Acórdão nº 8/07.5TBSNT.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Maio de 2011
Magistrado Responsável | MAIA COSTA |
Data da Resolução | 11 de Maio de 2011 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. RELATÓRIO AA, com os sinais dos autos, foi condenado nas seguintes penas parcelares: - nos autos: por factos ocorridos entre Outubro e Novembro de 2001, foi condenado em 18.7.2008, pela prática de um crime de burla agravada, p. e p. pelos arts. 217º e 218º, nºs 1 e 2, a) e c), do Código Penal (CP), na pena de 3 anos de prisão; - no proc. nº 510/02.5GHSNT, da Vara Mista de Coimbra, foi condenado em 2.4.2004, pela prática, em 27.9.2002, de um crime de burla agravada, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos; - no proc. nº 10080/99.4TDLSB, da 6ª Vara Criminal de Lisboa, foi condenado em 18.11.2005, pela prática, em Abril de 1999, de um crime de falsificação, p. e p. pelo art. 256°, nº 1, c), do CP, na pena de 1 ano de prisão, e de dois crimes de burla agravada, p. e p. pelos arts. 217° e 218°, nº 2, a), do CP, respectivamente, na pena de 3 anos de prisão e na pena de 3 anos e 6 meses de prisão, tendo em cúmulo jurídico destas três penas sido condenado na pena única de 4 anos e 6 meses de prisão; - no proc. nº 481/03.0SILSB, da 8ª Vara Criminal de Lisboa, foi condenado em 12.8.2006, pela prática, em 27.1.2003, dos crimes de burla qualificada e de falsificação de documento, na pena única de 3 anos e 3 meses de prisão; - no proc. nº 588/04.7TATVD, do 1° Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Torres Vedras, o arguido foi condenado em 28.11.2006, pela prática, em Junho e Julho de 2004, de um crime de burla e de três crimes de burla qualificada na pena única de 6 anos e 10 meses de prisão; - no proc. nº 5342/03.0TDLSB, da lª Vara Criminal de Lisboa, foi condenado em 10.5.2007, pela prática, em 2.9.2002, de um crime de burla qualificada, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão; - no proc. nº 1548/04.3TDLSB, do 1° Juízo Criminal de Oeiras, foi condenado em 16.6.2008, pela prática, em 1.2.2004, de um crime de falsificação de documento, na pena de 1 ano e 8 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, com sujeição a regime de prova.
Foi realizado o cúmulo destas penas no Juízo de Grande Instância Criminal de Sintra, da Comarca da Grande Lisboa-Noroeste, por acórdão de 10.11.2010, que condenou o arguido na pena única de 12 anos de prisão.
Dessa decisão interpôs o arguido recurso para este Supremo Tribunal, concluindo: 1. O recorrente foi condenado em cúmulo jurídico a uma pena única de 12 anos de prisão, a qual é considerada exagerada.
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A decisão que efectiva o cúmulo jurídico das penas parcelares, tem que necessariamente demonstrar, fundamentando, que além de indicados foram efectivamente avaliados os factos e a interacção destes com a personalidade.
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No caso vertente o Tribunal a quo não valorou devidamente todos os elementos necessários a uma boa decisão, mais concretamente o imputado ressarcimento dos prejuízos na medida da pena.
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Por essa razão o acórdão violou o previsto nos arts. 374º nº 2, 379º, 97º nº 5, 410 nº 2 a) e c) todos do CPP, e 70º, 71º, 77º e 78º todos do CP, devendo o mesmo ser declarado nulo e dado sem efeito.
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É inequívoca a verificação de uma situação de concurso de crimes ou crime continuado, tal como define o art. 30 nº 1 e 2 do CP, cometido pelo recorrente. Donde a verificação deste pressuposto legal só pode levar à imposição de uma única pena nos termos do art. 77º ou 79º do CP.
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Está-se perante estas duas figuras quando hipoteticamente é concebível a possibilidade de realização de um único julgamento por todos os crimes.
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Tendo em atenção os crimes praticados pelo recorrente, nomeadamente burla, falsificação de documento, a similaridade do modus operandi, a existência de uma suposta linha ininterrupta em termos temporais da prática dos crimes, sem margem para dúvida que se está perante uma única resolução criminosa/crime exaurido, ou então perante uma situação de um crime continuado, devendo ser aplicada uma única pena com base numa única culpa, não tendo decidido dessa forma violou o Tribunal “a quo” o art. 30º, 77º e 79º todos do CP.
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A decisão que efectiva o cúmulo jurídico das penas parcelares necessariamente que terá que demonstrar fundamentando que foram avaliados o conjunto dos factos e a interacção destes com a personalidade. Poderá eventualmente concluir por uma impossibilidade de percepção do poliformismo do perfil da personalidade na sua interacção com os actos criminosos.
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Independentemente da circunstância de a avaliação da personalidade em função dos factos não se poder reconduzir a um apelo a repetidas fórmulas de natureza genérica (que induzem a elaboração de um cúmulo jurídico à revelia dos concretos factores a ponderar) é evidente que, no caso vertente, o denominado modo de vida se consubstancia na existência do concurso de infracções que dá origem à elaboração do cúmulo jurídico.
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Sendo esta operação um caso especial de determinação da pena que, necessariamente, assume um conteúdo agravativo é evidente que definir a pena conjunta em função da existência de um concurso de crimes constitui uma valoração que, sendo dupla, é inadmissível.
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A referência à personalidade começa e acaba na referência ao modo de vida não permitindo concluir se o Tribunal avaliou, ou não a personalidade em termos da globalidade dos factos detectando indícios de uma personalidade vocacionada para a prática deste tipo de infracções indicando-se uma tendência que se deverá traduzir num sentido agravativo ou se hipoteticamente, estarem perante uma pluralidade pouco sedimentada na personalidade.
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O arguido ressarciu totalmente os ofendidos no processo n.º 510/02.5GHSNT, Vara Mista de Coimbra, processo n.º 10080/99.4TDLSB, 6ª Vara, e processo n.º 481/03.0SILSB, 8ª Vara, assim como nos presentes autos, os ofendidos com excepção da C....
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E quanto à C... esta entidade além de ter faltado sempre ao julgamento que se realizou após decisão do Tribunal da Relação, não ficou em situação económica difícil, o que seria uma agravante no caso concreto.
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Caso a Lei de Processo Penal que entrou em vigor em Setembro de 2007 abrangesse o arguido nestes processos, art.º 206º, n.º 1 do CPP ou se o arguido tivesse sido julgado mais tarde, isto é, a partir de Setembro de 2007 as penas que lhe foram aplicadas quer na 6ª vara, 8ª Vara, Coimbra não existiriam porque os procedimentos teriam sido arquivados.
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Assim na aplicação da pena única ter-se-á que ter em conta esta situação, que não poderá prejudicar o arguido, pondo o legislador na mão do julgador, o emendar da situações injustas, tais como não aplicar à lei adjectiva o mesmo principio que o da lei substantiva, ou seja a lei mais favorável ao arguido.
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Assim no cômputo da pena além da atenuante por ressarcimento dos danos considerando as declarações feitas pelos ofendidos de desistência da queixa e juntas aos autos temos que ter em conta a não existência da pena na vigência da presente lei.
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Assim, temos que as penas que deveriam ser contabilizadas para efeitos do cúmulo seriam as penas do processo n.º 588/04.7TATVD de Torres Vedras com pena total de 6 anos e 10 meses e da 1ª Vara Criminal, 4 anos e 6 meses e a pena destes autos devidamente atenuada atendendo ao ressarcimento de todos os ofendidos e desistência de queixa com excepção da C....
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Fazendo a soma aritmética destas penas quase que totalizam a mesma em que o arguido foi condenado.
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Quanto ao processo que correu termos pelo Tribunal de Oeiras, o mesmo não podia ser sujeito a cúmulo jurídico, já que o Tribunal onde o arguido também ressarciu o ofendido quis-lhe dar um voto de confiança, arquivando o processo quanto ao crime de burla e suspendendo-lhe a pena quanto ao crime de falsificação.
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Ao integrar esta pena no cúmulo das penas de prisão, está este Tribunal a prejudicar o arguido e a decidir quanto a uma decisão transitada em julgado e não revogada.
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Por prejudicar as garantias do próprio recorrente não podia esta pena ser englobada no cúmulo sob pena de se violar o caso julgado e garantias de defesa do arguido.
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Desta forma foi violado o preceituado no art. 50, 56 do CP.
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Outra interpretação que não seja esta, é violadora e contrária ao preceituado no art.º 32 da CRP.
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O ideal teria sido apensar os processos, o que teria permitido o julgamento unitário da actividade que respeita aos processos. Como tal não foi feito, a solução para “remediar” a situação deverá ser aquela a que se chegaria se tivessem sido adoptados os procedimentos adequados.
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A tudo isto acresce, o largo tempo em que o arguido está preso e a interiorização que fez dos factos, o apoio familiar que possui e a sua idade já avançada, factor inibidor de atitudes propensas à prática de novos crimes.
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Deverá pois, ter-se em linha de conta a idade do arguido, a sua postura processual, as condições de reinserção e o apoio familiar na aplicação da pena final.
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O arguido demonstrou já arrependimento de uma conduta delituosa que o acompanhou durante alguns anos.
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A forma de demonstrar esse arrependimento é pagar aos ofendidos, o que tem feito até onde pode.
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Aliás uma circunstância a que o Tribunal deve atender para determinar a medida da Pena está plasmada na al. e) do nº 2 do artº 71º do C.P. para onde remete o art.º 77º nº 2 do mesmo diploma.
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Conduta posterior destinada a reparar as consequências do crime. A sua conduta posterior aos factos releva ao nível da prevenção que através desses actos de arrependimento/reparação se mostra acautelada contrariamente ao defendido no Acórdão de que se recorre, que não valorou devidamente a reparação, não o tendo relevado quanto à medida de pena.
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Demonstra o arguido através da reparação do dano que interiorizou os factos e reconhece o valor do bem jurídico violado.
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O Tribunal de 1.ª instância violou art. 70.º, 71.º, 72.º, 77.º e 78.º do CP.
O sr. Procurador da República respondeu, dizendo: 1.ª A pena de 12 anos de prisão imposta é adequada visto que o Tribunal considerou que em qualquer dos crimes pelos quais foi condenado o dolo foi muito...
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Acórdão nº 543/08.8GASEI.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Junho de 2011
...entre outros, os acórdãos do STJ , de 29 de Abril de 2010 ( proc. n.º 16/06.3GANZR.C1, 5.ª Secção) e de 11 de Maio de 2011 ( proc. n.º 8/07.5TBSNT.S1, 3.ª Secção), in www.dgsi.pt/stj. [7] Cfr. acórdão do STJ, de 20 de Janeiro de 2010, in CJ, n.º 222, pág. [8] Obra cit. pág.s 90 e 91.
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Acórdão nº 543/08.8GASEI.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Junho de 2011
...entre outros, os acórdãos do STJ , de 29 de Abril de 2010 ( proc. n.º 16/06.3GANZR.C1, 5.ª Secção) e de 11 de Maio de 2011 ( proc. n.º 8/07.5TBSNT.S1, 3.ª Secção), in www.dgsi.pt/stj. [7] Cfr. acórdão do STJ, de 20 de Janeiro de 2010, in CJ, n.º 222, pág. [8] Obra cit. pág.s 90 e 91.