Acórdão nº 045686 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Maio de 2002
Magistrado Responsável | ANTÓNIO MADUREIRA |
Data da Resolução | 21 de Maio de 2002 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1. RELATÓRIO: A..., devidamente identificado nos autos, interpôs, no TCA, recurso contencioso de anulação do despacho do Ministro da Administração Interna de 7/5/98, que determinou a sua dispensa de serviço da GNR, ao abrigo do n.º 4 do artigo 94.º do Decreto-Lei n.º 231/93, de 26 de Junho (LOGNR), conjugado com o n.º 3 do artigo 75.º do Decreto-Lei n.º 265/93, de 31 de Julho (EM/GNR), imputando-lhe os vícios de violação de lei decorrentes da inconstitucionalidade orgânica e material dos referidos preceitos legais e dos princípios da igualdade e da proporcionalidade.
Por acórdão de 1/7/99, foi negado provimento ao recurso.
Com ele se não conformando, interpôs o recorrente o presente recurso jurisdicional, em cujas alegações defendeu, em síntese: - Os diplomas em causa foram produzidos pelo Governo, com base em competência legislativa originária, mas os preceitos questionados respeitam a matéria da competência, com reserva relativa, da Assembleia da República (artigo 168.º, n.º 1, alíneas b), d) e v) da C.R.P., na redacção em vigor ao tempo), pelo que são organicamente inconstitucionais.
- O Governo inovou relativamente às normas constantes dos Decretos-Lei n.ºs 333/83, 465/83 e 142/77, sendo que os dois primeiros foram decretados sem a indispensável autorização da Assembleia da República, nos termos da Constituição então vigente.
- O processo de dispensa de serviço, ao afectar a carreira profissional e a situação funcional dos militares da GNR, tem a natureza de um processo sancionatório e a dispensa, em si, assume a natureza de uma pena expulsiva.
- Essa medida está ainda integrada no âmbito do regime da função pública e respeita aos direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores, consubstanciando um despedimento que atenta contra a segurança no emprego, que lhe garante o artigo 53.º da Constituição.
- A ruptura do vínculo do emprego tem de ser fundada em justa causa, apurada em processo disciplinar integralmente assegurador das garantias de defesa dos arguidos, quer na P.S.P, quer para a totalidade dos trabalhadores da função pública ou do sector privado, pelo que a dispensa feita através do processo de dispensa de serviço viola esse princípio de defesa e o princípio da igualdade.
- No caso sub judice foram também violados os princípios da proporcionalidade e da igualdade, porquanto não se vislumbra como possa um "desvio moral" relativo à sua vida privada afectar o apreço público da corporação e exigir o termo do seu vínculo funcional de emprego, não tendo, em casos de muito maior gravidade, sido aplicada medida tão gravosa.
- Ao assim não decidir, o acórdão recorrido fez errónea aplicação dos artigos 13.º, 18.º, n.ºs 1, 2 e 3, 168.º, n.º 1, alíneas b), d) e v) e 277.º, n.º 1 da C.R.P., na versão em vigor ao tempo.
Contra-alegou o recorrido, defendendo a bondade do julgado, por, em síntese: - Quer o artigo 94.º do Decreto-Lei n.º 231/93, de 26 de Junho (LOGNR), quer o artigo 75.º do Decreto-Lei n.º 265/93, de 31 de Julho (EM/GNR), estabelecerem uma medida estatutária de dispensa de serviço, e não uma sanção disciplinar, não respeitando a matéria da competência da Assembleia da República, pelo que não sofrem de inconstitucionalidade orgânica; - Não violam os princípios da segurança no emprego nem o da igualdade, pelo que também não são materialmente inconstitucionais.
E isto porque não colhe o argumento não inovatório desta regulamentação, na medida em que o Decreto-Lei n.º 142/77 (RDM) não previa a medida estatutária da dispensa de serviço (a dispensa de serviço nele prevista era apenas uma recompensa concedida às praças pelo seu comportamento e consistia na dispensa de formaturas e de serviços com duração de 24 horas), mas sim a da separação de serviço, que era seguramente uma pena disciplinar e os Decretos-Lei n.ºs 333/83 e 465/83 foram também eles emitidos sem autorização legislativa.
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FUNDAMENTAÇÃO: A matéria de facto dada como provada não foi impugnada, nem há fundamentos para a alterar oficiosamente, pelo que se dá por reproduzida ( art.º 713.º, n.º 6 do C.P.C.).
Dela resulta que o recorrente foi dispensado do serviço pelo despacho recorrido por, em síntese, ter efectuado uma gravação vídeo, enquanto mantinha relações sexuais com uma sua cunhada, com quem mantinha uma relação extra-conjugal de há longa data, imagens essas que largamente divulgou no meio em que se inseria, sem o consentimento da ofendida, que, perante factos devassadores da sua vida privada, se sentiu humilhada e ultrajada. Algumas dessas pessoas a quem foram mostradas tais imagens, entre as quais se encontravam elementos do sexo feminino, verificando "tratar-se de corpos nus" e por uma questão de pudor, recusaram-se a continuar o seu visionamento. A conduta do recorrente provocou na área onde residia, S. Vicente, Madeira, a consternação generalizada, quer contra si, quer contra a instituição que servia e desvirtuou os requisitos morais e éticos que lhe eram exigidos pela sua qualidade e função, revelando o seu acto ser incompatível com a...
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