Acórdão nº 00482/06.7BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 22 de Junho de 2011

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução22 de Junho de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: A… e mulher, M…, vieram interpor, a fls. 381 e seguintes, o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 06.07.2009, a fls. 366 e seguintes, pela qual foi julgada totalmente improcedente a acção administrativa comum intentada contra a Freguesia de Lordelo, A… e outros.

Invocaram para tanto que a sentença recorrida errou no julgamento da matéria de facto e no enquadramento jurídico, tendo violado o disposto nos artigos 546º nº 1 e 548º nº 2 do Código de Processo Civil, 373º nº 1, 376º, 393º nº 1, 945º nº 1 e 947º nº 1, 358º do Código Administrativo e 10º nº 3, 154º nos 1 e 2, 196º e 197º do Código do Notariado.

A freguesia de Lordelo contra-alegou defendendo a manutenção da sentença recorrida.

O Ministério Público não emitiu parecer sobre o mérito do recurso.

*Cumpre decidir já que nada a tal obsta.

*São estas as conclusões das alegações do presente recurso jurisdicional (fls.456 e seguintes) e que definem respectivo objecto: 1ª) Os AA. em resposta à junção aos autos da “declaração” referida em 14) e 20) dos factos provados disseram que tal documento é “(…) integralmente forjado e falso, que nem sequer foi assinado por todas as pessoas cujos nomes aí figuram”.

  1. ) A parte contrária não respondeu a tal arguição, o que determina que esse documento não pudesse ser atendido na causa para efeito algum, pelo que os factos referidos em 14), 15) e 20) a 24) não deveriam ter sido julgados provados, porquanto a respectiva prova se fundou unicamente naquele documento.

  2. ) O que deveria ter ficado provado relativamente ao quesito 1º da base instrutória, designadamente face à junção aos autos de uma certidão em 21/05/2007, era que “Por certidões emitidas pelo Tribunal Judicial de Guimarães, onde correm termos uns autos de inventário com o nº 4216/03.0TBGMR, apresentado pelo interveniente principal J… na qualidade de cabeça de casal, consta sob a verba nº 18 e como bem imóvel, no acervo de bens deixados pela M…, a sepultura nº 39 do sector 4 do cemitério paroquial de Lordelo” (sublinhado nosso para realçar a alteração pretendida).

  3. ) Se se entender não julgar não provados os factos referidos em 14), 15) e 20) a 24) pelos motivos acima referidos, há que ter em conta que em 20) dos factos provados diz-se que “A M… (…) subscreveram a declaração constante a fls. 99 e 100 dos autos”.

  4. ) Não é possível dar como provado que a M… subscreveu qualquer declaração, porque nem isso foi alegado - apenas foi alegado que apôs na declaração a sua impressão digital - nem, de facto, a declaração foi por ela subscrita (ver, inclusivamente, o ponto 14) dos factos provados).

  5. ) Porque não se provou qualquer intervenção da M… na subscrição do documento, não pode dar-se como provado o que consta dos pontos 21), 22) e 23) dos factos provados, dando-se como assente que ela pretendeu, ao subscrevê-lo, produzir qualquer declaração com efeitos jurídicos, quaisquer que eles fossem.

  6. ) O documento em causa não foi assinado pela M… nem por outrem a seu rogo, pelo que não tem qualquer força probatória (artigo 376º do Código33 Civil).

  7. ) Também por isso os factos referidos em 14), 15) e 20) a 24) não deveriam ter sido julgados provados, porquanto a respectiva prova se fundou unicamente naquele documento.

  8. ) Não se diga, em contrário, que foi produzida prova testemunhal no sentido da alegada doação. É que, refere o artigo 393º nº 1 do Código Civil que, se a declaração negocial (doação) por disposição da lei houver de ser reduzida a escrito (artigo 947º nº 1 do Código Civil), não é admitida prova testemunhal.

  9. ) A mãe do A. não doou a sepultura a quem quer que fosse - o documento que titula a pretensa doação (a valer como meio de prova) não foi por si subscrito e também o não foi sequer pela “donatária” (mãe da M…) como, mesmo que tivesse ocorrido uma doação, esta não podia ser válida, pois não teria preenchido a forma legalmente prescrita (artigo 947º nº 1 do Código Civil).

  10. ) O “documento” em causa não pode titular validamente qualquer doação pelas razões que sucintamente se vão referir: Em primeiro lugar, a transmissão da sepultura, sendo esta um bem imóvel, “só é válida se for celebrada por escritura pública” (artº. 947º nº 1 do Código Civil).

    Em segundo lugar, uma doação manual de imóveis não pode ser provada por testemunhas; apenas a doação manual de móveis pode ser provada por testemunhas, e mesmo assim só se for feita com tradição (Batista Lopes, Doações, pág. 45).

    Em terceiro lugar, tratando-se de transmissão de bem que ao “doador” fora cedido por concessão da Junta de Freguesia, à validade da transmissão será sempre indispensável a emissão de novo alvará em nome do adquirente (artº. 358º do Código Administrativo).

    Em quarto lugar a “doação” não foi subscrita pela “donatária” (mãe da M…), que, por isso, não aceitou a “doação”, e já não pode fazê-lo (artº. 945º nº 1 do Código Civil), o que a torna igualmente inválida.

    Com efeito, não havendo aceitação do donatário o negócio só produz efeitos após essa aceitação (Ac. STJ de 9/1/2003 in A.J. 47/48, pág. 22).

    Em quinto lugar, a “declaração” não está sequer subscrita pela alegada “doadora”, mesmo que se entendesse que a mancha parecida com uma impressão digital corresponde à de qualquer dos seus dedos, sendo, por isso, nula, nos termos do artº. 154º nº 1 e 2 do Código do Notariado (o rogo deve ser dado ou confirmado perante o notário, no próprio acto do reconhecimento, depois de lido o documento ao rogante).

    Em sexto lugar, a alegada “conferência” feita pelo 1º Cartório da Secretaria de Guimarães, a não ser um acto inteiramente falsificado, como parece, é seguramente inexistente, por não preencher o formalismo referente às menções obrigatórias estabelecidas pelo artº. 10º nº 3, 196º e 197º do Código do Notariado.

    Em suma: o “documento” em causa, tal como acima ficou dito, seja qual for o prisma por que seja encarado, é juridicamente inválido e imprestável.

  11. ) Não tendo ficado provada qualquer transmissão por acto inter vivos do uso e da fruição da sepultura, pela simples razão que não foi demonstrada qualquer manifestação válida de vontade nesse sentido exprimida pela mãe do A., pouco importa discutir-se se a Freguesia autorizou ou consentiu (expressa ou tacitamente) tal transmissão.

  12. ) A decisão recorrida viola, por isso, claramente, as normas dos artigos 546º nº 1 e 548º nº 2 do Código de Processo Civil, 373º nº 1, 376º, 393º nº 1, 945º nº 1 e 947º nº 1, 358º do Código Administrativo e 10º nº 3, 154º nos 1 e 2, 196º e 197º do Código do Notariado.

    *I – MATÉRIA DE FACTO: Os Recorrentes atacam o julgamento da matéria de facto defendendo desde logo que: os Autores em resposta à junção aos autos da “declaração” referida em 14) e 20) dos factos provados disseram que tal documento é “(…) integralmente forjado e falso, que nem sequer foi assinado por todas as pessoas cujos nomes aí figuram”; a parte contrária não respondeu a tal arguição, o que determina que esse documento não pudesse ser atendido na causa para efeito algum, pelo que os factos referidos em 14), 15) e 20) a 24) não deveriam ter sido julgados provados, face ao disposto nos artigos 546º, n.º1, e 548º, n.º2, do Código de Processo Civil (conclusões 1ª e 2ª) Ora não é verdade que os Réus e o Intervenientes não tenham dito nada sobre esta arguição dos Autores.

    Tanto os Réus A… e M…, como a Ré Freguesia do Lordelo (juntamente com a resposta ao incidente de intervenção provocada), como ainda, os Intervenientes A… e R…, nas contestações que apresentaram, disseram relativamente ao documento em causa o seguinte: “…Assim e como consta do documento junto aos autos, assinaram M…, L…, R… M… e A…, tendo a M… aposto a marca do seu dedo, por não saber assinar, como aliás fora do mesmo modo que procedeu em 1978 quando tinha adquirido a concessão da sepultura, conforme Doc. 5 junto pelo A. com a PI.

    … Assinaturas que foram conferidas na Secretaria Notarial de Guimarães, junto do 1º Cartório em 15/11/1988; ….O que confere à presente declaração um carácter autêntico.” Estas afirmações estão em clara oposição com as dos Autores pelo que não se podia considerar assente a falsidade do documento, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 546º, n.º1, e 548º, n.º2, do Código de Processo Civil.

    Por outro lado, não tendo os autores apresentado prova da sua arguição, como era seu ónus, face ao disposto no artigo 549º, n.º1, do Código de Processo Civil, temos tão-só as afirmações contraditórias das partes pelo que o teor do documento fica apenas...

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