Acórdão nº 047809 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Fevereiro de 2002

Magistrado ResponsávelJ SIMÕES DE OLIVEIRA
Data da Resolução20 de Fevereiro de 2002
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, 3ª Subsecção: -I- A... e mulher recorrem da sentença do T.A.C. do Porto que julgou improcedente acção de indemnização por responsabilidade civil extra-contratual que intentaram contra o Hospital Distrital de Vila Nova de Famalicão, absolvendo o Réu do pedido.

Os recorrentes são os pais da menor B..., falecida em 27.5.94 em consequência de meningococcemia fulminante, e a causa de pedir da acção o diagnóstico tardio da doença e a falta de assistência médica e medicamentosa durante o internamento no referido hospital, que ocorreu na madrugada desse dia.

Segundo a sentença, a improcedência da acção ficou a dever-se a não se ter provado a existência de nexo causal entre a conduta omissiva e culposa do Réu (que se julgou ter havido) e o resultado da morte da vítima.

Inconformados, os recorrentes elaboraram as suas alegações, nas quais enunciam as seguintes conclusões: 1 - "Doente, a B..., foi entregue aos cuidados dos Serviços de Urgência do Hospital R. especificadamente aos cuidados e responsabilidade da Dr.ª C...; 2 - Pela referida Dr.ª C..., não foi diagnosticada a doença, que medicou uma meningococemia fulminante, como se tratasse uma simples constipação; 3 - Para além de não diagnosticar a doença (não obstante o quadro já evidente à hora de chegada, às 02-00M de 27/5/94 e explosivo às 05H-00M) entendeu internar a doente para Observações; 4 - Mas manteve a doente até às 08H-00M da manhã votada ao mais completo abandono, sem qualquer espécie de assistência médica ou medicamentosa; 5 - Todo o comportamento da Dr.ª C... aponta para um crime de homicídio por negligência (aguarda-se o final do processo crime cujos termos decorrem); 6 - Não obstante a partir das 08H-00M outro médico do Hospital R. ter iniciado as diligências que se impunham a fim de tentar salvar a doente, não o conseguiu; 7 - As diligência concretizadas já o não foram atempadamente; 8 - A terem sido atempadamente concretizadas a B... estaria ainda hoje entre nós; 9 - E não está. Não está por culpa da Dr.ª C... que por omissão levou a tal resultado; 10 - Há efectivamente nexo de causalidade entre o comportamento da Dr.ª C..., médica do R., e a morte da B... (dano correspondente), tivesse a Dr.ª C... sido diligente, cuidadosa e interessada e teria actuado de acordo com as boas artes médicas e a B... estaria viva; 11 - Pelo que deve o R. ser condenado no pagamento aos AA. da indemnização de 20.100.537$00 peticionada bem como nos respectivos juros a contar da data da citação; 12 - A, aliás douta, sentença recorrida violou o disposto nos arts. 514º do Cód. Proc. Civil e artº. 483º, 486º, 487º, 495º, 496º, 501º e 562º, todos do Cód. Civil".

O recorrido contra-alegou, defendendo a manutenção da sentença, pelas razões que sintetizou nas seguintes conclusões: 1 - "Os factos provados são só os constantes da douta decisão.

2 - A médica, nos serviços de urgência, viu a doente, às 3 horas da manhã, 3,30 horas da manhã (meia hora após) ; às 4 horas (meia hora depois) às 4,30 a doente foi vista por enfermeiro.

Só às 8 horas a Mãe da doente, que ficou no Hospital, disse à médica (a quando da visita dela à doente) que sua filha tinha, agora, outras "manchas", diferentes das iniciais.

3 - E do exame então feito logo se desencadeou outro tipo de actuação conforme à situação: - chamado outro médico; - internamento da doente na pediatria; - recolha de sangue e urina para análises (pois o laboratório hospitalar iniciou o serviço às 9 horas); - transferência da doente para o Porto, acompanhada de médico e de enfermeiro.

Eram 9,30 horas.

4 - Nada mais se podia fazer. A doença era e é fulminante.

Só às 8 horas se reuniram elementos para um perfeito diagnóstico.

Até essa hora esse diagnóstico era impossível.

5 - O dano, a morte da criança, não tem qualquer ligação nem deriva de qualquer negligência, acto lícito, ilícito, culposo ou não da médica que assistiu à doente.

6 - Nem as queixas apresentadas podiam fazer supor aquele tipo de doença fulminante".

O Ministério Público é de parecer que o recurso não merece provimento O processo foi aos vistos legais, cumprindo agora decidir.

- II - A sentença considerou provados os seguintes factos: 1. B... faleceu em 27.MAI.94, pelas 11h30, com sete anos de idade, vítima de meningococcemia fulminante no Hospital de S. João do Porto e era filha dos AA.; 2. Quando a menor foi transportada ao Hospital de V. N. Famalicão, foi recebida no respectivo Serviço de Urgência pela Dr.ª C..., cerca das 02H00 do dia 27.MAI.94, a qual a mandou despir e indagou junto da A. mulher, sua mãe, pelo seu estado; 3. Com o funeral da sua filha os AA. despenderam a quantia de 200 720$00 (roupa inclusive); 4. A vitima era uma filha extremosa dedicando grande amor aos seus pais; 5. Do mesmo modo, os AA. eram muito amigos da sua filha, a quem dedicavam muito amor e carinho; 6. A morte da B... causou aos AA. um profundo desgosto e uma grande tristeza.

7. Como a filha dos AA. B... sentisse dores na perna esquerda, apresentasse uma temperatura situada entre os 39,5º e os 41º e tivesse umas manchas vermelhas no abdómen e no pescoço, os AA., após as 02H00 do dia 27.MAI.94, transportaram-na ao Hospital de V. N. de Famalicão; 8. Durante a viagem, a menor vomitou; 9. Quando a menor foi transportada ao Hospital de V. N. Famalicão, foi recebida no respectivo Serviço de Urgência pela Dr.ª C..., cerca das 03H00 do dia 27.MAI.94, a qual a mandou despir e indagou junto da A. mulher, sua mãe, pelo seu estado; 10. Na ocasião, mediante solicitação da Dr.ª C..., a A. mulher narrou tudo o que ocorrera com a menor na véspera; 11. Nessa altura, a Dr.ª C... introduziu um supositório marca "Benuron 500mg" na menor; 12. Nesse momento, a A. mulher chamou a atenção da Dr.ª C... para a circunstância da menor apresentar manchas de côr de "sangue" ao longo do corpo; 13. Mais esclareceu que tinha esfregado a menor com "Nifloril" questionando se a existência das manchas se deveria a tal circunstância; 14. Perante essas dúvidas, a Dr.ª C... elucidou a A. mulher no sentido das manchas se deverem a "sarna" ou a qualquer outra alergia; 15. De seguida a Dr.ª C... observou os ouvidos, a boca e a garganta da menor, tendo constatado que a criança apresentava a garganta com coloração avermelhada; 16. Mais determinou que esperassem durante meia hora a fim de se aguardar pela descida da temperatura da menor; 17. Nesse momento a A. mulher interpelou aquela médica quanto a saber que tipo de exames e de análises iriam fazer à sua filha, tendo a Dr.ª C... respondido que somente pela manhã se iria indagar pela necessidade de tal; 18. Na ocasião, eram cerca de...

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