Acórdão nº 829/09.4TTVFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Maio de 2011
Magistrado Responsável | PAULA LEAL DE CARVALHO |
Data da Resolução | 09 de Maio de 2011 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Procº nº 829/09.41TTVFR.P1 Apelação Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 412) Adjuntos: Des. António José Ramos Des. Eduardo Petersen Silva Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B…, aos 23.10.2009, intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum contra C…, pedindo a condenação desta a pagar-lhe: - €3.930,91, a título de remunerações por trabalho suplementar referente aos anos de 2007 e 2008; - €588,32, a título de remuneração pelo trabalho suplementar durante o tempo de descanso compensatório; - Subsidiariamente, no caso de não ser possível liquidar as quantias pedidas nas alíneas anteriores, na sua totalidade ou em parte, a pagar-lhe o que se apurar em “execução de sentença”.
- €411,80, a título de retribuição correspondente ao período de aviso prévio em falta; - €1.742,70 a título de compensação legal pela violação do direito a férias.
- Uma indemnização, a liquidar na pendência da presente acção ou em “execução de sentença”, correspondente à diferença entre o valor do subsídio de desemprego recebido e o que receberia se a remuneração por trabalho suplementar tivesse sido paga e sujeita aos descontos das contribuições.
- Juros de mora, à taxa legal, que se vencerem desde a data da citação até integral pagamento de todas as quantias devidas.
Para tanto, alega em síntese que: no dia 17 de Julho de 2007, celebrou com a R. um contrato de trabalho temporário, a termo incerto, por força do qual ficou obrigado a desempenhar funções “junto da empresa utilizadora D…; E…; F… - ACE”, na empreitada de alargamento e beneficiação para 2x3 vias do sublanço Estarreja / Feira da A1 – Auto Estrada do Norte – Ovar; auferia a retribuição base mensal de €406,50€ desde a data de admissão até 31.12.07 e de 426€ desde o dia 01.01.08 até 31.10.2008, data da cessação do contrato; prestou, em dias úteis, o trabalho suplementar que alega, que a Ré não lhe pagou e não tendo, ainda, gozado os respectivos descansos compensatórios; a ré comunicou-lhe a cessação do contrato de trabalho por carta datada de 24.10.2008, recebida aos 29.10.2008, não tendo, assim, sido cumprido o prazo de aviso prévio de 30 dias. Durante o período de execução do contrato de trabalho nunca gozou qualquer dia de férias porque a Ré não lhas marcou, nem permitiu que gozasse os 30 dias úteis de férias a que tinha direito, em consequência do que, nos termos do art. 222º do CT, reclama a correspondente compensação (580,90€ x 3).
A Ré contestou a acção, confessando aceitar pagar ao A. o valor peticionado a título de aviso prévio em falta, mas, no mais, concluindo pela improcedência da acção e consequente absolvição.
Para tanto impugna o alegado pelo A., não aceitando o horário de trabalho invocado uma vez que a empresa utilizadora não lhe forneceu qualquer registo ou informação da prática de 11 horas de trabalho diárias por parte do A., sendo aquela a responsável pela eventual existência quer de trabalho suplementar, quer de violação do direito a férias.
O A. respondeu, mantendo o alegado na petição inicial e acrescentando, quanto à violação do direito a férias, que a Ré também a isso obstou já que, quando esta lhe comunicou, apenas dois dias antes de o contrato de trabalho cessar, para gozar férias, já não tinha o A. possibilidade de as gozar.
Proferido despacho saneador tabelar, com dispensa da selecção da matéria de facto, realizada a audiência de julgamento, com gravação da prova pessoal nela prestada, e decidida a matéria de facto, foi proferida sentença a julgar a acção procedente e a condenar a Ré a pagar ao A.: -A quantia global de € 6.673,73, assim discriminada: €3.930,91 a titulo de remuneração por trabalho suplementar referente aos anos de 2007 e 2008; € 588,32 a título de remuneração pelo trabalho suplementar prestado durante o tempo de descanso compensatório; € 411,60 a título de retribuição correspondente ao período de pré-aviso em falta; € 1.742,70 a título de compensação legal pela violação do direito a férias.
- Indemnização a liquidar em execução de sentença, correspondente a diferença entre o valor do subsidio de desemprego recebido pelo A. e o valor que receberia se a remuneração por trabalho suplementar tivesse sido paga e sujeita aos descontos legais das contribuições.
- Sobre “Todas as quantias acima referidas”, juros a taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento.
Inconformada, veio a Ré apelar da sentença, referindo no respectivo requerimento de interposição do recurso que “vem, Interpor recurso, com Arguição da Nulidade da Sentença, nos termos do disposto nas alíneas b) e d) do nº 1 do art. 668º do C.P.C., o que faz nos termos do nº 1 d) Art. 77º do C.P.T.”, passando de seguida a apresentar as suas alegações[1] que conclui nos termos que a seguir sintetizamos: I.
Impugnação da matéria de facto: Pretende a reapreciação da matéria de facto sobre a prestação efectiva, ou não, de trabalho suplementar realizado pelo A., durante o período de execução do contrato de trabalho temporário a termo incerto celebrado pela Ré enquanto se encontrava sob a autoridade da empresa utilizadora e consequente exigibilidade, ou não, da Ré pelo seu pagamento.
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Dos autos não constam documentos que sustentem o pedido do A. quanto ao trabalho suplementar, a ele incumbido o respectivo ónus da prova.
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A prova testemunhal produzida em audiência não permite que se considere como provados os nºs 9 e 12 do rol dos factos dados como provados, por não se encontrar devidamente provada a existência da realização de trabalho suplementar, nem o número de dias em que terá sido prestado, por falta de demonstração dos pressupostos para quantificar as horas de trabalho suplementar ou de que, tendo existido, o trabalho não tenha sido pago.
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As 3 testemunhas apresentadas pelo A. (única prova efectuada) eram seus amigos e colegas, duas delas contaram com a ajuda do A. na obtenção de trabalho e uma delas (G…) tem um processo a correr contra a Ré pelos mesmos fundamentos e com os mesmos pedidos, que correu termos no Tribunal do Trabalho de Aveiro e que se encontra em recurso (interposto pelo ali Autor e aqui testemunha), sendo ambos representados pelo mesmo mandatário, o que denuncia elevada probabilidade de ter sido prejudicada a isenção dos respectivos depoimentos, atento o interesse comum e sendo evidente a preparação do discurso.
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O depoimento de G… (cujas passagens, por referência aos tempos da gravação, indica) esclareceu ter sido a empresa utilizadora a determinar o horário de trabalho e afirmou nunca ter dele dado conhecimento à Ré, testemunha essa que depôs em especial sobre o seu próprio processo, preocupando-se em confirmar o horário nos moldes alegados na petição inicial e não tendo referido que não lhe tinha sido pago o trabalho suplementar.
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A testemunha H… (cujas passagens, por referência aos tempos da gravação, indica) referiu que recebia ordens directas da empresa F… e apesar de algumas conjecturas acerca do conhecimento, pela Ré, do horário alegado, através de um funcionário de nome L…, nunca entregou nem viu que este entregasse à Ré os supostos cartões de onde constariam as horas trabalhadas e registadas.
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A testemunha J… (cujas passagens, por referência aos tempos da gravação, indica) é testemunha no processo de G… e foi a que, dentro do “notório alinhamento”, pior concretizou o horário de trabalho do A., referindo, no entanto, que foi a empresa utilizadora quem sempre lhe deu ordens e confirmou que nunca disse nada à Ré sobre esse horário.
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Desses depoimentos resulta que quem definiu o horário de trabalho em concreto foi a empresa utilizadora e que dele não foi dado conhecimento à Ré.
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O A. não intentou a acção contra a empresa utilizadora, não arrolou como prova outras testemunhas, designadamente encarregados, superiores hierárquicos, quem diariamente lhe dava instruções, determinava o horário e enviava as informações para pagamento, assim como não requereu a junção aos autos de documentos em poder de terceiros, designadamente, cartões de ponto, mapas de registo de trabalho suplementar.
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Improcedendo o pedido relativo ao trabalho suplementar, improcede igualmente o pedido referente ao descanso compensatório.
XI.
Nulidade da sentença: há insuficiência da prova produzida pelas testemunhas arroladas pelo A., uma total falta de fundamentação sobre a valorização de tais depoimentos, sendo que a defesa da Ré e as testemunhas por esta arroladas não foram sequer valoradas, nem objecto de apreciação.
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A afirmação, na sentença, de que é “irrelevante a alegação da R. quando se refere ao facto da empresa utilizadora não lhe forneceu qualquer registo ou informação da pratica de 11 horas de trabalho diárias por parte do A.” é insuficiente, não constando da sentença “qualquer alusão à formação da convicção do Tribunal, muito menos uma análise crítica.”.
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As testemunhas arroladas pela Ré, designadamente I…, prestaram ao Tribunal vários esclarecimentos, que indica e que, diz a Recorrente, eram úteis e relevantes, como por exemplo o facto de a Ré não ter em seu poder o contrato de utilização de trabalho temporário porque o utilizador nunca o devolveu, bem como incumprimentos que terão levado ao afastamento repentino da empresa utilizadora pelo dono da obra.
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O Tribunal a quo não apreciou em concreto a prova produzida, não fundamenta como formou a sua convicção e não se pronuncia sobre questões de facto e de direito, pelo que violou o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais que lhe impõem o art. 208º nº 1 da CRP e o nº 1 e 2 do art. 158º do CPC, pelo que a sentença é nula nos termos das als. b) e d) do art. 668º do CPC.
XV.
Interpretação e aplicação do Direito: O tribunal a quo não procedeu a uma correcta interpretação e aplicação da lei ao aceitar que seria a empresa de trabalho temporário a responsável pela retribuição do trabalho suplementar.
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No Regime Jurídico do Trabalho Temporário, Utilizador e Empresa de Trabalho Temporário assumem em simultâneo a...
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