Acórdão nº 048438 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Julho de 2002

Magistrado ResponsávelJOÃO BELCHIOR
Data da Resolução09 de Julho de 2002
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo I - Relatório A..., com os demais sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal do despacho do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna (E.R) de 28 de Novembro de 2001, que lhe indeferiu o pedido de concessão de autorização extraordinária de residência formulado ao abrigo do art.º 88.º do Decreto-Lei 244/98, de 8 de Agosto.

Imputa ao acto contenciosamente impugnado (A.C.I.) vícios de forma e de violação de lei.

Notificada a E.R para responder, sustentou a legalidade do acto recorrido.

Foram os intervenientes processuais notificados para produzirem alegações.

Disse então o recorrente que mantinha o invocado em sede de p.i., para ali remetendo, sede em que havia formulado as seguintes conclusões: 1. O recorrente entrou e reside ininterruptamente em Portugal desde o ano de 1997, tendo formulado, a 25 de Abril de 2000, competente pedido de concessão de autorização de residência, ao abrigo do artigo 88º. do Decreto-Lei n.º 244/98, de 08 de Agosto, o qual viria a ser autuado sob o n.º 6333/2000 (doc. 1).

  1. No decurso do mês de Dezembro de 2001, foi o recorrente notificado da decisão de indeferimento, por despacho de Sua Excelência o Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna (doc. 2).

  2. Acontece que o recorrente não se conforma com esta decisão pois considera que a sua situação é de reconhecido interesse nacional, verificando-se, cumulativamente, razões humanitárias e como tal integrando-se na previsão normativa do actual artigo 88.º do Decreto-Lei n.º 244/98, de 08 de Agosto, com as alterações do Decreto-Lei n.º 4/2001, de 10 de Janeiro.

  3. Com efeito, a permanência do recorrente em Portugal não contraria, de forma alguma, o interesse nacional, na medida em que é auto-suficiente, possui as necessárias condições de habitabilidade e uma razoável estabilidade sócio-económica, que apenas será completa caso o recorrente seja autorizado a residir em Portugal.

  4. O acto recorrido viola o preceituado no artigo 88.º do Decreto-Lei n.º 244/98, de 08 de Agosto, com as alterações do Decreto-Lei n.º 4/2001, de 10 de Janeiro, pois o interesse nacional deve ser entendido, como algo que seja bom para o Estado, enquanto colectividade com múltiplos fins.

  5. O artigo 88.º do Decreto-Lei n.º 244/98, de 08 de Agosto, com as alterações do Decreto-Lei n.º 4/2001, de 10 de Janeiro, deve ser interpretado extensivamente, pois deve entender-se que, o nosso ordenamento jurídico-constitucional recebe directamente, através do artigo 16.º da C.R.P., os Princípios e as normas da Declaração Universal dos Direitos do Homem, nomeadamente o seu artigo 13.º, onde se proclama a liberdade de circulação dentro e fora de um Estado, nomeadamente, a liberdade para emigrar, a qual implica que os Estados mais desenvolvidos não façam uma interpretação restritiva das leis de imigração.

  6. Face ao que antecede, não se deve recusar uma autorização de residência a um requerente que vem de um país que não tem condições para lhe assegurar um mínimo de condições de vida.

  7. Recusar um pedido de residência a alguém nestas circunstâncias, equivale a negar-lhe a oportunidade para fugir à miséria, a qual é uma das mais terríveis violações à dignidade humana.

  8. Entendimento consagrado pelo actual artigo 88.º do Decreto-Lei n.º 244/98, de 08 de Agosto, com as alterações do Decreto-Lei n.º 4/2001, de 10 de Janeiro, onde se estabelece que a Autorização de Residência pode ser concedida por razões humanitárias, sendo certo que a situação do recorrente enquadra-se na previsão normativa da supracitada disposição legal.

  9. Com efeito, se a Administração não aceitar o pedido de residência formulado pelo ora recorrente, violará o preceituado no artigo 4.º do C.P.A., pois não pode negar ao recorrente, que se encontra em Portugal desde 1997 a trabalhar e que tem neste país toda a sua vida organizada e estabilizada, o direito de aqui permanecer, sobretudo quando, em situações semelhantes, tem concedido esse direito a outros cidadãos estrangeiros.

  10. Deste modo é forçoso concluir que o acto administrativo em recurso enferma do vício de violação de lei.

  11. Por outro lado, a fundamentação do indeferimento do pedido de concessão de autorização de residência constante do despacho recorrido não pode deixar de equiparar-se à falta de fundamentação, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 125.º do Código do Procedimento Administrativo, uma vez que os fundamentos adoptados são obscuros e manifestamente insuficientes, que deixam por esclarecer concretamente a motivação do acto.

  12. Na verdade, do acto recorrido não se retira, quais os elementos probatórios, qual o raciocínio lógico que o motivaram.

  13. Pelo que, o acto recorrido enferma igualmente do vício de forma, o qual consiste na falta de fundamentação, violando o preceituado no n.º 1 do artigo 125.º do C.P.A., no n.º 1 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 256-A/77 e n.º 3 do artigo 267.º da C.R.P..

  14. A Administração deve abster-se do recurso a critérios subjectivos na fundamentação do acto, uma vez que se encontra posta em causa a garantia consagrada no n.º 3 do artigo 268.º da C.R.P. e nos artigos 124.º e 125.º do C.P.A..

    A entidade recorrida contra-alegou, apresentando as conclusões seguintes: 1) É manifesto que o Recorrente não reúne os requisitos para beneficiar do disposto no artigo 88.º do Decreto-Lei n.º 244/98, de 8 de Agosto, na redacção do Decreto-Lei n.º 4/2001 , de 10 de Janeiro, e que o despacho recorrido não padece de vício de violação de lei nem ofende: os artigos 16.º, e 268.º da CRP; os artigos 4.º, 124.º e 125.º do CPA; o artigo 1.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 256-A/77, de 17 de Junho; os princípios previstos no artigo 13.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem; 2) Tendo o Recorrente invocado factos pelos quais se demonstra que se está perante interesses meramente individuais, não se encontravam preenchidos os pressupostos de facto de aplicação do regime excepcional consagrado no artigo 88.º do Decreto-Lei n.º 244/98, de 8 de Agosto, na redacção do Decreto-Lei n.º 4/2001, de 10 de Janeiro; 3) Não ocorreu a alegada ofensa dos princípios consignados no artigo 4.º do CPA e no artigo 13.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem; a violação destes princípios só pode ocorrer nos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT