir o recurso".

    1.2. A recorrida não apresentou alegações.

    1.3. O EMMP entende que o recurso merece provimento de acordo com jurisprudência que identifica.

  20. O acórdão recorrido de fls. 96 e seguintes partiu da matéria factual estabelecida a fls. 98 que aqui se dá por reproduzida.

    3.1. Entendeu-se, sumariamente, que ocorre oposição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento (fls. 139).

    Reafirma-se a existência da identidade da questão de direito e da situação de facto pois que o acórdão recorrido apreciou-se o acto tributário da liquidação do IRS do ano de 1996 e no fundamento o do ano de 1996 tendo os recorrentes invocada a qualidade de deficientes com uma incapacidade superior a 60%, comprovada em ambos os casos por atestado médico emitido em data anterior àquele ano de 1996.

    Tais atestados foram, em qualquer das situações, seguidos de instruções internas dos serviços de saúde e do Fisco, a comunicar novos critérios de avaliação de incapacidade bem como do Decreto-Lei nº 202/96 e seguidas de igual exigência de apresentação nos serviços fiscais de novo atestado médico com o mesmo fundamento de revogação dos critérios de avaliação que precederam aquelas instruções.

    Igualmente foi efectuada liquidação oficiosa com base na não apresentação de novo atestado médico, ao abrigo dos aludidos novos critérios de avaliação de incapacidade.

    Os acórdãos recorrido e fundamento adoptaram soluções opostas em cada um dos casos, face a idêntica questão jurídica, aos mesmos pressupostos factuais e no domínio do mesmo regime jurídico pois que aquele levou à procedência da impugnação da liquidação de IRS de 1996 enquanto que este levou improcedência da impugnação da liquidação de IRS de 1996.

    Existindo identidade da questão de direito e de facto conclui-se que têm, por isso, as decisões proferidas nos ditos acórdãos sentidos divergentes pelo que existe a referida oposição.

    3.2. O acórdão recorrido e fundamento apreciaram as impugnadas liquidações de IRS, referente aos anos de 1996, tomando em consideração os questionados benefícios fiscais concedidos aos deficientes com hipovisão.

    Os impugnantes apresentaram as respectivas declarações de rendimentos de 1996, para efeitos de IRS, tendo invocado que possuíam uma incapacidade permanente superior a 60% para os efeitos do artº 44ºdo EBF e apresentado atestados reportados a 1995 e porque não apresentaram novo atestado, à luz dos critérios vigentes em sede de avaliação, que lhe permitisse beneficiar do disposto no artº 44º do Estatuto dos Benefícios...

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