Acórdão nº 0162/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Junho de 2011

Magistrado ResponsávelANTÓNIO CALHAU
Data da Resolução01 de Junho de 2011
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I – A…, Sa, com os sinais dos autos, não se conformando com a decisão da Mma. Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou totalmente improcedente a oposição por si deduzida à execução fiscal que lhe foi instaurada pelo Serviço de Finanças de Lisboa-6, por dívida de IRC de 1999 e 2002, e respectivos juros, no montante global de € 13.077.805,83, ao abrigo do disposto nos artigos 203.º, n.º 1, alínea a) e 204.º, n.º 1, alíneas c) e f), do CPPT, dela vem interpor recurso para este Tribunal, formulando as seguintes conclusões: A. Ao não ter decidido pela revogação implícita do acto de liquidação n.º 2006 8310004698, concretizada pelo acto de liquidação n.º 8310033484, a sentença em apreço padece de erro de julgamento nos termos previstos nas alíneas c) e d) do art.º 668.º do CPC, aplicável “ex vi” do art.º 2.º do CPPT.

  1. Tal erro assenta no facto do Tribunal “a quo” se ter limitado a transcrever e seguir a argumentação vertida na informação proveniente da Divisão de Liquidação dos Impostos sobre o Rendimento e a Despesa (Informação n.º 439/2007, de 16 de Junho de 2007, a fls. 241-255 dos autos), anexa à contestação, suposta fundamentação a posteriori, sem cuidar de a analisar criticamente e de dela retirar as devidas consequências jurídicas.

  2. Os factos subjacentes ao caso em apreço são cristalinos: em 27/03/2006, a Administração Fiscal emitiu a liquidação n.º 2006 8310004698, e em 29/05/2006 (dois meses depois), a mesma Administração Fiscal emitiu a liquidação n.º 2006 8310033484, (compensação n.º 2006 00009363085), referente ao mesmo exercício de 1999.

  3. De acordo com a teoria geral dos actos tributários e, em particular, com a doutrina da sucessão de actos administrativos, aplicável aos actos tributários, “ex vi” do artigo 79.º da Lei Geral Tributária, é inevitável concluir que, juridicamente, a liquidação n.º 2006 8310033484, porque acto administrativo posterior – emitido em 29/05/2006 – revogou, implicitamente, a liquidação n.º 2006 8310004698, datada de 27/03/2006.

  4. Este entendimento é pacífico na jurisprudência que, na senda da doutrina, vem afirmando que o acto revogatório implícito constitui “um acto administrativo que, não declarando expressamente suprimir os efeitos de acto anterior, produz, na realidade, consequências jurídicas que, sendo incompatíveis com os efeitos produzidos pelo acto anterior de liquidação adicional, conduzem à eliminação destes” – cfr. o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 23/05/2006 e proferido no processo 01247/03 (Gomes Correia). Na doutrina, entre outros, José Robin de Andrade, A Revogação dos Actos Administrativos, 2.ª edição, Coimbra, Coimbra Editora, págs. 39 e ss, e Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2.ª edição, Almedina, 2007, pág. 668.

  5. Uma vez revogada, e porque intercalar, não pode a liquidação n.º 2006 8310004698 estar subjacente ao processo de execução “sub judice”, devendo este ser titulado, ou pela liquidação adicional originária (liquidação adicional n.º 8310017227) ou pela última liquidação emitida relativamente ao exercício em apreço (liquidação n.º 2006 8310033484).

  6. Sem prescindir, o processo de execução em apreço assenta num título executivo falso, na acepção da alínea c) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, pois, resulta, expressamente, da “Citação” da recorrente para os presentes autos, que a certidão de dívida subjacente tem origem no doc. n.º 06102100056000001333891 que corresponde à demonstração de acerto de contas anexa à liquidação n.º 2006 8310004698, de 27/03/2006.

  7. Tendo a referida liquidação sido revogada pela liquidação n.º 2006 8310033484 ou modificada no seu conteúdo, o título executivo que subjaz aos presentes autos (por assentar numa liquidação que foi revogada e modificada posteriormente) não reflecte a realidade, afigurando-se, por isso, falso. Neste sentido, vide Acórdão do STA, Processo n.º 667/09, de 13/01/2010 (PIMENTA DO VALE) – “A falsidade do título executivo, fundamento de oposição à execução fiscal vertido na alínea c) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, é a que decorre da discrepância entre o título executivo e os conhecimentos ou outros instrumentos de cobrança que nele se diz estarem-lhe subjacentes”.

    1. Conclusão que é admitida pela própria Administração Fiscal no § 4.º da informação junta aos autos pela Divisão de Liquidação dos Impostos sobre o Rendimento e sobre a Despesa (pág. 3).

  8. Não tendo assim entendido, contrariamente ao pugnado no Acórdão do STA, Processo n.º 342/10, de 07/07/2010 (JORGE LINO) – “A falsidade do título executivo traduz-se na falta de correspondência da atestação nele firmada em relação ao acto que esse título se destina a certificar”, também, por este motivo, incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento, por violação do disposto na alínea c) do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT, impondo-se, pois, a anulação da sentença em crise.

  9. Relativamente ao IRC de 2002, não tendo sido peticionada a sua apreciação na P.I., constitui nulidade prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC, aplicável ex vi do artigo 2.º do CPPT, o entendimento vertido na douta sentença “de que não resulta alegado ou provado qualquer facto que permita concluir que não é devida” e, também, nessa parte, conclui pela improcedência da oposição.

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    A Mma. Juíza a quo, por entender que a decisão recorrida não padece de quaisquer nulidades de que cumpra conhecer, sustenta a mesma na íntegra.

    O Exmo. Magistrado do MP junto deste Tribunal emite parecer no sentido de que o recurso merece provimento, incorrendo a decisão recorrida em excesso de pronúncia, pelo que deve a mesma ser declarada nula e o processo devolvido ao tribunal recorrido para proferimento de nova decisão, expurgada de tal nulidade.

    Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

    II - Mostram-se provados os seguintes factos: 1. Em 22 de Novembro de 2006, foi instaurado contra a oponente no Serviço de Finanças de Lisboa-6 o processo de execução fiscal n.º 3123200601046365 referente a dívida de IRC de 1999, no montante de EUR 2.551.939,74 e de IRC de 2002 e correspondentes juros, no montante de EUR 10.525.866,09, ascendendo a dívida exequenda ao montante total de EUR 13.077.805,83 (cf. autuação e certidões de dívida...

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