Acórdão nº 2779/07.0TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Junho de 2011

Magistrado ResponsávelGONÇALVES ROCHA
Data da Resolução30 de Junho de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

1--- AA, SA, anteriormente designada por BB, SA, instaurou, em 16 de Julho de 2007, acção declarativa com processo comum, contra CC, pedindo a sua condenação no pagamento da importância de € 40 000,00 (quarenta mil euros), acrescida de juros de mora vencidos desde a interpelação para pagamento e que à data da propositura da acção ascendiam a € 460,00 (quatrocentos e sessenta euros), bem como dos juros vincendos até integral pagamento; pediu ainda que o R seja condenado a restituir-lhe a importância de € 675,00 (seiscentos e setenta e cinco euros), que lhe foi entregue a título de fundo de maneio e € 32,98 (trinta e dois euros e noventa e oito euros) a título de ajudas de custo que recebeu em excesso, quantias acrescidas de juros de mora à taxa legal, sendo, a final, o crédito da autora compensado com as remunerações a que o réu tem direito por efeito da cessação do contrato de trabalho, no montante líquido de € 2793,29 (dois mil setecentos e noventa e três euros e vinte e nove cêntimos).

Para fundamentar a sua pretensão, alegou, em síntese, que: - o réu foi admitido ao seu serviço a 11 de Junho de 2005 para exercer as funções de oficial piloto; - no entanto, em 16 de Fevereiro de 2005, autora e réu haviam outorgado um contrato de formação profissional e promessa de contrato a termo certo, mediante o qual lhe foi dada formação, incluindo voo assistido em linha (voo de largada), obrigando-se este a exercer a actividade profissional resultante da formação ministrada, durante um período mínimo de três anos a contar da data da outorga do contrato de trabalho; - mais foi acordado que em caso de recusa ou impossibilidade por parte do réu da celebração do contrato de trabalho, este arcava com o encargo de indemnizar a autora pelos encargos decorrentes do curso de formação profissional ministrado; - acontece que a 12 de Março de 2007, o réu unilateralmente denunciou o contrato que o ligava à autora, passando a trabalhar para a DD, SA, colocando à disposição desta os conhecimentos adquiridos naquele curso de formação, pelo que tem de indemnizar a A no montante que foi acordado.

Realizada a audiência de partes e não tendo esta derivado em conciliação, foi ordenada a notificação do réu para contestar, o que fez, concluindo pela procedência da excepção de ilegitimidade que invocou, com a consequente absolvição da instância ou, pela improcedência da acção e com a consequente absolvição do pedido, devendo reconhecer-se a anulabilidade do pacto de permanência, nos termos do art. 282.º do Cód. Civil, ou caso assim se não entenda, a sua nulidade por violação do disposto no art. 147.º do Cód. Trab., reconhecendo-se ainda que o réu não é devedor à autora de qualquer quantia, mas antes pelo contrário, sendo aquele que detém um crédito sobre esta no valor de € 2739,29.

Para tal alegou resumidamente que: - a autora é parte ilegítima; - limitou-se a apor a sua assinatura no contrato de formação que lhe foi apresentado pela autora não tendo tido qualquer capacidade para negociar o seu conteúdo; - o curso ministrado pela autora englobou apenas sessões de simulador e voo assistido em linha, que o habilitou a pilotar aviões AIRBUS A310-300 e A300-600, sendo certo que já antes frequentara na DD a ground school, cujo custo não foi suportado por aquela; - aquando da sua contratação pela DD esta contratou pessoal com e sem qualificação no equipamento AIRBUS; - a cláusula 5ª do contrato de formação celebrado com a autora é nula ou anulável.

Na resposta a autora pronunciou-se pela improcedências das excepções e concluiu como na petição inicial, alegando, além do mais, o facto de o contrato de formação profissional e de promessa de contrato de trabalho celebrado com o réu ter passado a integrar o contrato individual de trabalho do demandado.

O despacho saneador julgou improcedente a excepção de ilegitimidade invocada pelo réu.

Instruída e julgada a causa foi proferida sentença julgando a acção improcedente e absolvendo o réu do pedido.

Inconformada com essa decisão, da mesma interpôs a autora recurso de apelação, que julgada parcialmente procedente, revogou a sentença recorrida e condenou o réu a pagar à autora a quantia de € 11 387,71 (onze mil trezentos e oitenta e sete euros e setenta e um cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos a partir do trânsito em julgado do acórdão e até integral pagamento.

Inconformado recorreu agora o R de revista, tendo rematado a sua alegação com as seguintes conclusões: 1º - A segurança dos negócios jurídicos e a boa fé que deve nortear os mesmos, impõe que as partes e sobretudo nos contratos a termo, expressamente façam consignar no seu clausulado todas as condições que pretendem ver enxertadas, não se podendo sujeitar qualquer dos contraentes ao que expressamente não foi convencionado.

  1. - Assim, se no contrato definitivo, os promitentes não manifestaram, por forma clara e precisa, a vontade de se vincularem à celebração nos termos acordados no contrato promessa, se é duvidosa e incerta a posição por eles assumida, não será legítimo o recurso a outros meios de prova, ou a uma argumentação abrrogante, para se determinar qual foi a vontade dos contraentes, pois a lei exige, imperativamente, que logo no documento escrito fique expresso em termos inequívocos a vontade respectiva à obrigação de cumprir a promessa, o que não sucede.

  2. - O montante fixado pelas partes no pacto de permanência a que se reporta o art. 147º do CT de 2003, funciona como limite máximo da indemnização a pagar pelo trabalhador ao empregador, no caso de deixar de trabalhar para este, antes de terminado o prazo convencionado. O valor concreto da indemnização tem de corresponder ao montante das despesas extraordinárias, comprovadamente feitas pelo empregador, com a formação do trabalhador. Não tendo a entidade patronal comprovado nos autos, ter efectuado quaisquer despesas extraordinárias com essa formação, não pode o trabalhador ser condenado a pagar-lhe qualquer quantia.

  3. - Apesar de a lei consentir na celebração de pactos de permanência durante a vigência do contrato de trabalho, que visam garantir o retorno do investimento efectuado pela entidade empregadora na formação do trabalhador, impõe o art. 147º do Cód. de Trabalho à entidade patronal o ónus da prova da despesa comprovadamente realizada com o trabalhador, não tendo ficado demonstrado o quanto a Recorrente despendeu na formação em concreto do trabalhador em causa; diz ainda o dispositivo legal que o retorno do investimento deverá advir de despesa extraordinária com a formação, facto que também ficou por demonstrar 5º - A licitude daquela cláusula, depende da existência de uma despesa extraordinária, em que entidade empregadora, assume a seu custo, os encargos e despesas, com vista ao enriquecimento pessoal do trabalhador em concreto, não devendo incluir-se as despesas pagas no âmbito de um plano global de formação profissional dos trabalhadores da empresa, 6º - Devendo, ser declarada nula a cláusula quinta do Acordo de Formação, porque contrário à lei: 7º - Atentos os factos assentes e a prova documental junta aos autos, a Recorrida, sempre soube que as alegadas despesas extraordinárias decorrentes da formação ministrada, não correspondiam ao montante fixado na cláusula, no entanto, preferiu alhear-se de tal facto, onerando o Recorrente com um pacto de permanência desfasado da situação real; 8º - A prova produzida e vazada na douta sentença, impunha ainda, que o Tribunal declarasse a nulidade da cláusula penal, obtendo-se a destruição do acto inquinado, atenta a conduta da Recorrida, a falta de seriedade na declaração, a reserva mental, a sua motivação ilícita, indevidamente fixando um montante indemnizatório, que em nada corresponde à despesa realizada, 9º- O art.147º n.º1 do Cód. de Trabalho, contrariando as garantias e os direitos dos trabalhadores, mais não é que um aval do Estado concedido às entidades empregadoras, para, através de uma alegada cláusula penal, limitarem a liberdade dos trabalhadores e abusiva e unilateralmente alterarem os contratos de trabalho.

  4. - Nos autos o trabalhador manteve, até à data da rescisão do contrato, um vínculo precário com a entidade patronal, sujeitando-se [à sua] discricionariedade, caso esta pretenda resolver o mesmo vínculo.

  5. - Alheio às garantias do trabalhador, o Tribunal admite que a relação laboral seja regulada por um pacto de permanência, onde só o Recorrente, que fica obrigado ao pagamento de uma indemnização caso o viole, admitindo que a Recorrente, impeça o trabalhador de exercer o seu direito, rescindir livremente o contrato de trabalho, e aceitando que aquela, sem respeitar o dever de informação ao trabalhador, altere o termo do contrato, art. 101º n.º 1 e 98º n.º 1 al. e) do Cód. de Trabalho, agravado pelo facto de, com manifesta violação dos ditames da boa fé, obrigar o trabalhador a uma indemnização francamente excessiva, quarenta mil euros, em nada correspondentes ao valor efectivamente despendido pela recorrida na formação ministrada ao recorrente, art. 97º e 93º do Cód. de Trabalho.

  6. - Quando, ab initio, deveria o Tribunal declarar a nulidade da cláusula, não podendo considerar o advérbio de modo, comprovadamente, ínsito no texto da lei, um mero e dispensável formalismo, pondo em causa a segurança e boa fé negocial, nomeadamente o sujeito passivo, que assim se vê submetido à álea da Autora, que conscientemente fixa um valor a título de cláusula penal em nada correspondente com a situação real.

  7. - Pois, dos factos assentes e da prova documental junto...

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