Acórdão nº 5454/03.0TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Junho de 2011

Magistrado ResponsávelLOPES DO REGO
Data da Resolução07 de Junho de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA e marido, BB, instauraram acção declarativa, com processo comum ordinário, contra a Companhia de Seguros ............., SA, (ora denominada Companhia de Seguros Fidelidade ............., SA) , ............. – Agência de Viagens e Turismo, L.da e DD, pedindo que os réus fossem condenados pagar à autora (I) a quantia de € 38.444,11 e ao autor (II) a quantia de € 2.642,25, quantias essas acrescidas de juros, à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento.

Fundamentando a sua pretensão, alegaram, em síntese, que, em 2001, se deslocaram ao Recife - Brasil, integrados numa viagem turística, a qual foi oferecida à autora pela H......., tendo-se o autor marido integrado também na viagem, acompanhando a mulher, mas custeando do seu bolso o respectivo bilhete.

A H....... encarregou a 2ª ré de organizar a viagem, tendo o respectivo programa sido fornecido aos participantes e o 3º réu foi o guia acompanhante do grupo durante a viagem.

Fazia parte das condições da viagem a efectivação de um seguro de viagem, no montante de 500.000$00, contratado com a 2ª ré.

Uma das actividades incluídas no programa da viagem foi um passeio de “buggy” pelas praias próximas de Porto Galinhas, passeio esse no qual participaram os autores.

Quando se encontravam já de regresso do passeio, circulando no areal, o réu DD, que conduzia o buggy no qual eram transportados os autores, efectuou uma guinada brusca no volante do veículo, o que determinou o capotamento do mesmo, tendo, em consequência disso, ficado a autora gravemente ferida, com escoriações várias, fracturas de ambos os pulsos e corte profundo no joelho esquerdo.

Foi transportada para o Hospital, onde foi submetida a duas intervenções cirúrgicas aos pulsos e outra ao joelho esquerdo, tendo, por via disso, ficado internada 11 dias e depois regressou a Portugal, onde continuou em tratamento até Janeiro/2002.

A autora continua a apresentar rigidez do punho direito e ferida deformativa do joelho esquerdo, o que lhe determina uma IPP de 0,098, mantendo dores permanentes e perda de força nos pulsos, bem como grandes dificuldades na realização das tarefas diárias.

Sofreu fortes dores e abalo psíquico e físico e outros danos físicos e morais.

O autor marido pagou a respectiva viagem e não tirou o menor proveito da mesma, sofrendo também forte abalo psicológico e moral, ao acompanhar o sofrimento da mulher, a quem teve que prestar auxílio durante os meses em que durou o tratamento.

A ré Fidelidade ............. contestou, pedindo que a acção fosse julgada improcedente, pois que, nos termos da apólice de seguro e no que respeita à rubrica “despesas de tratamento e de repatriamento 500.000$00”, já indemnizou a autora, tendo esta dado a competente quitação.

Em sede de eventual responsabilidade por incapacidade permanente, a mesma teria que ser avaliada nos termos das condições gerais, perante a solicitação da ofendida, o que não foi efectuado e os danos invocados relativamente ao autor não são cobertos pela apólice.

Os réus ............. – Agência de Viagens e Turismo, L.da e DD também contestaram, excepcionando a incompetência absoluta do tribunal, bem como a ilegitimidade dos réus, uma vez que o proprietário do buggy transferiu a responsabilidade civil do veículo para entidade sediada no Brasil - a Federação Nacional dos Seguros Privados e de Capitalização – F........... -, sendo o seguro obrigatório, pelo que os pedidos de indemnização deviam ser formulados contra a seguradora e não contra os réus – e impugnando a versão do acidente, constante da petição inicial.

Acrescentaram ainda que, para além do seguro de viagem, a 2ª ré celebrou com a.... Seguros, SA, um contrato de Seguro das Agências de Viagens, tendo transferido a sua responsabilidade para essa seguradora, pelo que sempre seriam os réus partes ilegítimas.

Os autores replicaram, dizendo - relativamente à contestação da seguradora - que a mesma não lhes deu conhecimento das cláusulas contratuais, tendo-se limitado a autora a assinar um recibo que lhe foi presente pela ré e só recentemente a incapacidade da autora pôde ser avaliada.

Quanto à contestação dos restantes réus, sustentaram a competência do tribunal e o desconhecimento da existência de algum seguro automóvel que, a existir, tal não eximiria de responsabilidade os réus.

Foi proferido despacho, convidando os autores a fazer intervir a F..........., e os 2º e 3º réus a requerer a intervenção da seguradora.....

Tais intervenções foram requeridas, tendo sido admitida a intervenção principal das chamadas.

A F........... foi citada e não contestou ; e a Companhia de Seguros.... apresentou contestação, sustentando, nomeadamente, que, de acordo com as condições gerais do contrato celebrado com a ré ............., estão expressamente excluídos os danos decorrentes de acidentes de viação provocados por veículos obrigados a seguro, o que seria o caso dos autos.

Foi julgada improcedente a excepção de incompetência absoluta do tribunal e, no despacho saneador, decidiu-se que o Tribunal é o competente.

Foram igualmente as partes consideradas legítimas, tendo sido julgadas improcedentes as excepções de ilegitimidade passiva invocadas.

Foi proferido despacho a fixar a Base Instrutória, não tendo sido apresentadas reclamações.

Procedeu-se a julgamento, sendo seguidamente, proferida sentença, em que se julgou a acção parcialmente procedente , decidindo-se em consequência: 1) - Condenar o réu DD e a Interveniente Federação Nacional dos Seguros Privados e Capitalização – F........... - a pagar à autora AA: a) - a quantia de € 393,75, acrescida de juros de mora vencidos desde a data da citação e vincendos, à taxa de 4% ano e até integral pagamento; b) - a quantia de € 13.000, acrescida de juros de mora vincendos desde a data presente sentença, à mesma taxa de 4%, até integral pagamento e 2) - Condenar os mesmos a pagar ao autor BB a quantia € 354,40, acrescida de juros de mora vencidos desde a data da citação e vincendos, à taxa de 4% ano e até integral pagamento; 3) - Absolver os mesmos do mais que contra si era peticionado e 4) - Absolver as rés Companhia de Seguros ............., S.A., ............. –Agência de Viagens e Turismo, L.da e a Interveniente Companhia de Seguros...., SA da totalidade do pedido.

  1. Inconformado, apelou o réu DD, tendo a Relação, porém, confirmado a decisão recorrida.

    Novamente inconformado, interpôs o mesmo R. DD a presente revista, que encerra com as seguintes conclusões que, como é sabido, lhe delimitam o objecto: 1- O Recorrente discorda parcialmente da decisão da primeira instância e totalmente do Douto Acórdão proferido a fls. conforme se propõe explicitar.

    2- Na verdade, o ora Recorrente entende que está a ser vítima de uma grande injustiça e vem fazer um último apelo a Vossas Excelências a fim de se fazer Justiça na última instância deste país.

    3- Pois, o Recorrente entende que a sentença e o Acórdão proferido tem vícios que ferem a validade dos mesmos, nomeadamente por falta de fundamentação legal e deficiente aplicação e interpretação da lei.

    Posto que: 4- A decisão da Ia instância no parágrafo 7 da pág. 13 e o Douto Acórdão de fls. partiu do pressuposto de que: "Da matéria provada resulta que os AA. e os RR. são portugueses e que aqueles e os RR. ............. - Agência de Viagens e Turismo, Lda. e DD se encontravam ocasionalmente no Brasil, pelo que, em termos de responsabilidade extracontratual também é aplicável a lei portuguesa".

    5- Daqui partindo, urge aplicar o direito e esse no caso concreto forçosamente não poderá passar pela fundamentação de condenar o ora Recorrente com base no princípio da exclusão de partes.

    6- Portanto, em violação manifesta do princípio da legalidade material previsto no art° 659° n° 2, 158°, 666° n° 3, 660° do C. P. C, bem como, do art° 13° e 208° da Constituição da República Portuguesa do C. P. C. e o princípio da tipicidade prevista na lei civil.

    7- Visto que, ao contrário do que acontece nos negócios jurídicos (vide art° 405° do C. C.) que vigora o princípio da liberdade contratual, na responsabilidade civil extracontratual (art° 483° e 497° do C. C), a lei tipifica direitos, negócios, efeitos ou situações jurídicas não reconhecendo outros para além desses, que nela se encontrem expressamente previstos.

    8- Assim sendo, o Douto Acórdão da Relação e o Tribunal da Ia instância condenou o Réu ora recorrente com base na responsabilidade solidária sem que para tal existe qualquer fundamento legal porque não enquadrável no art° 497° ou noutra disposição legal.9- A sentença e o Acórdão ora recorrida são nulos porque não fundamentados em disposição legal em violação manifesta do princípio da legalidade material a que o juiz está necessariamente vinculado pois, numa decisão judicial deve ser indicar e aplicar o direito (vide art° 659° n° 2 do C. P. C), ou seja, indicar a (s) norma (s) que sustenta a sua fundamentação de direito.

    10- De tal modo que, para efeitos do instituto do direito de regresso a seguradora não pode dele fazer uso quando haja mera culpa do responsável pelo acidente, nos termos do art° 19° ai. a) do dec. Lei n° 522/85 de 31 de Dezembro em vigor à data do acidente.

    11- Se a lei portuguesa não exige ao culpado, em acidente automóvel, que reembolse a seguradora os danos que pagou ao lesado, como pode exigir que aquele seja com esta solidariamente responsável? 12- Bem pelo contrário, visto que, por força do art° 29° n° 1 ai. a) desse mesmo diploma os responsáveis civis são partes ilegítimas na presente acção porque as acções de responsabilidade civil automóvel, devem ser intentadas tão somente contra a seguradora do veículo interveniente no sinistro automóvel.

    13- Recorda-se que, sendo a âncora da decisão recorrida a aplicação do direito do direito português aos presentes autos e estando provado nos autos que: a) O proprietário do "buggy", EE, transferiu a responsabilidade...

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