Acórdão nº 936/07.8.TBVVD.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelMANUEL BARGADO
Data da Resolução26 de Maio de 2011
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam nesta Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I - RELATÓRIO H… , S.A.

intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma sumária, contra ANTÓNIO… , pedindo que este seja condenado a pagar-lhe a quantia de € 7.326,00 (sete mil, trezentos e vinte e seis euros), a título de danos patrimoniais.

Fundamentando a sua pretensão, alega a autora, em síntese, que no exercício da sua actividade comercial, em 8 de Março de 2001, celebrou com o réu um contrato de aluguer de veículo sem condutor, nos termos do qual veio a adquirir um veículo automóvel cuja utilização facultou ao réu, mediante o pagamento de 60 (sessenta) rendas mensais, sendo a primeira no valor de € 5.856,61, acrescido de IVA, e as restantes no valor de € 179,11, acrescido de IVA. Como o réu não pagou as rendas vencidas nos dias 15 dos meses de Fevereiro a Junho de 2004, a autora resolveu o contrato através de carta registada com aviso de recepção, datada de 8 de Julho de 2004, mas como o réu não procedeu à restituição do veículo em causa, a autora intentou uma providência cautelar no âmbito da qual logrou concretizar a respectiva apreensão e entrega.

Na data da entrega o veículo apresentava-se danificado na parte lateral esquerda, na parte lateral direita e na parte traseira, sendo que o valor de mercado daquela viatura, com uma desvalorização do uso normal, à data da sua apreensão, ascenderia a € 7.200,00 (sete mil e duzentos euros), mas em consequência dos estragos que apresentava, a autora vendeu-o apenas pelo montante de € 600,00 (seiscentos euros), e teve de suportar o valor de € 726,00 com a sua retoma.

O réu contestou, contrapondo que não entregou o veículo por ter sido interveniente num acidente de viação, no dia 7 de Novembro de 2003, quando nele circulava, tendo-o levado para as oficinas da marca para que procedessem à sua reparação, sendo que a autora teve conhecimento dessa situação, através de uma carta remetida pela companhia de seguros “Generali”, datada de 9 de Dezembro de 2003, tendo esta seguradora proposto adquirir o veículo pelo montante de € 9.500,00 (nove mil e quinhentos euros), alegando desconhecer qual o valor da indemnização que terá concretamente pago à autora, tendo o autor pago a quantia de € 6.000,00 pela sua reparação.

A autora respondeu, esclarecendo nada ter recebido daquela seguradora e concluindo como na petição inicial.

Posteriormente, já depois de designada data para a realização da audiência preliminar, apresentou o réu o “articulado” de fls. 82, qualificando o contrato celebrado entre autora e réu como um contrato de ALD a que se aplica o Decreto-Lei nº 359/91, de 21 de Setembro, que regula os contratos de crédito ao consumo, os quais devem conter a TAEG (taxa anual efectiva global) e as condições em que esta pode ser alterada, sob pena de nulidade, elementos que o contrato em apreço não contém, sendo por isso nulo O facto da nulidade poder ser invocada a todo o tempo, não significa que o possa ser em qualquer estado dos autos com desrespeito das regras processuais, pelo que a mesma devia ter sido invocada pelo réu por via de excepção, na contestação, e não em articulado superveniente, não consentido por lei. Assim, à semelhança do que sucedeu com outro requerimento apresentado pelo réu também antes da realização da audiência preliminar - no qual desenvolveu extensos argumentos em defesa da sua tese, pretendendo a ampliação da base da instrutória -, devia o articulado em causa ter sido mandada desentranhar dos autos.

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A autora respondeu, sustentando a inaplicabilidade do referido diploma legal ao contrato dos autos que é um contrato de aluguer e não de crédito.

Realizada a audiência preliminar, elaborou-se despacho saneador tabelar com subsequente enunciação da matéria de facto tida por assente e organização da pertinente base instrutória.

Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, sendo a matéria de facto controvertida decidida pela forma constante do despacho de fls. 197 a 199, sem reclamação.

Por fim, foi proferida a sentença que, julgando a acção procedente, condenou o réu a pagar à autora a quantia de € 7.326,00 a título de danos patrimoniais.

Inconformado com o decidido, recorreu o réu para esta Relação, encerrando o recurso de apelação interposto com as seguintes conclusões: «1- Os presentes autos iniciaram-se com a acção declarativa de condenação, sob a forma de processo sumário, intentada pela apelada, onde esta, tendo por base um contrato, por si denominado de „Contrato de Aluguer de Veiculo Sem Condutor”, pedia que o aqui apelante fosse condenado a pagar-lhe o montante de 7.326,00€ (sete mil trezentos e vinte e seis euros), a titulo de danos patrimoniais.

2- Porque não está o Tribunal vinculado à qualificação jurídica dada pelas partes, concluiu o Digníssimo Tribunal a quo que “Do clausulado a que as partes submeteram o contrato em apreço cremos poder reconduzi-lo à figurado “contrato de aluguer de longa duração” (ALD).

3- Invocou o aqui apelante a nulidade do contrato dos presentes autos, na medida em que entende que está em causa um contrato de crédito ao consumo sujeito à disciplina prevista pelo D.L 359/91, de 21 de Setembro, que exige que do contrato conste a TAEG (taxa anual efectiva global) e as condições em que pode ser alterada, sob pena de nulidade. Tudo conforme disposto nos arts. 2.º alínea a) e b; art. 3.º al a); art. 6.º, n.º 2 al a) e c) e art 7, n.º 1 todos do D.L 359/91, de 21 de Setembro.

4- E no caso em sub judice, do contrato celebrado entre a apelada e o apelante não consta nem a TAEG nem tão pouco as condições em que pode ser alterada.

5- Entendeu, porém, o Digníssimo Tribunal a quo que não assistia razão ao apelante na medida em que do D.L 359/91, de 21 de Setembro, “excluem-se os contratos em que uma das partes se obriga, contra retribuição, a conceder à outra o gozo temporário de uma coisa móvel de consumo duradouro, excepto se o locatário tiver o direito de adquirir a coisa locada, num prazo convencionado, eventualmente mediante o pagamento de um preço determinado ou determinável nos termos do próprio contrato (cfr. artigo 3.º alínea a))” – cfr. se pode ler na douta sentença recorrida.

6- Ora, no que tange ao disposto na primeira parte deste normativo legal vai dito que nos contratos de ALD – seguindo a qualificação jurídica atribuída pela douta sentença de que se recorre ao contrato em mérito nos autos – e como se pode até mesmo ler na douta sentença de que se recorre, “…cada uma das prestações mensais a cujo pagamento se obriga o designado locatário não é mais do que uma parcela ou fracção do montante global, previamente definido a reembolsar ao locador.

Do que se trata, portanto, não é de remunerar o locador pela concessão temporária do gozo da coisa locada, mas reembolsá-lo da quantia que adiantou na sua aquisição, acrescida dos juros remuneradores da intermediação financiadora em que, afinal se traduz a sua intervenção(…) – vide “Algumas Questões sobre o ALD, Estudos de Direito do Consumidor, n.º 3, 2001, p.310”- o sublinhado é nosso.

7- E como prossegue a douta sentença recorrida “(…) a obrigação do locatário no âmbito do ALD não tem por objecto uma prestação de execução periódica , como sucede num genuíno contrato de locação, mas uma verdadeira prestação de execução fraccionada.

Nestas circunstâncias só violentando a realidade (isto é: os interesses e o regime negocial efectivamente pactuado pelas partes intervenientes) se poderia qualificar o aluguer inserido na operação de ALD como um contrato de natureza locatícia, como um contrato, afinal, em que uma das partes se obriga a proporcionar temporariamente à outra, contra retribuição, o gozo de certa coisa (…) – vide ob. Cit., p.311”.

8- Na verdade, “O locador, durante o período de vigência do negócio, percebe não só o valor suportado com a compra, mas ainda o lucro financeiro. (…) Acresce que tal negócio envolve a prévia aquisição do bem pelo locador com o intuito de, ulteriormente, conceder o seu gozo ao locatário.

Este, por sua vez, obriga-se ao pagamento de uma renda que não corresponde ao mero gozo in Manual da Locação Financeira, de Fernando de Gravato Morais, Almedina, 2006, pág. 53 e 54; o sublinhado é nosso.

9- Aliás, só assim se compreende também que a primeira renda do contrato em causa nos autos tenha tido um valor muito mais elevado que as seguintes, sendo que in casu a primeira renda paga pelo apelante foi no valor 5.856,61€ acrescido de IVA e as restantes no valor de 179,11€, acrescido de IVA – cfr. ponto 5.º dos factos provados constantes na douta sentença de que se recorre - e também só assim se compreende que se estipule a prestação de uma caução, que no caso em mérito foi no montante de 2.936,67€ -vide clausula 9.ª das condições particulares do contrato em mérito nos autos.

10- E também só assim...

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