Acórdão nº 0100/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Setembro de 2002

Magistrado ResponsávelBENJAMIM RODRIGUES
Data da Resolução25 de Setembro de 2002
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A - O relatório 1. A FAZENDA PÚBLICA, dizendo-se inconformada com o acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo, de 25/09/2001, o qual concedeu provimento ao recurso interposto pela impugnante A..., identificada nos autos, da sentença do Tribunal Tributário de 1ª instância de Viana do Castelo, de 31/01/2000, e julgou procedente a impugnação, anulando o acto de liquidação do IRS relativo ao ano de 1996, sentença esta que, ao contrário, havia julgado improcedente a mesma impugnação judicial, dele recorre directamente para esta formação judicial, alegando estar o decidido em oposição com o decidido em outros acórdãos do STA e do TCA, nomeadamente, com o proferido por este tribunal em 05/12/2000, no proc. n.º 4236/00, que escolheu para acórdão fundamento, sobre questões de facto e de direito idênticas, ocorridas sob o domínio da mesma legislação.

  1. Pelo despacho do relator de fls. 123 e segs. dos autos, e por a ter por evidente, foi decidido julgar verificada a oposição de acórdãos e ordenar o prosseguimento do recurso.

  2. Alegou, então, a recorrente Fazenda Pública sobre o mérito da causa, defendendo a doutrina seguida no acórdão fundamento e pedindo a revogação do acórdão recorrido e a improcedência da impugnação, com base nas razões que levou à seguinte síntese conclusiva: "a) Os benefícios fiscais têm de reportar-se à situação pessoal e familiar do contribuinte em 31 de Dezembro de cada ano civil.

    1. A prova exigida por lei para gozo do respectivo benefício fiscal deve ter em conta a data de 31 de Dezembro do ano anterior.

    2. O DL. n.º 206/96, de 23/10, entrou em vigor em 30/11/96 por força do que à data de 31 de Dezembro de 1996 se encontravam fixados os critérios de avaliação de incapacidade para o ano de 1996 e anos subsequentes.

    3. Só a aplicação do DL. n.º 206/96, de 23/10, a todos os processos de incapacidade salvaguarda o princípio constitucional da igualdade.

    4. É requisito essencial para que a incapacidade seja atendível relativamente ao IRS de 1996 e anos subsequentes a apresentação pelo contribuinte perante a AF de prova da sua incapacidade de acordo com as normas do DL. n.º 206/96.

    Termos em que deverá o presente recurso ser considerado procedente, revogando-se o acórdão recorrido por não ter feito a interpretação mais correcta da aplicação do Decreto-Lei n.º 206/96, de 23/10 - art.º 7º n.º 2, art.ºs 25º e 80º do CIRS e 44º do EBF e acolhendo-se a interpretação consagrada no douto acórdão de 05.12.2000, recurso 4236/00 TCA, julgando-se improcedente a impugnação".

  3. A recorrida não contra-alegou.

  4. O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido do provimento do recurso por adesão á tese seguida em numerosos casos idênticos, como os acórdãos do Pleno de 6/3/2002, tirados nos proc.ºs n.ºs 25 536, 26 011 e 26 169.

    B - A fundamentação 6. O reexame da questão preliminar O despacho do relator proferido a fls. 123 e segs. dos autos julgou verificada a existência de oposição de julgados e ordenou o prosseguimento do recurso.

    É de manter o julgamento então feito sobre a verificação dos requisitos deste recurso por oposição de julgados a que aludem as alíneas b) e b') do art.º 30º do ETAF, na redacção que lhe foi dada pelo DL. n.º 229/96, de 29/11.

    Na verdade, é evidente a antinomia de decisões relativas a idênticas questões de facto e de direito: enquanto o acórdão recorrido, a propósito do beneficio fiscal concedido nos art.ºs 25º e 80º do CIRS e 44º do EBF, entendeu que a incapacidade de 60% fiscalmente relevante para auferir de tal benefício não estava sujeita, relativamente aos rendimentos do ano de 1996, ao critério de determinação estabelecido pelo DL. n.º 202/96, de 23/10, valendo a determinação feita ao abrigo apenas da TNI aprovada pelo DL. n.º 341/93, de 30/9, determinação essa que constava do documento médico que foi exibido para prova da deficiência, e que a administração fiscal não poderia exigir a apresentação de um atestado médico em que essa incapacidade fosse apurada segundo os critérios por si veiculados segundo os quais apenas interessava para aquele efeito fiscal a incapacidade residual ou existente após a correcção, e em consequência de uma tal interpretação concedeu provimento ao recurso, revogou a sentença da 1ª instância que julgara improcedente a impugnação judicial e julgou-a agora procedente, - ao contrário, o acórdão fundamento entendeu exactamente, no quadro da mesma legislação e relativamente aos rendimentos sujeitos a IRS do ano de 1996, que a posição da administração fiscal de relevar fiscalmente tão só a incapacidade existente após a correcção era legítima como legítima era a exigência por ela feita da apresentação de documento médico comprovativo que fosse emitido com observância de tal sentido normativo, tendo em decorrência de uma tal interpretação legal negar provimento ao recurso interposto da sentença de 1ª instância que julgara improcedente a impugnação judicial.

  5. O quadro de facto Por não controvertida e não haver lugar à sua alteração, dá-se aqui por assente a matéria de facto nos termos em que a mesma foi fixada pelo tribunal recorrido nos termos dos art.ºs 713º n.º 6, 726º, 749º e 762º n.º 1 do CPC.

  6. O mérito do recurso.

    8.1. A questão básica trazida para conhecimento deste Pleno tem tido, quer na Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo, quer no seu Pleno, uma resposta largamente maioritária no sentido que foi seguido, aliás, pelo acórdão fundamento (Para além dos acórdãos do Pleno referidos pelo Ex.mo Procurador-Geral Adjunto no seu parecer, pode-se identificar ainda o acórdão de 27/06/2001, proferido no proc. n.º 25 693, e o de 06/03/2002, tirado no proc. n.º 25 714.).

    É essa jurisprudência que aqui se renova, pela aquisição dos termos que lhe deram expressão no referido acórdão de 06/03/2002, tirado no proc. n.º 25 714.

    Disse-se, então, aí o seguinte: «A questão nuclear trazida para conhecimento deste Pleno tem que ver com a definição do regime legal de determinação do grau de invalidez permanente que há-de ser devidamente comprovado pela entidade competente, igual ou superior a 60% que constitui pressuposto legal da elevação dos limites de deduções ao rendimento de trabalho (art.º 25º n.º 3), da elevação dos limites de deduções à colecta (art.º 80º n.º 6) e da concessão dos benefícios fiscais previstos no art.º 44º n.º 5 do Estatuto dos Benefícios Fiscais, em sede de IRS, regime esse referido ao tempo posterior ao início de vigência do DL. n.º 202/96, de 23 de Outubro.

    Não há dúvida de que estamos perante benefícios fiscais, na acepção que deles nos dá o art.º 2º n.ºs 1 e 2 do Estatuto dos Benefícios Fiscais (Este artigo nos seus n.ºs 1 e 2 diz o seguinte: «1 - Consideram-se benefícios fiscais as medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem.

    2 - São benefícios fiscais as isenções, as reduções de taxas, as deduções à matéria colectável e à colecta, as amortizações e reintegrações aceleradas e outras medidas fiscais que obedeçam às características enunciadas no número anterior.

    3-....

    4-... ».), cuja concessão, prevista desde o início de vigência do CIRS, encontra o seu fundamento nas razões de justiça social de "propiciar às pessoas com deficiência a sua plena participação na comunidade" que a nossa Constituição, desde a sua versão original, manda prosseguir com os cidadãos deficientes (art.º 71º) (No desenvolvimento deste preceito constitucional o art.º 25º da Lei n.º 9/89, de 2 de Maio, prescreve que: "O sistema fiscal deve consagrar benefícios que possibilitem às pessoas com deficiência a sua plena participação na comunidade".).

    Tratam-se de benefícios fiscais estruturais, pois a modelação da estrutura do tipo de imposto a que dizem respeito, e em que impedem o nascimento da obrigação tributária com o seu conteúdo normal, encontra-se feita tendo em conta a possibilidade da sua existência subjectiva.

    Ora, decorre dessa estrutura do imposto sobre o rendimento sobre as pessoas singulares, em cuja construção/definição as citadas normas que prevêem os referidos benefícios participam, que a sua existência real está aí indissociadamente ligada à ocorrência objectiva dos factos tributários cujos efeitos constitutivos da obrigação tributária impedem ou conformam. O direito aos mesmos, de acordo com o disposto no art.º 11º do EBF, reporta-se à data da verificação dos respectivos pressupostos e, por seu lado, estes estão referidos ao momento em que se consome o facto tributário.

    É por referência ao rendimento anual que foi tomado pelo legislador do tipo de imposto como correspondente à unidade temporal e periódica de sujeição à tributação ou, dito de outro modo, que foi elegido dentro do devir contínuo do tempo como facto tributário típico do imposto sobre o rendimento, que se encontram reportados os pressupostos de cuja verificação depende a existência dos benefícios fiscais aqui em causa. Enquanto não acontecem historicamente os factos previstos na lei como fonte da obrigação de imposto, também não se coloca, de acordo com as normas que os prevêem, a questão da existência do direito aos benefícios fiscais em causa, pois os pressupostos dessa existência estão assumidos pela lei apenas para produzir os seus efeitos se o facto tributário existir com a dimensão quântica que apele à sua intervenção jurídica.

    Nesta medida, a questão da existência concreta do beneficio apenas se coloca quando e se existirem os factos tributários cujos efeitos constitutivos da obrigação de imposto modelam negativamente.

    A elevação em 50%, em relação ao limite estabelecido no n.º 1 do art.º 25º do CIRS, da dedução aos rendimentos brutos da categoria A, que o n.º 3 do mesmo artigo contempla só existe, à face do preceito, desde que existam os rendimentos da fonte económica considerada (categoria A)...

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