Acórdão nº 0307/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Novembro de 2002

Magistrado ResponsávelJOÃO BELCHIOR
Data da Resolução12 de Novembro de 2002
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo (STA): I. RELATÓRIO A..., com os demais sinais dos autos, recorre da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo do Círculo do Porto (TAC) que relativamente ao recurso contencioso de anulação que ali interpôs contra o despacho (A.C.I.) do Vereador do Pelouro de Obras e Urbanismo da Câmara Municipal de Caminha (E.R.), de 21.11.96, julgou: improcedente o vício de "desvio de poder ou usurpação de poder" e que ocorria a excepção de caducidade do direito ao recurso contencioso por extemporaneidade na sua interposição relativamente aos demais vícios.

Não se conformando a recorrente contenciosa com tal decisão, dela interpôs o presente recurso jurisdicional.

Alegando, formulou as conclusões seguintes:

  1. Uma licença de loteamento não pode conferir direitos de propriedade ou dominiais a ninguém (a começar pela entidade licenciadora) à custa de terceiros: é que a operação de loteamento culmina numa simples autorização administrativa, cujos efeitos estão tipificados na lei, e através da qual, designadamente, o proprietário de um prédio obtém um fraccionamento e uma alteração do uso do respectivo solo, no sentido de nos lotes obtidos com a divisão se poderem vir a construir dois ou mais edifícios para habitação, comércio ou indústria.

B) A propriedade (pública ou privada) só se adquire, e assim é dito no artº 1316º do Código Civil, "por contrato, sucessão por morte, usucapião, ocupação, acessão e demais modos previstos na lei." (como é o caso da expropriação, também prevista, aliás no artº. 1308º. do mesmo Código) - e nunca por efeito de uma autorização administrativa processada inter alies.

C) A transferência de certas parcelas do terreno a lotear para o domínio público municipal prevista no Regime Jurídico dos Loteamentos Urbanos (destinadas a bainhas de estacionamento, passeios, arruamentos, espaços verdes, etc. ), é um efeito jurídico do loteamento circunscrito, por definição, ao prédio loteado, e que só é oponível, naturalmente, ao próprio proprietário/loteador e aos seus sucessores (no caso, os adquirentes dos lotes, ora recorridos particulares).

D) Um alvará de loteamento não pode ser interpretado, nunca poderia ser interpretado, no sentido de apresentar tais poder e alcance - e isto é uma evidência, mesmo para leigos em assuntos jurídicos, que só por ostensiva má-fé pode ser ignorada.

E) Um acto que acolha uma tal interpretação da licença de loteamento, como sucede com o acto ora impugnado, no sentido de lhe atribuir os referidos efeito ou intenção (de transferência unilateral para o domínio público, sem o devido processo expropriatório, - regulado no Código das Expropriações - de um bem imóvel propriedade de um terceiro alheio ao processo de loteamento), está ferido de nulidade, por implicar uma lesão do conteúdo essencial do direito de propriedade (consagrado no artº. 62º. CRP) do titular do terreno confiscado (cfr. artº.133º, nº2, al. d) do CPA).

F) O Vereador do Pelouro de Obras e Urbanismo da Câmara Municipal de Caminha, ao indeferir o pedido de licenciamento de construção de vedação com rede plastificada, não se limitou a exercer a sua competência administrativa na matéria em causa; G) Na verdade, com a prática do acto administrativo recorrido foram claramente excedidos e ultrapassados os limites decorrentes das suas atribuições.

H) Com efeito, a autoridade recorrida, ao fazer tábua rasa da presunção de veracidade de registo da propriedade atempadamente entregue pela recorrente à autoridade recorrida, conforme consta do processo administrativo, ou do seu valor probatório, contrariando-a através de um acto de autoridade "da sua lavra", nada mais fez do que se substituir (ou se sobrepor) a outras autoridades com distintas atribuições: na...

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